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1 FARMACOLOGIA II RAUL BICALHO – MEDUFES 103 Interação Medicamentosa INTRODUÇÃO • Interação medicamentosa: o É um evento clínico em que os efeitos de um fármaco são alterados pela presença de outro fármaco (mais comum), de um alimento, de uma bebida ou de algum agente químico/ambiental ▪ Ex.: Álcool, leite, suplementos etc. o Constitui causa comum de efeitos adversos o É algo extremamente negligenciado, porque a notificação de interação é muito pobre, principalmente pela ignorância de que ela está acontecendo o O entendimento e o cuidado adequado das interações é fundamental para reduzir iatrogenia e danos ao paciente decorrentes da farmacoterapia o Nem sempre a interação é ruim, existem interações que utilizamos em prol da terapêutica (Ex.: Quando é recomendada a administração do medicamento junto com alimento, normalmente é para melhorar absorção) CLASSIFICAÇÃO DAS INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS • Interações farmacocinéticas: o Podem ser em qualquer etapa da farmacocinética (Absorção, distribuição, biotransformação e excreção) o Na absorção: ▪ Alteração no pH gastrintestinal → Ex.: Antiácido altera o pH gastrintestinal e dificulta a absorção de drogas que dependem do pH ácido ou facilita a absorção de drogas que requerem pH mais elevado ▪ Adsorção, quelação e outros mecanismos de complexação → Ex.: Sais biliares ▪ Alteração na motilidade gastrintestinal (Acelerando ou retardando) ▪ Má absorção causada por fármacos (Interação com carreadores) o Na distribuição: ▪ Competição na ligação a proteínas plasmáticas → Ex.: 2 drogas que têm boa taxa de ligação à albumina. Se elas forem administradas juntas, elas vão competir. As 2 vão ter aumento na fração livre, a que tiver maior afinidade vai ligar mais e a outra vai ter um aumento maior da fração livre ❖ Lembrando que é a fração livre do medicamento que chega no sítio de ação e gera o efeito ❖ O aumento da fração livre pode estar relacionado tanto a efeitos benéficos quanto a efeitos tóxicos ▪ Hemodiluição com diminuição de proteínas plasmáticas → Ex.: Administração de soro o Na biotransformação/depuração/metabolização: ▪ Indução enzimática → Se for causada em um fármaco administrado junto, haverá uma metabolização mais rápida dessa droga (ela será depurada/eliminada mais rapidamente) ▪ Inibição enzimática → Se for causada em um fármaco administrado junto, haverá um aumento da meia- vida dessa droga (ela vai durar mais tempo, vai concentrar mais) PROF. RONEY OLIVEIRA 2 FARMACOLOGIA II RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Na excreção: ▪ Alteração no pH urinário → Usada positivamente com frequência. Ex.: Probenecida (Redutor de ácido úrico, também altera o pH urinário e retarda a eliminação de drogas que são rapidamente eliminadas pelo rim) ▪ Alteração na excreção ativa tubular renal ▪ Alteração no fluxo sanguíneo renal ▪ Alteração na excreção biliar e ciclo êntero-hepático • Interações farmacodinâmicas: o Ocorrem nos sítios de ação dos fármacos, envolvendo os mecanismos pelos quais os efeitos desejados e não desejados se processam o O efeito resulta da ação dos fármacos envolvidos no mesmo receptor ou enzima o Interação farmacodinâmica é uma interação na qual o alvo do mecanismo de ação é o mesmo (o sítio de ação) o Ex.: O alvo dos benzodiazepínicos e dos barbitúricos é o receptor GABA. A interação dos 2 tipos de medicamento leva a um aumento da depressão neuronal. Se os 2 forem administrados sem a cautela devida, pode até levar o paciente a uma depressão respiratória importante e até à óbito • Interações de efeito: o Ocorrem quando dois ou mais fármacos em uso concomitante têm ações farmacológicas similares ou opostas o Podem produzir sinergias ou antagonismos sem modificar farmacocinética ou mecanismo de ação dos fármacos envolvidos o Ex.: Associação de 2 antibióticos que atuam com mecanismos de ação diferentes, mas os 2 têm meta de depenar a infecção, seja matando ou incapacitando a bactéria (ação/resultado sinérgico por meios diferentes) o Ex. 2: Uma medicação antagonista de receptor benzodiazepínico, que age em outro sítio do receptor, não no mesmo que o benzodiazepínico, e antagonizando seu efeito o Ex. 3: Álcool e benzodiazepínico. Os 2 são depressores do SNC, mas agem de formas diferentes (O benzodiazepínico se liga ao receptor gabaérgico e o álcool muda a fluidez de membrana, aumentando a penetração de cloreto) • Interações farmacêuticas: o Também chamadas de incompatibilidade medicamentosa (Quando eles se