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Clínica cirúrgica 04 Caroline Leão Conhecer as principais técnicas farmacológicas de anestesia geral. Visita pré-operatória Como a escolha do tipo de anestesia sofre influência multifatorial, a visita pré- operatória investiga esses fatores e as características individuais que aumentam o risco anestésico. O que abordar na visita Condições atuais da saúde História de doenças pré-existentes, como por exemplo asma e bronquite (podem desencadear broncoconstrição aguda grave); hipertensão (pode aumentar a incidência de acidente vascular ou infarto do miocárdio); hérnia de hiato (aumenta o risco para broncoaspiração), infecções de vias aéreas superiores – IVAS – (risco de complicações pulmonares, broncoespasmo e obstrução das VAS) História da doença atual: sinais e sintomas, exames e tratamento realizados Uso de medicamentos – anticonvulsivantes, antiarrítmicos, hipotensores, vasodilatadores, anticoagulantes, etc Tabagismo e etilismo Reações adversas à fármacos Alergias Antecedentes familiares de complicações anestésicas Histórico de hipertermia maligna e intercorrências em processos anestésicos anteriores É importante que o enfermeiro tenha conhecimento sobre os tipos de anestesia e suas possíveis complicações para poder oferecer uma assistência segura. Estágios da anestesia (Guedel) Estágio I (Analgesia): paciente consciente, porém sonolento, há redução das respostas aos estímulos álgicos; Estágio II (Excitação ou delírio): perda de consciência e início do período de excitação com reações indesejáveis como vômito, tosse, laringoespasmo, pupilas dilatadas e respiração irregular; Estágio III: (Anestesia Cirúrgica): sem movimento espontâneo, respiração tornando-se irregular, relaxamento muscular, pupilas contraídas A anestesia é considerada adequada quando o estímulo doloroso não produz respostas somáticas autonômicas deletérias (p.ex., hipertensão, taquicardia); Estágio IV: (Paralisia Bulbar): respiração superficial ou ausente, pupilas não reativas, hipotensão que pode progredir para parada circulatória e morte. 1. Anestesia Geral Os anestésicos gerais são usados para que os pacientes tenham perda da consciência e não respondam aos estímulos dolorosas durante os procedimentos cirúrgicos. Eles são administrados sistemicamente e exercem seus principais efeitos no sistema nervoso central (SNC). Esse estado de inconsciência se caracteriza por amnésia, analgesia, depressão dos reflexos, relaxamento muscular e depressão neurovegetativa. 1.1 Anestesia Geral Inalatória: Todos os anestésicos inalatórios mais novos deprimem a taxa metabólica cerebral de forma similar, resultando em um eletrencefalograma isoelétrico. Eles geralmente produzem uma perda de consciência e amnésia em concentrações inspiradas relativamente mais baixas (25-35% da CAM), embora haja uma variação considerável na sensibilidade entre indivíduos. Os anestésicos inalatórios produzem depressão miocárdica dose-dependente e uma redução na pressão arterial sistêmica. Essa redução na pressão arterial se deve principalmente a uma redução na resistência vascular sistêmica. A frequência cardíaca é relativamente inalterada pelos anestésicos inalatórios, embora o desflurano e, em algum grau, o isoflurano possam causar estimulação simpática, levando à taquicardia e hipertensão durante a indução ou quando a concentração inspirada é aumentada abruptamente Os anestésicos inalatórios são capazes de prover proteção miocárdica contra algumas lesões isquêmicas e de reperfusão que duram além da eliminação dos gases anestésicos. Os anestésicos inalatórios produzem depressão respiratória dose-dependente com uma redução no volume corrente e na frequência respiratória. O aumento na pressão parcial arterial de dióxido de carbono como resultado da depressão respiratória é, de certo modo, compensado pela estimulação do procedimento cirúrgico presente. Todos os anestésicos inalatórios produzem depressão dose-dependente da resposta ventilatória à hipercarbia e da resposta quimiorreceptora à hipóxia, mesmo em concentrações subanestésicas (tão baixas quanto 0,1 CAM). Classificação dos anestésicos inalatórios Alguns anestésicos inalatórios estão em um estado gasoso em temperatura ambiente e são armazenados em tanques. Exemplos de tais gases anestésicos incluem o óxido nitroso, o xenônio e um gás explosivo, o ciclopropano, que não é mais usado. A maioria dos anestésicos inalatórios usados atualmente é chamada de anestésicos voláteis porque são líquidos em temperatura ambiente. Eles são armazenados em garrafas e convertidos em uma fase gasosa usando vaporizadores específicos para o agente que podem fornecer uma concentração exata do fármaco no circuito anestésico. Exemplos de anestésicos voláteis obsoletos incluem éter dietílico, halotano e enflurano. Os anestésicos voláteis atuais incluem o sevoflurano e o isoflurano. O desflurano é um anestésico inalatório que tem características de um gás puro e de um anestésico volátil. Isto é, como o seu ponto de ebulição é 24°C, ele passa de líquido para gás em uma temperatura muito próxima à temperatura ambiente normal. A vaporização do desflurano requer um vaporizador que é mais complexo do que o necessário para os outros anestésicos voláteis. A. Óxido nitroso Por muitos motivos, o uso clínico de óxido nitroso está em declínio. Primeiro, como ele é relativamente fraco (a CAM é 105%), não pode ser usado como o único agente anestésico. Segundo, ele pode se difundir prontamente em espaços aéreos fechados como o ouvido médio, intestino, seios aéreos cranianos, no pneumoperitôneo (p. ex., durante procedimentos laparoscópicos), no pneumotórax e em bolhas de gás inseridas durante cirurgia ocular. Isso pode resultar em um aumento no volume do espaço (p. ex., distensão intestinal) ou um aumento na pressão (p. ex., no olho ou no ouvido médio). Terceiro, ele está associado com uma alta incidência de náusea e vômitos pós- operatórios quando usado por mais de uma hora. Quarto, devido à sua interferência no metabolismo do folato, ele tem o potencial para efeitos tóxicos no desenvolvimento do embrião. O óxido nitroso oxida o átomo de cobalto na vitamina B12, assim inibindo de forma irreversível a enzima metionina sintetase dependente da B12 e resultando em níveis elevados de