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Fibromialgia: Conceito e Fisiopatologia

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FIBROMIALGIA 
 
 
Conceito 
Síndrome dolorosa crônica não inflamatória, caracterizada por dor generalizada há mais de três 
meses, com sinais e sintomas variados como, sono não restaurador, síndrome das pernas inquietas, 
fadiga, cefaleias tensionais, síndrome do intestino irritável, síndrome da fadiga crônica, síndrome 
de Raynaud, doenças infecciosas (herpes), sensação de articulações edemaciadas. Há também 
efeitos colaterais que podem desencadear a fibromialgia, como estatinas, fibratos e algumas drogas 
ilícitas que acarretam lesão muscular, além de alguns corticóides. O GH está relacionado com a 
restauração muscular, e a pessoa com fibromialgia têm um déficit de GH, com quadros de lesão 
muscular cíclicos. 
Existe grande sensibilidade ao toque, calor e frio. Prevalece mais nas mulheres, entre 30 e 60 anos, 
e piora principalmente com alguns fatores sociais como ansiedade, depressão, fator de estresse 
extremo (pós-guerras). 
 
Fisiopatologia 
Apesar de ser uma condição reumatológica intensamente estudada, a fisiopatologia da fibromialgia 
não está totalmente esclarecida (Sarzi-Puttini et al., 2012). Diversas hipóteses têm sido citadas na 
literatura ao longo dos anos tentando explicar os mecanismos envolvidos na génese e evolução 
desta doença (Coaccioli et al., 2008; Goldenberg et al., 2008). 
Distúrbios ao nível do processamento da dor, perturbações do sono, alterações no sistema 
imunitário, no sistema neuroendócrino e ainda a implicação de fatores de origem genética, 
psicológica, emocional e ambiental fazem parte de alguns dos modelos explicativos para a origem 
desta doença (Chakrabarty e Zoorob, 2007; Latorre-Santiago e Torres-Lacomba, 2017). Contudo, 
alterações em apenas um destes fatores não explica a multiplicidade de sintomas presentes na 
fibromialgia. Desta forma, pressupõe-se que a manifestação e evolução da fibromialgia estará 
dependente da interação entre os múltiplos fatores anteriormente citados, contribuindo de forma 
sinérgica para o desenvolvimento, não apenas da dor, mas também dos restantes sintomas que 
constituem o complexo quadro clínico da fibromialgia (Carvalho et al., 2008; Coaccioli et al., 
2008). 
Distúrbios no processamento da dor – Desregulação das vias inibitórias descendentes e da via 
nociceptiva ascendente da dor (5ht e NA inibem) 
Segundo Jay e Barkin (2015), uma atividade reduzida do sistema nervoso simpático e 
parassimpático em doentes com fibromialgia parece estar envolvida nas alterações do equilíbrio. 
Os doentes com fibromialgia aparentemente apresentam uma disfunção da 5- HidroxiTriptofano 
e da NoraAdrenalina ao nível destas vias inibitórias da dor, contribuindo para a sensibilização central 
e hiperexcitabilidade das vias transmissoras da dor ao nível da medula espinhal e supra-espinhal 
(Lopes, 2003; Arnold, 2006) e, consequentemente, conduzindo a uma disfunção das vias 
descendentes e originando fenómenos de hiperalgesia e alodinia em pacientes com fibromialgia 
(Lopes, 2003; Loggia et al., 2014) 
Anomalias na libertação de neurotransmissores – Via da serotonina 5HT 
Anomalias na libertação de neurotransmissores – Via da noradrenalina NA 
Receptores da serotonina 
Os recetores da 5-HT são fundamentais para regular o nível deste NT na fenda sináptica. Na 
fibromialgia estes aparentam ter um papel fundamental na regulação da dor, humor e 
comportamento dos doentes (Mease, 2005). Estes recetores também são responsáveis pela 
