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Educação especial e inclusiva 2 www.soeducador.com.br SUMÁRIO EDUCAÇÃO ESPECIAL: CONCEITOS E DEFINIÇÕES .............................................................. 3 Exclusão................................................................................................................................................. 6 Integração .............................................................................................................................................. 6 Inclusão .................................................................................................................................................. 7 Educação Inclusiva .............................................................................................................................. 8 Escola Inclusiva .................................................................................................................................... 9 Portador de Necessidades Especiais.............................................................................................. 10 Necessidades ...................................................................................................................................... 11 Autismo ................................................................................................................................................ 12 A EDUCAÇÃO ESPECIAL: DOS PRIMÓRDIOS AO SÉCULO XXI .......................................... 14 No Brasil............................................................................................................................................... 15 LEIS ...................................................................................................................................................... 28 PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS: CLASSIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO .......................................................................................................................... 30 AS DIFERENTES NECESSIDADES ESPECIAIS......................................................................... 35 Deficiências sensoriais ...................................................................................................................... 38 Deficiência visual ................................................................................................................................ 38 Deficiência auditiva ............................................................................................................................ 40 Deficiências físicas ............................................................................................................................. 41 Deficiências mentais .......................................................................................................................... 43 Crianças superdotadas ...................................................................................................................... 45 ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO E OS RECURSOS EDUCACIONAIS ESPECIAIS .......................................................................................................................................... 53 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 71 Educação especial e inclusiva 3 www.soeducador.com.br EDUCAÇÃO ESPECIAL: CONCEITOS E DEFINIÇÕES Nosso objetivo será conceituar educação especial, bem como necessidades especiais, diferenciando dificuldades de aprendizagem de deficiência, uma vez que percebemos haver certa confusão nessas duas conceituações, além de algumas terminologias pertinentes à Educação Especial que vai de encontro à Inclusão. Procuraremos ao longo desta apostila, compreender melhor as deficiências inerentes ao ser humano e analisar diferentes atitudes face às dificuldades de aprendizagem que poderão surgir em decorrência dessa deficiência e, também, levá-los a refletirem sobre algumas posturas dos educadores diante de alunos com necessidades educacionais especiais. Lembramos que toda e qualquer criança tem o direito a uma educação que lhe permita realizar o seu máximo potencial humano, independente da sua capacidade de aprendizagem! Para tanto, vale expor na íntegra os artigos 58 a 60 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDB nº 9394/96: Art. 58. Entende-se por educação especial, para efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. § 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio, especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela da educação especial. § 2ºO atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular. § 3ºA oferta de educação especial, dever constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil. Educação especial e inclusiva 4 www.soeducador.com.br Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicas, para atender as suas necessidades; II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como os professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV - educação especial para o trabalho, visando sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no mercado de trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. Art. 60. Os órgãos normativos dos sistemas de ensino estabelecerão critérios de caracterização das instituições privadas sem fins lucrativos, especializados e com atuação exclusiva em educação especial, para fins de apoio técnico e financeiro para o Poder Público. Parágrafo único. O Poder Público adotará, como alternativa preferencial, a ampliação do atendimento aos educandos com necessidades especiais na própria rede pública regular de ensino, independentemente do apoio às instituições previstas neste artigo. Podemos tirar algumas breves conclusões dos artigos acima, sendo a primeira delas, concordar que a legislação brasileira evoluiu sobremaneira. A inserção de educandos com necessidades educacionais especiais, no meio escolar, é uma forma de tornar a sociedade mais democrática. Da mesma forma, a transformação das instituições de ensino em espaço de inclusão social é tarefa de todos que operam com a alma e o corpo das crianças especiais. Percebe-se também que a garantia constitucional que resultou do compromisso liberal do Estado brasileiro de educar a todos, sem qualquer discriminação ou exclusão social e o acesso ao ensino fundamental para os educandos, em idade escolar, sejam normais ou especiais, passou a ser, a partir de 1988 (com nossa nova constituição) um direito público Educação especial e inclusiva 5 www.soeducador.com.br subjetivo, isto é, inalienável, sem que as famílias pudessem abrir mão de sua exigência perante o Poder Público. Segundo Zacharias (2007),no começo da década de 1990, em todo o mundo, iniciou-se um processo de reintegração da criança portadora de deficiências ou distúrbios de aprendizagem na Escola e classes comuns. O nome desse movimento mundial é Educação Inclusiva, que propõe o atendimento da criança em classes comuns, garantindo-se as especificidades necessárias, com um atendimento de um professor especialista ao professor da classe comum. O mais importante documento que norteia a Educação Inclusiva é a Declaração de Salamanca, que é, ao mesmo tempo, uma Declaração de Direitos e uma proposta de ação. Surgiu na Conferência Mundial, patrocinada pela UNESCO, em junho de 1994, em Salamanca, na Espanha. Tem como objetivo maior, garantir o direito a todos os alunos com qualquer grau de deficiência ou distúrbio de aprendizagem, ao que comumente chamamos de Educação Comum. Crianças em idade escolar apresentam dificuldades de aprendizagem, as quais podem ser transitórias ou permanentes, decorrentes de condições individuais, econômicas ou socioculturais. A essas dificuldades dá-se o nome de Necessidades Educacionais Especiais – NEE. O termo necessidades educacionais especiais refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem. Crianças com necessidades especiais são aquelas que, por alguma espécie de limitação requerem certas modificações ou adaptações no programa educacional, a fim de que possam atingir seu potencial máximo. Essas limitações podem decorrer de problemas visuais, auditivos, mentais ou motores, bem como de condições ambientais desfavoráveis (ZACHARIAS, 2007, p. 1). Apresentar e delinear alguns conceitos sobre a matéria em questão é importante para que o leitor entenda o contexto e também porque vem mostrar a evolução do pensamento e dos valores que nascem através deles. Assim, são expostos abaixo, os conceitos de estudiosos do assunto que envolve a inclusão, conceitos estes que entendemos ser de extrema importância para a compreensão dos movimentos e das ações exercidas pelos diversos atores deste cenário da educação inclusiva. Educação especial e inclusiva 6 www.soeducador.com.br Exclusão Segundo Fischer e Marques (2001), a exclusão social remonta à Antiguidade Grega, onde escravos, mulheres e estrangeiros eram excluídos, mas o fenômeno era tido como natural. A exclusão torna-se visível e substanciosa quando ocorre uma evidência da pobreza após a crise econômica mundial da idade contemporânea. Sobre a origem do termo exclusão social, as mesmas autoras pontuam que tomou vulto a partir do livro Les Exclus (1974) de Lenoir, o