homocisteína. Esse produto final leva à disfunção endotelial e estresse oxidativo e desestabiliza a placa arterial. A administração prolongada de óxido nitroso, como na sedação na unidade de cuidados intensivos, está associada com anemia grave. Por fim, o óxido nitroso, assim como o CO2, causa depleção do ozônio na atmosfera. A despeito do uso em declínio do óxido nitroso intraoperatoriamente, a administração de uma mistura 50:50 de oxigênio e óxido nitroso (Entonox) permanece útil para analgesia curta em odontologia pediátrica, analgesia do trabalho de parto, troca de curativos de queimaduras e procedimentos relacionados. B. Halotano Propriedades físicas: Halogenado; Não-inflamável e não-explosivo. Efeitos em órgãos e sistemas: 1. Cardiovascular: - redução dose-dependente da PA; - depressão do miocárdio e redução do DC; - redução do fluxo sanguíneo coronariano; - lentificação da condução pelo nó sinoatrial; - aumento do intervalo QT. 2. Respiratório: - respirações rápidas e superficiais; - aumento da FR e queda do volume corrente; - queda do volume minuto e elevação da PaCO2; potente efeito broncodilatador; - relaxamento da musculatura lisa brônquica; - atenuação dos reflexos da via aérea; - inibição da função mucociliar (hipóxia e atelectasia pós-operatórias. 3. Cerebral: - vasodilatação cerebral: aumento do FSC; - inibição da auto-regulação cerebral; - redução modesta do metabolismo cerebral. 4. Neuromuscular: relaxamento muscular; potencialização dos BNM; agente desencadeador de hipertermia maligna. 5. Renal: redução dofluxo sanguíneo renal; redução do débito urinário. 6. Hepático: redução do fluxo sanguíneo hepático; pode provocar espasmo da artéria hepática: metabolismo anaeróbio: formação de fluoretos. Biotransformação e toxicidade: metabolismo: oxidação hepática: ácido trifluoroacético; hepatite por halotano: rara (1 para 35.000 pctes); risco maior de hepatite: exposições repetidas, mulheres obesas de meia idade e história familiar positiva. C. Isoflurano: Propriedades físicas: - halogenado; - não-inflamável; -odor desagradável e irritante. Efeitos em órgãos e sistemas: 1. Cardiovascular: mínima depressão miocárdica; DC mantido por elevação da FC; síndrome de roubo coronariano (significado clínico controverso). 2. 2. Respiratório: depressão respiratória; taquipnéia menos expressiva que outros halogenados; efeito broncodilatador. 3. Cerebral: concentrações acima de 1 CAM: aumento do FSC e da PIC; aumento da PIC pode ser revertido ou prevenido com hiperventilação. 4. Neuromuscular: relaxamento da musculatura esquelética; potencialização dos BNM. 5. Renal: redução do fluxo sanguíneo renal; redução da taxa de filtração glomerular; redução do débito urinário. 6. Hepático: redução do fluxo sanguíneo hepático; não há efeito sobre a artéria hepática: suprimento de oxigênio mantido. Biotransformção: produto final: ácido trifluoroacético. D. Sevoflurano: Propriedades físicas: Halogenado; Odor mais agradável e menos irritante; Rápido aumento da concentração alveolar (FA); Indicado para indução anestésica. Efeitos em órgãos e sistemas: 1. Cardiovascular: depressão moderada da contratilidade do miocárdio; redução da resistência vascular periférica e da PA menor que a do isoflurano; não causa aumento da FC: o DC cai mais do que com o uso de isoflurano; 2. Respiratório: depressão respiratória; efeito broncodilatador. 3. Cerebral: aumento do FSC e da PIC; redução do metabolismo cerebral. 4. Neuromuscular: relaxamento muscular; potencialização dos BNM. 5. Renal: redução do fluxo sanguíneo renal; geração de fluoretos: afeta função tubular renal. 6. Hepático: redução do fluxo sanguíneo portal; aumento do fluxo da artéria hepática; fluxo hepático total e oxigenação hepática mantidos. Biotransformação: citocromo P450; geração de fluoretos: nefroxicidade; baixo fluxo: composto A (nefrotóxico). 1.2 Anestesia Intravenosa Mecanismo de ação Os agentes anestésicos intravenosos mais usados – os barbitúricos, o propofol, os benzodiazepínicos e o etomidato – agem no receptor do ácido _-aminobutírico A (GABA A), como mostrado esquematicamente. O GABA é o principal neurotransmissor inibitório dentro do sistema nervoso central, e sua ação no receptor GABAA causa aumento do transporte de íons cloreto (Cl_) através da membrana e para dentro do neurônio pós-sináptico. O neurônio pós-sináptico se torna hiperpolarizado, o que inibe funcionalmente a propagação adicional dos sinais nervosos. O receptor GABAA é, portanto, um canal iônico ativado pelo ligante composto de cinco subunidades. Os anestésicos intravenosos que se ligam ao receptor GABA A não se ligam ao mesmo local que o próprio GABA (o sítio de ligação ortostérico), eles se ligam a outras localizações (sítios alostéricos) e alteram o efeito do GABA no receptor. Esses anestésicos intravenosos são, portanto, moduladores alostéricos positivos do receptor GABA A e causam alterações conformacionais do receptor, de modo que a ação do GABA é potencializada e a sedação ocorre. A composição de subunidades dos recep tores GABA pode variar: há 19 subunidades possíveis que se originam de oito classes de subunidades. Os agentes anestésicos intravenosos podem ser ativos somente em receptores que expressam certas combinações: o sítio de ligação alostérica dos benzodiazepínicos ocorre apenas na interface das subunidades, e o etomidato é ativo primariamente nos receptores GABAA que contêm subunidades. A. Barbitúricos Os barbitúricos usados mais comumente são os tiobarbitúricos: tiopental, tiamilal e o oxibarbiturato metoexital. Os barbitúricos deprimem o sistema ativador reticular no tronco cerebral e acredita- se que potencializem a ação dos receptores GABA A, aumentando a duração de uma abertura associada no canal do íon cloreto. Os barbitúricos diminuem a taxa de metabolismo cerebral do oxigênio (TMCO2), o fluxo sanguíneo cerebral (FSC) e a pressão intracraniana (PIC). Os barbitúricos podem induzir um eletroencefalograma isoelétrico (EEG), diminuindo maximamente a TMCO2. Quando são adicionadas ao ringer lactato ou outras preparações de fármacos acídicos, ocorre uma precipitação cristalina que pode ocluir de forma irreversível os tubos e cateteres intravenosos. Os barbitúricos raramente causam dor na injeção, mas causam irritação tissular significativa quando