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Centro Universitário de Adamantina Curso de Medicina Dor Torácica e diagnósticos diferenciais Ligantes: Flavia de Souza e Milene Sakai Teshima Caso Clínico Paciente do sexo masculino, com 23 anos de idade, procurou um centro hospitalar no noroeste paulista e deu entrada com queixa de dor torácica à direita e dispneia intensa há cinco dias. Relatou início do quadro álgico torácico direito há dois meses, com piora gradual há quinze dias e evolução para dor de intensidade 10, pela escala verbal-numérica, há cinco dias em região subcostal direita, do tipo pontada, em repouso, sem fatores de melhora ou piora, associada a náuseas e sem irradiação. Julgou necessário procurar o pronto atendimento devido a dispneia presente aos mínimos esforços e agravada ao decúbito, tosse produtiva e dorsalgia persistente nos últimos cinco dias. Antecedentes pessoais Paciente informou ser tabagista, etilista e usuário de drogas ilícitas, maconha e crack, de forma esporádica. Exame Físico Ectoscopia: Paciente encontrava-se lúcido e orientado em tempo e espaço, em regular estado geral, desidratado (1+/4+), hipocorado (2+/4+), anictérico, acianótico, eutrófico, afebril, nutrido, taquipneico (FR = 28 irpm) e saturação de O2 84% em ar ambiente. Cardiovascular: O aparelho cardiovascular apresentava bulhas rítmicas normofonéticas em dois tempos, sem sopros. Pulmonar: O exame físico pulmonar apresentou expansibilidade diminuída à direita com murmúrio vesicular presente à esquerda com sensação de crepitação à palpação demonstrando enfisemas subcutâneos difusos pelo hemitórax direito. Abdominal: O abdome encontrava-se atípico, flácido, normotenso, com ruídos hidroaéreos presentes, ausência de cicatrizes, ausência de massas palpáveis, ausência de visceromegalias, indolor à palpação superficial e profunda, percussão sem indicação de hepatomegalia, esplenomegalia e espaço de traube em local anatômico, sem sinais de macicez móvel e sem demais alterações clínicas. Exames laboratoriais Apresentava leucocitose sem desvio de 12500/mm³ no hemograma, tendo sorologias e testes rápidos negativos. Exame de imagem Radiografia de tórax admissional Qual hipótese diagnóstica? No raio X de tórax apresentava pneumotórax de grande volume (> 3 cm) à direita, além disso não apresentava doença pulmonar subjacente, caracterizando um pneumotórax espontâneo do tipo primário. Evolução e conduta do caso Foi instituída então analgesia, ofertado oxigênio em cateter nasal, 1L/min, realizada drenagem torácica em selo d’água e internação hospitalar. APRESENTAÇÃO DO TEMA Dor torácica e diagnósticos diferenciais na Urgência e Emergência Epidemiologia ● Nos EUA, dor ou desconforto torácico é a 3ª causa mais frequente de procura ao departamento de emergência. ● Representa cerca de 5 a 7% dos atendimentos de emergência. Fisiopatologia Dor somática Dor visceral Dois mecanismos Dor somática: ● Apresenta uma dor precisamente descrita. Dor visceral: ● Apresenta uma dor sem localização precisa. Etiologia 1. Cardíacas e grandes vasos. 2. Pulmão, pleura, mediastino e artérias pulmonares 3. Esôfago, estômago e abdome superior 4. Músculos, nervos e caixa torácica 5. Outras. Etiologia - Cardíacas e grandes vasos ● Síndrome coronariana aguda. ● Pericardite, miocardite. ● Doenças valvares. ● Cardiomiopatia do estresse (Takotsubo). ● Intoxicações agudas catecolinérgicas. ● Síndromes aórticas agudas (dissecção). Etiologia - Pulmão, pleura e artérias pulmonares ● Embolia pulmonar. ● Infecções pulmonares. ● Pleurite. ● Pneumotórax. ● Hipertensão pulmonar. ● Mediastinite, pneumomediastino, tumores mediastinais. ● Neoplasias pulmonares. Etiologia - Esôfago, estômago e abdome superior ● Úlcera péptica/dispepsia não ulcerosa. ● Refluxo gastroesofágico, esofagite, espasmo esofágico. ● Ruptura de esôfago (síndrome de Boerhaave). ● Pancreatite aguda. ● Colecistite