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Emergências psiquiátricas

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Saúde Mental Mayra Cleres de Souza, UFR
emergências psiquiátricas
introdução
São situações nas quais há uma alteração do comportamento ou do estado mental (humor, pensamento, sensopercepção) de um indivíduo que está associada a um risco iminente à integridade física ou psíquica do próprio paciente ou de outras pessoas, demandando intervenção terapêutica imediata.
Essa alteração pode ser percebida pelo próprio afetado ou por outras pessoas. 
Durante o atendimento a uma emergência psiquiátrica, é importante ficar atento a cinco objetivos fundamentais:
I. Realizar uma hipótese diagnóstica adequada, investigando e excluindo causas orgânicas que possam causar os sintomas e determinando-se o paciente apresenta intoxicação ou abstinência de alguma substância psicoativa.
II. Utilizar medidas para estabilização das alterações agudas, diminuindo os riscos associados.
III. Promover o tratamento mais adequado, evitando medidas coercitivas e utilizando um ambiente o menos restrito possível.
IV. Formar uma aliança terapêutica, promovendo maior confiança na relação, maior qualidade nas informações obtidas e maior eficácia nas intervenções propostas, ou seja, melhorando a elucidação diagnóstica e o processo terapêutico.
V. Organizar um plano terapêutico e realizar os encaminhamentos adequados para a continuidade do tratamento, como a indicação de internação psiquiátrica ou o acompanhamento em serviço ambulatorial.
suspeita de organicidade
Um dos aspectos cruciais é estar atento a características sugestivas de organicidade do quadro, por exemplo:
Apresentação dos sintomas: início agudo, curso flutuante, apresentação atípica, presença de alucinações não auditivas ou sintomas catatônicos.
História psiquiátrica: primeiro episódio, ausência de história psiquiátrica prévia ou refratariedade ao tratamento psiquiátrico.
Exame do estado mental: alteração do nível de consciência, comprometimento da atenção ou da memória, presença de desorientação.
Antecedentes: idade avançada (>40 anos), presença de doença clínica preexistente ou história de trauma craniencefálico.
Exame físico: presença de sintomas neurológicos ou de sinais de infecção.
Agitação psicomotora e agressividade
definições
Pode ser definida pela presença de comportamentos motores e/ou verbais aumentados e inadequados, acompanhados de excitação psíquica e elevação das respostas a estímulos. Está associada a risco para a integridade física do indivíduo, de pessoas próximas ou até mesmo da equipe de saúde. Durante episódios de agitação psicomotora, podem ocorrer manifestações de agressividade.
Estima‐se que 20 a 50% dos atendimentos em serviços de emergência psiquiátrica envolvem o risco de agitação psicomotora e que 10% dos pacientes avaliados evoluirão com agitação.
Está relacionada à diminuição da atividade GABAérgica e serotoninérgica e ao aumento da atividade noradrenérgica, dopaminérgica e do eixo hipotálamo‐hipófise‐suprarrenal.
avaliação do paciente
Cabe ao profissional fazer a avaliação diagnóstica e a estimativa de risco de agressividade. 
A estimativa de risco depende de inúmeros fatores além do diagnóstico. Do ponto de vista sociodemográfico, há maior prevalência de agressividade entre homens, jovens (entre 15 e 24 anos), com baixo nível social e educacional e com baixo suporte social. Em termos biológicos, há relação com portadores do alelo Met 158 da COMT.
Em relação aos aspectos psicológicos, são exemplos baixa tolerância a frustrações, baixa autoestima, impulsividade, desinibição, déficit de função executiva, baixo coeficiente de inteligência e modelo parental violento. Na história clínica, há associação com episódios prévios de comportamento agressivo, internação psiquiátrica prévia, antecedente de encarceramento, uso de substâncias psicoativas, antecedente de abuso durante a infância, presença de alucinações auditivas com vozes de comando e juízo pobre de realidade.
Ademais, deve‐se permanecer atento a sinais de agressão iminente, como contato visual prolongado, aumento do volume da voz, face e postura ameaçadoras, ameaças verbais e movimentos súbitos. 
Manejo
É importante zelar pela integridade física e psíquica do paciente, auxiliando‐o a retomar o controle sobre seu comportamento, além de reduzir o risco de danos a terceiros, promovendo um ambiente seguro. 
A primeira intervenção a ser tomada é o manejo verbal e comportamental, com o objetivo de tentar descalonar o quadro de agitação. Deve‐se promover um ambiente tranquilo e seguro. A abordagem verbal deve ser clara e concisa, em tom calmo, com escuta cuidadosa, identificando sentimentos e desejos do paciente e respeitando seu espaço. Deve‐se concordar (ou “concordar para discordar”), evitar ser provocativo e ofertar escolhas e otimismo.