extravasam. A injeção intra-arterial inadvertida de tiobarbitúricos causa complicações sérias, incluindo vasoconstrição intensa, trombose e necrose tissular. A ação anestésica dos barbitúricos é terminada primariamente por redistribuição a partir de tecidos lipofílicos centrais do cérebro para os compartimentos de massa muscular periférica. Os barbitúricos sofrem lenta eliminação terminal por meio de metabolismo hepático, conjugação biliar e excreção renal. A eliminação terminal do tiopental é prolongada com uma meia-vida de 10 a 12 horas. O clearance do metoexital é mais dependente do fluxo sanguíneo hepático, permitindo uma meia-vida de eliminação mais curta, de quatro horas. Deve-se ter cuidado em pacientes com porfiria, pois os barbitúricos estimulam a formação de porfirina e podem precipitar uma crise aguda. B. Propofol O propofol (Diprivan) é um composto alquilfenol que aumenta a afinidade de ligação do GABA com o receptor GABA A. Acoplado com o canal do cloro, a ativação leva à hiperpolarização da membrana nervosa e é similar ao mecanismo de ação dos barbitúricos. O propofol causa uma redução na pressão arterial devido a uma diminuição simultânea na resistência vascular sistêmica, uma redução na pré-carga (causada por inibição do tônus simpático e efeito direto no músculo liso vascular) e depressão miocárdica direta. Esses efeitos são dependentes da dose e da concentração. O propofol reduz o TMCO2, o FSC e a PIC. Contudo, em pacientes com pressão craniana aumentada, o efeito depressor do propofol sobre a pressão arterial sistêmica irá reduzir dramaticamente a pressão de perfusão cerebral (PPC). O propofol não afeta a regulação cerebrovascular ou a reatividade cerebral à tensão do dióxido de carbono. O propofol também tem propriedades antipruriginosas e antieméticas. A emulsão de propofol com frequência causa dor à injeção nas pequenas veias da mão. Essa dor pode ser minimizada pela injeção em veias maiores e pela mistura do propofol com lidocaína antes da injeção. A ação anestésica do propofol é terminada primariamente por redistribuição a partir dos tecidos lipofílicos centrais do cérebro para compartimentos periféricos. Quer seja usado como um bólus único, um agente de indução ou como infusão contínua, a meia-vida de redistribuição é muito curta (2-8 minutos), e a meia-vida contexto-dependente para infusões de até oito horas é menor do que 40 minutos. O metabolismo é primariamente hepático, e os metabólitos hidrossolúveis inativos são eliminados por via renal. Contudo, mesmo a presença de doença hepática e renal clinicamente significativa não altera acentuadamente a farmacocinética do propofol. O propofol deve ser manuseado com técnica estéril, uma vez que a emulsão pode favorecer o crescimento bacteriano. O propofol não utilizado deve ser descartado seis horas após a abertura. O uso de infusão em alta dose no longo prazo em crianças e adultos gravemente enfermos pode causar síndrome de infusão do propofol (SIPR) caracterizada por insuficiência cardíaca, rabdomiólise, acidose metabólica, insuficiênciarenal, hipercalemia, hipertrigliceridemia e hepatomegalia. A SIPR é rara, e sua fisiopatologia é incerta, mas é geralmente fatal. Se suspeitada, o propofol deve ser descontinuado imediatamente, e um sedativo alternativo deve ser utilizado. C. Benzodiazepínicos Os compostos benzodiazepínicos consistem em um anel benzeno e um anel diazepínico. Os benzodiazepínicos mais usados em anestesia são o midazolam, lorazepam e diazepam. O midazolam é hidrossolúvel em baixo pH. O lorazepam e o diazepam são insolúveis e são formulados com propilenoglicol. Às vezes é vista irritação venosa com a administração. Os benzodiazepínicos se ligam aos mesmos receptores GABA A que os barbitúricos, mas em um local diferente do receptor. A frequência de abertura do canal iônico do cloro associado é aumentada com a ligação do GABA ao receptor, causando sedação ao longo da mesma via que o propofol e os barbitúricos. Os benzodiazepínicos diminuem, do mesmo modo, a TMCO2, o FSC e a PIC. Embora os benzodiazepínicos sejam incapazes de suprimir completamente os focos do EEG, eles são eficazes na supressão e no controle de convulsões do tipo grande mal. Ao contrário do propofol e dos barbitúricos, a sedação com benzodiazepínicos pode ser revertida farmacologicamente. O flumazenil é um antagonista competitivo especifico para os benzodiazepínicos com uma alta afinidade pelo local no receptor para benzodiazepínicos Os benzodiazepínicos são metabolizados no fígado e são suscetíveis à disfunção hepática e à coadministração de outras medicações. Embora os benzodiazepínicos não sejam conhecidos por serem teratogênicos significativos, há uma preocupação de que eles possam aumentar a incidência de fissura palatina em pacientes suscetíveis. Os recém-nascidos podem exibir síndrome de abstinência por benzodiazepínicos administrados à mãe. Portanto, os benzodiazepínicos geralmente são evitados durante a gravidez. D. Etomidato Estruturalmente, o etomidato não está relacionado a outros agentes anestésicos. Para permitir uma solução injetável, o fármaco é dissolvido em propilenoglicol. Essa solução pode causar dor à injeção, que pode ser reduzida por pré-administração de lidocaína intravenosa. O etomidato também age por meio de ligação aos receptores GABA A, aumentando a afinidade dos receptores pelo GABA, embora pareça operar preferencialmente em receptores GABA A que expressam apenas um subgrupo das possíveis subunidade. O etomidato parece causar desinibição subcortical, explicando os movimentos mioclônicos involuntários e o trismo encontrados comumente durante a indução com essa medicação. O etomidato diminui a TMCO2, o FSC e a PIC, enquanto mantém uma boa PPC secundária à estabilidade hemodinâmica. O etomidato é capaz de produzir potenciais semelhantes à convulsão no EEG em pacientes epilépticos sem criar convulsões reais, ajudando a localizar focos de convulsão durante o mapeamento intraoperatório. Embora possa criar esses potenciais, ele tem propriedades anticonvulsivantes e pode ser usado contra o estado epiléptico. Também aumenta a amplitude dos potenciais evocados somatossensoriais (PESSs), ajudando em situações nas quais a interpretação é necessária e a qualidade do sinal dos PESSs é ruim. Náuseas e vômitos