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IESC V - DESPRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTO NA ATENÇÃO BÁSICA

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DATA DA AULA: 17.02.21
IESC – DESPRESCRIÇÃO DE MEDICAMENTO NA ATENÇÃO BÁSICA
· POLIMEDICAÇÃO
A polimedicação é definida como o emprego de cinco ou mais fármacos de uso crônico por um paciente determinado; no aspecto qualitativo, analisa-se uso de ao menos um medicamento considerado inadequado.
Os perfis associados a ambos os tipos de polimedicação estão condicionados, em geral, pela expectativa de vida reduzida, pela baixa adesão terapêutica e pela alta possibilidade de interações farmacológicas e de efeitos adversos. Nesse sentido, as condições de vida e as expectativas dos próprios pacientes têm papel fundamental.
Em relação a esse fenômeno, o caso do Brasil não é alheio a essa tendência mundial, provavelmente favorecida por dois elementos essenciais: o primeiro tem a ver com o envelhecimento da população; e o segundo, com o aumento na incidência de doenças crônicas. As mudanças demográficas no Brasil foram aceleradas nas últimas duas décadas, com decréscimo progressivo na taxa de natalidade e taxas de mortalidade estáveis, que condicionam o aumento na proporção de indivíduos adultos de ambos os sexos. 
As consequências da polimedicação são numerosas: por um lado, diminui a adesão terapêutica, aumenta a incidência de efeitos adversos e a possibilidade de interações medicamentosas, com repercussão direta sobre o estado de saúde das pessoas; por outro, aumenta o risco de hospitalização, diminui a qualidade de vida e supõe maior morbimortalidade. Além disso, tem implicações médico-legais, éticas e econômicas que devem ser levadas em conta. 
Nos últimos anos, foram desenvolvidas numerosas estratégias para enfrentar esse problema. Tais estratégias, em nossa prática clínica diária, podem ser reunidas em quatro grupos: 
1) medidas que incidem na educação e na formação dos profissionais; 
2) sistemas informatizados orientados a ajudar na tomada de decisão; 
3) intervenções baseadas na revisão farmacoterapêutica; e 
4) intervenções multidisciplinares ou multifacetadas. 
Uma recente revisão sistemática da Cochrane, que incluiu uma intervenção com software de ajuda para a revisão de medicamentos e intervenções multidisciplinares, concluiu que, embora tais programas pareçam ser úteis para a diminuição da prescrição inadequada, os resultados clinicamente relevantes são incertos, pois existem dados controversos em relação ao número de hospitalizações e problemas relacionados com a medicação. Esses resultados são similares aos de outra metanálise, mais extensa, recentemente publicada. Apesar da heterogeneidade de tais resultados, existem evidências suficientes para afirmar que, em linhas gerais, essas medidas afetam de forma direta a melhora da adequação terapêutica e, em alguns casos, melhoram variáveis clínicas, como o número de hospitalizações. Nesse sentido, convém salientar que são programas de marcado caráter hospitalocentrista, quantitativo e que se distanciam do que de fato ocorre em nossas consultas, em que o componente qualitativo, o contexto social e a comunidade adquirem o papel de protagonista. A desprescrição surge precisamente nesse espaço.
· DESPRESCREVER
O primeiro é a adequação terapêutica, que pode ser definida como parte da terapia do paciente, na qual, mediante a indicação, a prescrição, a dispensação, a administração e o seguimento, o profissional pode obter alguns resultados apropriados às condições e circunstâncias do próprio paciente e do conjunto da comunidade. O segundo refere-se à revisão da medicação, entendida como a sua avaliação estruturada, com objetivo de otimizar o uso de medicamentos e melhorar os resultados em saúde, o que implica detectar problemas relacionados com os fármacos e recomendar intervenções. Ambos os termos descrevem um processo que parte do conhecimento fiel do estado e da situação do paciente, passando por um diagnóstico correto de seus principais problemas de saúde até a indicação ou não de determinado tratamento. Por isso, é muito importante que se tenha em mente que, quando se fala de desprescrição, se descreve um processo singular e contínuo (prescrição-desprescrição) que necessariamente deve ser adaptado a cada pessoa e circunstância. O resultado final do processo será uma intervenção fundamentada que, levando em conta a situação vital e clínica do paciente, considere a indicação, a seleção, a dose, a substituição ou a eliminação de alguns fármacos, a adição de outros ou a seleção de medidas não farmacológicas.