Caso tais medidas iniciais não sejam efetivas, o próximo passo é a contenção farmacológica, associada ou não à contenção física.
A contenção farmacológica deve idealmente oferecer rápida tranquilização sem sedação excessiva, com medicações de início rápido e duração suficiente, além de baixo risco de efeitos colaterais ou interação medicamentosa. São comumente utilizados antipsicóticos típicos (haloperidol, clorpromazina), atípicos (risperidona, olanzapina) ou benzodiazepínicos (diazepam, midazolam, lorazepam). 
O haloperidol é uma das medicações mais estudadas. Seu uso VO e IM pode ser iniciado com 5 mg e repetido a cada 30 min até uma dose máxima recomendada de 20 mg, mas, em casos excepcionais, pode chegar até 80 mg/dia. Deve‐se ficar atento a parkinsonismo, acatisia, distonia aguda, alargamento de QTc, hipotensão postural e risco de síndrome neuroléptica maligna. A associação de prometazina 25 a 50 mg, VO ou IM, promove mais sedação e menos distonia aguda. O uso EV tem início de ação mais rápido, porém é desencorajado pela pouca praticidade na emergência e pelo maior risco de alterações eletrocardiográficas.
A clorpromazina deve ser preferencialmente usada VO (25 a 50 mg, a cada 1 a 4 horas). Apesar de sua extensa utilização na prática, não é recomendado o uso IM, pelo risco de toxicidade cardíaca/hipotensão súbita, lesão muscular no local da aplicação e maior efeito anticolinérgico (agravando delirium).
A olanzapina pode ser usada na dose de 10 mg, VO ou IM, a cada 2 horas, até 40 mg/dia. Deve‐se evitar o uso concomitante de olanzapina IM e benzodiazepínicos. A risperidona pode ser usada na dose de 2 mg, VO, a cada 2 horas, até 8 mg/dia.
O lorazepam pode ser utilizado VO em doses de 2 mg e repetido a cada 2 horas, com dose máxima diária recomendada de 12 mg (escolha em casos de lesão hepatica).
O midazolam 15 mg, IM, tem início de sedação mais rápido que haloperidol com prometazina, porém seu efeito é de curta duração. O diazepam não tem sido indicado como primeira escolha em agitações, exceto na abstinência alcoólica. Não deve ser feito IM. 
Deve‐se ficar atento ao uso de benzodiazepínicos parenterais, pelo risco de depressão respiratória.
A contenção física pode ser associada à contenção farmacológica (quando apenas esta não for suficiente) e deve ser realizada por equipe clínica treinada, composta por cinco pessoas (uma para cada membro e uma para a cabeça do paciente). Apenas um profissional deve conversar com o paciente e lhe explicar sobre o procedimento em curso, procurando acalmá‐lo. Além da imobilização dos membros com faixas resistentes, pode ser necessário também o uso de faixa abdominal e/ou torácica. Deve‐se ter atenção para não comprimir feixe vascular ou nervoso. 
É crucial zelar pela segurança do paciente, assegurando‐lhe um posicionamento confortável, retirando‐lhe objetos de risco e monitorando seu nível de consciência e seus sinais vitais. Assim que houver melhora da agitação, deve‐se retirar a contenção mecânica. 
síndrome neuroléptica maligna
É caracterizada por rigidez muscular (podendo ocorrer rabdomiólise), hipertermia, disautonomia e hipermetabolismo (aumento de pressão arterial, frequência cardíaca e frequência respiratória) e alteraçãodo nível de consciência. Trata‐se de uma condição rara (0,02 a 0,2% dos pacientes tratados com antipsicóticos), mas potencialmente letal (entre 3 e 20%). Sua gênese está relacionada com a depleção aguda de dopamina e o bloqueio de receptores dopaminérgicos D2. 
Em geral, ocorre nas duas primeiras semanas de início, troca ou aumento de dose do agente antidopaminérgico. Pode ocorrer também na retirada de agentes dopaminérgicos.
O tratamento deve ser a descontinuação do fármaco, hidratação vigorosa EV e alcalinização da urina, para evitar lesão renal pela CPK, além de medidas de suporte, como correção de distúrbios hidreletrolíticos e suporte para funções respiratória, cardíaca e renal. Para controle de temperatura, podem ser utilizados banhos frios, cobertores frios ou lavagem gástrica com água gelada.
