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Rebeka Freitas - É importante considerar o ritmo intestinal prévio em um indivíduo que se apresenta com diarreia, pois as pessoas têm ritmos diferentes ⇾ o ritmo normal de uma pessoa pode ser de 2x ao dia, enquanto de outra pode ser 4x ao dia.pl - Diarreia = mudança no ritmo intestinal ⇾ aumento do número habitual de evacuações; diminuição da consistência das fezes; aumento da massa fecal (>200g/dia) ⇾ a estimativa da massa é de difícil avaliação. - A síndrome diarreica pode ou não vir acompanhada de outros sintomas, como: >> Febre (sugere processo inflamatório); >> Tenesmo (sensação de que a evacuação vai acontecer, mas não acontece) /urgência fecal (sugerem comprometimento de ânus ou esfíncter anal); >> Inapetência/anorexia (quadro crônico ⇾ neoplasia?); >> Dor abdominal; >> Flatulência; >> Náuseas/vômitos; >> Perda de peso (doença neoplásica, quadro disabsortivo). - O conteúdo fecal líquido origina-se de: ingesta oral (1-2L); secreções provenientes do estômago, intestino delgado, saliva, pâncreas, e bile (8 L) - O intestino delgado recebe, portanto, 9-10L; absorve 6 L no jejuno e 2,5 L no íleo ⇾ diarreia com origem no intestino delgado se reflete numa perda de liquido muito grande, e com menos frequência (4-6 dejeções). - O cólon recebe cerca de 2L, e cerca de 100-200 mL saem na evacuação ⇾ diarreia com origem no intestino grosso se reflete numa perda de liquido menor, e com mais frequência (9-10 evacuações). - A diarreia é um processo complexo que raramente envolve apenas um mecanismo fisiopatológico, por exemplo: >> A cólera gera um grande estímulo à secreção (grande volume de fezes), altera a motilidade; a bactéria secreta toxinas que alteram a permeabilidade da membrana (o paciente precisa de muita água para hidratação). >> Doenças inflamatórias intestinais causam lesão da mucosa intestinal, produção de secretagogos pelo sistema imunológico - Escala de Bristol: aspectos das fezes: - Classificação da diarreia quanto à fisiopatologia: osmótica; secretória; inflamatória; motora; disabsortiva - Classificação da diarreia quanto à cronologia: 1) Aguda: até duas semanas; 2) Persistente: duas a quatro semanas; 3) Crônica: acima de quatro semanas. - Classificação da diarreia quanto ao local de origem: alta (intestino delgado) x baixa (intestino grosso). - Diarreia alta: dor em região periumbilical (região anatômica do intestino delgado está no centro do abdome); diarreia baixa: dor em todo abdome (difusa) ou em fossa ilíaca esquerda. - Classificação da diarreia quanto à etiologia: infecciosa x não- infecciosa. CLASSIFICAÇÃO: FISIOPATOLOGIA ➳DIARREIA OSMÓTICA - Presença de substâncias osmoticamente ativas na luz que são pouco absorvidas ⇾ retenção de água na luz intestinal por osmose para manter a osmolaridade intraluminal. S ndrome Diarreica Rebeka Freitas - Consiste numa diarreia aquosa e volumosa (intestino delgado). - Melhora com jejum e piora com a ingestão de alguns alimentos. - Pode haver distensão abdominal, hipertimpanismo, hiperemia na região anal. - Exemplos de causas: uso de álcool, medicamentos (sorbitol, manitol), intolerância a lactose e frutose. ➳ DIARREIA SECRETÓRIA - Causa mais comum: infecções produtoras de enterotoxinas ⇾ ex: infecção por E. coli enterotoxigênica - Pode ser causada também por produção excessiva de hormônios e secretagogos ⇾ ex: gastrina (gastrinoma), síndrome carcinoide (serotonina, prostaglandinas, calcitonina), VIPomas, outros - Diarreia alta, não disentérica (não há sangue), geralmente indolor, pode haver febre, desidratação, taquicardia, hipotensão. - A diarreia persiste com o jejum, aquosa e com grande volume. - É uma diarreia aguda e na história clínica o paciente geralmente relata algum alimento suspeito. - Normalmente, a diarreia secretória é autolimitada, não sendo necessário o uso de antibioticoterapia (o organismo dá conta); a medicação só é administrada quando a diarreia persiste por mais de 2-5 dias e quando o paciente apresenta hipoxemia, febre e outros. ➳ DIARREIA INFLAMATÓRIA OU EXUDATIVA - Secundária a processos inflamatórios, com consequente lesão de mucosa e aumento da permeabilidade intestinal. - Pode haver mais de um mecanismo fisiopatológico; pode ser infecciosa ou não; geralmente acomete o cólon. - Pode haver presença ou não de disenteria (sangue e muco nas fezes) - Ex: Doença inflamatória intestinal (doença de Crohn. e retocolite), neoplasias, shiguelose, colite pseudomembranosa (toxinas produzidas pelo Clostridium). ➳ DIARREIA MOTORA - Mudanças na motilidade intestinal (não há lesão) que podem influenciar na absorção de fluidos, principalmente no cólon. - A diarreia motora pode ocorrer por hipomotilidade ⇾ estase e supercrescimento bacteriano com consequente má absorção da bile e aumento da secreção intestinal. - Possíveis causas de hipomotilidade: hipotireoidismo, diabetes (neuropatia autonômica que leva ao supercrescimento bacteriano), outros. - A diarreia motora também pode ocorrer por hipermotilidade ⇾ o bolo fecal não transita pelo cólon pelo tempo adequado = prejuízo à absorção. - Possíveis causas de hipermotilidade: doenças funcionais (SII), hipertireoidismo, DM, medicamentos. ➳ DIARREIA DISABSORTIVA - Deficiências digestivas e lesões parietais que impedem a correta digestão ou absorção. - Principal sintoma: esteatorreia (as fezes ficam boiando no vaso por conta do peso). - Outros: restos alimentares nas fezes, distensão abdominal, grande volume fecal, perda ponderal. - Possíveis causas: insuficiência exócrina do pâncreas, supercrescimento bacteriano, doença celíaca, intolerância à lactose, doença de Whipple. CLASSIFICAÇÃO: CRONOLOGIA ➳ DIARREIA AGUDA - Duração de até 14 dias. - Manifestações associadas: náuseas, vômitos, febre, hipoatividade, outros contactantes com quadro similar, sintomas de VAS. - Principais etiologias: vírus (Rotavírus, Norovírus, Adenovírus); bactérias (E. coli, Salmonella, Shigella, C. jejunii, V. cholerae); helmintos (Estrongiloides, Ancilóstomo, Necator etc); protozoários (Giárdia, ameba etc); libação alcoólica... ➳ DIARREIA PERSISTENTE - Diarreia com duração superior a 14 e inferior a 30 dias. - “Área nebulosa”: diarreia aguda prolongada? Início de uma diarreia crônica? ➳ DIARREIA CRÔNICA - Duração > 30 dias. Rebeka Freitas - Pode haver sinais e sintomas específicos das etiologias subjacentes. - Principais causas: infecciosas (principalmente protozoários e helmintos) e não-infecciosas (DII, neoplasias, intolerância à lactose, colites microscópicas, SII, medicamentos, doença celíaca, síndromes disabsortivas). CLASSIFICÇÃO: LOCAL DE ORIGEM ➳ DIARREIA ALTA - Grande volume por evacuação; poucas evacuações (< 6/dia); ausência de muco, pus ou sangue nas fezes; dor em mesogástrio; ausência de tenesmo; presença de restos alimentares. ➳ DIARREIA BAIXA - Pequeno volume por evacuação; muitas evacuações (>10/dia); pode cursar com muco, pus ou sangue nas fezes; dor