Desprescrever não é só retirar medicamentos que não são considerados adequados. Para a desprescrição, é preciso fazer uma análise mais ou menos pormenorizada e padronizada, que, respeitando como eixo central a idiossincrasia do paciente, tem como finalidade “[…] mostrar e resolver os paradoxos que estão por trás do regime terapêutico […]”, de forma que reflita o mais fiel possível a pessoa, considerada de maneira global ou holística.
MODELOS TEÓRICOS DE DESPRESCRIÇÃO
A preocupação fundamental em torno do processo de desprescrição é a de decidir qual fármaco deve ser retirado. Essa identificação dos medicamentos potencialmente inadequados (MPIs), por meio de listagens (sistemas explícitos, com base em critérios), algoritmos e questionários (sistemas implícitos, com base em juízos clínicos), definirá a evolução dos modelos de desprescrição durante esta primeira década.
Deve-se considerar a situação basal do paciente e sua expectativa de vida, dando especial atenção às situações de final da vida. É importante incluir o paciente na tomada de decisão de forma ativa, simétrica e transversal ao longo de todo o processo. Deve-se também obter o histórico da relação que o paciente estabeleceu com a sua medicação. Os temores do paciente diante da retirada da medicação deverão ser compensados com um plano em acordo com as ações preventivas (retirada progressiva, mudanças adaptadas ao ritmo e às necessidades do paciente, priorização de fármacos que serão desprescritos). Deve-se garantir, também, o seguimento e a reavaliação frequente para detectar efeitos adversos e a adesão ao plano de desprescrição.
Passada esta primeira década, Woodward10 será o primeiro a decifrar todos esses conflitos e dilemas da desprescrição e responder com o primeiro modelo de desprescrição por fases:
1) Elaborar uma lista de medicamentos; 
2) Identificar o fármaco a ser desprescrito; 
3) Planejar a desprescrição; e 
4) Revisá-la. 
Woodward inclui, no terceiro passo, as preferências do paciente, por meio de um planejamento conjunto profissional-paciente, e a necessidade do consentimento informado. A partir de então, abundaram as publicações de autores que propõem diferentes aproximações teóricas à desprescrição, com alcance e repercussão ímpares. A maioria transita entre métodos mais deliberativos, sem recomendações específicas, a protocolos minuciosos, como o de Scott e colaboradores: um modelo de 10 passos, preciso e metódico ao extremo na seleção da medicação considerada inapropriada.
FASES DA DESPRESCRIÇÃO
Na prática, na maioria das vezes, a desprescrição de medicamentos em atenção primária é feita de maneira flexível, intuitiva e implícita. As etapas aqui descritas não são estanques nem sequenciais, mas sim um processo contínuo em que prescrição e desprescrição estão juntas.
Diante disso, não se pode perder de vista que a desprescrição é precedida de uma prescrição, sendo que prevalece a prudência sobre qualquer outro princípio; além disso, deve-se certificar que o paciente tenha sido informado adequadamente sobre os objetivos a serem alcançados, as revisões a serem feitas para analisar seus efeitos, a duração prevista do tratamento, bem como e quando retirar a medicação.
· Passo 1: Obtenção da história completa dos medicamentos. Devemos obter uma lista completa de todos os medicamentos que o paciente usa. É necessário associar cada medicamento com sua dose, frequência, formulação, via de administração, duração de uso e indicação clínica. Devem ser analisados os problemas de saúde ativos e inativos e sua correspondência com os medicamentos prescritos.Deve-se ter conhecimento acerca de reações alérgicas prévias, efeitos adversos e, se possível, fármacos consumidos antes e seus efeitos. Também é importante detectar possíveis problemas cognitivos ou sensoriais que possam dificultar a adesão terapêutica, assim como fazer uma avaliação clínica dos órgãos vitais (funções hepática, renal, cardíaca), cujo funcionamento pode interferir na resposta terapêutica.