Podem ser utilizados agentes dopaminérgicos, como a bromocriptina (2,5 mg, VO, 2 a 3 vezes/dia, ajustando‐se a dose até 45 mg/dia) e a amantadina, além de relaxantes musculares, como dantroleno EV (dose de ataque 1 a 2,5 mg/kg e depois 1 mg/kg a cada 6 horas). Outra opção terapêutica, principalmente para casos refratários, é a eletroconvulsoterapia. Na presença de agitação psicomotora nesse quadro, recomenda‐se o uso de benzodiazepínicos, não utilizando antipsicóticos.
síndrome serotoninérgica
É caracterizada por tremor, rigidez muscular, mioclonias, clonias, hiperreflexia, alteração do nível de consciência, hipertermia, instabilidade autonômica, diarreia e vômitos. É mais comum entre idosos e hepatopatas e apresenta uma mortalidade estimada entre 2 e 12%. 
Sua gênese envolve o aumento da atividade serotoninérgica no sistema nervoso central e periférico e, portanto, relaciona‐se ao uso combinado de agentes serotoninérgicos ou intoxicação causada por eles. 
O tratamento envolve descontinuação do fármaco serotoninérgico, hidratação EV rigorosa, correção de distúrbios hidreletrolíticos e suporte clínico. Pode‐se usar antagonistas serotoninérgicos, como a ciproeptadina (dose de ataque de 12 mg e 2 mg a cada 2 horas, até o máximo de 32 mg/dia) ou a clorpromazina (50 a 100 mg, IM ou EV lento, a cada 6 horas, dose máxima de 400 mg/dia). Há melhora em até 24 horas após o início do tratamento.
catatonia
A catatonia é um complexo fenômeno motor e comportamental, caracterizado por imobilidade/estupor, catalepsia (indução passiva de postura mantida contra a gravidade), flexibilidade cérea (resistência leve ao posicionamento do examinador), negativismo (oposição ou respostas ausentes às instruções ou aos estímulos externos), mutismo (ausência de resposta verbal), desenvolvimento ativo de posturas bizarras e caretas, maneirismo (ação de maneira caricatural e esquisita), estereotipias (movimentos repetitivos e sem metas), ecolalia (imitação de fala) e ecopraxia (imitação de gestos).
Há o risco de evoluir com rompantes de agitação despropositada. A catatonia maligna é uma forma grave de catatonia, caracterizada por agitação, hipertermia, disautonomia, rigidez e delirium, com mortalidade em torno de 9%.
É fundamental a investigação de organicidade, como quadros neurológicos e metabólicos. Algumas medicações também estão associadas. 
Apenas após a exclusão de causas orgânicas, pode‐se considerar etiologia psiquiátrica para a catatonia. Entre os transtornos psiquiátricos, ocorre mais frequentemente em quadros afetivos (depressão e mania), mas pode ocorrer em vários outros, como esquizofrenia, psicose induzida por substâncias e autismo. 
Quando confirmada a etiologia psiquiátrica, o tratamento pode ser feito com lorazepam 8 a 24 mg/dia. Caso seja um caso grave ou não responda ao lorazepam, é indicada eletroconvulsoterapia.
síndrome de abstinência alcoólica
A síndrome de abstinência alcoólica (SAA) é caracterizada por hiperativação autonômica (taquicardia, taquipneia, elevação de pressão arterial, sudorese), psíquica (ansiedade, irritabilidade, inquietação, insônia), tremores, náuseas e vômitos. Os sintomas geralmente se iniciam 6 a 12 horas após a cessação ou diminuição do uso de álcool em usuários crônicos de grandes quantidades, com pico em 48 a 72 horas, e desaparecem em 5 a 14 dias. 
Em casos mais graves, podem ocorrer complicações, como convulsões (comumente entre 12 e 24 horas, em 15 a 33% dos casos) e delirium tremens. É caracterizada por início abrupto de rebaixamento do nível de consciência, desorientação temporoespacial, confusão, ilusões e alucinações, principalmente visuais. A mortalidade é de 1 a 15% e decorre de complicações como convulsões, hipertermia e arritmias. 
É crucial investigar fatores clínicos associados/desencadeantes de abstinência, como trauma craniencefálico, acidente vascular cerebral, infecções (meningite, pneumonia), pancreatite aguda e hepatite alcoólica. 
O tratamento de escolha deve ser realizado com suporte clínico, com hidratação e correção de distúrbios hidreletrolíticos. Benzodiazepínicos promovem alívio de sintomas e previnem complicações. O alvo é deixar o paciente calmo, mas evita‐se rebaixamento do nível de consciência. Há preferências pelo diazepam (10 mg, VO, a cada 2 ou 4 horas, sendo titulada a dose conforme a presença dos sintomas) ou lorazepam.
Recomenda‐se também o uso de tiamina (300 a 600 mg/dia, VO, ou 100 a 200 mg/dia, IM ou EV) para prevenção de síndrome de Wernicke.

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