misturam) o Ocorrem in vitro, isto é, antes da administração dos fármacos no organismo, quando se misturam dois ou mais deles numa mesma seringa, equipo de soro ou outro recipiente o Se esses medicamentos se juntam, geram reações físico-químicas, que podem gerar uma substância tóxica ou uma substância inerte o Drogas que têm essa interação devem ser prescritas em horários distantes e em recipientes diferentes INTERAÇÕES • Questões acerca de interações: o Não obrigatoriamente uma interação que seja descrita vai ocorrer, existe um potencial de ocorrência ▪ É importante que se saiba da possibilidade para se avaliar se vale a pena correr o risco ou não (e na maioria das vezes não vale, escolhendo uma alternativa como substituir uma das medicações, alterar dose etc.) o É difícil detectar uma interação medicamentosa, sobretudo pela variabilidade observada entre pacientes 3 FARMACOLOGIA II RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Muitas interações são dependentes de dose, nesses casos, a dose do medicamento indutor da interação poderá ser reduzida para que o efeito sobre o outro medicamento seja minimizado o Em muitas situações, em que são administrados medicamentos que interagem entre si, os pacientes necessitam apenas serem monitorados com o conhecimento dos potenciais problemas causados pela interação o O médico deve antecipar combinações potencialmente perigosas de medicamentos (clinicamente significativas) e o paciente pode ser alertado para observar sinais e sintomas que denotem um efeito adverso o Os medicamentos mais associados à ocorrência de efeitos perigosos quando sua ação é significativamente alterada são aqueles com baixo índice terapêutico (Ex.: digoxina, fenitoína, carbamazepina, aminoglicosídeos, varfarina, teofilina, lítio e ciclosporina) e os que requerem controle cuidadoso de dose (Ex.: anticoagulantes, anti-hipertensivos ou antidiabéticos) o Pacientes com múltiplas doenças, com disfunção renal ou hepática, e aqueles que fazem uso de muitos medicamentos são os mais susceptíveis ▪ A população idosa frequentemente se enquadra nesta descrição o Uma interação conhecida não necessariamente ocorrerá na mesma intensidade em todos os pacientes o Os profissionais de saúde devem estar atentos às informações sobre interações medicamentosas e devem ser capazes de descrever o resultado da potencial interação e sugerir intervenções apropriadas ▪ Porém, é quase impossível lembrar de todas as interações conhecidas e de como elas ocorrem ▪ Mas, dentro da sua área de atuação, normalmente se grava as mais comuns do acervo de medicamentos EXEMPLOS DE INTERAÇÕES COMUNS • Ácido Acetilsalicílico (AAS) X Omeprazol: o Dissolução mais rápida do revestimento entérico dos salicilatos revestidos potencializando efeitos secundários gástricos dos salicilatos o Muitas vezes, médicos recomendam erroneamente o omeprazol para pacientes (que tomam AAS) no intuito de proteger do risco gástrico do AAS ▪ Mas, na verdade isso não está ajudando, porque leva a uma dissolução mais rápida do revestimento entérico do AAS, o que acaba ativando mais rapidamente o medicamento ainda no estômago, levando a uma maior chance de efeitos secundários gástricos o Essa associação acaba perpetuando a necessidade da associação, porque se o paciente tem efeito gástrico pelo AAS (Ex.: Gastrite), eleacaba tendo que administrar um inibidor de bomba de prótons, como o omeprazol ▪ Com o indivíduo mantendo o omeprazol e o AAS, ele não melhora, gerando um ciclo vicioso • Ácido Acetilsalicílico (AAS) X Ibuprofeno: o Redução dos efeitos terapêuticos de ambos os medicamentos o Ocorre inibição competitiva pelo sítio de ligação com a ciclooxigenases o É uma interação farmacodinâmica (mesmo sítio de ligação) antagônica (inibição) • Ácido Fólico X Fenitoína: o Diminuição da eficácia da fenitoína o Mecanismo desconhecido (Não dá para classificar) 4 FARMACOLOGIA II RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Ex.: Grávidas fazendo o uso de ácido fólico, mas que usam fenitoína para controle de crises epiléticas. As crises podem voltar enquanto se faz a suplementação de ácido fólico, porque a eficácia da fenitoína cai • Amitriptilina (Antidepressivo) X Carbamazepina (Antiepilético): o Inibição da ação da amitriptilina e potencialização da carbamazepina o MA → Competição por vias de metabolização e indução enzimática por parte da carbamazepina o É uma interação farmacocinética na depuração/no metabolismo ▪ Na indução enzimática a carbamazepina atua especificamente sobre a amitriptilina (diminuindo sua