Desde esse primeiro momento, devemos nos comprometer com o respeito à visão do paciente: temos de informar a(o) paciente/cuidador(a) sobre o motivo para fazer a desprescrição, sobre os objetivos que buscamos e os previsíveis efeitos adversos que podemos esperar. A revisão de fármacos deve incluir também a indagação sobre o valor que o paciente outorga a cada um deles, assim como os aspectos culturais e contextuais. Com todas essas informações, teremos uma imagem global do paciente e sua biografia, tanto pessoal como clínica, em relação aos fármacos.
● Passo 2: Identificação dos medicamentos potencialmente inadequados. Com o balanço dos riscos/benefícios, identificamos medicamentos de alto risco: anticolinérgicos, fármacos de estreita margem terapêutica, psicotrópicos, fármacos sem indicação ou usados fora da ficha técnica (off-label), etc. Na determinação dos riscos/benefícios de um fármaco em um paciente real, devemos considerar: suas necessidades, seus benefícios, seus efeitos adversos presentes ou futuros, suas interações com outros fármacos ou patologias, sua adesão terapêutica, a carga de medicação, as preferências do paciente, os objetivos da atenção e a sua expectativa de vida. 
Existem ferramentas para a identificação de medicamentos inadequados. As mais usadas são os critérios de Beers e colaboradores (atualizados em 2012) e os STOPP (atualizados em 2014), dentro das ferramentas explícitas; e o algoritmo de Garfinkel e Mangin e o de Potter e colaboradores dentro das implícitas. 
● Passo 3: Determinação dos fármacos a serem desprescritos e as prioridades. A priori, nunca poderemos ter certeza absoluta de que a retirada será benéfica e segura, ainda mais quando são escassas as evidências sobre a desprescrição. Portanto, devemos apoiar-nos no julgamento que contrabalança as evidências, os riscos e as preferências do paciente.
Determinadas questões podem facilitar a identificação de fármacos suscetíveis de serem retirados (Quadro 109.4). O mais urgente é rever a continuidade de medicamentos que estejam produzindo efeitos adversos ou que possam causar danos. Ou seja, reconsiderar os indicados para uma doença já superada, os envolvidos em cascatas terapêuticas e os que o paciente resiste em tomar. Se identificarmos mais de um fármaco para ser desprescrito, é recomendável priorizar. É conveniente que a retirada seja sequencial: não mais do que um fármaco em cada tentativa, com o intuito de relacionar claramente a eventual recorrência de sintomas ou síndromes de retirada.
Alguns autores propõem um esquema simples para ordenar os fármacos de um paciente em função de sua utilidade, o que facilita a ordem para fazer a desprescrição (Quadro 109.5). É prudente conversar sobre tais prioridades com o paciente. Neste ponto, é importante estimar a expectativa de vida do paciente, assim como o tempo que os fármacos demoram para obter benefícios clínicos, desenvolver efeitos adversos ou extinguir seu efeito residual após a sua retirada. Isso resulta em um exercício complexo, com muitas implicações éticas e grande dificuldade do ponto de vista clínico, pois é impossível predizer o futuro, ainda mais entre grupos tão heterogêneos de pacientes (idosos frágeis, doentes terminais, pessoas que sofreram reações adversas a medicamentos, etc.). Contudo, é um passo fundamental para que exista congruência entre as metas da assistência sanitária e os objetivos dos fármacos. Significa julgar se o medicamento se posiciona como uma “peça lógica” dentro da situação específica do paciente.
 
 
 
● Passo 4: Planejamento e início. Muitos fármacos podem ser retirados de forma abrupta, mas outros não (p. ex., psicotrópicos e betabloqueadores). Existem três razões para reduzir as doses de um fármaco antes de retirá-lo definitivamente: prevenir síndromes de retirada, detectar precocemente a recorrência de sintomas e para comodidade do paciente. A retidada gradual e supervisionada ajuda também a reduzir os medos do paciente, para que se sinta cuidado e observado (no caso de não poder desprescrever um fármaco, ajudará na definição da dose mínima eficaz). No entanto, na maioria das vezes, desconhecemos o melhor modo de fazer a desprescrição para cada medicação em relação ao tempo e à pauta de retirada.
