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Abdome agudo – Sabinston Abdome agudo se refere a dor e sensibilidade abdominal. Requer uma avaliação completa e rápida, com terapia, em geral, cirúrgica de emergência. O diagnóstico varia conforme idade e sexo. A apendicite é mais comum em jovens, enquanto doença biliar, obstrução intestinal, isquemia e infarto intestinal e diverticulite são mais comuns em idosos. As causas cirúrgicas de abdome agudo são infecção, isquemia, obstrução ou perfuração. As causas não cirúrgicas de abdome agudo são endócrinas/metabólicas, hematológicas e toxinas/drogas. Dada a natureza potencialmente cirúrgica do quadro, uma avaliação rápida é necessária. Se analisa a história clínica do paciente, logo então se realiza um exame físico minucioso. Estudos laboratoriais e por imagem, geralmente necessários, são orientados pelas duas primeiras etapas. Anatomia e fisiologia A dor abdominal é dividida em visceral, parietal e referida. A primeira é relacionada com inervação de fibras aferentes de órgãos intra- abdominais, tanto de vísceras ocas como a cápsula de órgãos sólidos, geralmente é mal localizada. A dor parietal resulta da irritação do peritônio parietal, tende a ser mais aguda e bem localizada. A dor referida é a dor percebida em um local distante da fonte de estímulo, sendo casos comuns: - Ombro direito: Fígado, vesícula biliar e hemidiafragma direito. - Ombro esquerdo: Cardíaca, cauda do pâncreas, baço e hemidiafragma esquerdo. - Escrotos e testículos: Ureter. A penetração de bactérias ou irritantes químicos na cavidade peritoneal pode causar um extravasamento de líquido na cavidade peritoneal. O peritônio responde à inflamação com maior fluxo sanguíneo, maior permeabilidade e formação de exsudato fibrinoso em sua superfície. O intestino também desenvolve paralisia local ou generalizada. A superfície fibrinosa e uma redução do movimento intestinal provocam aderência entre o intestino e o omento ou a parede abdominal e ajudam a bloquear a inflamação. Como resultado, um abscesso pode produzir dor aguda localizada com ruídos hidroaéreos e função gastrointestinal preservados, enquanto um processo difuso, como uma úlcera duodenal perfurada, produz dor abdominal generalizada com diminuição da motilidade intestinal. A peritonite pode afetar toda a cavidade abdominal ou parte do peritônio visceral ou parietal. História É essencial para formular um diagnóstico e o esquema de tratamento subsequente. Não enfocar a investigação apenas nas queixas de dor, mas também nos problemas antecedentes e os sintomas associados. As perguntas devem ser estruturadas para revelar o início, o tipo, a localização, a duração, a irradiação e a cronologia da dor vivenciada. Com frequência, pode-se obter mais informação observando como o paciente descreve a dor vivenciada. Dor identificada com um dedo geralmente é mais localizada e típica de inervação parietal ou inflamação peritoneal em comparação com a indicação da área de desconforto com a palma da mão, que é mais típica de desconforto visceral do intestino ou doença de órgão sólido. O início súbito de dor lancinante sugere condições como perfuração intestinal ou embolização arterial com isquemia, embora outras condições como cólica biliar possam manifestar-se subitamente também. A dor que se desenvolve e se exacerba ao longo de várias horas é típica de condições de inflamação progressiva ou infecção, como colecistite, colite ou obstrução intestinal. Igualmente importante ao caráter da dor é a sua localização e irradiação. A dor de órgão sólido visceral no abdome é generalizada no quadrante do órgão envolvido (ex: hepática – superior direito). Dor no intestino delgado é referida como dor periumbilical pouco localizada, enquanto a dor no cólon é referida entre o umbigo e a sínfise pubiana. A dor também pode se irradiar além do local da doença, como o fígado, que pode gerar dor referida no ombro direito, ou a dor genitourinária que pode ser sentida nos flancos e se irradia para a bolsa escrotal / grandes lábios. Atividades que aumentam/diminuem a dor também devem ser analisadas. A ingesta de alimentos aumenta a dor os casos de obstrução intestinal, cólica biliar, pancreatite, diverticulite ou perfuração intestinal, porém pode aliviar a dor da úlcera peptídica não perfurada ou da gastrite. Pacientes com irritação peritoneal evitam mover o abdome e referem dor no deslocamento de carro até o hospital devido aos solavancos, porém sentem melhora da dor quando flexionam os joelhos. Sintomas associados também devem ser analisados. Vômitos podem ocorrer na dor abdominal grave de qualquer causa, ou como resultado de obstrução intestinal mecânica ou íleo. É mais provável que o vômito preceda o início da dor abdominal significativa em muitas condições clínicas, enquanto a dor de um abdome agudo cirúrgico manifesta-se primeiro e estimula o vomito. A constipação pode resultar de obstrução mecânica ou redução de peristaltismo, e deve-se verificar se o paciente continua a eliminar gazes ou fezes pelo reto, pois em uma obstrução total há mais probabilidade de acontecer isquemia intestinal ou perfuração, devido a subsequente distensão volumosa. A diarréia está comumente associada a enterite infecciosa, doença intestinal inflamatória e contaminação parasitária. A diarreia com sangue ocorre nessas situações e na isquemia colônica. A HCP e o diagnóstico de doenças preexistentes podem levar a análise