aguda. ● Abscesso hepático ou subfrênico. Etiologia - Músculo, nervos e caixa torácica ● Fibromialgia, miosite, estiramento muscular. ● Costocondrite. ● Lesões em costelas. ● Herpes-zoster. ● Doenças do disco cervical e síndromes radiculares. ● Transtorno psiquiátricos. ● Mastite. ● Idiopática. Outras etiologias A história clínica e o exame físico são cruciais na avaliação inicial para auxiliar no diagnóstico etiológico da dor torácica. Quadro clínico Medicina de Emergência - 11ª Edição HCMFUSP Síndrome Coronariana Aguda Os achados clínicos são ocasionados por isquemia do miocárdio aguda: ● Angina instável. ● Infarto agudo do miocárdio (IAM). Síndrome Coronariana Aguda - Características epidemiológicas Características relevantes para o diagnóstico: ● Sexo. ● Idade. ● Tabagismo. ● Obesidade. ● Diabetes. Síndrome Coronariana Aguda - História Clínica O paciente pode relatar dor torácica, desconforto, queimação, peso ou sensação de opressão. O quadro frequentemente se inicia em repouso, embora estresse psicológico ou pequenos esforços também possam desencadear. Eventualmente, anemia grave, febre, infecção, hipertireoidismo ou outra condição clínica podem ser os desencadeantes de isquemia miocárdica aguda. O desconforto costuma ser na região retroesternal e pode se irradiar para a região proximal/ulnar do braço esquerdo, para ambos os braços, ombros, pescoço ou mandíbula. Síndrome Coronariana Aguda - História Clínica O exame físico no contexto da Síndrome Coronariana Aguda é inexpressivo, mas algumas características podem aumentar sua probabilidade: ● Presença de quarta bulha. ● Sopro carotídeo. ● Diminuição de pulsos em membros inferiores. ● Aneurisma abdominal. ● Achados de sequelas de AVC. Pneumotórax espontâneo Pneumotórax espontâneo primário: ● Acomete indivíduos sadios e sem uma patologia pulmonar prévia. Pneumotórax espontâneo secundário: ● Ocorre em pacientes com doença pulmonar de base. ● Evento mais grave e de maior risco. Pneumotórax espontâneo - História clínica Os sinais e sintomas tipicamente iniciam-se de maneira súbita e em repouso (cerca de 90% dos casos). As principais queixas são: ● Dor torácica intensa, localizada no hemitórax afetado, do tipo pleurítica (com piora ao inspirar e ao tossir). ● Dispneia. Pneumotórax espontâneo - História clínica O exame físico pode estar normal no paciente com pneumotórax pequeno a moderado. Nos casos mais graves, o exame físico pode demonstrar: ● Redução da expansibilidade no hemitórax acometido e ausência do frêmito tátil. ● Redução do murmúrio vesicular no lado do pneumotórax com timpanismo à percussão. Exames complementares como radiografia de tórax e ultrassonografia podem confirmar a suspeita. Pneumotórax espontâneo - História clínica Pneumotórax hipertensivo: ● Quando o ar entra no espaço pleural, mas não consegue sair (efeito de válvula unidirecional), ocorre um aumento da pressão intrapleural e compressão de estruturas vasculares, dificultando o retorno venoso. ● Pode causar hipotensão e choque obstrutivo. Medicina de Emergência - 11ª Edição HCMFUSP Correlação clínica Medicina de Emergência - 11ª Edição HCMFUSP Exames complementares ● ECG: É fundamental e deve ser feito nos primeiros 10 minutos após a chegada na emergência, buscando identificar achados sugestivos de SCA. ● Papel diagnóstico do nitrato sublingual: critérios usados para o diagnóstico de angina típica é a melhora da dor com o repouso ou com o nitrato. Na Emergência, quando o paciente melhora da sua dor com o nitrato sublingual, há a tendência de valorizar esse dado como indício de doença cardíaca isquêmica. Porém é importante lembrar: - Não de nitrato antes do ECG pois se o paciente está com IAM de parede posterior e ventrículo direito ele pode evoluir para choque grave. ● Troponina de alta sensibilidade: sua elevação precoce indica SCA, sendo importante considerar o aumento da troponina e a taxa de elevação. Exames