qual define os excluídos como aqueles indivíduos concebidos como resíduos dos trinta anos gloriosos de desenvolvimento da França. Para Jaguaribe citado por Dupas (1999), exclusão tem “feições de pobreza”. Já Buarque citado por Nascimento (1996), infere que a partir da década de 80, a exclusão social passou a ser vista como um processo presente, visível e que ameaçava confinar grande parte da população num apartheid informal, expressão que dá lugar ao termo “apartação social”. Em essência, a exclusão é multidimensional, manifestando-se de várias maneiras e atingindo diferentes sociedades, mas evidentemente, os países pobres são afetados em maior profundidade. Embora provocada pelo setor econômico, tem também seus meandros passando pela falta de vontade política e social. Os principais aspectos em que a exclusão se apresenta dizem respeito à falta de acesso ao emprego, a bens e serviços, e também à falta de segurança, justiça e cidadania (Fischer e Marques, 2001), ou seja, suas manifestações aparecem no mercado de trabalho, no acesso à moradia e aos serviços comunitários, aos bens e serviços públicos, entre outros. Os excluídos, entre outros são: os idosos, os sem-terra, os portadores de deficiência, os analfabetos, os grupos étnicos minoritários. Integração Segundo o Ministério da Educação e Cultura (Brasil, 1994, p.18), “integração é um processo dinâmico de participação das pessoas num contexto relacional, legitimando sua integração nos grupos sociais, implicando reciprocidade”. Para Mazzotta (1998), integração pressupõe a ampliação da participação nas situações comuns para indivíduos e grupos que se encontram segregados, ou seja, para aqueles alunos que necessitam e utilizam os serviços de educação especial, justifica Educação especial e inclusiva 7 www.soeducador.com.br a busca pela integração. Surgido na década de 60, o conceito de integração relacionava-se diretamente com as crianças deficientes. Foi um movimento que aconteceu em época de grande movimentação social e civil, de luta pelos direitos, pela igualdade e justiça. Blanco (1998) explica que o movimento de integração surgiu da necessidade de promover o direito dos alunos portadores de necessidades especiais à educação especial. Inclusão De acordo com Abbamonte (2009), a palavra Inclusão não significa promover a adequação ou a normatização de acordo com as características de uma maioria, seu significado está mais próximo à possibilidade de fazer parte, conviver e não se igualar. Portanto, é com grande cautela que devemos levantar a bandeira da inclusão escolar de crianças com graves problemas de desenvolvimento. Ao invés de tomarmos o assunto partindo de um ideal, do que diz a lei, é mais apropriado levar em consideração a própria criança, verificar o problema que ela apresenta e, a partir daí, avaliar a maneira de ingressá-la numa ou noutra sala de aula. A colocação da autora é muito pertinente e leva a refletir sobre a responsabilidade que se tem à frente quando se trata de avaliar uma criança, pois uma vez que a criança é colocada na escola, todos os profissionais estão assumindo um compromisso com ela. Em Sassaki (1997, Educação especial e inclusiva 8 www.soeducador.com.br p.41), encontra-se que a inclusão é: [...] Um processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo bilateral no qual as pessoas ainda excluídas e a sociedade buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos. Após as devidas conceituações, podemos inferir que existe uma diferença importante entre integrar e incluir. O primeiro pressupõe adaptar o aluno à escola, e incluir, vai muito além, é preparar a escola, como um todo, em seu espaço físico, na formação do corpo docente, entre outros, para receber o aluno portador de qualquer que seja sua necessidade. Observa-se no primeiro conceito que na integração, a escola abre as portas para o aluno, mas não disponibiliza os meios para que este possa locomover, acompanhar, aprender. Já na inclusão, que é completamente mais justa, quem se movimenta, quem se prepara para receber o aluno é a escola. Educação Inclusiva Para conceituar a educação inclusiva é preciso expressar, pelo menos, algumas de suas funções, ou seja, a escola inclusiva precisa cuidar, integrar, reconhecer, relacionar-se com crianças e pessoas de um modo geral, com necessidades especiais (MACEDO, 2009). É uma tarefa nova, restrita até poucos anos, à família ou a alguma pessoa que, por alguma razão, assumia esse papel. Na atualidade, espera-se que as escolas fundamentais incluam crianças que apresentem limitações. A educação inclusiva é uma educação democrática, comunitária, pois supõe que o professor saia da sua solidão, arrogância, falso domínio e tenha a coragem de dizer não sei, tenho medo, nojo, vergonha, pena, não respeito, quero aprender ou rever minhas estratégias pedagógicas, pois não consigo ensinar para certos tipos de criança, não sei controlaro tempo, não seria ajudar – não no sentido da co- dependência, mas no sentido da interdependência, – não sei respeitar meu aluno (MACEDO, 2009). Embora sejam duras e ásperas, as declarações de Macedo (2009) são reais e pertinentes ao que acontece com as escolas e seus profissionais quando se propõe a Educação especial e inclusiva 9 www.soeducador.com.br exercer o sentido amplo de educação inclusiva. De acordo com Mrech (2009), “Por educação inclusiva se entende o processo de inclusão dos portadores de necessidades especiais ou de distúrbios de aprendizagem na rede comum de ensino em todos os graus”. Como se observa na fala de Mrech (2009), seu pensamento vai além, quando coloca no processo de inclusão, os portadores de distúrbios de aprendizagem, que até certa época não eram considerados para essa educação. A melhor e mais simples conceituação para educação inclusiva é vê-la como um processo de inclusão de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais, na rede comum do ensino em todos os seus graus ou série, e deste modo, conquistar o objetivo maior da educação: educação de qualidade e para todos. Escola Inclusiva De acordo com a Declaração de Salamanca - Espanha (1994), nascida da Conferência Mundial sobre Educação Especial, UNESCO: O princípio fundamental é que todas as crianças deveriam aprender juntas, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que possam ter. As escolas inclusivas devem reconhecer e responder às diversas dificuldades de seus alunos, acomodando tanto estilos como ritmos diferentes de aprendizagem, assegurando uma educação de qualidade a todos através de currículo apropriado, modificações organizacionais, estratégias de ensino, uso de recursos e parcerias com a comunidade [...] Dentro das escolas inclusivas, as crianças com necessidades educacionais especiais deveriam receber qualquer apoio extra que possam precisar, para que se lhes assegure uma educação efetiva. Mediante os conceitos para educação inclusiva, a instituição escolar é facilmente relacionada a um ambiente onde vamos buscar uma educação justa, igualitária e de qualidade. Relacionando o processo inclusivo à instituição escola, pode-se definir que ela será inclusiva quando procurar educar todos os alunos em salas de aula regulares. Isso significa permitir a educação e a frequência de todos na escola regular, bem como oferecer a todos uma série de desafios e oportunidades que sejam adequadas às suas habilidades e necessidades, tema tão debatido por Perrenoud nos fins dos anos 90. Desse modo, o primeiro passo para a escola ser inclusiva é o reconhecimento e a aceitação das diferenças individuais, pois as Educação especial e inclusiva 10 www.soeducador.com.br necessidades educativas especiais pressupõe outras estratégias de ensino- aprendizagem que não as usadas rotineiramente com a maioria dos alunos. Sobre a Escola Inclusiva, Gil (2007) citando Staimback (1999, XII) afirma que ela é um lugar do qual todos fazem parte, em que todos são aceitos, onde todos ajudam e são ajudados por seus colegas e por outros membros da comunidade escolar, para que as suas necessidades educacionais sejam satisfeitas. Nesse sentido, Mrech (2009) aconselha que para uma escola apresentar-se como inclusiva deveria ser direcionada para a comunidade, ser vanguardista, buscar padrões de excelência, ser colaborativa e cooperativa, além de ainda, mudar os papéis e responsabilidades da equipe, estabelecer infraestrutura de serviços, como promoção do acesso físico, tornar o ambiente educacional flexível, promover parceria com os pais, montar estratégias baseadas em pesquisas, estabelecer novas formas de avaliação e, por fim, levar todos os participantes da escola a buscarem sempre desenvolvimento profissional. Esse sentido amplo dado à Escola Inclusiva leva a concordar com o pensamento de Sá (2009) quando diz que a educação é para todos, isto é, a educação inclusiva é uma educação que visa reverter o percurso da exclusão ao criar condições, estruturas e espaços para uma diversidade de educandos. Portanto, a escola será inclusiva quando conseguir transformar não apenas a rede física, mas a postura, as atitudes e os pensamentos dos educadores e da comunidade escolar em geral, para aprender a lidar com a heterogeneidade e conviver naturalmente com as diferenças. Portador de Necessidades Especiais Devido a necessidade da Organização Mundial da Saúde – OMS – em fazer a Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (CIDID), em 1989, definiu-se deficiência como sendo: Toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica ou anatômica; a incapacidade como toda restrição ou falta – devida a uma deficiência – da capacidade de realizar uma atividade na forma ou na medida que se considera normal a um ser humano; e a desvantagem como uma situação prejudicial para determinado indivíduo, em consequência de uma deficiência ou uma incapacidade, que limita ou impede o desempenho de um papel que é normal em seu caso (em função da idade, sexo e fatores sociais e culturais). Educação especial e inclusiva 11 www.soeducador.com.br Entende-se que essa definição veio com o propósito de defender a igualdade de condições, melhorias na condição de vida, em razão do desenvolvimento e do progresso socioeconômico; e estabelecendo inúmeras diretrizes que assegurassem direitos individuais e sociais a serem seguidas, uma vez que somente na década de 60 é que o mundo passou a perceber a existência desses direitos para os portadores de deficiência. Segundo o MEC (Brasil, 1994, p. 22), a pessoa portadora de necessidades especiais é aquela que: Apresenta, em caráter permanente ou temporário, algum tipo de deficiência física, sensorial, cognitiva, múltipla, condutas típicas ou altas habilidades, necessitando, por isso, de recursos especializados para desenvolver mais amplamente o seu potencial e/ou superar ou minimizar suas dificuldades. No contexto escolar, costumam ser chamadas de pessoas portadoras de necessidades educativas especiais. Valente (2009) nos fornece um quadro simplificado com os tipos mais comuns de necessidades especiais, que é de extrema importância, tanto para diagnóstico quanto para diferenciação e entendimento do leitor, uma vez que observa-se grande desinformação e confusão por parte da sociedade no tocante ao conceito de portador de necessidade especial. Essas necessidades serão vistas com pormenores mais adiante. Necessidades Física-Hemiplégicos, paraplégicos, tetraplégicos (incluindo sujeitos com membros amputados). Sensorial-Cegos, surdos e surdos-mudos. Mental-Síndrome de Down (ou trissomia) apresentando as seguintes características: rosto redondo, cabelos finos e de textura peculiar, olhos amendoados, membros curtos, mãos e dedos pequenos, baixa estatura, tendência a sobrepeso, e rebaixamento intelectual. São indivíduos altamente sociáveis e facilmente integráveis em qualquer ambiente. Em sala de aula, em função de algum rebaixamento intelectual (que pode ser muito brando ou severo), apresentam dificuldades em acompanhar o currículo, sendo clientes de salas de reforço (salas de recursos especiais). Educação especial e inclusiva 12 www.soeducador.com.br Paralisia Cerebral-Também não se trata de doença, mas, na maioria dos casos, sequela de parto acidentado ou mal feito. Outros casos de ocorrência se dão por aneurisma de vaso sanguíneo na caixa craniana (geralmente problema congênito) ou por sequelas após convulsões ocasionadas por febres muito altas, comuns em crianças de pouca idade. Nota-se que muitos dos casos de paralisia cerebral se dão por ignorância, miséria e falta de interesse do poder público em instituir campanhas que estimulem a gestação acompanhada por médico ou parteira. Os portadores de paralisia cerebral não possuemcontrole de sua musculatura e, na maior parte dos casos, apresentam deficiências múltiplas: cegueira, surdez, mudez, paralisia total ou parcial de membros e mesmo rebaixamento intelectual. É nesses quadros que se dão a maioria dos casos severos ou muito severos, tornando impraticável a inclusão escolar em salas de aula regulares, devendo o sujeito ser atendido em classes especiais ou classes hospitalares. Autismo Até hoje a ciência não conseguiu definir com precisão a manifestação patológica, suas causas e tratamentos. O indivíduo autista vive em outra dimensão do psiquismo, diferente das pessoas comuns. Não nutre ou manifesta afetos e geralmente é dotado de rebaixamento intelectual. Muitos executam movimentos automáticos, de balançar a cabeça, mover os membros ou pronunciar interminavelmente palavras ou frases aparentemente sem sentido - os estereótipos. Educação especial e inclusiva 13 www.soeducador.com.br O problema acomete mais a pessoas do sexo masculino. O diagnóstico preciso, quanto à sua intensidade, é prejudicado pelo fato de o autista não se comunicar, ou fazê-lo de modo restrito ou precário. Da mesma forma, sem um quadro diagnóstico apontando a intensidade do problema, é quase impossível a elaboração de currículos adaptados ou flexibilizados para esses sujeitos quando em escolas. TDAH-Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade - recentemente descrito como caso psiquiátrico, passível de tratamento com medicação, psicoterapia e fisioterapia. TODA-Transtorno de Déficit de Atenção - também controlável através de medicação específica. Dislexia e disgrafia Distúrbios de aprendizagem, perfeitamente controláveis, correspondendo a uma dificuldade do sujeito em decodificar o código linguístico (o disgráfico não consegue escrever com a mão, mas consegue digitar perfeitamente bem). Gagueira Emocional de causas variadas, passíveis de tratamento através da intervenção concomitante de profissionais de fonoaudiologia e psicologia. Lentidão Distúrbio de aprendizagem - alunos que apresentam dificuldades em acompanhar o desenvolvimento do currículo regular (geralmente baseado em conteúdos lógico-dedutivos ou de memorização), e ocasionados por motivos variados, entre eles problemas emocionais ou Q.I. (Quociente de Inteligência) muito abaixo da média. São facilmente recuperáveis através da dispensa de atenção redobrada, com reforço nos conteúdos curriculares. Valente (2009) alerta ainda que os superdotados, aqueles indivíduos que possuem uma capacidade intelectual muito acima da média, também são portadores de necessidades especiais, porém, não por deficiência (dedicamos um tópico específico para falar sobre os superdotados). Devido essa condição, a legislação recomenda aceleração de currículo ou encaminhamento para serviços especializados, os quais são praticamente Educação especial e inclusiva 14 www.soeducador.com.br inexistentes no Brasil. Isso leva a inferir que muitos superdotados se perdem no anonimato, o que vem caracterizar exclusão social. A EDUCAÇÃO ESPECIAL: DOS PRIMÓRDIOS AO SÉCULO XXI A história da educação inclusiva passa pela história da educação especial que surgiu por volta de 1500, quando se iniciaram na Europa os primeiros movimentos para ensinar a pessoa deficiente. Até então, os deficientes ficavam em asilos, protegidos, pois não se acreditava em seu desenvolvimento. Famílias de boa situação financeira contratavam professores particulares que se interessavam em tornar preceptores de crianças com deficiência, inicialmente com crianças surdas (CARMO, 2007; FRAGELLI, 2005). Em 1700, houve a expansão para o trabalho com crianças cegas, contudo, as crianças com problemas mentais continuavam internadas. As primeiras instituições especializadas surgiram na França, em 1760 – Instituto Nacional de Surdos-Mudos e em 1784 – Instituto dos Jovens Cegos, mas ainda sem apoio da sociedade (CARMO, 2007; FRAGELLI, 2005). Nessas escolas, a educação dos cegos era voltada para trabalhos manuais, e dos surdos, comunicação por gestos. Não preconizavam o aprendizado da leitura, da escrita, dos cálculos nem das artes, o que veio acontecer somente por volta de 1824. Ambos se sustentavam da venda dos trabalhos realizados. Já para as pessoas com deficiências físicas, o primeiro instituto surgiu na Alemanha, em 1832. Em 1848, nos Estados Unidos, passam a ter atendimento oficial para aprenderem comportamentos sociais básicos (CARMO, 2007; FRAGELLI, 2005). Sahb (2004) pontua a II Guerra Mundial como um marco para a preocupação com os portadores de necessidades especiais, quando os países centrais começaram a se preocupar em identificar os sub e superdotados, com o objetivo de encaminhá-los para um tipo de educação mais condizente com seus dotes intelectuais. O mesmo autor (2004, p.3) cita as considerações de Edler (2000, p.15): Historicamente, a educação especial tem sido considerada como a educação de pessoas com deficiência, seja ela mental, auditiva, visual, motora, física, múltipla ou decorrente de distúrbios invasivos de desenvolvimento, além das pessoas superdotadas que também têm integrado o alunado da educação especial. Educação especial e inclusiva 15 www.soeducador.com.br As classes especiais, dentro das escolas regulares, só apareceram a partir de 1950 e, evidentemente, a partir de movimentos organizados pelos pais que lutavam pelos direitos dos seus filhos (CARMO, 2007; FRAGELLI, 2005). Esses primeiros movimentos para atender às pessoas portadoras de deficiência que refletiam as mudanças significativas, em termos educacionais, e que estavam nascendo nos grupos sociais, foram concretizadas primeiramente na Europa e depois se expandiram para os Estados Unidos, Canadá e, recentemente, para o Brasil. Mazzota (1996, p. 15) enfatiza que: A defesa da cidadania e do direito à educação das pessoas portadoras de deficiência é atitude muito recente em nossa sociedade. Manifestando-se através de medidas isoladas, de indivíduos ou grupos, a conquista e o reconhecimento de alguns direitos