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LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO JUVENIL Introdução Lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) é uma doença autoimune sistêmica, caracterizada por envolvimento concomitante ou evolutivo de vários órgãos e sistemas (particularmente cutâneo, articular, renal, cardiopulmonar, hematológico e neuropsiquiátrico) em um mesmo paciente. Na faixa etária pediátrica, as manifestações do LES são imprevisíveis, e as principais características dessa doença crônica são a grande variabilidade das manifestações clínicas e a produção de múltiplos autoanticorpos. Desconhecida Combinação de vários fatores com pacientes predispostos ETIOPATOGENIA LESJ É caracterizada por perda da tolerância imunológica a vários autoantígenos e pela consequente formação de Imunocomplexos EPIDEMIOLOGIA Estima-se que de 15 a 20% dos casos de LES têm início durante a infância ou adolescência (início até 18 anos de idade), sendo essa população considerada como LES juvenil (LESJ). A doença pode ser diagnosticada em qualquer idade, mesmo durante o 1º mês de vida. No LESJ, há predileção pelo sexo feminino em todas as faixas etárias pediátricas. Diagnóstico O LESJ mais frequentemente apresenta-se com a forma aguda da doença, com vários órgãos e sistemas simultaneamente acometidos ao diagnóstico (particularmente envolvimentos renal, neuropsiquiátrico, pulmonar e hematológico). O LESJ tem curso clínico evolutivo mais agressivo e maior frequência de infecções em comparação com as populações de adultos com LES. Diagnóstico Manifestações clínicas, exames laboratoriais e sorológicos, biópsias ou outros procedimentos de diagnóstico. O diagnóstico de LESJ realizado de acordo com os critérios de classificação do Colégio Americano de Reumatologia. Para o diagnóstico de LESJ, é necessária a presença de 4 ou mais dos 11 critérios, simultânea ou evolutivamente, durante qualquer intervalo de tempo. Critérios Colégio Americano de Reumatologia 1- Eritema malar 2- Eritema Discoide 3- Fotossensibilidade 4- úlceras de mucosa 5- Artrite não erosiva 6- Serosite(pleurite ou pericardite) 7- Doença renal 8-Doença neuropsiquiátrica 9-Doença hematológica 10-Alterações imunológicas 11- Fator antinuclear FAN positivo Tratamento Deve ser individualizado Objetivando controle inflamatório da doença, prevenir danos e proporcionar melhor qualidade de vida Glicocorticoides Antimaláricos Imunossupressores e agentes biológicos para atividade de doença Outros fármacos a depender das manifestações e evolução do comprometimento em outros órgãos Uso de protetor solar diário Estímulo de atividade física leve a moderada CASO 1 Paciente do sexo feminino, 7 anos, raça branca, natural e procedente de Salvador/BA, procurou o serviço de emergência. A mãe referiu dor intensa e inchaço nos joelhos há cerca de 15 dias. A dor e o edema impediam a criança de brincar e de deambular. As manifestações articulares evidenciadas na paciente foram associadas com manchas elevadas, vermelhas, indolores e não pruriginosas. Essas lesões cutâneas eram fixas e localizavam-se em nádegas, pernas e coxas. CASO 1 História médica anterior paciente nascida a termo, parto vaginal, com 38 semanas, peso ao nascer de 3,9kg; evoluiu no período neonatal sem intercorrências e teve alta do berçário no segundo dia de vida; condições habitacionais e de higiene adequadas; alimentação exclusiva com leite materno até 6 meses de idade, tendo iniciado com dieta variada após esse período; vacinação em dia; história familiar de artrite reumatoide (avô materno) e sem história pessoal de doenças prévias. Exame físico da admissão no pronto-socorro: regular estado geral, hidratada, afebril (temperatura axilar 37°C), corada, eupneica, anictérica, acianótica; frequência cardíaca (FC): 80bpm; frequência respiratória (FR): 20ipm; pressão arterial (PA): 100 x 60mmHg; peso 22,5kg (percentil 50%); altura 123cm (percentil 50%); adenomegalias de 0,5 a 1cm de diâmetro, indolores, consistência fibroelástica, localizadas em regiões cervical, axilar, inguinal; cutaneomucoso: lesões purpúricas palpáveis que não desapareciam à digitopressão, cor eritemato-violácea, indolores, sem prurido e localizadas em nádegas, pernas e coxas; Exame físico da admissão no pronto-socorro: apresentava úlceras dolorosas em mucosas oral e nasal; aparelho respiratório normal; aparelho cardiovascular com bulhas rítmicas normofonéticas sem sopros, pulsos periféricos simétricos e palpáveis; abdome: fígado a 3cm do rebordo costal direito, com consistência elástica, e baço a 3cm do rebordo costal esquerdo, com