O paciente deve estar em situação estável do ponto de vista clínico no momento da desprescrição, para otimizar a identificação de recorrências e síndromes de retirada. É necessário especificar se foi feita tentativa para desprescrever uma determinada medicação antes, se falhou e por quê. As falhas com psicofármacos, por exemplo, são frequentes e não devem excluir futuras tentativas.
● Passo 5: Seguimento, apoio e documentação. O objetivo do seguimento é múltiplo. Em primeiro lugar, monitorar o surgimento de efeitos adversos (síndromes de retirada, recorrência da patologia), tornar explícito o caráter de cuidado ativo da desprescrição e, por último, valorizar a aceitação das recomendações e retroalimentar a adesão ao plano de desprescrição, pois a eficácia da retirada estruturada costuma decair com o tempo. Para obter a confiança da pessoa na desprescrição, é fundamental que o ritmo das mudanças se adapte a suas possibilidades e necessidades.
É essencial um seguimento próximo (sobretudo no início, quando costumam aparecer os problemas), manter uma atitude tipo “portas abertas”, envolver ativamente o paciente ou seu cuidador nas decisões e ressaltar suas conquistas. Diante de um possível fracasso que implique reiniciar a medicação, a atitude apropriada será assumir o erro da retirada e não insistir se não existem circunstâncias adequadas. As revisões (frequência, intensidade, duração, etc.) dependem da medicação e do paciente: elas devem ser individualizadas; podem ser feitas por telefone ou presencialmente, de acordo com as preferências do paciente. A ideia desse apoio é que o paciente se sinta cuidado. É importante potenciar as propostas alternativas não farmacológicas cientificamente válidas e aceitáveis.
Todo o processo de desprescrição deve ficar documentado na história clínica do paciente: fármaco, pauta de retirada, eventual falha e as razões dela ter ocorrido.
PROGNÓSTICO E POSSÍVEIS COMPLICAÇÕES
Como toda intervenção médica, a desprescrição não está isenta de riscos, os quais devem ser pesados para que se possa decidir de forma prudente. Sempre é necessário levar em conta as possíveis complicações que poderiam surgir devido à desprescrição.
SÍNDROME DE RETIRADA: Frequente em fármacos que agem sobre o sistema nervoso central (SNC), são comuns as complicações oriundas da retirada de antidepressivos inibidores seletivos de recaptação da serotonina (ISRS), que ocorrem aproximadamente uma semana depois de tirar o fármaco, sendo leves e se resolvendo em 10 dias, ou com a retirada de benzodiazepinas, que se associam com uma síndrome de abstinência muito mais grave, com confusão, alucinações e convulsões. A interrupção abrupta da levodopa pode precipitar uma reação grave com características de síndrome neuroléptica maligna (SNM), que inclui rigidez muscular severa, disfunção autonômica e deterioração do nível de consciência. Nos pacientes que fizeram uso de corticoides sistêmicos de forma contínua, a interrupção repentina pode conduzir a uma crise addisoniana secundária à supressão do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal.
EFEITO REBOTE: Seria a reaparição, após a suspensão brusca do fármaco, dos sintomas em intensidade maior à apresentada previamente pelo paciente. Dessa forma, o término de um tratamento com betabloqueadores pode associar-se com o surgimento de taquicardia e hipertensão, que pode, por sua vez, agravar-secom um quadro de insuficiência cardíaca ou cardiopatia isquêmica. A interrupção de inibidores da bomba de próton (IBP) pode produzir una hipersecreção ácida e o agravamento de sintomas gastrintestinais. A insônia de rebote é comum após a retirada de fármacos hipnóticos.
DESMASCARAMENTO DE INTERAÇÕES: As interações farmacocinéticas devem ser levadas em conta no momento de retirar um fármaco. Por exemplo, se há suspensão do omeprazol em um paciente com uma dose estável de varfarina, o índice de normalização internacional (INR) pode diminuir, pois o omeprazol é um fármaco que inibe o metabolismo da varfarina.