dos portadores de deficiência podem ser identificados como elementos integrantes de políticas sociais, a partir de meados deste século. Enfim, pode-se constatar que a mobilização da sociedade moderna é um fenômeno recente que deve muito mais a homens, mulheres, leigos ou profissionais, deficientes ou não, que se envolveram nas questões sociais ligadas aos direitos sociais e humanos, mais especificamente ao atendimento às pessoas deficientes, buscando o direito à qualidade de vida dessas pessoas, do que aos governos, os quais deveriam ser os promotores de fato da implantação e efetivação desse direito de cidadania, oportunidade e igualdade. No Brasil O ano de 1854 marca o início do atendimento aos portadores de deficiência no Brasil, quando foi criado, no Rio de Janeiro, o primeiro instituto para surdos (CARMO, 2007). Inicialmente esses institutos tinham como objetivo somente oferecer abrigo e proteção para os deficientes, tendo sido reproduzidos, de acordo com modelos europeus. No período entre 1905 a 1950, a grande maioria dessas instituições eram particulares e com caráter assistencialista. E, mesmo existindo algumas oficiais, não resolviam o problema da demanda de portadores de deficiência existente. Em relação aos serviços públicos, estes eram prestados através das escolas regulares, as quais ofereciam classes especiais para o atendimento aos deficientes (CARMO, 2007). Educação especial e inclusiva 16 www.soeducador.com.br A mobilização social começa nas décadas de 50 a 60 com o surgimento e fortalecimento de algumas organizações e de movimentos educativos como os trabalhos de Paulo Freire. O governo brasileiro assume, em 1957, a educação do deficiente, a nível nacional e, em 1961, quando já vigorava a primeira Lei de Diretrizes e Basesda Educação Nacional, nº 4.024/61, em seu título X, os artigos 88 e 89 faziam referência à educação dos excepcionais, garantindo, assim, a educação aos deficientes: Art. 88. A educação de excepcionais, deve, no que fôr possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade. Art. 89. Toda iniciativa privada considerada eficiente pelos conselhos estaduais de educação, e relativa à educação de excepcionais, receberá dos poderes públicos tratamento especial mediante bolsas de estudo, empréstimos e subvenções. (LDBEN nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961). Há que ressalvar o seguinte: existia a lei, mas de fato, a história mostra que a escola não funcionava bem assim, embora no artigo 89, encontra-se que o governo ajudará a iniciativa privada prestar serviços às pessoas deficientes, ou seja, a escola regular não estava preparada nem recebia de fato os portadores de necessidades especiais. Nas análises dos artigos citados, observa-se que existe uma ambiguidade, ou seja, ao mesmo tempo em que propõe atendimento integrado na rede regular de ensino, delega às instituições sob administração particular, a responsabilidade de parte do atendimento, através de apoio financeiro. A LDBEN nº 5.692, de 11 de agosto de 1971, para os ensinos de 1º e 2º graus, faz referência à educação especial em apenas um artigo (artigo 9), deixando claro que os conselhos estaduais de educação garantiriam aos deficientes o recebimento de tratamento especial nas escolas. Hoje, é claramente observável que a educação especial ficou a cargo de instituições filantrópicas, algumas subsidiadas com apoio do governo, outras buscando parcerias com a iniciativa privada e que, nas escolas regulares, embora seja lei, as condições mínimas necessárias, tanto em relação ao suporte financeiro, pessoal qualificado e estrutura física adequada ao recebimento, não condizem, portanto, a escola se esquiva de sua parcela de compromisso. Com a Constituição Federal de 1988, vários capítulos, artigos e incisos sobre educação, habilitação e reabilitação da pessoa deficiente, além da sua integração à vida comunitária foram inseridos. A ambiguidade Educação especial e inclusiva 17 www.soeducador.com.br do dever do estado é novamente observável na CF/88 (artigo 205) e na nova LDBEN/96 (artigo 58): Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (CF/88) Art. 58 - Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. (LDBEN/96). Voltando o olhar para o surgimento da educação inclusiva e o caminho que tem seguido nos dias atuais, nota-se uma evidente preocupação em igualar as oportunidades ao acesso ao ensino escolar, em proporcionar continuidade dos portadores de necessidades especiais na escola regular. A política educacional inclusiva, integradora, pressupõe um modo de se construir o sistema educacional que considere as diferenças e necessidades de todas as crianças, jovens e adultos, sem discriminá-los ou segregá-los por quaisquer dificuldades ou diferenças discriminatória que possam ter. A escola inclusiva pressupõe uma nova escola, comum na sua organização e funcionamento, pois adota os princípios democráticos da educação de igualdade, equidade, liberdade e respeito à dignidade que fortalecem a tendência de manter na escola regular os alunos portadores de necessidades especiais (SAHB, 2004, p.6). A legislação educacional vigente não é completamente clara e específica, mas o Brasil segue pelo caminho que busca meios adequados e justos para que as instituições promovam o acesso e a permanência nas escolas regulares, de forma democrática. No quadro abaixo, encontram-se as leis e seus principais artigos que levará o leitor a perceber que em termos de legislação não há o que se queixar, faltando, entretanto, fazê-las funcionar na prática. Educação Especial Na Perspectiva Da Educação Inclusiva: Desafios Da Implantação De Uma Política Nacional Breve história apagada Educação especial e inclusiva 18 www.soeducador.com.br O Brasil, o atendimento educacional direcionado às pessoas com deficiências foi construído separadamente da educação oferecida à população que não apresentava diferenças ou características explícitas que a caracterizasse como “anormal”. Dessa forma, a educação especial constituiu-se como um campo de atuação específico, muitas vezes sem interlocução com a educação comum. Esta separação materializou-se na existência de um sistema paralelo de ensino, de modo que o atendimento de alunos com deficiência ocorreu de modo incisivo em locais separados dos outros alunos. A formação de uma educação especial brasileira deu-se dentro de um contexto de pouca atenção à educação pública em geral. Schwarcz (1998 apud VEIGA, 2008) informa que o recenseamento do ano de 1872 registrou 84% da população brasileira como analfabeta. Essa restrita atenção em relação à educação pode ser explicada por vários motivos, dentre os quais, ressaltamos: 1. A organização econômica do Brasil nos períodos da Colônia e Império não necessitava da alfabetização e da instrução da massa trabalhadora (grande parcela da população vivia na zona rural e a economia baseava-se, inicialmente, na exploração de bens naturais e, posteriormente, na produção de monoculturas em grandes latifúndios); 2. Havia pouca atenção à educação também por parte de nossos colonizadores, pois registros de Portugal apontam que naquele país, no século XIX, grande parte da população não tinha acesso à instrução e era analfabeta; 3. Apesar de a educação ser prevista a “todos os cidadãos” (na Constituição de 1824), a massa de trabalhadores era composta de maioria escrava. Com a República, a preocupação com a instrução tornou-se mais marcante, embora acanhada, de modo que a taxa de matrícula da população brasileira foi crescendo gradativamente nos centros urbanos durante o século XX. Romanelli (1989) mostra a evolução populacional e de escolaridade brasileira na primeira metade do século XX. Em 1920, a taxa de escolarização era de 8,99% da população e em 1950 chega a 26,15% (cf. ROMAELLI, 1989). Esse período, pesquisas desenvolvidas nos países Europeus apontavam a preocupação com os alunos que frequentavam a educação pública, mas não se beneficiavam totalmente dela. Alfred Binet (1857-1911) e Theodore Simon (1872-1961) iniciaram seus trabalhos de mensuração da inteligência das crianças francesas matriculadas em suas escolas. Publicaram, em 1905, uma escala de Educação especial e inclusiva 19 www.soeducador.com.br inteligência, cujo objetivo foi medir o desenvolvimento da inteligência das crianças de acordo com a idade (idade mental). Esse momento, acreditava-se que a separação de alunos “normais” e “anormais” traria benefício para todos no processo educativo. Monarcha (2007) informa que, no Brasil, tal escala foi aplicada sob a orientação de Clemente Quaglio (1872-1948), na capital paulista. Os resultados foram publicados na obra A solução do problema pedagógico social da educação da infância anormal de inteligência no Brasil, em 1913. A preocupação em identificar “normais” e “anormais” foi difundida na ciência médico-pedagógica de vários países. Como exemplo dessa preocupação, apresentamos o trecho de um artigo do italiano Ugo Pizzoli (1863-1934), publicado no Brasil em 1914, em revista de educação da época: O aspecto eterno (atitude geral, a fisionomia, o vestuário, a postura espontânea) caracteriza e revela a condição psicológica da criança [...] O primeiro cuidado do professor será distinguir o tipointeligente normal médio do tipo débil de espírito (imbecilidade, deficiências por paradas de