pós-operatórios são mais comuns com o etomidato do que com o propofol ou o tiopental, e ele não tem qualquer propriedade analgésica. O etomidato inibe transitoriamente a 11-_-hidroxilase, uma enzima envolvida na produção de esteroides, o que causa supressão adrenocortical. Mesmo após uma única dose de indução, a supressão pode ser vista por 5 a 8 horas. Em seu favor, contudo, o etomidato não causa liberação de histamina e causa mínima depressão hemodinâmica e broncoconstrição, mesmo na presença de doença cardiovascular e pulmonar. Essa estabilidade hemodinâmica é que fundamenta o uso continuado de etomidato na prática clínica. Com o etomidato, o despertar ocorre primariamente por redistribuição para os tecidos periféricos. A eliminação terminal ocorre por biotransformação hepática em metabólitos inativos que, então, são excretados por via renal. E. Cetamina A cetamina é um derivado fenciclidina altamente lipossolúvel. A cetamina tem propriedades únicas para distingui-la de outros anestésicos intravenosos: ela estimula o sistema nervoso simpático, tem mínima depressão respiratória e causa broncodilatação potente. Possui várias vias de administração, o que a torna uma excelente opção para pacientes não cooperativos e pediátricos. Seus principais efeitos são mediados por seu potente antagonismo do receptor N-metil-D-aspartato (NMDA), em vez da ação no receptor GABA A. A cetamina é um vasodilatador cerebral, causando aumento do FSC e da PIC. Ela também aumenta a TMCO2. É relativamente contraindicada em pacientes com lesões que ocupam espaço dentro do sistema nervoso central (SNC), especialmente aquelas com PIC elevada. O receptor NMDA é um receptor excitatório encontrado em todo o SNC, incluindo áreas na medula espinal, sistema talamolímbico e núcleo do trato solitário (NTS). O glutamato, o neurotransmissor excitatório mais importante dentro do SNC, se liga ao receptor e (entre muitas outras funções) converte sinais para dor, associa sinais sensoriais entre o tálamo e o córtex e causa excitação global. A cetamina causa analgesia não apenas por bloquear o sinal doloroso na medula espinal, mas também por “dissociar” a comunicação da dor entre o tálamo e o sistema límbico. Esse estado de amnésia dissociativa leva o paciente a parecer consciente (olhos abertos, com olhar fixo), mas ele permanece não responsivo aos estímulos sensoriais (dor, estímulo verbal). O mecanismo de ação da cetamina é complexo. Teoriza-se que a cetamina bloqueia os receptores NMDA dentro do NTS e impede que esses neurônios inibam o centro vasomotor, resultando em uma liberação positiva de catecolaminas. Isoladamente, a cetamina é um depressor miocárdico direto, mas, secundário a essa liberação indireta de catecolaminas, ela age como um estimulante cardíaco, causando aumento da pressão arterial, da frequência cardíaca e do débito cardíaco. A cetamina também bloqueia os canais de sódio, que contribuem para seus efeitos analgésicos. O término do efeito clínico da cetamina é devido primariamente à redistribuição a partir do cérebro para os tecidos periféricos. A cetamina é metabolizada no fígado pelo sistema do citocromo P450 em vários metabólitos, dos quais um deles, a norcetamina, retém algumas das propriedades anestésicas. Os metabólicos são excretados por via renal. Embora lipossolúvel, a cetamina é a molécula com menor ligação proteica de todos os anestésicos intravenosos. Infelizmente, a cetamina tende a produzir reações desagradáveis no despertar da anestesia, como alucinações, experiências fora do corpo e medo, o que tem limitado seu uso disseminado como medicação anestésica primária. Essas reações de emergência são mais bem toleradas na população pediátrica e devem ser da maior consideração em pacientes psiquiátricos. Todavia, as propriedades únicas da cetamina e suas múltiplas vias de administração documentadas (intravenosas, intramuscular, oral, retal e mesmo peridural e intratecal) dão a ela muitos usos clínicos adjuntos. F. Dexmedetomidina A dexmedetomidina (Precedex) é um alfa2-agonista de ação central altamente seletivo. Ela produz sedação e analgesia sem depressão respiratória substancial. Os receptores alfa2 são localizados na pré-sinapse e no locus cerúleo, uma área do cérebro responsável pela estimulação e atividade simpática. Os receptores alfa2 são receptores inibitórios e, quando ativados, diminuem a quantidade de neurotransmissores liberados da corrente sanguínea. Para os nervos simpáticos, isso resulta em menos liberação de catecolamina, que causa redução da pressão arterial e da frequência cardíaca. Os receptores alfa2 também estão localizadosnos axônios na medula espinal envolvidos na transmissão da dor. Quando esses receptores são ativados, a transmissão nociceptiva é diminuída, e a percepção da dor é atenuada. A ativação dos alfa2 receptores no locus ceruleus causa sedação e redução da atividade simpática. Como a dexmedetomidina age apenas nos receptores alfa2, que não estão envolvidos com a respiração, é observada mínima depressão respiratória. O fígado metaboliza rapidamente a dexmedetomidina por meio de mecanismos que envolvem a uridina 5’-difosfoglicuronosil transferase. O fármaco é eliminado rapidamente, e os metabólitos são excretados por meio da bile e da urina. Como a dexmedetomidina provê sedação e analgesia sem causar depressão respiratória, ela tem usos clínicos na sala de cirurgia e no ambiente de cuidados intensivos. Ela é usada em situações de tolerância preexistente aos opioides em pacientes com dor crônica ou para reduzir a administração de opioides naqueles pacientes em risco de depressão respiratória pós-operatória relacionada aos opioides, como na obesidade mórbida ou em pacientes com apneia obstrutiva do sono. A dexmedetomidina, contudo, não deve ser infundida continuamente por mais de 24 horas, pois há preocupação com hipertensão de rebote, excitabilidade de rebote e arritmia. Conhecer os principais anestésicos locais. Os anestésicos locais são uma classe de fármacos que inibem de modo transitório e reversível a condução dos impulsos neurais sensoriais, motores e autonômicos. Clinicamente, os anestésicos locais são usados primariamente para prover anestesia perioperatória ou analgesia. Mecanismo de Ação Os anestésicos locais agem na membrana axonal através da ligação