REAPARIÇÃO DE SINTOMAS: É importante não interpretar um efeito rebote como uma recorrência dos sintomas da doença original. Isso é importante sobretudo com condições como a depressão tratada com fármacos, cuja retirada provocaria sintomas que podem ser confundidos com um efeito rebote da doença. Surpreendentemente, os ensaios clínicos que avaliam processos de retirada de fármacos, em muitos casos, não mostram aumento da incidência de sintomas da doença original, ou que os fatores de risco reapareçam após a interrupção da medicação.
BARREIRAS E FACILITADORES
· Fatores que dependem do contexto cultural, social ou sanitário
O mercado farmacêutico, em constante expansão, põe à disposição dos médicos um amplo leque de medicamentos, cada dia com mais indicações, colaborando para que a polimedicação seja hoje um fenômeno social. Os pacientes acreditam que a indústria farmacêutica antepõe seus benefícios econômicos à segurança, que exerce pressão excessiva para promover seus medicamentos e influenciar os prescritores, bem como omite, em sua propaganda, informações que possam prejudicar seus interesses.
A conjuntura econômica de um país, as decisões políticas e de gestão, a disposição de recursos e os sistemas de incentivos supõem elementos importantes para possibilitar a incorporação à prática clínica do processo de desprescrição, mas, outras vezes, podem entorpecê-la.
A falta de tempo e a sobrecarga laboral é uma das barreiras mais importantes. A desprescrição é uma tarefa multidisciplinar que requer coordenação entre distintos profissionais, ainda mais se levarmos em conta que muitas alternativas não farmacológicas dependem do trabalho em equipe. Contudo, nos sistemas de saúde em geral, outros profissionais de saúde (assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, farmacêuticos, fisioterapeutas, psicólogos) se encontram subutilizadas.
O modelo de assistência à saúde tende à fragmentação por problemas, deixando de lado a concepção global da pessoa e seu contexto social e familiar. Isso às vezes ocasiona diferentes comunicações (e não uma única) junto ao paciente, que recebe mensagens contraditórias. Nesses casos, ele costuma fazer um balanço sobre qual profissional provê os cuidados de forma habitual e quem ele considera ter maior grau de conhecimento: o médico de família e comunidade – por seu conhecimento global do paciente –, ou o especialista hospitalar – ao ter um conhecimento adicional específico mais amplo. 
Por último, a medicalização e a tecnificação da sociedade, a ênfase excessiva no modelo biomédico e na solução farmacológica dos problemas de saúde e o fato de que os pacientes superestimam o efeito dos fármacos e subestimam seus danos fazem com que a desprescrição seja uma atividade pouco aceita na sociedade.
· Fatores que dependem dos profissionais
Estar sensibilizado quanto à prescrição adequada e aos perigos implicados na utilização de medicamentos desnecessários facilita a revisão da medicação. No entanto, às vezes, há uma discrepância entre essas crenças e a prática clínica real. Outra barreira importante à desprescrição é a resistência dos médicos para desprescrever um tratamento, mesmo sabendo que é desnecessário, inútil ou prejudicial, provocando, assim, a sua renovação indefinidamente. Esse comportamento é denominado “inércia sobreterapêutica” e é favorecido por distintos fatores. 
Adquirir experiência, com o tempo, no hábito de desprescrever faz com que o médico tenha autoconfiança, e observar que a desprescrição resolve e evita problemas retroalimenta e motiva a sua prática, e vice-versa.
Também agem como barreiras: baixa aceitabilidade das alternativas não farmacológicas, situações sociofamiliares e pessoais desfavoráveis e/ou diferenças em relação ao médico sobre o objetivo do tratamento.
· Fatores que dependem do relacionamento entre o profissional de saúde, o paciente e o cuidador
A desprescrição é um processo realizado por pessoas que interagem em um âmbito relacional definido. O relacionamento clínico incide de uma forma especial nas atitudes e comportamentos em torno da desprescrição. 
