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Resfriado comum - Rinofaringite

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RINOFARINGITES VIRAIS 
A nasofaringite viral ou resfriado comum é a desordem infecciosa mais comum da infância, de 
natureza benigna e autolimitada. A definição anatômica de resfriado comum é de uma nasofaringite (ou 
rinofaringite) de etiologia viral que leva à inflamação da mucosa do nariz, faringe e seios paranasais. O 
resfriado comum predispõe a criança a complicações bacterianas, como a otite média aguda e a sinusite. A 
faringite bacteriana, por sua vez, não é uma complicação do resfriado comum. 
OBSERVAÇÃO: É importante que esteja clara a diferença entre resfriado e gripe erroneamente usados como 
sinônimos nosológicos entre os leigos. A gripe é uma doença sistêmica epidêmica causada pelo vírus influenza, 
caracterizada clinicamente por febre alta, mialgias e prostração. No resfriado, os sinais e sintomas são 
mais restritos às vias aéreas superiores. 
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA 
As crianças pequenas possuem a média de seis a oito episódios de resfriados comuns por ano (10-15% 
delas chegam a ter doze episódios de resfriado/ano), ao passo que os adultos apresentam cerca de dois a 
três episódios/ano. Tais cifras explicam por que tais infecções são as campeãs de absenteísmo ao trabalho e 
à escola. 
Não obstante, as crianças do grupo de alto risco de IVAs (ex.: irmão mais velho que frequenta escola, 
convivência em creche, pais fumantes) podem ter até nove/dez resfriados por ano. Felizmente a incidência 
da doença declina após os três anos de vida. 
Os períodos do ano de maior incidência são: outono, inverno e primavera. A sazonalidade depende do 
agente, por exemplo: rinovírus – início do outono e final da primavera; influenza e VSR – inverno; parainfluenza 
– final do outono; cocksackievírus – verão (“resfriado do verão”). 
O agente etiológico mais frequente é o rinovírus, que responde 
por metade ou mais dos casos. A imunidade adquirida contra este 
agente pode ser duradoura. Porém não há imunidade cruzada 
entre os sorotipos e, infelizmente, são conhecidos cerca de 100 
sorotipos, o que na prática se traduz por mais de um episódio de 
resfriado em uma mesma criança ou adulto durante o ano. 
O coronavírus, vírus sincicial respiratório e metapneumovírus 
são agentes ocasionais. Os vírus influenza, parainfluenza, 
adenovírus, enterovírus e bocavírus são agentes possíveis, mas 
incomuns. O principal dado epidemiológico para a aquisição do 
resfriado comum é o contato com pessoas doentes. 
O rinovírus e o coronavírus são agentes típicos de vias aéreas superiores, causando bronquite e 
pneumonia apenas raramente. Os demais vírus são agentes clássicos das infecções de vias aéreas inferiores, 
por exemplo: pneumonia viral (vírus sincicial respiratório, influenza A e B, parainfluenza e adenovírus) e 
bronquiolite (vírus sincicial respiratório, parainfluenza, adenovírus e metapneumovírus). O período de 
incubação dos agentes que mais comumente causam a nasofaringite viral gira em torno de dois a cinco dias. 
As crianças são os maiores reservatórios para os vírus e geralmente propagam e adquirem a infecção 
em creches e escolas. Os vírus são transmitidos sob a forma de aerossol e partículas maiores, que são 
levados ao meio ambiente através de tosse e coriza de crianças afetadas e, principalmente, por contato 
com mãos e objetos (fômites) que contenham secreções infectadas. O doente passa a mão no nariz com 
coriza e toca na mão de outra pessoa que, por sua vez, leva o vírus ao seu nariz, ou aos seus olhos, 
estabelecendo assim o ciclo de contaminação. 