com uma região específica dentro da subunidade _. Isso impede a ativação do VGNa, inibindo, assim, a corrente de Na_ para dentro que medeia a despolarização da membrana. O sítio de ligação dos anestésicos locais se situa dentro do poro do canal e é formado a partir de resíduos de aminoácidos nos segmentos S6 dos domínios I, III e IV. O sítio de ligação pode ser abordado a partir de duas vias: a partir do aspecto intracelular do poro do canal (via hidrofílica) ou lateralmente a partir da membrana lipídica (via hidrofóbica). À medida que a quantidade de anestésico local administrado aumenta, uma porcentagem crescente de VGNa se liga aos anestésicos locais, inibindo ainda mais a entrada de Na_. Subsequentemente, a velocidade de despolarização (em resposta à estimulação) é atenuada, inibindo a obtenção do potencial de membrana limiar. Em consequência, a obtenção de um potencial de ação se torna cada vez mais difícil. Com um número suficiente de VGNa ligados a anestésicos locais, um potencial de ação não pode mais ser gerado, e a propagação do impulso é bloqueada. O anestésico local ligado a VGNa não altera o potencial de repouso da membrana nem altera o limiar de ação (potencial de ação). Os anestésicos locais se ligam mais avidamente ao VGNa nas conformações ativadas (abertas) e inativadas (o poro do canal está aberto, mas fechado por movimento da porta de inativação). A diferença na afinidade de ligação é atribuível à diferença na disponibilidade das duas vias para o anestésico local atingir o sítio de ligação. Os anestésicos locais produzem uma redução na corrente de entrada de Na_ caracterizada como bloqueio tônico, que é dependente da concentração, que representa uma diminuição no número de conformações de VGNa abertos (1). Com a despolarização repetida, um maior número de VGNa está nas conformações ativadas ou inativadas. Portanto, eles podem estar ligados em uma determinada concentração do anestésico local. Adicionalmente, a velocidade de dissociação dos anestésicos locais do seu sítio de ligação é mais lenta do que a velocidade de transição da conformação inativada para a de repouso. Assim, estimulações repetidas resultam em acúmulo de VGNa ligados a anestésicos locais caracterizados como bloqueio dependente de frequência. Mecanismos do bloqueio nervoso Para que os anestésicos locais se liguem ao VGNa, eles precisam atingir a membrana neural. Assim, os anestésicos locais precisam penetrar por uma quantidade variável de tecido perineural e ainda manter um gradiente de concentração suficiente para difundir pela dupla camada lipídica. Apenas uma pequena fração (1-2%) dos anestésicos locais atinge a membrana neural mesmo quando esses anestésicos são depositados próximos aos nervos periféricos. Os nervos periféricos que foram desaquecidos in vitro requerem cerca de cem vezes menos anestésicos locais do que os nervos periféricos in vivo. Em contraste, os nervos neuroaxiais centrais são envoltos em três camadas de meninges: a pia-máter, a aracnoide e a dura-máter. A qualidade do bloqueio nervoso é determinada não apenas pela potência intrínseca do anestésico local escolhido, mas também pela concentração e pelo volume do anestésico local administrado. A potência de um anestésico local pode ser expressa como a concentração efetiva mínima necessária para estabelecer um bloqueio nervoso completo. O volume do anestésico local também é importante, uma vez que um comprimento suficiente do axônio ou nodos sucessivos de Ranvier precisa ser bloqueado para inibir a regeneração do impulso neural. Isso se deve ao fenômeno de condução decremental. A despolarização da membrana decai passivamente a partir do local de geração do potencial de ação até o ponto em que a despolarização cai abaixo do limiar para ativação do VGNa e a propagação do impulso é interompida. Se uma porção menor do que o comprimento crítico do axônio for bloqueado, o potencial de ação ainda pode ser regenerado no segmento proximal da membrana neural ou nodo de Ranvier quando a despolarização decremental ainda está acima do limiar do potencial. Clinicamente, há uma progressão previsível do bloqueio da função sensorial e motora, começando com a perda da sensação de temperatura, seguida pela da propriocepção, função motora, dor aguda e, por fim, do toque leve. Chamada de bloqueio diferencial, essa progressão foi atribuída inicialmente a diferenças no diâmetro do axônio, com fibras menores inerentemente mais suscetíveis ao bloqueio da condução em comparação a fibras maiores. Contudo, pequenas fibras mielinizadas (A_ e A_) são as mais suscetíveis ao bloqueio da condução. A seguir, em ordem de suscetibilidade ao bloqueio, estão as grandes fibras mielinizadas (A_ e A_), e as menos suscetíveis são as pequenas fibras C não mielinizadas. Dentro dos nervos periféricos, a difusão longitudinal e radial dos anestésicos locais irá produzir concentrações variáveis dos fármacos ao longo e dentro do nervo durante a instalação e recuperação do bloqueio clínico. Quando os anestésicos locais são depositados em torno de um nervo periférico, a difusão progride da superfície externa (capa) em direção ao centro (polpa) ao longo de um gradiente de concentração. Como consequência, as fibras nervosas arranjadas na capa de nervos periféricos mistos são bloqueadas inicialmente. Essas fibras nervosas externas são distribuídas geralmente para estruturas anatômicas mais proximais, enquanto as fibras centrais inervam estruturas mais distais. Esse arranjo topográfico explica o desenvolvimento inicial da anestesia proximal, seguido pela anestesia distal, à medida que o anestésico local se difunde para as fibras nervosas da polpa localizadas mais centralmente. Em resumo, a sequência de início e recuperação do bloqueio dos nervos periféricos depende de uma combinação dos arranjos topográficos das fibras nervosas dentro de um nervo periférico misto e sua suscetibilidade inerente ao bloqueio anestésico local. A. Anestésicos locais aminoamidas Lidocaína A lidocaína foi o primeiro anestésico local amplamente usado e permanece o mais usado. Ele pode ser usado para infiltração, anestesia regional intravenosa (bloqueio de Bier), bloqueiodos nervos periféricos e anestesia neuroaxial (subaracnóidea e peridural). Caracteriza-se por um início de ação rápido a