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Clínica médica Complicações agudas da diabetes As complicações agudas hiperglicêmicas do paciente diabético, ainda representam um importante problema de saúde pública nas unidades de emergência, tanto em nosso meio como em âmbito mundial. Particularmente, a cetoacidose diabética tem sido registrada com frequência significativa e crescente na última década. Felizmente, as taxas de mortalidade relacionadas a essas complicações agudas diabéticas têm diminuído, e quando ocorrem, estão, geralmente, associadas a graves infecções generalizadas. A cetoacidose diabética (CAD) e o estado hiperglicêmico hiperosmolar (EHH) são duas das complicações agudas mais graves do diabetes. São 2 complicações extremas no espectro da hiperglicemia: CETOACIDOSE DIABÉTICA (CAD) Principal e mais grave complicação do DM1 mas pode ocorrer na DM2 Maior causa de mortalidade entre crianças e adultos jovens com DM1 A CAD se desenvolve em uma situação de deficiência insulínica grave ou absoluta, comumente associada a condições estressantes, que levam ao aumento dos hormônios contra-reguladores (forma fisiológica de compensar) como: Glucagon, Catecolaminas, Cortisol, Hormônio do crescimento (GH). Organismo tenta driblar a falta de insulina Deve-se lembrar que, normalmente, a cetogênese é bloqueada pela ação da insulina, mesmo quando esta se encontra em concentrações muito baixas. Por isso, a cetoacidose só ocorre quando a deficiência de insulina for absoluta (como no DM1) ou quando os níveis de hormônios contrarreguladores insulínicos (cortisol, GH, glucagon) forem extremamente elevados na presença de uma deficiência relativa de insulina (como no DM2, na vigência de intercorrências médicas graves – infarto, sepse etc.). O aumento da atividade cetogênica é um componente fisiopatológico marcante em tal situação Insulina: Hormônio Anabólico (assimilação/ incorporação Celular de substância para depósito), Captação da glicose para produção de glicogênio, Síntese proteica (no músculo), Lipogênese (produção de gordura para o armazenamento) Hormônios Contrarreguladores (fazem o catabolismo/quebra): Glucagon, cortisol, GH, catecolaminas, Catabolismo (Degradação), Lipólise(quebra das gorduras), Cetogênese nos hepatócitos (cetonas como combustível), Glicogenólise (hepática e muscular) Em pacientes com DM1 acha que não entra glicose na célula por algum motivo e não por falta de insulina, assim o corpo estimula os hormônios contra-reguladores · Fatores precipitantes (que podem piorar) DM1 de início recente (quando não sabem que são diabéticas, crianças) Infecção (geralmente pneumonia ou infecção do trato urinário), onde se tem que aumentar a quantidade de insulina pois se desenvolve uma resistência a ação da insulina e o aumento de hormônios contrarreguladores Parada ou diminuição da dose de insulina ou obstrução do catéter da bomba de insulina (faz pulsos de insulina para conseguir equilibrar e não ficar com a glicose muito alta) Estresse cirúrgico ou emocional (que aumenta o cortisol que pode levar a crise) Endocrinopatias que causem hiperfunção (acromegalia, tireotoxicose, Síndrome de Cushing) provocam uma demanda maior de insulina Uso de fármacos que causam hiperglicemia como: corticóide (pode aumentar os níveis glicêmicos e levar o paciente a cetoacidose), diuréticos tiazídicos e antipsicóticos, uso dos inibidores de SGLT2 (off-label no DM1) as vezes a pessoa diminui a quantidade de insulina achando que está boa devido a esse medicamento levando cetoacidose Uso de drogas: cocaína (aumento de catecolaminas) Alguns pacientes com diabetes tipos 2 que sofrem algo grave como um AVC grande por exemplo, pode provocar uma diminuição da produção de insulina que pode levar ao quadro · Fisiopatologia O principal distúrbio hormonal causador da CAD é a deficiência de insulina associada ao aumento do glucagon (principal hormônio) Quando ocorre diminuição da insulina e concomitante aumento dos hormônios hiperglicêmicos(contrarreguladores), ocorre a ativação da lipase (enzima) no tecido adiposo (age principalmente nos triglicérides) pela falta