Portanto, não se esqueça deste conceito: a principal forma de transmissão dos vírus causadores do 
resfriado, principalmente o rinovírus e VSR, é o contato direto, e não a via inalatória como pode parecer à 
primeira vista. Por outro lado, a via inalatória é mais importante para o vírus influenza, que se dissemina 
principalmente através de pequenas partículas de aerossol. Mas este é um agente incomum no grupo das 
etiologias das rinofaringites e, por isso, sua via de transmissão tem menor importância clínica. 
PATOGÊNESE 
Os vírus invadem as células epiteliais colunares ciliadas das vias aéreas superiores, promovendo uma 
resposta inflamatória local. A bradicinina é um importante mediador, porém a histamina não parece ter um 
papel significativo. A mucosa torna-se congesta (edemaciada, eritematosa) por vasodilatação, enquanto a 
produção de muco exacerba-se. 
As citoquinas atraem neutrófilos (PMN) para o local, explicando a coriza purulenta, mesmo na ausência de 
superinfecção bacteriana. A rinorreia e a tosse resultam de estimulação de fibras colinérgicas locais. A 
lesão dos cílios do epitélio dificulta a limpeza adequada das secreções. A dor de garganta e a sensação 
de “garganta arranhando” são ocasionadas por lesão direta do epitélio da nasofaringe pelo vírus. 
O rinovírus não provoca destruição celular, ao passo que os vírus influenza e adenovírus já o fazem. 
Dentro de 24 horas após o início da infecção, uma IgA específica encontra-se presente nas secreções e, 
após uma semana, anticorpos das classes IgG e IgM contra o vírus são encontrados no soro, conferindo 
imunidade, principalmente para o sorotipo de rinovírus responsável pelo quadro clínico. 
O vírus influenza apresenta alta capacidade automutagênica e, por isso, mesmo o desenvolvimento de 
imunidade específica não é suficiente para prevenir novas infecções. A infecção por parainfluenza e o VSR 
não conferem imunidade específica. 
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 
O período de incubação é de um a três dias. Inicia-se com uma sensação de garganta “arranhando”, 
de duração máxima de três dias, evolui com espirros, obstrução nasal e rinorreia. A coriza (rinorreia) e a 
obstrução nasal (congestão dos cornetos) estão sempre presentes, definindo clinicamente a síndrome da 
nasofaringite. A coriza é abundante, sendo clara nos primeiros três dias, mas frequentemente se torna 
purulenta nos últimos dias. Esta modificação na cor da secreção de maneira alguma deve ser interpretada 
como resultado de infecção bacteriana secundária, refletindo apenas a descamação epitelial e a presença de 
polimorfonucleares. 
A obstrução nasal piora à noite (posição deitada) e prejudica muito a alimentação dos lactentes, 
que são respiradores nasais preferenciais. Os vírus influenza, VSR e adenovírus podem cursar com sintomas 
gerais como febre e mialgias. A ocorrência desses sintomas é incomum quando a síndrome é causada por 
rinovírus. A tosse surge em 30% dos casos, observada principalmente durante o sono, devido ao gotejamento 
pós-nasal. Nessa situação, o decúbito dorsal faz com que as secreções “pinguem” nas vias aéreas posteriores 
e promovam tosse. 
A duração média do resfriado comum é de uma semana, e apenas 10% dos casos mantêm clínica por 
duas semanas. A febre pode ser alta. Cerca de 59% dos afetados apresentam temperatura axilar superior 
a 39ºC, e, por isso, a febre não deve ser um sinal clínico usado isoladamente na diferenciação entre uma 
infecção viral e bacteriana. Em lactentes, algumas vezes observamos 
um período prodrômico caracterizado por anorexia, inquietude, 
amolecimento das fezes e vômitos. 
A rinoscopia anterior demonstra edema e hiperemia dos 
cornetos e da mesma forma, pode-se observar discreta hiperemia de 
orofaringe. A otite média aguda é a principal complicação bacteriana 
do resfriado comum, podendo estar presente em até 30% dos casos. Geralmente as crianças acometidas 
apresentam uma mudança na gravidade da doença e passam a apresentar febre alta, irritabilidade e dor 
de ouvido. A sinusite e a pneumonia são complicações bacterianas menos comuns. Uma crise de asma brônquica 
pode ser deflagrada ou agravada pela infecção viral. 