intermediário e uma duração de ação intermediária para bloqueio dos nervos periféricos e anestesia peridural. Embora as preocupações a respeito dos SNTs tenham levado à redução do seu uso para anestesia subaracnóidea, ela permanece popular para anestesia peridural. A lidocaína pode ser aplicada topicamente na forma de geleia, pomada, adesivo ou aerossol para anestesiar as vias aéreas superiores. As injeções intravenosas tendo como alvo níveis plasmáticos relativamente baixos produzem analgesia sistêmica e têm sido usadas como um adjunto para atenuar a resposta simpática à laringoscopia e intubação. O adesivo é um sistema de administração tópica idealizado para fornecer doses baixas de lidocaína aos nociceptores envolvidos superficialmente em uma quantidade que produza analgesia desprovida de bloqueio sensoriomotor. Mepivacaína Compartilha um perfil clínico similar ao da lidocaína, mas com uma duração de ação discretamente mais longa, pois resulta em menos vasodilatação. Ela é relativamente ineficaz quando aplicada por via tópica. Como agente anestésico espinal, parece ter uma incidência de SNTs mais baixa, embora não clinicamente insignificante, comparada com a da lidocaína. O metabolismo no feto e no recém-nascido é prolongado e, portanto, não é usado para analgesia obstétrica. Prilocaína A prilocaína também tem um perfil clínico similar ao da lidocaína e é usada para infiltração, bloqueio de nervos periféricos e raquianestesia e anestesia peridural. Devido à sua elevada depuração, ela demonstra a menor toxicidade sistêmica de todos os anestésicos locais amida e, portanto, é potencialmente útil para anestesia regional intravenosa. Contudo, a administração de doses maiores ( 500-600 mg) pode resultar em metemoglobinemia. Bupivacaína A bupivacaína é um homólogo estrutural da mepivacaína, lipossolúvel. Assim, ela é caracterizada por um início de ação relativamente mais lento comparado com o da lidocaína, mas tem uma duração de ação estendida. Fornece anestesia e analgesia sensorial prolongada, que em geral ultrapassa a duração e intensidade do seu bloqueio motor, especialmente com o uso de concentrações menores em infusões contínuas. Essa característica estabeleceu a bupivacaína como o anestésico local mais amplamente usado para analgesia peridural no trabalho de parto e para manejo da dor pós-operatória aguda. Injeções únicas para aplicações de bloqueio nervoso periférico podem fornecer anestesia cirúrgica por até 12 horas e analgesia sensorial que dura até 24 horas. Ropivacaína A ropivacaína é outro homólogo estrutural da mepivacaína e bupivacaína. Juntas, essas duas características resultam em potência clinicamente equivalente para bloqueio neural, mas com um perfil menos cardiotóxico comparado com o da bupivacaína. Ela tem um efeito vasoconstritor inerente, que pode contribuir para seu reduzido perfil cardiotóxico e possivelmente aumento da sua duração de ação. De um modo global, o perfil clínico é similar ao da bupivacaína, levando em consideração a sua reduzida potência comparada com a bupivacaína. B. Anestésicos locais aminoésteres Procaína A procaína era usada primariamente para infiltração e raquianestesia durante a primeira metade do século XX. A baixa potência, início de ação relativamente lento e curta duração de ação limitam o amplo uso da procaína. Preocupações a respeito de SNTs com lidocaína despertaram um interesse renovado no uso da procaína para anestesia subaracnóidea de duração intermediária. A despeito da sua baixa incidência de SNT comparada com a lidocaína, o risco aumentado de falha no bloqueio e a náusea associada têm limitado sua utilidade clínica. Clorprocaína Devido à sua potência relativamente baixa e metabolismo muito rápido pelas colinesterases plasmáticas, a 2-clorprocaína pode ser usada em concentrações relativamente altas (2-3%), tendo o menor potencial para toxicidade sistêmica de todos os agentes anestésicos locais clinicamente úteis. A despeito do seu pKa relativamente alto, o uso de concentrações relativamente altas resultam em rápida instalação de anestesia cirúrgica. Essa característica, somada a praticamente nenhuma transmissão ao feto, a torna particularmente útil quando é necessária uma anestesia peridural cirúrgica de início rápido (i.e., parto cesariano urgente ou emergente). Além disso, o uso de 2-clorprocaína tem sido associado com uma incidência muito baixa de SNT. Tetracaína A tetracaína é um potente anestésico local aminoéster, caracterizado por um início de ação lento e uma longa duração de ação. Em contraste com a bupivacaína, a duração de ação da tetracaína é prolongada significativamente com a adição de um vasoconstritor. Devido a seu lento início de ação e ausência de dissociação sensoriomotora (resultando em bloqueio motor significativo), raramente é indicada para anestesia peridural ou bloqueio nervoso periférico, e sua aplicação clínica primária é para anestesia subaracnóidea de duração estendida. Cocaína A cocaína é o único agente anestésico local que ocorre naturalmente. As aplicações clínicas atuais para a cocaína são amplamente restritas à anestesia tópica para procedimentos no ouvido, nariz e garganta onde a sua intensa vasoconstrição é clinicamente útil para reduzir o sangramento ao instrumentar a nasofaringe. A cocaína inibe a receptação neuronal da noradrenalina, mediando seus efeitos vasoconstritores neurogênicos, mas ela também pode causar efeitos colaterais cardiovasculares significativos, como hipertensão, taquicardia e arritmias. Descrever os princípios da analgesia pós-operatória. O tratamento da dor pós-operatória deve ser feito de forma regular e não de demanda, atendendo as necessidades individuais de cada paciente, devendo haver familiaridade com a técnica e as drogas escolhidas, especialmente por parte da equipe médica e de enfermagem, que cuida do paciente. Anti-inflamatórios não esteroides (AINE) Nessa categoria de fármacos estão incluídas as drogas que agem através da inibição da ciclooxigenase (COX), bloqueando a conversão do ácido araquidônico em prostanóides, conhecidos como prostaglandinas e prostaciclinas e tromboxanos, envolvidos no processo inflamatório e na sensibilização dolorosa central e periférica. Aparentemente os AINE também possuem uma ação inibitória na transmissão nociceptiva, sinérgica