complementares ● Radiografia de tórax: Maior utilidade no diagnósticodiferencial de dor torácica não isquêmica como infecções pulmonares, derrame pleural, pneumotórax, entre outras. E eventualmente, pode sugerir derrame pericárdico, embolia pulmonar ou hipertensão pulmonar. ● Ultrassom torácico à beira do leito: utilizado para avaliar rapidamente importante diagnósticos diferenciais como pericardite, derrame pericárdico, dilatação de ventrículo direito (embolia pulmonar), estenoses, cardiomiopatía hipertrófica, síndrome aórtica aguda, pneumotórax, pneumonia ou derrame pleural. Exames complementares ● Ecocardiograma transesofágico: exame de escolha em paciente com suspeita de dissecção de aorta. ● Angiotomografia de tórax, de aorta e de coronárias: - Angiotomografia de aorta: paciente com suspeita de dissecção de aorta. - Angiotomografia de tórax: exame de escolha na suspeita de embolia pulmonar. - Angiotomografia de coronárias: exame de escolha para suspeita de estenose coronariana e avaliação de diagnósticos diferenciais como embolia pulmonar, derrame pericárdico e pneumotórax. Exames complementares Manejo Clínico Conduta médica inicial para todos incluídos no protocolo de dor torácica: ● Avaliação e atendimento de imediato (primeiros 10 minutos): MOVE (monitor - oxigênio - veia - ECG). Monitor: Monitorização cardíaca contínua + oximetria pulso + pressão não invasiva + repouso no leito + jejum; Oxigênio: Oxigenoterapia faz parte do atendimento inicial de todos os pacientes com SCA e deve ser mantida se saturação de O2 (SatO2) < 90% em ar ambiente e/ou risco de hipoxemia (congestão pulmonar, dispneia). O fluxo de oxigênio deverá ser titulado para manter uma SatO2 ≥ 94% (ou 90-92% se doença pulmonar obstrutiva crônica). Deve ser iniciado por cateter nasal 2 a 4 l/min podendo aumentar fluxo ou mudar para máscara de O2 se necessário. Nos casos com SatO2 entre 90 e 94%, pode-se considerar manter oxigenoterapia (cateter nasal 2 a 4l/min) nas primeiras 6 horas em pacientes sem pneumopatia crônica que apresentem SCA CSST. Manejo Clínico Veia: Acesso IV (Acesso venoso salinizado) e ao obter acesso já pode coletar exames laboratoriais: Troponina (considerar CKMB Massa), Ureia/Creatinina, coagulograma, Hemograma, glicemia, Sódio/Potássio (Acrescentar perfil lipídico nos casos de SCA confirmada). ECG: ECG de 12 derivações; Manejo Clínico Uma vez feito o diagnóstico de SCA o manejo clínico de maneira geral envolvem tratar sintomatologia e prevenir complicações. ● MONAB + 2: Morfina (se dor refratária ao nitrato em SCA CSST); Oxigênio (se satO2 < 90% como parte do MOVE); Nitrato (se dor torácica, congestão, hipertensão); AAS (Rotina); Beta-bloqueador (dose baixa via oral nas primeiras 24h se paciente estável); + 2 medicações antitrombóticas (1 anticoagulante e 1 antiplaquetário para associar ao AAS). Manejo Clínico - SCA ● Pneumotórax espontâneo primário de pequeno volume (< 3 cm) com paciente estável: Na conduta inicial administrar analgésicos e repouso relativo. Paciente deve ficar em observação de 4 a 6 horas, e após esse período repetir raio X. Em casos de ausência de alterações paciente pode receber alta. ● Pneumotórax espontâneo primário de grande volume ( > 3 cm) com paciente estável: Na conduta inicial solicitar internação com as seguintes opções de tratamento: 1- Aspiração com agulha fina introduzida no 2º ou 3º espaço intercostal, na face anterior torácica; 2- Drenagem com cateter fino (<14F) – pode ser usada a válvula unidirecional (Heimlich); Manejo Clínico - Pneumotórax Referências MARTINS, Glendha Stephanie; et al. Pneumotórax espontâneo em paciente jovem: relato de caso. Rev Med Minas Gerais 2020; 30: e-E0018. Medicina de Emergência - 11ª Edição HCMFUSP - Cap 17: dor ou desconforto torácico. Protocolo de dor torácica. América Serviços Médicos. 2019. smweb.amil.com.br/ControleDocumento/Rel_DocumentoHtml.aspx?IdD ocumento=76548 Obrigada