da ação inibitória da insulina na lipase A lipase vai atuar nos triglicerídeos, causando sua degradação em ácidos graxos e glicerol vão até o fígado Há um aumento de ácidos graxos no fígado e lá sofrem beta oxidação e resultando em grande quantidade de acetil-CoA (acetil coenzima A) no fígado Essa grande quantidade de acetil-CoA, não é utilizada totalmente pelo ciclo de Krebs e acaba sendo desviada para produção de 2 ácidos fortes: Beta OH-Butírico e Acetoacético Esses 2 ácidos fortes se transformam em cetonas Como os corpos cetônicos (ácido acetoacético, ácido beta-hidroxibutírico e acetona) são ácidos orgânicos, seu acúmulo vai determinar acidose metabólica com aumento do ânion-gap (normoclorêmica). Ocorre também (de forma simultânea), uma proteólise dos músculos, quebrando a proteína em aminoácidos, que chegam ao fígado e são utilizados para formação de glicose (neoglicogênese) A diminuição da insulina provoca menor captação da glicose pelos tecidos, que associada a produção excessiva de glicose pelo fígado (glicogenólise-glicogênio em glicose), resulta em hiperglicemia A Hiperglicemia causa os sintomas de pólis · Quadro clínico Poliúria e polidipsia, polifagia Náuseas e vômitos (que se persistem piora a desidratação), normalmente relacionados a desidratação Desconforto abdominal Respiração de Kussmaul (respiração acidótica): respiração ampla e acelerada) Hálito cetônico (‘esmalte/acetona’) Desidratação Turgor diminuído na pele Taquicardia Hipotensão Hipotermia (até 34oC). Sinal de mal prognóstico Febre=infecção Nível de consciência: desde alerta (50%) até comatoso (10%) em mais graves · Apresentação clínica Evolução: CAD em 24 horas normalmente já está no hospital Primeiros sintomas são poliúria, polidipsia e perda de peso (pela desidratação e quebra de gordura) Progressão para sintomas neurológicos (letargia, sinais focais, obnubilação e coma) #Hiperventilação e dor abdominal -Dor abdominal na CAD: refere a gravidade da cetoacidose (quando tem é porque está grave) Sintomas do TGI = Mais comuns em crianças Associada à gravidade da acidose metabólica, mas não com a de hiperglicemia ou desidratação Possíveis causas: Retardo no esvaziamento gástrico e íleo induzido pela acidose e Pancreatite (pode não estar com pancreatite como crianças) · Exame físico Sinais de depleção de volume são comuns (↓ turgor cutâneo, axilas secas e mucosa oral (língua – rugosa), ↓pressão venosa jugular, taquicardia e hipotensão) Na CAD promove um odor frutado (semelhante do removedor de esmalte de unha) e hiperventilação compensatória (respiração de Kussmaul). · Exames laboratoriais Glicemia Eletrólitos séricos (com cálculo do Anion Gap – quando elevado a chance é grande de dar cetoacidose), Ureia e creatinina Hemograma (normal ter uma leve leucocitose e não ser infecção) Cetonas urinárias e séricas Osmolaridade plasmática Gasometria arterial Rx de tórax (para ver não tem pneumonia...) Eletrocardiograma -Anion Gap: Fórmula: Na-( Cl+ HCO3) Valor normal: 7-9 mEq/l Na CAD o Anion Gap está elevado (geralmente maior que 10 mEq/l) Faz o diagnóstico diferencial das acidoses metabólicas Testes adicionais – Individualizar caso a caso: Urocultura (suspeita de infecção de urina), Cultura de escarro (tuberculose...), Hemocultura (infecção mas não sabe qual o agente – bactéria), Lipase e amilase (pancreatite), RX de tórax · Avaliação diagnóstica Corpos cetônicos: podem ser dosados no sangue ou na urina e geralmente se encontram bastante elevados Gasometria: Revela acidose metabólica (PH e HCO3 diminuídos) com alcalose respiratória (Pco2 diminuído). Os cetoácidos são tamponados pelo bicarbonato que se encontra depletado (diminuído) Teste de nitroprussiato: Cor púrpura na presença de ácido acetoacético (e, em menor grau, acetona). Teste da vareta de urina (Acetest) ou bastões de reagentes (Ketostix) · Diagnóstico Não é uma glicemia tão elevada · Avaliação diagnóstica Medição direta de beta-hidroxibutirato sérico (geralmenteé difícil no hospital) Acidose metabólica de ânion gap elevado Osmolaridade Plasmática (inalterada normalmente) Osm = [2 x Na (mEq / L)] + [glicose (mg / dL) ÷ 18] Osmolaridade normal é 300 mOsm/l Glicemia- geralmente é inferior a 800 mg/dL HbA1c (hemoglobina glicosilada): episódio agudo (DM não diagnosticado) vs. DM mal controlado. Para saber se estava com mal controle ou não sabia que era diabetes e acabou de diagnosticar. Virá normal (aguda) Sódio sérico –Diminuído, normal ou aumentado Potássio-usualmente normal, em cerca de 1/3 dos casos aumentada (normalmente fica dentro da célula quando se tem acidose o potássio sai da célula e entra o H+, quando se dosar o potássio pode ser medido erroneamente) #Lembrar que a terapia com insulina reduz e transfere o K+ para as células. Isso pode causar hipocalemia grave. Fósforo: Os níveis na admissão são normais ou elevados, não refletindo o déficit corporal existente, devido a saída do P do intra para o extracelular Amilase e lipase sérica: pode elevar em 20-79% (mesmo sem ter pancreatite). Podem estar elevadas, porém sem evidências clínicas/radiológicas. As vezes a amilase está alta devido a interferência da salivar ou pela desidratação A pancreatite aguda pode precipitar ou complicar a CAD. Mecanismos propostos: A fonte inespecífica da amilase é frequentemente salivar e da lipase não é conhecida *Hemograma: Contagem de leucócitos entre 10.000-15.000 na admissão. Uma leucocitose > 25.000 sugere processo infeccioso (sintoma de febre, prostração) *Urina I-Rastrear infecção, glicosúria e cetonuria Triglicérides costumam estar muito elevados CAD – Tríade 1) Hiperglicemia (entre 300-350 mg/dL). 2) Acidose metabólica com ânion gap aumentado (principal achado). 3) Cetonemia: Leve, moderada ou grave. · Tratamento Os quadros de hiperglicemia com cetose, mas sem acidose (pH >7,3), conhecidos como cetose diabética, podem ser tratados com hidratação e insulina suplementar, com reversão em poucas horas, geralmente não necessitando de internação. O objetivo é: 1-Reposição volêmica 2-Correção dos distúrbios metabólicos 3-Correção dos distúrbios eletrolíticos 4-Detecção e tratamento dos fatores precipitantes 1-Reposição endovenosa de líquidos Iniciada com solução (soro fisiológico) salina isotônica (NaCl 0,9%) A taxa ideal de infusão: Choque hipovolêmico = Mais rápido. Hipovolemia sem choque (e sem IC) = = 15 a 20 mL/kg (~ 1000 mL/hora) nas primeiras 2h = Após estabilização clínica, 10 a 14 mL/kg/ hora (250-500 ml/hora) *2ª-3ª hora = Avaliar estado de hidratação, eletrólitos e débito urinário. Verificar de novo a mucosa, frequência cardíaca... Quando a glicemia baixar para <250mg/dL, deve-se associar a glicose as soluções de hidratação (na concentração de 5 – 10%). Isso diminui a incidência de complicações da terapêutica, como hipoglicemia e edema cerebral. -Correção de Sódio: Concentração de Na pode ser falseada pela hiperglicemia Na corrigido= Na encontrado+ 0,016 X (glicemia sérica-100) Se Sódio > 135 mEq/l = Iniciar soro ao meio, com soro fisiológico 0,45%. Não se pode fazer reposição com o soro 0,9% (joga metade fora e coloca metade de aguda destilada para ficar 0,45) Se sódio < 135 mEq/l = Repor soro fisiológico 0,9% Concentração de Na+ "corrigida" para o grau de hiperglicemia: -Correção de Potássio: Antes de dar insulina fazer a reposição de potássio e sódio. Se der insulina antes de repor potássio se pode fazer uma iatrogenia Fazer K estimado K estimado= K encontrado-( 6x7,3-PHencontrado) 2-Insulina: Infusão contínua EV/IV de insulina regular Dose inicial de 0,1U/kg/peso em Bôlus e depois manter infusão de 0,1U/kg/hora Insulina Ultra-rápida podem ser dadas por via IM ou SC, se paciente não tiver em choque. Glicemia capilar de 1/1 hora Glicemia capilar deve cair 50-70 mg/dl/hora Quando glicemia = 200 mg/dl, reduzir a infusão de insulina para 0,02-0,05U/kg/hora (indica melhora do quadro e pode gerar hipoglicemia se não diminuir) Adicionamos dextrose (soro glicosado) quando a glicose diminui para 200 mg/dL Manter glicemia entre 150-200 mg/dl -Correção da acidose/reposição de bicarbonato: Só se repõe bicarbonato em acidoses muito graves Desvantagens da utilização de bicarbonato: Indução de hipocalemia (extracelular sem potássio), “Acidose paradoxal” no