desenvolvimento, atrasos, etc.) (PIZZOLI, 1914, p. 2). A prática de identificação de possíveis alunos “anormais” era solicitada ao professor para organização de salas de aulas homogêneas. Rocha (1979) identifica duas obras fundamentais para a educação dos “anormais” nesse momento: Educação da Inteligência Anormal no Brasil, de Clemente Quaglio e Tratamento e educação das crianças anormais de inteligência, de Basílio de Magalhães, ambas dos anos de 1910. É interessante ressaltar que, diferentemente da tendência da época, os estudos de Basílio de Magalhães concluíram que a convivência de crianças anormais e normais era benéfica, sob o ponto de vista emocional e econômico (MAGALHÃES, s/d). Apesar de registros da existência de matrículas de alunos com deficiências em escolas privadas e estaduais desde o final do século XIX , é possível dizer que, no país, a organização de instituições especializadas foi a referência para o atendimento a essas pessoas. Em 1933, o decreto que instituiu o código da educação no estado de São Paulo deixou clara essa preferência e indicou a implantação de classes especiais quando isso não fosse possível: Parte VII Da educação especializada Art. 824 Educação especial e inclusiva 20 www.soeducador.com.br Dos tipos de escolas especializadas: a) escolas para débeis físicos b) escolas para débeis mentais c) escolas de segregação para doentes contagiosos d) escolas anexas aos hospitais e) colônias escolares f) escolas para cegos g) escolas para surdos-mudos h) escolas ortofônicas i) escola de educação emendativa dos delinquentes. Onde não for possível a instalação de escolas especializadas autônomas [...] serão organizadas classes para esses fins especiais nos grupos escolares. (DECRETO 5.884, de 1933) Sob a supervisão de organismos públicos de inspeção sanitária, a organização das classes especiais públicas e o encaminhamento para instituições especializadas ocorreram a partir da justificativa científica de separação dos alunos “normais” e “anormais”. Esse período, o Brasil estava passando por um processo de transformação econômica com a instalação de seu parque industrial e o início do movimento de crescimento das cidades, que passaram a receber a população que vivia anteriormente no campo. Com isso, ocorreu o aumento progressivo do número de matrículas nas escolas brasileiras (como mostrado anteriormente). A frequência da população pobre nas escolas públicas ficou mais evidente e as leis da época registraram a preocupação com o estado dessa população: Art. 826 As escolas de débeis físicos se destinam às crianças desnutridas ou em crescimento em atraso as quais convenha regime especial de trabalho escolar, com o fim de reintegrá-las na normalidade física (DECRETO 5.884, de 1933) A preocupação científica de identificação e tratamento dos “anormais” também estava presente na formação de Helena Antipoff (1892–1974), que a partir dos anos de 1930, marcou a educação especial brasileira. Em 1932, Helena Antipoff, que veio para o Brasil a convite do governo de Minas Gerais, criou a Instituição Pestalozzi de Minas Gerais. Esse Instituto impulsionou a educação especial naquele estado e influenciou as ações ligadas à educação em todo o país. À época, as crianças Educação especial e inclusiva 21 www.soeducador.com.br deveriam ser agrupadas seguindo critérios estabelecidos pela aplicação de testes de inteligência: Conforme dissemos, o primeiro passo no sentido de individualizar o ensino é agrupar os alunos, tendo em vista o ritmo de desenvolvimento mental. O processo mais empregado hoje em dia é a seleção das crianças e sua concentração em classes homogêneas de valor forte, médio e fraco, organizadas em escalas de idades mentais. São numerosos os testes de inteligência global, de aplicação individual e coletiva, destinados às crianças em idade escolar. [...] O critério do Quociente Intelectual, como a experiência demonstrou, é superior ao simples critério da idade mental, para a formação de classes homogêneas [...] (BOLETIM . 14 PUBLICAÇÃO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO – MG, 1934 apud ATIPOFF, 1974, p. 56) Esses critérios serviram tanto para a organização de classes homogêneas das escolas públicas quanto para a formação das classes especiais: As classes organizadas, considerando os vários critérios apontados acima, passaram a ser denominadas: classes A, B, C, AB, BC, Br, Cr, e ainda D e E. [...] As classes D e E foram chamadas Classes Especiais. Elas, foram colocados os excepcionais de toda a espécie, que frequentavam a escola pública: retardados mentais, deficientes sensoriais, e de linguagem, crianças com distúrbios de motricidade, orgânicos (classe D) e com desvios de comportamento (Classe E). (BOLETIM . 14 PUBLICAÇÃO DA SECRETARIA DE EDUCAÇÃO – MG, 1934 apud ATIPOFF, 1974, p. 58) Vemos, pelo decreto do estado de São Paulo e pelo Boletim da Secretaria de Educação do estado de Minas Gerais, ambos dos anos de 1930, que na história da educação brasileira a separação foi constituindo-se como preferência e não exceção. Dessa forma, a separação de crianças foi (e talvez ainda seja) uma prática pedagógica proposta para a educação em geral. Partindo do pressuposto de adequação dos espaços segregados e com escassas escolas públicas no país, durante a primeira metade do século XX, pais e profissionais de pessoas com deficiências passaram a se organizar e formar instituições privadas de atendimento especializado. Essas instituições acabaram ocupando um lugar de destaque na Educação Especial brasileira, chegando a confundir-se com o próprio atendimento público, aos olhos da população, pela gratuidade de alguns serviços. Assim surgiram a Pestalozzi do Brasil Educação especial e inclusiva 22 www.soeducador.com.br no Rio de Janeiro em 1945, a Pestalozzi de Niterói em 1948, ambas com o apoio e colaboração de Helena Antipoff. Seguindo essa tendência, em 1954, também no Rio de Janeiro, a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE – foi organizada e se desenvolveu ocupando “o espaço vazio da educação especial como rede nacional” (SILVA, 1995, p. 36). Essas e outras instituições alcançaram no Brasil uma grande amplitude, de forma que Jannuzzi (1997) afirma que muitas decisões da política da educação especial são frutos de pressões dessas associações. Mesmo quando o governo brasileiro passa a legislar a Educação Especial para todo o país, na LDB (Lei de Diretrizes e Bases) de 1961, não deia de contemplar a existência e o financiamento das instituições particulares especializadas (cf. ART. 89 da LDB/1961). Apesar de a escolarização obrigatória brasileira ser de apenas quatro anos, referente ao antigo curso primário, até a década de 1960, sua cobertura era pequena, reduzida a uma pequena parcela da população. Um relatório da UNESCO, datado de 1963 e publicado no Brasil apenas em 1982, confirmou essas informações, alertando que, enquanto muitos países europeus já haviam atingido a universalização no ensino obrigatório e registravam grande expansão do ensino de 2º grau, outros países não conseguiam “escolarizar mais do que a minoria das crianças em idade de frequentar a escola primária” e estavam “longe de haver ensinado toda a população a ler e escrever” (UESCO, 1982, p. 11). Após o golpe militar de 1964, a legislação sobre as diretrizes e bases da educação nacional foi revista e, em 1971, a Lei Educacional n.º 5.692 passou a obrigatoriedade da escolarização brasileira para oito anos, com a instituição do 1º grau. Em relação à Educação Especial, a Lei 5.692/71, no Artigo 9º, definiu a caracterização dos alunos de Educação Especial como aqueles “que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em atraso considerável quanto à idade regularde matrícula e os superdotados”. A partir desse momento, registrou-se um aumento significativo do número de classes especiais nas escolas estaduais nos diferentes municípios brasileiros (cf. BRASIL, 1975). Pela especificação da Lei 5.692/71, foi atribuída à educação especial a responsabilidade de atendimento de crianças sem a necessidade de diagnóstico de deficiência. Em 1973, para a implantação do Centro acional de Educação Especial – CEESP – foram convidados como assessores técnicos James J. Gallagher, da Universidade de Carolina do Norte, e David M. Jackson, da Superintendência da Educação Pública em Springfield, Illinois, ambos dos Estados Unidos da América. O Educação especial e inclusiva 23 www.soeducador.com.br presidente da República era Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) e o discurso corrente sobre a educação era de investimento para a formação de recursos humanos e para o desenvolvimento do país (JAUZZI, 2004). Gallagher (1974) defendia que: [...] um retardado e internado entre as idades de 10 e 60 anos, nos Estados Unidos, para ser cuidado, custa ao Estado US$ 5.000 ao ano, ou um total de US$250.000 durante toda a sua vida. O mesmo indivíduo recebendo educação e tratamento adequados pode tornar uma pessoa útil e contribuir para a sociedade. Assim, o custo extra que representam os custos extras com educação especial pode ser compensador quanto a benefícios econômicos maiores. Há um estudo segundo o qual um adulto retardado e educado poderia ganhar US$ 40 para cada dólar extra despendido com sua educação. (GALLAGHER, 1974, p. 100) A citação acima aponta para a