ação) ▪ Na competição por vias de metabolização uma atua sobre a outra (recíproca) • Antimicrobianos X ACO (Anticoncepcional oral): o Diminuição da eficácia contraceptiva (do anticoncepcional) ▪ Não é incomum, são vários antimicrobianos/antibióticos que interagem reduzindo a eficácia do ACO, alguns com maior grau e outros com menor grau (AB de amplo espectro tendem a ter esse efeito mais pronunciado) o MA → Redução de enzimas hidrolíticas produzidas pela flora, importantes na recirculação entero-hepática dos anticoncepcionais orais o A conduta é orientar a paciente sobre a diminuição de eficácia do ACO e para ela ficar atenta sobre a atividade sexual, seja evitando ou utilizando outros métodos contraceptivos (Ex.: Camisinha) até o próximo ciclo do ACO • Fluconazol X Estatinas: o Aumento do risco de miopatia (Que pode evoluir para rabdomiólise) o MA → Aumento dos níveis plasmáticos de sinvastatina por inibição de sua metabolização o É uma interação farmacocinética de metabolização • Glibenclamida (Hipoglicemiante) X Hidroclorotiazida (Anti-hipertensivo): o Diminuição da eficácia da glibenclamida e hiponatremia o MA → Hidroclorotiazida diminui a sensibilidade dos receptores teciduais de insulina e a glibenclamida potencializa o efeito de perda de potássio o É uma interação de efeito CONSIDERAÇÕES FINAIS • Orientações gerais: o É fundamental pesquisar a possibilidade de interações clinicamente relevante, principalmente envolvendo os fármacos mais comumente usados pelo profissional de saúde o Consultar listas disponibilizadas por instituições confiáveis quando diante de uma combinação suspeita o Esteja alerta para quaisquer medicamentos que tenham baixo índice terapêutico ou que necessitem manter níveis séricos específicos (Ex.: digitálicos, aminoglicosídeos, varfarina, teofilina, lítio, imunossupressores, anticoagulantes, citotóxicos, anti-hipertensivos, anticonvulsivantes, anti-infecciosos ou antidiabéticos) o Lembre-se daqueles medicamentos que são indutores enzimáticos (Ex.: barbituratos, carbamazepina, fenitoína, rifampicina, nicotina) ou inibidores enzimáticos (Ex.: alopurinol, cloranfenicol, cimetidina, ciprofloxacino, dissulfiram, eritromicina, fluconazol, fluoxetina, isoniazida, cetoconazol, metronidazol, verapamil) 5 FARMACOLOGIA II RAUL BICALHO – MEDUFES 103 o Analise a farmacologia básica dos medicamentos considerando problemas óbvios (Depressão aditiva do Sistema Neural Central, por exemplo) o Considere que os idosos estão sob maior risco devido à redução das funções hepática e renal, que interferem na eliminação dos fármacos o Tenha em mente que interações que modificam os efeitos de um fármaco também podem envolver medicamentos de venda sem prescrição, fitoterápicos, assim como certos tipos de alimentos, agentes químicos não-medicinais e drogas sociais, tais como álcool e tabaco o Idade e gênero, também influenciam a predisposição a reações adversas a medicamentos resultantes de interações medicamentosas o Considerar opções terapêuticas, substituindo um dos fármacos por outro com propriedades símiles e com menor risco de interação (Ex.: Substituir cimetidina por ranitidina) o Realizar monitoria e ajustar dose dos fármacos que interagem entre si, quando não houver possibilidade de substituir ou suspender um deles o Evitar esquemas terapêuticos complexos, sempre que possível (Ex.: Evitar associações de fármacos com mesma ação farmacológica quando não houver prova suficiente de benefício ao paciente, tais como anti-inflamatórios não-esteroides, analgésicos etc.) o Acompanhar o paciente para prevenir a ocorrência de interações e de reações adversas a medicamentos o Individualizar a terapia → Pensar em início, meio e fim do tratamento (Pensar nos ajustes, nos intervalos e quando o medicamento deve ser retirado/descontinuado) o Desconfiar de interações quando os rumos do tratamento (resposta, comportamento do paciente) se alterarem sem causa aparente o Educar o paciente, que deve conhecer sobre sua doença, os benefícios e riscos da terapia o Estimular o paciente a indagar sobre a doença e o tratamento que recebe e verificar se ele sabe sobre a forma de uso dos medicamentos o Pacientes esclarecidos e que entendam essas questões provavelmente serão mais aderentes ao regime terapêutico e serão parceiros na identificação de melhoras e de problemas com o tratamento, aperfeiçoando a comunicação • Sugestão de App para ver interação medicamentosa: o Medscape → Atualizações frequentes, fácil de pesquisar e grátis
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