regulação do sono e do humor (Ablin e Buskila, 2013; O’Mahony et al., 2015). 
O recetor 5-HT2A é responsável pela regulação do sono e do comportamento assim como pela 
prevenção de alucinações. 
A região de codificação do recetor 5-HT2A inclui 7 polimorfismos, um estudo realizado ao 
polimorfismo T102C no recetor 5-HT2A em pessoas com fibromialgia, descobriu-se que estes 
apresentavam uma diminuição do genótipo T/T e, consequentemente, um aumento do genótipo 
T/C e C/C, podendo esta alteração genética ser responsável pelas perturbações do sono recorrentes 
nesta condição 
Já os receptores 5-ht3, são os únicos que se encontram acoplados a canais iónicos. Esta 
característica permite a estes recetores ter uma atividade contrária à dos recetores 5-HT1A e 5-
HT2A no processo da dor. Ou seja, estimulam a dor. No tratamento da fibromialgia é interessante 
explorar esta característica, administrando antagonistas dos recetores 5-HT3. 
Que são os setrons, ex: ondasetron. 
Desregulação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal 
O eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) está implicado no controlo da depressão, da resposta 
ao stress e do sono. Neste eixo estão envolvidas três glândulas distintas: hipotálamo, adenohipófise 
e adrenais. Quando ocorre a estimulação do hipotálamo é secretada a hormona libertadora de 
corticotrofina (CRH), um dos responsáveis pela estimulação da libertação da hormona 
adrenocorticotrófica (ACTH) pela adenohipófise, que, por sua vez, induz a produção de cortisol, um 
glucocorticoide (Veldhuis et al., 2013; Singh et al., 2019). O cortisol produzido tem afinidade por 
dois recetores de tipos diferentes: de glucocorticoides e de mineralocorticoides, pelos quais tem 
alta afinidade. 
Esta ligação promove uma redução dos níveis de secreção de CRH e ACTH através de um 
mecanismo de feedback negativo, de forma a manter a homeostasia (Tomas et al., 2013). 
Segundo Carvalho e colaboradores (2008), distúrbios neuroendócrinos, como sejam alterações 
dos níveis de cortisol, parecem estar envolvidos nos mecanismos fisiopatológicos da fibromialgia. 
Esta hipótese é suportada pelo facto de doentes fibromiálgicos estudados apresentarem na saliva 
níveis reduzidos de cortisol (hipocortisolismo). O hipocortisolismo tem sido associado a muitas 
características clínicas da fibromialgia, como fadiga, perturbações do sono, estado depressivo e 
aumento da atividade do sistema nervoso simpático. Esta alteração dos níveis de cortisol poderá 
estar relacionada com uma disfunção ao nível do eixo HPA, ocorrendo uma diminuição da resposta 
da ACTH e da adrenalina à hipoglicemia e uma diminuição da resposta cortical à ACTH (Tanriverdi 
et al., 2007; Singh et al., 2019). 
É também sugerido que NTs como a NA, 5-HT e acetilcolina estão envolvidos na regulação do eixo 
HPA (McQuade e Young, 2000). 
Autores defendem que algumas das alterações do foro endócrino poderão estar relacionadas com 
os níveis reduzidos de 5-HT apresentados pelos doentes com fibromialgia (Di Franco et al.). Esta 
hipótese é sustentada devido ao facto de experimentalmente, após a administração de para-
clorofenilalanina (substância que provoca a redução da síntese de 5-HT do sistema nervoso 
central), além da modificação do padrão do sono, ocorre uma diminuição do ritmo circadiano no 
cortisol plasmático que determina o aparecimento de uma síndrome do tipo da fibromialgia, 
também caracterizada por dor musculoesquelética generalizada e fadiga (Coaccioli et al., 2008; 
Mutsuura et al., 2009). 
 