em hipogástrio/fossa ilíaca; com tenesmo; ausência de restos alimentares AVALIAÇÃO CÍNICA - Deve-se avaliar a duração do episódio, assim como o possível agente etiológico. - É preciso saber se a diarreia é inflamatória ou não inflamatória; se a diarreia é funcional (motora) ou orgânica (comprometimento do estado geral). - Deve-se avaliar a gravidade do quadro: paciente hipoxemiado ou não, desidratado ou não, etc. - Diarreia no paciente com AIDS e em uso de imunossupressores: acontece por conta de agentes oportunistas que aproveitam a baixa imunidade. -História clínica: >> Início dos sintomas, ingestão de alimentos suspeitos, uso de medicamentos; >> Número de dejeções, aspecto das fezes, volume, presença de muco ou sangue; >> Sintomas associados: febre, dor abdominal, náuseas e vômitos; >> Sinais de desidratação; >> Perda de peso, desnutrição, sangramentos, anemia; >> Alternânciade ritmo intestinal; >> Fatores de risco para HIV; >> Investigar possível quadro de etilismo - A apresentação clínica da diarreia costuma ser bastante semelhante, independente do agente causador. - Inflamatória x não inflamatória ⇾ pesquisa de leucócitos nas fezes - Diarreia inflamatória: causada por bactérias invasivas ou produtoras de citotoxinas, parasitas ⇾ íleo e cólon. - A diarreia inflamatória apresenta um quadro mais grave ⇾ ruptura de mucosa, com perda de líquido, hemácias e leucócitos. - Exame físico: grau de desidratação (risco de choque hipovolêmico); níveis pressóricos; temperatura; nível de consciência; estado nutricional; palidez; icterícia; presença de linfonodos ou massas abdominais; toque retal (diarreias inflamatórias, neoplasias, avaliar fístulas). - Indicações para realizar exame quando o paciente tem diarreia: diarreia inflamatória sanguinolenta; severa depleção de volume; duração maior que 3 dias; hospedeiro imunocomprometido; dor abdominal importante e persistente; sinais de irritação peritoneal (perfuração); surto na comunidade; sinais de doença sistêmica. - Quando a decisão de investigação da diarreia é tomada, realiza-se: >> Descrição macroscópica das fezes ⇾ ex: fezes aquosas, sem muco e sangue, sem febre, sugerem diarreia secretória (intoxicações alimentares); >> Pesquisa de leucócitos nas fezes: diarreia inflamatória (doença infecciosa, autoimune); >> Pesquisa de sangue oculto nas fezes ⇾ por exemplo, quando há anemia hipocrômica microcítica (ferropriva) inexplicável, realiza-se esse exame, na suspeita de haver sangue oculto nas fezes; >> Parasitológico de fezes; >> Coprocultura; >> Hemograma, VHS/PCR (marcadores inespecíficos de inflamação): avaliar grau de anemia, leucocitose, afastar doença inflamatória; >> Glicemia: afastar diabetes; Rebeka Freitas >> Pesquisa de Clostridium difficile: colite pseudomembranosa, relacionado ao uso de antibióticos; >> Retossigmoidoscopia (não precisa de laxativo) e colonoscopia: solicitado em doenças inflamatórias e neoplásicas; >> Entero-ressonância e entero-tomografia: avaliam intestino delgado nas doenças inflamatórias; >> Capsula endoscópica: avalia intestino delgado; não pode ser feita em pacientes com suspeita de estenose intestinal, pois a cápsula pode parar, o que exigiria uma cirurgia para sua retirada. - Diagnóstico diferencial de diarreia: incontinência fecal (perda do esfíncter); diarreia fictícia (ingestão de laxantes); síndrome de Munchausen; bulimia. ETIOLOGIAS DA DIARREIA ➳ DOENÇA INFLAMATÓRIA - Importante causa de diarreia crônica; - Retocolite