SNC, Alcalose Metabólica (rebote), Aumento da afinidade da Hb pelo Oxigênio (problema na oxigenação), Piora da acidose intracelular -Resolução: Glicemia < 200 mg/dl, Normalização do ânion gap (< 12 mEq/L), Normalização dos níveis sanguíneos de beta-hidroxibutirato < 1,5 mmol/L, Normalização do pH venoso (> 7,3), Normalização do BIC (≥ 15 mEq/L) · Complicações Hipoglicemia durante o tratamento Hiperglicemia pela interrupção da insulina EV/IV sem cobertura adequada com insulina SC (quando tirada de uma vez) Hipopotassemia Edema cerebral pelo excesso de hidratação e correção muito rápida da osmolaridade plasmática Congestão e anasarca Hipoxemia Síndrome da angústia respiratória aguda (SARA) IRA, pela desidratação ESTADO HIPERGLICÊMICO HIPEROSMOLAR O estado hiperglicêmico hiperosmolar (EHH) é uma complicação aguda grave que ocorre geralmente em adultos com DM2 Ocorre mais em idosos Desidratação grave (mais do que na cetoacidose), ausência de cetonúria, níveis glicêmicos muito elevados, sinais e sintomas neurológicos Alta taxa de letalidade A maioria dos pacientes que desenvolve EHH tem múltiplas comorbidades (sequela de AVC, insufi ciência renal etc.) · Fatores precipitantes 1-Infecção (pneumonia e ITU) 2-Fármacos hiperglicemiantes 3-IAM 4-Acidente Vascular cerebral (AVC) 5-Pancreatite 6-Endocrinopatias de hiperfunção · Fisiopatologia Sintomas de Pólis e desidratação intensa No EHH, a deficiência de insulina costuma ser parcial (moderada), sendo a concentração plasmática de insulina suficiente para bloquear a lipólise exagerada e a síntese hepática de corpos cetônicos, mas não para manter a glicemia normal Ausência de cetoacidose Níveis glicêmicos muito altos (glicemia maior que 600 – no aparelho – hi) Hiperosmolaridade (acima de 300) Alteração no nível de consciência A insulina impede a lipólise e o surgimento de acidose e cetose Hiperglicemia resulta na incapacidade de eliminação de glicose renal, que se encontra no espaço extracelular contraído pela intensa desidratação Déficit hídrico de cerca de 10 L ou mais (repor mais devagar por ser idoso) Não faz cetogênese poia já tem um pouco de insulina, mas há quebra de glicogênio tanto no musculo quanto no fígado · Diagnóstico · Apresentação clínica Evolução: EHH insidiosa por vários dias. Primeiros sintomas são poliúria, polidipsia e perda de peso. Progressão com sintomas neurológicos (letargia, sinais focais, obnubilação e coma). EHH: sintomas neurológicos são mais comuns (↑ Osm). · Tratamento O tratamento do EHH, a exemplo da CAD, também inclui os 3 pilares: hidratação IV (abundante), reposição de potássio e insulinoterapia (no EHH, sempre IV). 1-Hidratação: O grau de desidratação do EHH é mais intenso que na CAD Necessidade de reposição de 8-10 L de água Adequar a hidratação para cada paciente avaliando os parâmetros cardiorrespiratórios e renais A hidratação é parecida com o protocolo de CAD, a diferença é que quando a glicemia chegar ao redor de 300 mg/dl, deve-se instalar o soro de NaCl a 0,45% com 5% de glicose (desidratação mais grave). Provavelmente vai estar com sódio elevado Insulina-semelhante a da CAD, com a diferença de diminuir a infusão para 0,02-0,05U/kg/h, quando a glicemia atingir 300 mg/dl Melhora do estado de consciência e da osmolaridade plasmática sinalizam a resolução do EHH Reposição de KCl é idêntica a CAD Não de repõe HCO3 (pois só é feita em casos graves e aqui não tem) Critérios para a resolução: A insulinoterapia intensiva, a hidratação e a reposição de potássio devem ser mantidas, no EHH, até que o paciente atinja as metas de tratamento · Complicações Hipocalemia, hiponatremia e hipoglicemia são mais comuns no EHH do que na CAD, por isso a monitorização laboratorial dessas complicações deve ser realizadade forma intensiva, e cuidados devem ser tomados para prevenção das mesmas, conforme os protocolos de tratamento apresentados. Insuficiência renal aguda (pré-renal ou renal, por necrose tubular aguda e/ou rabdomiólise) Eventos trombóticos (trombose de veias profundas, tromboembolia pulmonar) são mais frequentes no EHH
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