É mais fácil cessar uma medicação crônica quando o relacionamento entre o médico de família e o paciente foi desenvolvido durante anos e se baseia no respeito e na confiança mútua. A sensação do paciente de que o profissional se preocupa com ele e emprega tempo e esforços voltados para ele são facilitadores do processo de desprescrição. 
O envolvimento do paciente na tomada de decisão é fundamental no processo de desprescrição. As preferências do paciente abrangem um amplo leque de opções: em geral, as pessoas seguem confiando na decisão do profissional, mas não a qualquer custo, pois aceitam melhor as recomendações sobre desprescrição se consideram que o profissional os leva em conta ao tomarem decisões, se argumenta sobre cada recomendação ou se lhes informa adequadamente sobre a decisão de deixar um fármaco. No entanto, muitos pacientes delegam a responsabilidade na tomada de decisões ao profissional e aceitam passivamente seus conselhos. Por esse motivo, se o profissional não oferece a possibilidade de revisar a medicação e fazer as mudanças necessárias, o paciente e seus familiares em geral tampouco o fazem e aceitam implicitamente que devem seguir tomando a medicação. 
Por último, algumas circunstâncias podem fragilizar o relacionamento médico-paciente e são evitadas por ambos. Deixar de prescrever fármacos, ainda que sejam potencialmente não apropriados, às vezes pode ser desagradável, e alguns médicos tendem a evitá-lo, a fim de salvaguardar o relacionamento clínico. A postura extrema dessa concepção pode conduzir a uma prescrição complacente e o uso da prescrição para evitar conflitos médico-legais (medicina defensiva). Outras vezes, a negativa parte do próprio paciente, por preconceber que poderia ferir a sensibilidade do médico.
· Fatores que dependem do paciente
A atitude do paciente frente à desprescrição está determinada, em última instância, por sua percepção sobre o medicamento e o sistema sanitário, influenciada, por sua vez, por suas vivências prévias e influências externas. As emoções e as expectativas que despertam, às vezes contrapostas, podem ser, ao mesmo tempo, facilitadores da desprescrição de fármacos inadequados, mas também motivadores de falta de adesão de medicamentos adequados. É importante explorar as motivações e as percepções do paciente, já que grande parte do êxito da desprescrição de fármacos dependerá da adaptação às necessidades dos pacientes. 
O primeiro aspecto dessa barreira para a desprescrição é que o paciente considera que a medicação é ainda necessária ou benéfica, seja porque percebe suas vantagens (alívio sintomático, realização de objetivos mensuráveis, como níveis de PA), seja por ter a esperança de que no futuro lhe será útil. Não podemos nos esquecer de que a noção dos pacientes sobre se um medicamento é adequado não tem porque coincidir com a dos profissionais de saúde. Essa ideia tem relação com as prioridades em saúde que, no caso dos idosos polimedicados, costumam ser principalmente a sobrevivência, a preservação da funcionalidade física e o alívio dos sintomas.
O segundo aspecto importante é a visão do paciente sobre o processo de desprescrição. Em geral, os pacientes entendem que se trata de um processo complexo, que requer tempo e planejamento, que deve ser gradual, e têm a necessidade de que os profissionaisem saúde os apoiem e deem a atenção e a informação devidas. Se eles resistem, observa-se que o fazem de maneira mecânica e sem adaptar-se a suas necessidades e circunstâncias. A desprescrição terá mais chances de ser aceita se for combinado previamente com o paciente a realização de um teste antes da retirada definitiva, ou a adoção de uma solução intermediária em casos de efeito rebote ou resistências internas importantes (p. ex., reduzir a dose).
O terceiro aspecto destaca as influências tanto internas como externas: as vivências dos pacientes são fundamentais para modular sua atitude diante da desprescrição – as experiências negativas ao deixar de usar um medicamento supõem um obstáculo, ao passo que experimentar problemas práticos na hora de tomar um medicamento (dificuldades perceptivas, limitações na compreensão das instruções, problemas na manipulação ou esquecimento para tomá-lo) predispõe a revisão de sua continuidade. Em outras ocasiões, as influências vêm de fora: não é de se estranhar que os pacientes sintam-se pressionados por seus cuidadores ou pelos médicos para medicarem-se. 