aos agonistas alfa2 e opiáceos. A ação dos AINE é dose /resposta limitada (efeito teto), ou seja, a sua administração em doses superiores às recomendadas não proporciona analgesia suplementar, aumentando a incidência de efeitos colaterais. Atualmente se conhecem dois tipos de COX. A COX- 1, presente na maioria dos tecidos está relacionada à função renal (balanço de água e sódio), à agregação plaquetária e à proteção da mucosa gástrica. A COX-2 normalmente presente no sistema nervoso central e no aparelho urogenital, é induzida durante o processo inflamatório se expressando nos macrófagos e outras células dos tecidos inflamados. Portanto a maior parte dos efeitos colaterais dos AINE, está relacionada a utilização de AINE não seletivos e de ação na COX-1, principalmente irritação gastrointestinal e alteração da hemostasia. Sua administração deve ser feita com extrema cautela em pacientes com patologias gastroduodenais, renais, ou com alteração da hemostasia. Os AINE, COX-2 seletivos, têm sido relacionados ao aumento da incidência de fenômenos tromboembólicos como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral, o que levou a retirada de alguns destes fármacos do mercado. Os AINE, no controle da dor pós-operatória, têm sido utilizados por via endovenosa devido ao caráter doloroso da via intramuscular e à dificuldade do emprego da via oral imediatamente após o ato operatório,quando o paciente ainda se encontra sonolento ou em jejum. No Brasil os AINE que podem ser utilizados via endovenosa se restringem ao cetoprofeno (100 a 300mg/dia diluídos em 100ml de solução isotônica), ao tenoxicam (20 a 40mg/dia)e ao cetarolaco (10-30mg/dia). Dipirona e Acetaminofeno Apesar da dipirona e do acetaminofeno serem as medicações analgésicas e antipiréticas mais populares, os seus mecanismos de ação permanecem controversos. Alguns estudos sugerem que a inibição da COX-2 possa explicar os efeitos farmacológicos da dipirona e do acetaminofeno Levy et al. demonstraram a redução de tromboxano no líquor humano após a utilização de dipirona, o que poderia explicar seu efeito analgésico e antipirético. Outros autores descreveram um terceiro tipo de COX (COX-3), presente principalmente no córtex cerebral, que é inibida seletivamente por drogas analgésicas e antipiréticas, como a dipirona e o acetaminofeno. Assim a inibição da COX-3 pode representar o mecanismo primário central da ação analgésica destas drogas. A dose recomendada de dipirona é de 15mg/kg a cada 6 horas e do acetaminofeno é de 12mg/kg a cada 4 a 6 horas. Opiáceos A ação analgésica deste grupo de fármacos se deve à ocupação de receptores mu, kappa e delta, reforçando a ação fisiológica das endorfinas e a das vias inibitórias noradrenérgicas e serotoninérgicas. Inibem, ainda, a liberação de neuromediadores da dor, como a substância P, e hiperpolarizam os neurônios aferentes do corno posterior da medula. A ação periférica dos opiáceos se explica através da ligação com receptores das terminações nervosas livres, ativos na presença de reação inflamatória. Na tentativa de dissociar a ação analgésica dos efeitos de depressão respiratória dos opiáceos, surgiram os agonistas parciais, dos quais se destacam a buprenorfina e os agonistas- antagonistas (agonistas kappa e antagonistas mu), como a pentazocina e a nalbufina. Na prática clínica a diminuição do potencial de depressão respiratória destas drogas se relaciona também à diminuição da potência analgésica. O tramadol é classificado como opióide por sua ação agonista sobre os receptores mu, mas apenas 30% de sua ação analgésica é revertida pela naloxona. Também atua sobre a inibição da recaptação de norepinefrina e serotonina e facilita a liberação pré-sináptica de serotonina. Sua potência analgésica é de 5 a 10 vezes menor que a da morfina, mas alguns estudos têm demonstrado uma eficácia semelhante, comparável a da morfina por via epidural, no controle da dor em cirurgias de grande porte. Na prática clínica a utilização do tramadol não tem sido associada à depressão respiratória, e apresenta um baixo potencial para o desenvolvimento de tolerância, dependência ou abuso. Como efeitos colaterais, os analgésicos opióides podem provocar sedação, náusea, vômitos, prurido, retenção urinária e constipação intestinal numa relação dose-dependente. Altas doses de opióides podem levar à depressão respiratória, apnéia, colapso circulatório e coma seguido de morte. Os opiáceos são efetivos no controle da dor e podem ser administrados praticamente por todas as vias e diferentes doses. A administração de opióides lipossolúveis via epidural, como o fentanil e o sufentanil, é controversa, uma vez que na prática clínica as doses necessárias por via epidural para analgesia se assemelham às doses endovenosas, provavelmente a ação via epidural se deva primeiramente a absorção sistêmica e subseqüente distribuição cerebral, e não por ação direta na medula espinhal. Portanto, a utilização de uma via de administração mais invasiva e de maior custo para o controle da dor não se justificaria. A meperidina possui lipossolubilidade intermediária, tendo sua ação analgésica mediada predominantemente pela medula espinhal quando utilizada a via epidural em pequenas doses, e teoricamente com menores efeitos colaterais quando comparada à morfina. A meperidina é metabolizada no fígado, formando a normeperidina, com importantes propriedades excitatórias no sistema nervoso central (SNC) e uma meia-vida longa, em torno de 15 horas, podendo chegar a 35 horas em pacientes com insuficiência renal. O aumento das concentrações plasmáticas de normepiridina limita o uso da meperidina por tempo prolongado ou em altas doses. Anestésicos locais Os anestésicos locais atuam sobre os canais de sódio das terminações nervosas, bloqueando a transmissão do estímulo nociceptivo. Sua utilização pode ser feita por diferentes vias e doses (subaracnóidea, peridural, perineural, intra-articular, interpleural, intercostal, inter-escalênica, infiltração da ferida cirurgica), com o objetivo de proporcionar somente analgesia, mantendo-se a sensibilidade táctil e a motricidade. O anestésico local deve ser empregado em baixas concentrações dando-se preferência a bupivacaína em aplicações intermitentes ou infusão contínua. A ropivacaína tem sido descrita