incorporação da Teoria do Capital Humano na educação especial na década de 1970, que já fazia parte do discurso educacional brasileiro (SAVIAI, 2008), e que a justificativa para a implantação de tais serviços pautou-se, ao menos em parte, na sua função econômica (ARRUDA; KASSAR; SATOS, 2006), evidenciando a preocupação com a relação custo-benefício direcionando a política educacional. Esse momento, o CEESP divulga os princípios de normalização e integração das pessoas com deficiências na educação que passam a marcar a educação especial brasileira. Educação Especial e a garantia do direito à educação pública A Constituição Federal de 1988 configurou-se como um novo estatuto jurídico para o país. Contando com o envolvimento da sociedade civil organizada, essa Constituição caracteriza-se por uma ênfase nos direitos sociais e pelo estabelecimento dos princípios de descentralização e municipalização para a execução das políticas sociais, inclusive na educação, que passa a ser considerada direito subjetivo. Constitucionalmente implicado, o Governo Federal desde a década de 1990 tem implantado e/ou fomentado um conjunto de ações nas várias áreas dos serviços públicos como parte do sistema de proteção social. o entanto, também a partir dessa década, o governo brasileiro passou claramente a adequar-se à organização do mercado mundial globalizado na expansão do modelo econômico capitalista. Desde o governo de Fernando Collor de Mello (1990-1992), tornou-se constante um Educação especial e inclusiva 24 www.soeducador.com.br discurso sobre a modernização da economia com críticas à ação direta do Estado, principalmente nos setores de proteção social. a continuidade dessa tendência, Fernando Henrique Cardoso (19941998; 1998-2002) assumiu o governo brasileiro e seu discurso sustentou-se na construção de uma “terceira via”, expresso desde a aprovação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado (BRASIL, 1995). Essa reforma, setores importantes como a educação e a saúde deveriam ter como corresponsáveis o “terceiro setor”, através da ação das instituições públicas não estatais. O quadro político e econômico constituído no Brasil, a partir do final dos anos 1990, passa a estabelecer uma tensão: de um lado o estabelecimento constitucional de políticas sociais universais (da educação, saúde), que teriam como pressuposto a ação direta do Estado; de outro um contexto de regulação e restrição econômica, sob um discurso de solidariedade e de necessidade de retração do setor público (com a participação do terceiro setor). Em 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtien – Tailândia –, e coube ao país, como signatário da Declaração Mundial sobre Educação para Todos, a responsabilidade de assegurar a universalização do direito à Educação. Desse compromisso decorreu a elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos, concluído em 1993, que tinha como objetivo assegurar, até o final de sua vigência, a todos os brasileiros “conteúdos mínimos de aprendizagem que atendam necessidades elementares da vida” (BRASIL, 1993, p. 13). O movimento de Educação para Todos atinge, de certa forma, as pessoas com deficiências. No entanto, parece-nos que as propostas direcionadas a essa população têm também alguns elementos específicos. Mel Ainscow, consultor da UESCO, faz um histórico interessante da Educação Especial no mundo e afirma que nos anos 1970 mudanças importantes ocorreram em muitos países, que culminaram com as proposições atuais. Ainscow (1995) apresenta um levantamento realizado por esse órgão na década de 1980 em 58 países, em que foi verificado que a organização da Educação Especial se dava predominantemente em escolas especiais separadas, que atendiam um número reduzido de alunos. A partir dessas informações, o relatório da UESCO indica que diante das “proporções da demanda e os escassos recursos disponíveis, as necessidades de educação e formação da maioria das pessoas Educação especial e inclusiva 25 www.soeducador.com.br deficientes não pode satisfazer-se unicamente em escolas e centros especiais” (UESCO, 1988 apud AISCOW, 1995, p. 18). A partir dessa constatação, o autor afirma que [...] é necessário introduzir mudanças tanto nas escolas especiais como nas regulares [...]. Há muitas indicações de que em um número elevado de países de todo o mundo a integração é um elemento central na organização da educação especial [...]. Esse projeto parece adequado para os países do Terceiro Mundo, dada a magnitude das necessidades e as inevitáveis limitações de recursos disponíveis (AISCOW, 1995, p. 18) Os argumentos registrados no relatório da UESCO em 1988 são os mesmos encontrados em um documento que marcou a Educação Especial no Brasil: A Declaração de Salamanca, fruto da “Conferência Mundial sobre necessidade Educativas Especiais: acesso e qualidade”, ocorrida na Espanha, em 1994: A experiência, sobretudo nos países em via de desenvolvimento, indica que o alto custo das escolas especiais supõe, na prática que só uma pequena minoria de alunos [...] se beneficia dessas instituições...[...]. Em muitos países em desenvolvimento, calcula-se em menos de um por cento o número de atendimentos de alunos com necessidades educativas especiais. A experiência [...] indica que as escolas integradoras, destinadas a todas as crianças da comunidade, têm mais êxito na hora de obter o apoio da comunidade e de encontrar formas inovadoras e criativas de utilizar os limitados recursos disponíveis (DECLARAÇÃO DE SALAMACA, 1994, p. 24-25) Essa declaração enuncia que diante do alto custo em manter instituições especializadas as escolas comuns devem acolher todas as crianças independentes de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outros. Dois anos mais tarde, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação acional em 1996 – LDB/96 – é promulgada, propondo a adequação das escolas brasileiras para atender satisfatoriamente a todas as crianças. Diferenças étnicas, sociais, culturais ou de qualquer ordem passam a ser foco do discurso de inclusão escolar. Os comentários de Ainscow e os registros da UESCO trazem à tona preocupações de ordem econômica direcionando as proposiçõesacerca do atendimento às pessoas com necessidades educacionais especiais, como também registradas na década de 1970, por ocasião da implantação do CEESP. Educação especial e inclusiva 26 www.soeducador.com.br Sob o impacto desses documentos e dentro de um conjunto de políticas sociais, um discurso de “educação inclusiva” toma corpo no país, de modo que profissionais que atuavam na Educação Especial passam, pouco a pouco, a utilizar o termo “inclusão” no lugar da bandeira da “integração”. Essa mudança ocorre em vários países, como registrado por Ortiz González, ao analisar a inclusão na Espanha: “O termo inclusão está sendo adotado nos Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, com a ideia de dar um passo à frente do que pretendeu a proposta integradora, que não tem servido para dar respostas à diversidade que se origina no seio da comunidade como se havia pretendido...” (GOZÁLES, 2005, p. 14). Sem desconsiderar os movimentos em prol de situações menos segregadoras para as pessoas com deficiências, acreditamos que a implantação de uma política de “educação inclusiva” deve ser analisada no contexto completo das políticas sociais nas sociedades capitalistas. A história do país, a relação estabelecida na legislação entre poder público, instituições privadas e rede de ensino, no que se refere às responsabilidades no atendimento de alunos com deficiências, caracterizou-se por uma complementaridade de ações, sem superposição de serviços: os grupos privados, como as Sociedades Pestalozzi e as APAEs, responsabilizaram-se pelo atendimento aos alunos mais comprometidos e as classes especiais públicas atenderam a população menos comprometida. Essa relação de atendimentos fez com que as instituições especializadas assumissem uma posição de atores principais na Educação Especial brasileira. o decorrer dos anos 2000, essa posição começa a mudar quando o governo brasileiro, mais enfaticamente com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006; 2007-2010), passa a implantar uma política denominada de “Educação Inclusiva”. Pressionado por oferecer atendimento aos alunos que possuem deficiências, desde 2003 o Governo Federal opta pela matrícula dessa população em salas comuns de escolas públicas, acompanhado (ou não) de um atendimento educacional especializado, prioritariamente na forma de salas de recursos multifuncionais. Para sustentação dessa política, o Decreto 6.571/2008 dispõe sobre o atendimento educacional especializado e modifica as regras do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUDEB) para garantir recursos àqueles alunos que efetivamente estejam matriculados em escolas públicas e recebendo atendimento educacional especializado. Em 2009, a Resolução n.