DIAGNÓSTICO 
A avaliação laboratorial com hemograma, VHS, cultura e isolamento de vírus de secreções de orofaringe 
ou nasais não é necessária, sendo o diagnóstico clínico. Os principais diagnósticos diferenciais são com: 
• Rinite alérgica: em quepredominam sintomas de espirros e prurido nasal recorrentes e deflagrados 
por alérgenos ambientais; 
• Corpo estranho no nariz: secreção nasal é unilateral e fétida; muitas vezes sanguinolenta; 
• Sinusite: presença de febre, cefaleia, edema periorbitário, rinorreia persistente ou tosse > 14 dias; 
• Coqueluche: tosse proeminente e persistente; 
• Sífilis congênita: rinorreia serossanguinolenta persistente com início entre um e três meses de vida. 
 
TRATAMENTO 
A terapia deve ser dirigida para as queixas e os sintomas apresentados. 
• Antitérmicos: Uso com cautela, sendo recomendado na presença de temperatura axilar superior a 
38ºC. Isso porque o tratamento agressivo da febre em infecções por rinovírus e VSR pode aumentar 
o tempo de excreção viral. O acetaminofen e a dipirona podem ser utilizados. O ácido acetilsalicílico 
não é recomendado por causa de sua associação com a síndrome de Reye nas infecções por influenza. 
O Ministério da Saúde recomenda para tratamento da febre o paracetamol na dose de 1 gota/kg/dose 
6/6 horas e a dipirona na dose de 1 gota/2 kg/dose 6/6 horas. 
• Instilação de soluções salinas isotônicas nas narinas, uso de vaporizadores e uma boa hidratação 
são medidas úteis para fluidificar as secreções. Em casos de pais tabagistas, a exposição ambiental à 
fumaça de cigarro deve ser evitada ao máximo. 
Os pais devem ser orientados quanto aos sinais de gravidade, retornando para reavaliação dentro de 
48h. Atualmente, sabemos que os anti-histamínicos e a administração de ácido ascórbico não influenciam a 
evolução de um episódio de nasofaringite viral, assim como a administração de descongestionantes, mucolíticos 
e expectorantes. 
O Ministério da Saúde não recomenda o uso de anti-histamínicos e descongestionantes nasais de 
administração tópica e/ou oral para crianças menores de dois anos. 
Em relação aos antivirais, a ribavirina é aprovada para o tratamento do vírus sincicial respiratório, mas seu 
uso no resfriado comum não tem eficácia. Os inibidores da neuraminidase (Oseltamivir e Zanamivir) têm uma 
modesta redução na duração dos sintomas e redução na evolução para otite média nos casos provocados pelo 
vírus influenza. Grandes obstáculos à sua utilização são a dificuldade de se fazer a distinção etiológica entre 
os diversos vírus causadores do resfriado e a necessidade de administração precoce, preferencialmente nas 
primeiras 48h dos sintomas. 
A medida preventiva mais eficaz contra o resfriado é lavagem frequente das mãos ou pelo menos após 
o contato direto com algum suspeito de resfriado ou gripe. 
IMUNIZAÇÃO 
Não existe vacina contra o rinovírus, o principal agente etiológico do resfriado comum, mas existe 
proteção vacinal contra o vírus influenza. A vacina anti-influenza faz parte do calendário básico vacinal do 
Ministério da Saúde, devendo ser administrada anualmente para crianças de seis meses a quatro anos e 
onze meses. 
Vale ainda lembrar que, de acordo com o Ministério da Saúde, os idosos com idade igual ou superior a 
60 anos também deverão receber a vacina anti-influenza anual.

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