como tendo menor ação sobre as fibras motoras (dissociação sensitivo-motora) e menor toxicidade cardiocirculatória em relação à bupivacaína racêmica, destacando- se como anestésico local para o controle da dor pósoperatória. Da mesma maneira, a levobupivacaína também possui uma menor cardiotoxicidade em relação à sua forma racêmica, com eficácia clínica similar. As restrições quanto ao uso exclusivo dos anestésicos locais para analgesia pós- operatória dizem respeito ao fenômeno de taquifilaxia que exige um aumento progressivo na dose utilizada, e aos efeitos indesejáveis de hipotensão arterial e de bloqueio motor quando utilizado em infusão contínua. A associação de opiáceos, clonidina, ou cetamina via espinhal ou endovenosa diminui estes fenômenos e proporciona uma melhor analgesia. Agonistas Alfa-2 Os receptores a2 estão localizados nas terminações pré-sinápticas das fibras simpáticas e sua estimulação inibe a produção e liberação da norepinefrina. No SNC os receptores a2 encontram-se no tronco cerebral e a ativação de seus núcleos resulta em sedação e anestesia. Também no tronco cerebral, a ação dos agonistas a2 ativa uma via inibitória descendente da medula espinhal, diminuindo o tônus simpático. Na medula espinhal estes receptores estão localizados no corno posterior e sua ativação inibe a transmissão da informação dolorosa, resultando em analgesia. A clonidina, agonista a2-adrenérgico, tem sido usado extensivamente em anestesiologia, inclusive na analgesia pós-operatória. Sua atividade analgésica foi inicialmente descrita em pacientes oncológicos que se tornaram tolerantes a morfina e tiveram sua dor atenuada após o emprego de clonidina por via peridural. A clonidina também pode ser administrada por via endovenosa, no entanto para a analgesia pós-operatória a utilização por via epidural ou epineural se mostrou mais efetiva. A dose recomendada, por via epidural, é de 1 a 8mg/kg em bolus ou 0,08 a 2mg/kg/h, ou ainda de 10 a 50mg/h. Seu uso isolado não produz analgesia adequada no pós-operatório e está associado à sedação intensa e hipotensão arterial. Por outro lado sua associação com opióides e anestésicos locais resulta numa diminuição do consumo de analgésicos. A utilização da clonidina com anestésicos locais, para bloqueio de nervos periféricos, proporciona maior duração de analgesia no pós-operatório, sem os efeitos colaterais indesejáveis da associação com opióides. Cetamina A cetamina em pequenas doses possui efeitos analgésicos, através de sua ação antagonista nos receptores Nmetil D-aspartato localizados no SNC, incluindo a medula espinhal. Previne a sensibilização do SNC em resposta à estimulação nociceptiva periférica. Isto explicaria sua prolongada ação analgésica, mesmo após uma dose única ou infusões contínuas por períodos curtos. A cetamina atua ainda sobre o sistema cardiovascular através do aumento de catecolaminas circulantes, o que resulta em elevação da frequência cardíaca e dapressão arterial. Apresenta ação direta sobre a musculatura lisa dos vasos, provocando vaso dilatação, sendo seu efeito sobre o miocárdio ainda discutível. Esta droga deprime pouco a ventilação através da diminuição da resposta respiratória ao CO2, mas normalmente observa-se a manutenção ou o aumento do volume minuto, da atividade da musculatura respiratória intercostal, e normalidade da capacidade residual funcional. A cetamina tem sido indicada em associação com anestésicos locais e opióides por via epidural ou com opióides por via endovenosa, potencializando a ação analgésica destas medicações. A utilização de cetamina intraoperatória chega a reduzir, em alguns casos, até 50% da necessidade de morfina no pós-operatório. Entretanto alguns estudos que avaliaram o emprego da cetamina na analgesia pós-operatória em cirurgias com extensas incisões e manipulações viscerais não demonstraram efetividade no controle da dor. As doses recomendadas de cetamina são de 0,15mg/ kg por via endovenosa em injeção única com o objetivo de prevenção de hiperalgesia, ou 1 a 2mg/kg/min por via endovenosa em infusão contínua, ou ainda 0,2mg-1,0mg/kg por via epidural. Neostigmine A neostigmina é um anticolinesterásico, portanto aumenta a concentração de acetilcolina nas sinapses nervosas, que por sua vez age em interneurônios colinérgicos e gabaérgicos do corno posterior da medula com efeito antinociceptivo, atuando sobre a liberação de norepinefrina, glicina e ácido gama-aminobutírico. Alguns estudos têm demonstrado sua ação analgésica quando administrada via epidural em doses de 50 a 60ìg ou de 5 a 10ìg/kg. Como efeito colateral mais evidente se observa a hipotensão. PCA (Patient Controlled-Analgesia) PCA é uma modalidade de controle de dor onde existe uma administração de analgésicos por demanda imediata do paciente em quantidade abundante, independente da via de administração e da droga utilizada. Isto diminui o tempo entre o aparecimento do sintoma e o alivio da dor. Habitualmente empregam-se as vias venosas e epidural, no entanto outras vias, como a subcutânea, têm se mostrado eficazes estando associadas a menor incidência de hipoxemia50. Embora qualquer analgésico possa ser administrado por esta técnica, os opióides são os agentes mais empregados. A infusão contínua de analgésicos facilita o controle e evita flutuações das concentrações plasmáticas com uma analgesia mais eficiente respeitando as diferenças individuais na necessidade de consumo de analgésicos. Atualmente, as modalidades de PCA mais utilizadas são aquelas com infusão em velocidade constante ou variável e administração sob demanda. Nos casos de velocidade variável existe um microprocessador que monitora a demanda e ajusta a velocidade de infusão. Independente do tipo de PCA existem variáveis básicas para sua utilização: dose inicial (quantidade de medicação necessária para se obter analgesia), intervalo mínimo entre as solicitações do paciente, velocidade de infusão basal e limites. A utilização de PCA implica em pessoal competente e treinado, pois se faz necessário uma adequada vigilância da qualidade analgésica e efeitos colaterais, principalmente sedação e depressão respiratória. Apesar do seu custo adicional, a PCA tem se tornado bastante popular devido ao grau de satisfação dos pacientes com a utilização desta modalidade.