de hipóteses que de outro modo não seriam consideradas. Todas as cicatrizes no abdome precisam ser consideradas na história clínica obtida. Por exemplo, história de apendicectomia, DIP ou colecistectomia podem contribuir para o diagnóstico diferencial. A utilização de medicamentos e a história ginecológica de pacientes femininos é importante na avaliação de dor abdominal em mulheres jovens durante a análise da probabilidade de gravidez ectópica, DIP, dor entre as menstruações ou endometriose grave. Medicamentos podem criar condições abdominais agudas ou mascarar seus efeitos. Os opiáceos podem causar constipação e obstrução, contribuir para espasmo do esfíncter de Oddi e exacerbar a dor biliar ou pancreática, suprimir a sensação dolorosa e dificultar um diagnóstico acurado. Os AINEs geram maior risco de inflamação do TG superior e de perfuração. Imunossupressores elevam o risco de doenças bacterianas ou virais e reduzem a resposta inflamatória. Anticoagulantes podem causar sangramentos gastrointestinais, hemorragias retroperitoneais ou na mucosa retal, e seu efeito deve ser levado em conta durante uma cirurgia. O alcoolismo associa-se a coagulopatia e hipertensão porta decorrente de doença hepática. A cocaína e meta-anfetamina são vasoespásticas, gerando hipertensão e isquemia cardíaca e intestinal. Exame físico Apesar das novas tecnologias como TC e RM, o exame físico ainda é essencial na avaliação do paciente. Deve sempre começar com a inspeção geral do paciente, procurando palidez, cianose e sudoreses, partindo então para a inspeção do próprio abdome. Pacientes com irritação peritoneal sentem dor ao movimentar o abdome, assim, ficam imóveis no leito e, geralmente, com os joelhos e quadris flexionados para reduzir a tensão na parede anterior do abdome. Doenças que provocam dor sem irritação peritoneal, como intestino isquêmico e cólica biliar e ureteral, fazem com que os pacientes mudem continuamente de posição no leito enquanto tentam achar uma posição que reduza seu desconforto. A inspeção começa com o aspecto do abdome (distendido, escafoide, com abaulamentos). Atenção especial deve ser dada a todas as cicatrizes presentes e, se de natureza cirúrgica, devem ser correlacionadas com a história cirúrgica obtida. Hérnias fasciaispodem ser suspeitadas e confirmadas durante a palpação da parede abdominal. Na ausculta abdominal, deve-se avaliar ruídos intestinais quanto à quantidade e qualidade. O silêncio abdominal sugere íleo, enquanto ruídos intestinais hiperativos podem ser encontrados nas enterites e na fase precoce da isquemia intestinal. A intensidade, qualidade do som e padrão dos ruídos peristálticos, devem ser considerados. A obstrução mecânica do intestino caracteriza-se por ruídos “metálicos” em tom alto, que tendem a ocorrer em salvas e estão associados a dor. Os sons intermitentes e tipo “eco” em geral estão presentes quando existe distensão luminar significativa. A percussão é utilizada para avaliar distensão gasosa do intestino, ar livre intra- abdominal, grau de ascite ou a presença de irritação peritoneal. O timpanismo é característico de alças intestinais repletas de gás. No quadro da obstrução intestinal ou íleo, esse timpanismo é ouvido em todos os quadrantes, exceto no superior direito, onde o fígado se localiza sob a parede abdominal. Se for identificada macicez localizada à percussão em qualquer área que não o quadrante superior direito, considera-se que possa haver uma massa abdominal deslocando o intestino. Além de revelar a gravidade e a localização exata da dor abdominal, a palpação pode confirmar, adicionalmente, a presença de peritonite, bem como identificar organomegalia ou qualquer massa intra-abdominal anormal. Apalpação deve ter início com manobras delicadas e distantes da área de dor relatada. Caso seja induzida dor considerável no início da palpação, o paciente provavelmente contrairá voluntariamente o abdome, limitando a informação obtida. A contração involuntária, ou espasmo muscular da parede abdominal, é sinal de irritação peritoneal e precisa ser diferenciada da contração voluntária. Para alcançar esse objetivo, o examinador faz pressão consistente na parede abdominal afastado do ponto de dor máxima, enquanto pede ao paciente que inspire lenta e profundamente. No quadro de contração voluntária, os músculos abdominais se relaxarão durante a inspiração, enquanto no involuntário os músculos permanecerão espásticos e tensos. Preparo para cirurgia de emergência Independentemente da gravidade da doença, todos os pacientes necessitam de algum grau de preparo pré-operatório. Deve-se obter acesso IV para as eventuais correções das anormalidades eletrolíticas. A maioria, senão a totalidade dos pacientes, terá necessidade de infusões de antibióticos, que deve ser iniciada tão logo se tenha sido feito um diagnóstico presuntivo. Os pacientes com íleo paralítico generalizado, caracterizados por ruídos intestinais hipoativos ou ausentes, beneficiam-se de uma sonda nasogástrica para reduzir a probabilidade de vômito e aspiração. A cateterização vesical com cateter de Foley para avaliação do débito urinário (normal; 0,5 ml/kg/h), uma medida de adequação da reposição volêmica, está indicada na maioria dos pacientes. Uma anormalidade eletrolítica comum que exige correção é a hipocalemia, sendo tratada com reposição de potássio por um cateter venoso central.
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