ulcerativa (RCU): acometimento contínuo do cólon com inflamação apenas da mucosa ⇾ úlceras mais superficiais. - Doença de Crohn (DC): acometimento salteado (“pedras de calçamento)”, inflamação transmural, acometimento perianal, não é restrito ao cólon (da boca ao ânus, qualquer parte do TGI). - Manifestações extra-intestinais: artrite, eritema nodoso, pioderma gangrenoso, uveíte, colangite esclerosante primária... - Diagnóstico: colonoscopia com biópsias seriadas. - Outros exames: provas inflamatórias (VHS/PCR), calprotectina fecal. - Tratamento: depende da forma de acometimento da doença, localização, gravidade - Opções disponíveis de tratamento: mesalazina, corticoide, azatioprina, imunobiológicos. ➳ COLITES MICROSCÓPICAS - Causa de diarreia crônica aquosa, não-sanguinolenta com cólon de aspecto normal à colonoscopia. - Fatores de risco: AINEs, IBPs, estatinas, inibidores seletivos da recaptação de serotonina, tabagismo... - Diagnóstico: colonoscopia com biópsias seriadas. - Colite linfocítica: ≥ 20 linfócitos intraepiteliais/campo de grande aumento. - Colite colagenosa: presença de banda subepitelial de colágeno com mais de 10 micrômetros de diâmetro. - Tratamento: budesonida. ⇾ corticoide com ação específica no intestino delgado ➳ SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL - Desordem gastrointestinal caracterizada por dor abdominal recorrente e alteração do hábito intestinal (diarreia ou constipação) geralmente associados à distensão. - Fisiopatologia: alterações do eixo cérebro-intestino, gatilhos ambientais. - Diagnóstico (Critérios de Roma IV): >> Dor abdominal recorrente (pelo menos 1x/semana), nos últimos 3 meses com início dos sintomas há pelo menos 6 meses + 2 dos seguintes critérios: a dor tem relação com a evacuação, mudança na frequência das evacuações, mudança na aparências das fezes. >> Ausência de sinais de alarme e de história familiar de câncer colorretal. - Tratamento: MEV, suporte emocional, medicamentos. ➳ DOENÇA CELÍACA - Enteropatia sensível ao glúten: doença imunomediada do intestino delgado causada pela sensibilidade ao glúten em indivíduos geneticamente predispostos. - Quadro clínico: diarreia volumosa, com fezes fétidas e flutuantes, esteatorreia, flatulência. - Manifestações extra-intestinais: dermatite herpetiforme, deficiência de vitamina D, anemia ferropriva, neuropatia periférica. Rebeka Freitas - Diagnóstico: EDA com biópsia de 2ª porção duodenal (o duodeno fica careca, sem as vilosidades) + Testes sorológicos (Anti-transglutaminase tecidual IgA + IgA sérico) - Tratamento: dieta isenta de glúten. ➳ COLITE PSEUDOMEMBRANOSA - Importante causa de diarreia em pacientes internados. - Associa-se também ao uso indiscriminado de antibióticos: fluoroquinolonas, clindamicina, cefalosporinas (qualquer um pode causar). - Alteração da microbiota intestinal ⇾ proliferação do Clostridioides difficile. - Outros fatores de risco: uso de IBP, idade avançada, outra doença intestinal de base. - Quadro clínico: diarreia aquosa, dor abdominal, febre, leucocitose. - Pode evoluir para megacólon tóxico. - Diagnóstico: pesquisa de toxinas A e B nas fezes (teste mais disponível); colonoscopia para busca de pseudomembranas se alta suspeição e exames laboratoriais negativos ⇾ sempre avaliar se paciente tem condições de se submeter ao exame. - Tratamento: suspender o antibiótico causador; vancomicina oral, fidaxomicina, metronidazol.
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