Diagnóstico 
Quadro clínico: 
O sintoma predominante da fibromialgia é a dor generalizada, de caráter crônico e persistente, que 
pode variar de intensidade para um mesmo paciente. A dor pode ser em pontada, peso ou 
queimação e os acometidos costumam utilizar termos dramáticos para expressar suas dores. É 
frequente ouvir, de diferentes pacientes, que eles se sentem como se todo o seu corpo estivesse 
"podre". Na descrição da dor e rigidez matinal, termos como “sinto como se um caminhão (ou 
ônibus, trem ou trator) tivesse passado pelo meu corpo" são muito utilizados. Com frequência, 
esses pacientes relatam que as dores pioram com a queda da temperatura, dias chuvosos, esforço 
físico ou estresse psicológico. 
A fadiga física e mental pode ser encontrada em mais de 90% dos pacientes e, ocasionalmente, é 
a queixa principal. Grande parte dos pacientes apresenta importante distúrbio do sono 
caracterizado pelo sono não restaurador, manifesto pela sensação de se sentir cansado ao acordar. 
O quadro clínico desta síndrome costuma ser polimorfo,exigindo anamnese cuidadosa e exame 
físico detalhado. O sintoma presente em todos os pacientes é a dor difusa e crônica, envolvendo o 
esqueleto axial e periférico. Em geral, os pacientes têm dificuldade para localizar a dor, muitas vezes 
apontando sítios peri-articulares, sem especificar se a origem é muscular, óssea ou articular. O 
caráter da dor é bastante variável, podendo ser queimação, pontada, peso, "tipo cansaço" ou como 
uma contusão. É comum a referência de agravamento pelo frio, umidade, mudança climática, 
tensão emocional ou por esforço físico. 
Outro sintoma geralmente presente é a "sensação" de inchaço, particularmente nas mãos, 
antebraços e trapézios, que não é observada pelo examinador e não está relacionada a qualquer 
processo inflamatório. Além dessas manifestações músculo-esqueléticas, muitos se queixam de 
sintomas não relacionados ao aparelho locomotor. Entre esta variedade de queixas, destaca-se 
cefaléia, tontura, zumbido, dor torácica atípica, palpitação, dor abdominal, constipação, diarréia, 
dispepsia, tensão pré-menstrual, urgência miccional, dificuldade de concentração e falta de 
memória. Cerca de 30% a 50% dos pacientes possuem depressão. Ansiedade, alteração do humor 
e do comportamento, irritabilidade ou outros distúrbios psicológicos acompanham cerca de 1/3 
destes pacientes, embora o modelo psicopatológico não justifique a presença da fibromialgia. 
O exame físico fornece poucos achados. Eles apresentam bom aspecto geral, sem evidência de 
doença sistêmica, sem sinais inflamatórios, sem atrofia muscular, sem alterações neurológicas, com 
boa amplitude de movimentos e com força muscular preservada, apesar dos sintomas 
mencionados. O único achado clínico importante é a presença de sensibilidade dolorosa em 
determinados sítios anatômicos, chamados de tender points. Faz-se importante ressaltar que estes 
"pontos dolorosos" não são geralmente conhecidos pelos pacientes, e normalmente não se situam 
na zona central de dor por eles referida. De acordo com os critérios atuais, devem ser pesquisados 
os seguintes pares de pontos: 
1. Subocciptal - na inserção do músculo subocciptal; 
2. Cervical baixo - atrás do terço inferior do esternocleidomastoideo, no ligamento 
intertransverso C5-C6; 
3. Trapézio - ponto médio do bordo superior, numa parte firme do músculo; 
4. Supra-espinhoso - acima da escapula, próximo à borda mediai, na origem do 
músculo supra-espinhoso; 
5. Segunda junção costo-condral - lateral à junção, na origem do músculo grande 
peitoral; 
6. Epicôndilo lateral - 2 a 5 cm de distância do epicôndilo lateral; 
7. Glúteo médio - na parte média do quadrante súpero-externo na porção anterior do 
músculo glúteo médio; 
8. Trocantérico - posterior à proeminência do grande trocanter; 
9. Joelho - no coxim gorduroso, pouco acima da linha média do joelho. 
O critério de resposta dolorosa em pelo menos 11 desses 18 pontos, são recomendados como 
proposta de classificação, mas não devem ser considerados como essenciais para o diagnóstico. 
 
 
Critérios clínicos para diagnóstico: 
Além de verificar os tender points, deve se aplicar dois questionários 
Um envolvendo os locais de dor 
-IDGI 
 
 
-EGS: fadiga, sono, sintomas cognitivos e satélites. 
 
P/ diagnóstico= Pelo menos 3 meses de dor; Sem outra doença que justifique; EGS maior ou 
igual a 5 + IDG maior ou igual a 7 OU IDG entre 3 e 6 + EGS maior ou igual a 9. 
 