º 4 institui as Diretrizes Educação especial e inclusiva 27 www.soeducador.com.br Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade Educação Especial, e estabelece as formas possíveis desse atendimento: Art. 1º Para a implementação do Decreto nº 6.571/2008, os sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofertado em salas de recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos (BRASIL, 2009, grifos nossos). A política de “Educação Inclusiva” vai materializando-se, também, com a constituição de um conjunto de programas e ações: “Programa acional de Formação Continuada de Professores na Educação Especial” e “Formação de Professores para o Atendimento Educacional Especializado”, que atente a formação continuada de professores, prioritariamente na modalidade à distância; “Benefício de Prestação Continuada da Assistência Social” (BPC), que realiza acompanhamento e monitoramento de acesso e permanência nas escolas dos alunos beneficiários do BPC, até 18 anos; “Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais”; “Escola Acessível”, para adaptação arquitetônica das escolas; “Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade”; “Programa Incluir”. Esses programas formam, hoje, um conjunto articulado que propõe a atingir os estabelecimentos de ensino dos diferentes municípios do país. Para mensurar a abrangência pretendida dessas ações, tomamos o Programa “Educação Inclusiva: Direto à diversidade” que, segundo a secretaria de Educação Especial do MEC, hoje atinge 5.564 municípios, que corresponde a 100% dos municípios brasileiros. Com esse Programa, o Governo Federal brasileiro se compromete a fomentar a política de construção de “sistemas educacionais inclusivos”, formando educadores num sistema de multiplicadores. Desafios da implantação de uma política nacional A Secretaria de Educação Especial do MEC informa que: Os resultados do Censo Escolar da Educação Básica de 2008 apontam um crescimento significativo nas matrículas da educação especial nas classes comuns do ensino regular. O índice Educação especial e inclusiva 28 www.soeducador.com.br de matriculados passou de 46,8% do total de alunos com deficiência, em 2007, para 54% no ano passado. Segundo os dados apresentados pela Secretaria de Educação Especial, em princípio, a política proposta tem alcançado seus objetivos. No entanto, faz-se necessário olhar dentro da escola e identificar diferentes desafios. LEIS Constituição Federal de 1988: Artigo 208: atender aos portadores de deficiência na rede regular de ensino, sendo obrigatório e gratuito. Art. 227: cria programas de prevenção e atendimento especializado para portadores de deficiência física, sensorial ou mental e integração social do adolescente portador de deficiência, facilitando acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e obstáculos arquitetônicos. Lei 10.172/01 – Aprova Plano Nacional de Educação São 27 objetivos e metas voltados para educação de portadores de necessidades especiais. Vão desde educação infantil até qualificação profissional; ações preventivas, atendimento extraordinário em classes especiais até formação continuada de professores. Lei 853/89 - Dispõe sobre o apoio às pessoas com deficiências, sua integração social, assegurando o pleno exercício de seus direitos individuais e sociais. Lei 8.069/90 – ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente "A criança e o adolescente portadores de deficiências receberão atendimento especializado. ” "Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais." Lei 9394/96 - LDBEN Atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. A oferta de educação especial, dever Educação especial e inclusiva 29 www.soeducador.com.br constitucional do Estado, tem início na faixa etária de zero a seis anos, durante a educação infantil. Os sistemas de ensino deverão assegurar: I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV – educação especial para o trabalho, visando asua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. Decreto 3.298/99 regulamenta a Lei 7.853/89 Dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção e dá outras providencias. Portaria MEC n°1.679/99 Dispõe sobre os requisitos de acessibilidade a pessoas portadoras de deficiências para instruir processos de autorização e de reconhecimento de cursos e de credenciamento de instituições. 1.8 - Lei n°10.098/00. Estabelece normas gerais e critérios básicos para promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida e dá outras providências. Declaração Mundial de Educação para Todos e Declaração de Salamanca (1994 – Espanha) O Brasil fez opção pela construção de um sistema educacional inclusivo ao concordar com a Declaração Mundial de Educação para Todos, firmada em Jomtien, Educação especial e inclusiva 30 www.soeducador.com.br na Tailândia, em 1990, e ao mostrar consonância com os postulados produzidos em Salamanca (Espanha, 1994) na Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade. Entre outras premissas, tem-se: "(...) Toda pessoa com deficiência tem o direito de manifestar seus desejos quanto a sua educação, na medida de sua capacidade de estar certa disso. Os pais têm o direito inerente de serem consultados sobre a forma de educação que melhor se ajuste às necessidades, circunstâncias e aspirações de seus filhos" Nesse aspecto último, por acréscimo nosso, os pais não podem incorrer em lesão ao direito subjetivo à educação obrigatória, garantido no texto constitucional]; "As políticas educacionais deverão levar em conta as diferenças individuais e as diversas situações. Deve ser levada em consideração, por exemplo, a importância da língua de sinais como meio de comunicação para os surdos, e ser assegurado a todos os surdos acesso ao ensino da língua de sinais de seu país. Face às necessidades específicas de comunicação de surdos e de surdos-cegos, seria mais conveniente que a educação lhes fosse ministrada em escolas especiais ou em classes ou unidades especiais nas escolas comuns" Segundo Francisco Cordão, presidente da Câmara de Educação Básica, esses dispositivos legais e político-filosóficos possibilitam estabelecer o horizonte das políticas educacionais, de modo que se assegure a igualdade de oportunidades e a valorização da diversidade no processo educativo. A compreensão nesse sentido é de que tais dispositivos devem converter-se em um compromisso ético-político de todos, nas diferentes esferas de poder, e em responsabilidades bem definidas para sua operacionalização na realidade escolar. PORTADORES DE NECESSIDADES ESPECIAIS: CLASSIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO A expressão necessidades especiais tornou-se bastante conhecida no meio acadêmico, no sistema escolar, nos discursos oficiais e mesmo no senso comum. Surgiu da intenção de atenuar ou neutralizar a acepção negativa da terminologia adotada para distinguir os indivíduos em suas singularidades por apresentarem limitações físicas, motoras, sensoriais, cognitivas, linguísticas ou ainda síndromes variadas, altas habilidades, condutas desviantes etc. Tal denominação foi Educação especial e inclusiva 31 www.soeducador.com.br rapidamente difundida e assimilada, talvez, pela amplitude e abrangência de sua aplicabilidade. Nessa perspectiva, podemos dizer que indivíduos cegos apresentam necessidades consideradas especiais, porque a maioria das pessoas não necessitam dos recursos e ferramentas por eles utilizados para ter acesso à leitura, à escrita e para se deslocar de um lado para outro, em sua rotina. Essas pessoas necessitam, por exemplo, do sistema braille, de livros sonoros, de ledores, de softwares com síntese de voz, de bengalas, cães-guia ou guias humanos. O mesmo raciocínio se aplica às pessoas que necessitam de muletas, cadeiras de rodas ou andadores para sua locomoção. Da mesma forma, os surdos valem-se da linguagem gestual e da experiência visual em sua comunicação. Existem também aqueles que necessitam de cuidados especiais para a alimentação, o vestuário, a higiene pessoal e outros hábitos ou atividades rotineiras. Em tais casos, essas pessoas necessitam desenvolver habilidades, funções e aprendizados específicos. Algumas dessas necessidades podem ser temporárias ou permanentes, dependendo da situação ou das circunstâncias das quais se originam. A literatura especializada a este respeito, particularmente representada pelos estudos de TELFORD & SAWREY (1978), é ilustrativa do longo e enviesado caminho percorrido para se chegar a uma conceituação que fosse mais precisa, científica e qualitativamente aceitável. Para esses teóricos: "A tendência atual é empregar termos menos estigmatizantes, mais gentis e menos carregados emocionalmente, em substituição aos mais antigos, que adquiriram conotações de desamparo e desesperança. (...). Embora a redenominação de antigas categorias reflita em parte as concepções cambiantes e a maior precisão na definição e classificação, ela é antes um reflexo de nossa ênfase cultural na crença democrática de que todas as pessoas nascem iguais e de nossa tentativa de evitar as conotações de inferioridade intrínseca que eventualmente se acrescentam aos termos empregados com referência a grupos de pessoas percebidas como deficientes. Embora os rótulos sejam necessários para alguns fins, há uma tendência a utilizá-los tão pouco quanto possível, em vista dos estigmas associados a muitos deles (...)