A principal emoção que dificulta a desprescrição é o medo das consequências negativas advindas da interrupção de um medicamento. Entre pacientes com baixa expectativa de vida, é comum que exista uma certa resistência em retirar medicamentos preventivos e a começar a utilizar outros que socialmente se associam com morte (p. ex., morfina), já que o paciente pode interpretar essa tentativa de desprescrição como um abandono da atenção em saúde.
Muitos pacientes realizam “experiências” com fármacos por si mesmos mediante estratégias variadas, algumas das quais podem acarretar certos riscos: não tomar os medicamentos temporalmente e observar o que acontece, reduzir a dose ou modificar horários. Explorar os dilemas gerados pela tomada de medicação e a maneira como os resolvem é importante para prevenir tais riscos.
EVIDÊNCIAS EM DESPRESCRIÇÃO
Diferentes enfoques podem ser usados para investigar a desprescrição: o primeiro engloba aqueles estudos que avaliam se uma intervenção é eficaz (formação para profissionais de saúde, software de ajuda à prescrição ou estratégias padronizadas para a revisão de medicamentos). Habitualmente tais estudos se concentram em idosos e em polimedicados. O resultado dessas pesquisas é dependente do plano da intervenção, do tamanho da amostra e da potência estatística (validade interna). O segundo parte de um ou de vários grupos farmacológicos e avalia sua adequação (indicação, dose, interações, etc.) em determinada população. Um bom exemplo disso é a desprescrição de benzodiazepinas em pacientes que as usam de forma crônica. Nesses casos, mede-se a modificação no padrão de prescrição e, às vezes, os resultados em saúde derivados da intervenção. As vantagens desse tipo de estudo é que possibilitam o desenvolvimento de guias de desprescrição e a avaliação de resultados, como redução de riscos ou efeitos adversos. Sua principal limitação é que se refere só a um determinado grupo de fármacos em um subgrupo de população selecionada, o que, com frequência, ocasiona problemas de validade externa.
PAPEL DO MÉDICO DE FAMÍLIA E COMUNIDADE
Para realizar um processo de desprescrição, é necessário superar a visão farmacocentrista e biomédica do fenômeno da polimedicação, situando o foco da atenção na pessoa e seu contexto familiar, comunitário e social. Só dessa forma se conseguirá obter o máximo partido dos medicamentos, maximizando seus benefícios e minimizando seus potenciais riscos, empregando-os para fins que estejam em acordo com as necessidades do paciente e sua expectativa e qualidade de vida.
O médico de família, como coordenador dos tratamentos farmacológicos do paciente, pelo seu conhecimento integral do paciente, sua proximidade, acesso e pela possibilidade de administrar uma atenção continuada no tempo, que permitem monitorar os efeitos do uso de medicamentos e os derivados de sua descontinuação, ocupa um papel central para fazer uma desprescrição de medicamentos de forma segura e aceitável.
PAPEL DA EQUIPE MULTIPROFISSIONAL
A participação de farmacêuticos ou enfermeiros nos processos de desprescrição é um fator importante para reforçá-los, e muitos pacientes se sentem seguros com a sua participação. As intervenções multidisciplinares também demonstraram ser mais efetivas para reduzir a polifarmácia e a terapêutica inadequada.
A otimização das equipes multidisciplinares também passa pelo compartilhamento de competências e responsabilidades. Por exemplo, a revisão interprofissional da medicação, realizada por enfermeiros e farmacêuticos, melhora a prática clínica de ambos e potencia a qualidade no manejo da medicação. Os enfermeiros, que percebem os farmacêuticos como diretores das rotinas de manejo da medicação, passam a considerá-los como uma fonte de conhecimento sobre adequação terapêutica e farmacoterapêutica. Ao contrário, os farmacêuticos advertem sobre o papel crucial dos enfermeiros na provisão de informação clínica relevante para facilitar a intervenção individual. Algumas evidências de estudos qualitativos revelam o papel central de aspectos como a organização dos dispositivos e recursos, a comunicação e a coordenação entre profissionais, os sistemas de informação e a sobrecarga de trabalho.

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