 
Tratamento 
 
 
Tratamento não farmacológico 
Os portadores de fibromialgia se beneficiam com a realização de atividade física. Há diversos 
motivos para justificar a atividade física nesta síndrome: aumento dos níveis de serotonina e de 
outros neurotransmissores inibitórios; aumento da produção de GH (hormônio do crescimento) e 
IGF1; regulação do eixo hipotálamo-hipófiseadrenal e do sistema nervoso autônomo; aumento da 
densidade capilar; aumento da quantidade de mioglobina; aumento da atividade mitocondrial. 
Todas estas mudanças contribuem para a melhora da dor, da qualidade do sono, da fadiga, da 
ansiedade e de outros sintomas. Soma-se o fato de que pode haver uma socialização, dependendo 
de circunstâncias, e influenciar positivamente alguns aspectos psicológicos. 
 
Tratamento farmacológico 
1º Linha: Antidepressivos em baixas doses ou miorrelaxantes 
Começar o tratamento com um só medicamento, se não funcionar, associar. 
Ex: Amitriptilina + ciclobenzaprina 
Fluoxetina + Amitripitilina 
Duloxetina + Pregabalina 
 
 O mecanismo de ação comum aos antidepressivos tricíclicos é o bloqueio de recaptura de 
monoaminas, principalmente norepinefrina (NE) e serotonina (5-HT), a Amitriptilina por ser 
amina terciária, inibe preferencialmente a recaptura da serotonina. O bloqueio acontece nos 
receptores muscarínicos (colinérgicos), histamínicos tipo 1, α2 e β-adrenérgicos e 
serotoninérgicos. A ação nesses receptores não se relacionam necessariamente com o efeito 
antidepressivo, estão muitas vezes relacionados com os efeitos colaterais. O mecanismo de 
ação promove aumento na eficiência da transmissão monoaminérgica, envolvendo os 
sistemas noradrenérgico e serotoninérgico pelo aumento da concentração sináptica de 
norepinefrina e serotonina. 
A inibição da recaptação de monoaminas está também relacionada aos mecanismos de redução 
da resposta da dor. Os ADTs são capazes de bloquear os receptores noradrenérgicos e 
serotoninérgicos à nível periférico, podendo contribuir também para analgesia periférica. 
 
 
>Tricíclicos: 
Inibem a recaptação de 5HT e NE, e em menor proporção Dopamina (DA) em nível pré-
sináptico. 
Aumento na eficiência da transmissão monoaminérgica (e possivelmente GABAérgica) 
Ação Inibitória à dor. 
Doses menores que as doses usadas para tratar depressão: 
Amitriptilina :25 a 150mg/noite. 
Nortriptilina: 10 a 150mg/ noite. 
Bloqueio de receptores colinérgicos Muscarínicos(M1) e α-adrenérgicos. 
Bloqueio de Histamina- relaxamento muscular e facilitador do sono. 
-Podem ser eficazes na melhora da dor e da qualidade do sono, além de contribuírem para a 
capacidade funcional. 
 
> IRS: 
Ação inibitória potente e seletiva da recaptação de serotonina. 
Potencialização da neurotransmissão serotoninérgica. 
Sertralina e Paroxetina são os mais potentes inibidores de recaptação de 5HT- maior 
eficácia nos quadros de ansiedade. 
A potência relativa da Sertralina em inibir a recaptação de dopamina a diferencia 
farmacologicamente dos outros ISRS. 
Fluoxetina tem maior meia vida – menos Síndrome de Descontinuação (SD). 
 
>Duais: 
-Venlafaxina: Fraca atividade como inibidores da recaptação de DA (clinicamente significativo 
apenas com doses elevadas). Mais potente à inibição de recaptação de 5HT. Dose de 75 a 
450mg/dia. 
-Duloxetina: Fraca atividade como inibidores da recaptação de DA (clinicamente significativo 
apenas com doses elevadas). Melhor perfil farmacológico em pacientes idosos. 
TTO: Neuralgia pós-herpética; Neuropatia diabética; Dor pós-operatória; Resposta 
analgésica mais precoce → Doses menores que as doses antidepressivas. 
É um inibidor da receptação da serotonina e da noradrenalina que também tem se 
mostrado eficaz na redução da dor e na melhora da capacidade funcional na FM, 
independentemente da presença de depressão.

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