." (ROSSMAN, 1973). "É paradoxal que, quanto mais aprendemos acerca das pessoas excepcionais, menos confiantes nos tornamos quanto a nossa capacidade de classificá-las de maneira útil." (BOGDAN e TAYLOR, 1976). Esses estudos representam uma contraposição à arbitrariedade e ao cunho preconceituoso e depreciativo que impregnavam a terminologia circulante entre pais, especialistas e o Educação especial e inclusiva 32 www.soeducador.com.br público em geral com referência às limitações física, motora, sensorial, cognitiva, às diferentes síndromes ou ao sofrimento mental. Tais proposições revelam uma mesma tendência, isto é, a preocupação em explicitar por meio de palavras ou expressões politicamente corretas, as virtudes e intenções de paradigmas ou concepções vigentes no decorrer das últimas décadas. Note-se que a conclusão apontada pelos autores sugere um movimento dinâmico, pouco satisfatório e, por isso, sujeito a incessantes indagações. Assim, as manifestações de certas características, peculiaridades ou diferenças individuais inspiraram a denominação corrente de pessoas com necessidades especiais para designar o que antes era concebido como grupos ou categorias de indivíduos excepcionais. Nesse contexto, a expressão alunos ou crianças excepcionais foi substituída por crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais e ratificada internacionalmente na Declaração de Salamanca (ver verbete Escola Inclusiva). No Brasil, em 1986, o MEC já adotava tal designação que passou a figurar como portadores de necessidades educacionais especiais-PNEE na Política Nacional de Educação Especial (SEESP/MEC/1994), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, Lei n. 9.394/96) e, finalmente, nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação especial (MEC/2001). Portanto, a nomenclatura está oficialmente consagrada até que seja destituída pela hegemoniade uma nova concepção. Dilemas e controvérsias A expressão necessidades educacionais especiais e correlatas obteve franca adesão por parte do sistema escolar e despontou como um verdadeiro achado no sentido de alargar os horizontes da educação especial. Isso porque, além de ser considerada um eufemismo capaz de esvaziar a suposta negatividade do termo portadores de deficiências, legitima e amplia o contingente de educandos a serem contemplados pelos serviços de apoio especializado. Trata-se, pois, de um postulado atraente pela abrangência e pela pretensão de ressignificar o desgastado jargão de diversos segmentos organizados por áreas de deficiência. De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais para a educação especial (SEESP/MEC/01), essa expressão pode ser utilizada para referir-se a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada capacidade ou de suas dificuldades para aprender. Está Educação especial e inclusiva 33 www.soeducador.com.br associada, portanto, a dificuldades de aprendizagem, não necessariamente vinculada a deficiência (s). Trata-se de um leque de manifestações, de natureza orgânica ou não, de caráter temporário ou permanente cujas consequências incidem no processo educacional. Ao mesmo tempo, as necessidades especiais são caracterizadas como manifestações decorrentes de dificuldades de aprendizagem, de limitações no processo de desenvolvimento com comprometimento do desempenho escolar, de dificuldades de comunicação e sinalização, de altas habilidades ou superdotação. A extensão do termo é tão ampla que se torna difícil perceber quem não apresenta necessidades educacionais especiais. Ao analisar os meandros dessa questão, MAZZOTTA (2001) nos alerta: "Alunos e escolas são adjetivados de comuns ou especiais e em referência a uns e outras são definidas necessidades comuns ou especiais a partir de critérios arbitrariamente construídos por abstração, atendendo, muitas vezes, a deleites pessoais de "experts" ou, até mesmo, de espertos. Alertemo- nos, também, para os grandes equívocos que cometemos quando generalizamos nosso entendimento sobre uma situação particular (...). Hoje, e provavelmente ainda por muitos anos do século XXI, as expressões Alunos Especiais e Escolas Especiais são empregadas com sentido genérico, via de regra, equivocado. Ignora-se, nestes casos, que todo aluno é especial e toda escola é especial em sua singularidade, em sua configuração natural ou física e histórico-social. Por outro lado, apresentam necessidades e respostas comuns e especiais ou diferenciadas na defrontação dessas duas dimensões, no meio físico e social." Considerem-se também os ecos provenientes do movimento de pessoas com deficiência, especialmente marcado pela década de 80 do século passado, quando a grita geral pela afirmação de direitos ecoou em contraposição ao enfoque assistencial e terapêutico da nomenclatura preponderante. Nesse contexto, termos como deficientes, incapazes, retardados, excepcionais e correlatos foram descartados, consagrando-se a expressão portadores de deficiência para referir-se a pessoas com limitações física, sensorial, mental ou múltipla. Posteriormente, a classificação genérica portadores de necessidades especiais passou a englobar essas e outras categorias. As incessantes indagações inspiram novas proposições como é o caso, por exemplo, da denominação Portadores de Direitos Especiais - PODE - proposta por Frei Beto. Mas as ressalvas e sutilezas continuam, pois, o termo portador de caiu na armadilha do Educação especial e inclusiva 34 www.soeducador.com.br léxico que aprisiona o sujeito ao desconforto de portar ou carregar deficiências, necessidades ou direitos. As definições no contexto da escola O uso indiscriminado desses termos, nas escolas, pode gerar consequências negativas quando um aluno ou um grupo de alunos são apontados como especiais e passam a ser tratados como um problema para a escola. Dependendo da forma como tais expressões são empregadas, deixam de ser achados importantes para se tornarem "achismos" que não contribuem com a escolarização bem-sucedida do alunado. Convém lembrar as recomendações de MAZZOTTA (2001) quanto ao perigo das generalizações, dos construtos arbitrários e abstratos que resultam em práticas e entendimentos equivocados. A terminologia aqui apresentada não escapa ao descontentamento daqueles que encaram tal generalização como meras tentativas de encobrir, negar ou descaracterizar as especificidades das várias deficiências. Além disso, há os que consideram a polêmica inócua e desnecessária ou que serve, apenas, para desviar o foco das discussões primordiais. Tais expressões e seus derivados não deveriam ser empregadas para classificar, discriminar, rotular ou incentivar a disseminação de ideias preconceituosas e pejorativas. O aprofundamento dessa temática mostra a persistência de um movimento dinâmico e paradoxal de adesão, contraposição e desconfiança, quando se trata de estabelecer categorias ou classificações de seres humanos. Os termos: diagnóstico, classificação, avaliação, testagem são utilizados e definidos de diferentes maneiras nas várias áreas médicas, psicológica, educacional, entre outras. O diagnóstico educacional consiste na utilização de recursos, meios e técnicas para analisar e avaliar as situações educacionais, os problemas e as dificuldades dos alunos, bem como, tomar conhecimento de suas causas para preveni-las e corrigi-las, quando possível. Todo diagnóstico tem duas funções básicas: 1- Localizar e analisar as causas das dificuldades dos alunos em todas as áreas das suas atividades; Educação especial e inclusiva 35 www.soeducador.com.br 2- Identificar e avaliar as áreas de aprendizagem e ajustamento, tanto as positivas, quanto as negativas. Zacharias (2007) diz que embora sejam muitas as desvantagens e desvios existentes na classificação de pessoas em categorias, elas acabam tornando-se necessárias, principalmente do ponto de vista da administração do Sistema Educacional, e apresenta a classificação abaixo, a qual decorre do modelo clínico, combinado sempre que possível ao modelo educacional. 1 Excepcionais Intelectuais 1.1 Superdotados 1.2 Deficientes mentais a) educáveis b) treináveis c) dependentes 2. Excepcionais por desvios físicos 2.1 Deficientes físicos não sensoriais 2.2 Deficientes físicos sensoriais a) deficientes auditivos b) deficientes visuais 3 Excepcionais psicossociais 3.1 alunos com distúrbios emocionais 3.2 alunos com desajustes sociais 4 Excepcionalidade múltipla 4.1-Alunos com mais de um tipo de desvio (ZACHARIAS, 2007). AS DIFERENTES NECESSIDADES ESPECIAIS Para falarmos das diferentes necessidades especiais, faz-se necessário uma breve introdução aos nossos sistemas sensoriais com os quais conhecemos e nos relacionamos com o mundo que são: a gustação; o olfato; o tato; a audição; a visão e a propriocepção. Educação especial e inclusiva 36 www.soeducador.com.br Figura 1: Os sentidos Fonte: http://www.afh.bio.br/sentidos/sentidos1.asp Legarda e Miketta (2008, p. 20) destacam três aspectos importantes e que estão relacionados aos sistemas sensoriais: 1. O uso integrado que fazemos dos sentidos em nossos primeiros anos de vida vai decrescendo com o passar dos tempos, devido à desvalorização da acuidade sensorial em nossa cultura e sistema educativo. Lamentavelmente, os currículos de estudo de crianças com mais de seis anos, descuidam, quase que completamente, desse importante aspecto do desenvolvimento que não se restringe apenas a uma forma de conhecer o meio ambiente, mas é também uma maneira de conhecermos a nós mesmos; 2. Os sentidos são nossa primeira fonte de conhecimento. No nascimento, não há o pensamento simbólico e nem o raciocínio lógico, somente
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