consistência elástica; osteoarticular: claudicação ao exame, dor e edema em joelhos; músculos: sem mialgia, e força muscular normal; extremidades: boa perfusão; neurológico: sensibilidade normal, reflexos normais. EXAMES COMPLEMENTARES hemograma completo: hemoglobina 12g/dL, hematócrito 32%, contagem de leucócitos 3.800/mm (neutrófilos 78%, linfócitos 20% e monócitos 2%), plaquetas 282.000/mm ; velocidade de hemossedimentação (VHS): 55mm/1ª hora; proteína C-reativa (PCR): 92mg/L; urina tipo I: sedimento evidenciando hemácias (500 por campo), proteínas (0,7g) e cilindros; hemáticos e granulares; proteinúria de 24 horas: 0,7g; ureia e creatinina: normais. Conduta A paciente do caso clínico 1 foi diagnosticada como púrpura de Henoch-Schönlein e recebeu os seguintes tratamentos na hospitalização do pronto-socorro: naproxeno* 15mg/kg/dia de 12 em 12 horas; ranitidina* 5mg/kg/dia de 12 em 12 horas. EVOLUÇÃO CASO 1 Durante a hospitalização, a paciente evoluiu com adinamia, fadiga, alopecia difusa e edema em membros inferiores. Os resultados de alguns exames foram disponíveis apenas no 3º dia de hospitalização: FAN positivo (título 1/360, padrão pontilhado fino); anticorpos anti-DNA de dupla hélice positivo; fator reumatoide negativo; anticorpos anti-Sm, anti-Ro/SSA, anti-La/SSB e anti-RNP foram negativos; anticorpos antifosfolípides: anticorpo anticardiolipina (IgM e IgG) e anticoagulante lúpico negativos; complemento sérico (frações C3, C4 e CH50) normal. O diagnóstico de LESJ foi confirmado para o caso clínico 1: a paciente preencheu mais de quatro dos critérios clínicos de classificação do Colégio Americano de Reumatologia, pois apresentava artrite, alteração hematológica (leucopenia e linfopenia), nefrite (cilindrúria e proteinúria > 0,5g/dia), FAN positivo e anticorpos anti-DNA de dupla hélice positivos EVOLUÇÃO CASO 1 No 7º dia de hospitalização, a paciente manteve urina tipo I (sedimento evidenciando hemácias [700 por campo], proteínas [0,8g] e cilindros granulares) e proteinúria de 0,9g/24 horas, sendo submetida a uma biopsia renal por agulha guiada por ultrassonografia (US) renal. A histologia renal evidenciou glomerulonefrite proliferativa mesangial, com depósitos glomerulares de IgA, IgG, IgM, C3 e C4. PRESCRIÇÃO CASO 1 após o diagnóstico de LESJ, foram iniciadas doses moderadas de prednisona* (1mg/kg/dia de 12 em 12 horas) e hidroxicloroquina* (5mg/kg/dia, dose única), havendo melhora progressiva da artrite e das alterações hematológicas (leucopenia e linfopenia); com um mês de seguimento ambulatorial, houve manutenção das alterações urinárias secundárias a glomerulonefrite proliferativa mesangial (cilindrúria e proteinúria 0,9g/dia). Nesse momento, foi associada azatioprina (2mg/kg/dia) e mantida hidroxicloroquina*. A prednisona* (1mg/kg/dia) foi modificada para dose única diária (8h); em todas as consultas, foram reforçadas adesão aos fármacos e uso diário de bloqueador solar (com fator de proteção acima de 30); nas consultas ambulatoriais subsequentes, a prednisona* foi progressivamente reduzida para 5mg/dia no 6º mês e suspensa no 8º mês de tratamento, para minimizar eventos adversos relacionados ao glicocorticoide; nos dois anos seguintes, a azatioprina e a hidroxicloroquina* foram mantidas. A paciente manteve-se em remissão clínica e laboratorial da doença. CASO 2 Paciente do sexo masculino, 12 anos, raça negra, natural e procedente da cidade de São Paulo. O pai referiu manchavermelha na face e no pescoço, que piorou após a exposição solar, associada a vermelhão intenso nas mãos e nos pés há seis meses. O paciente perdeu 2kg nos últimos dois meses. Há um mês, está com febre intermitente (variando de 38 a 39°C), anorexia e fadiga. História médica anterior: paciente nascido a termo, parto vaginal, com 39 semanas, peso ao nascer de 3,1kg; evoluiu no período neonatal sem intercorrências e teve alta do berçário no terceiro dia de vida; condições habitacionais e de higiene adequadas; alimentação exclusiva com leite materno até 4 meses de idade, tendo iniciado com dieta variada após esse período; vacinação em dia; sem história pessoal de doenças prévias e doenças autoimunes na família. Exame físico da admissão na enfermaria pediátrica: estado geral regular, descorado (3+/4+), hidratado, febril (temperatura axilar 39°C), eupneico, anictérico, acianótico; FC: 130bpm; FR: 24ipm; PA: 110 x 60mmHg; peso: 42,5kg (percentil de 50 a 75%); altura: 155cm (percentil 75%); estadiamento puberal de Tanner: genitália (G2) e pelos pubianos (P2); sem adenomegalias; cutaneomucoso: normal; aparelho respiratório: normal; aparelho cardiovascular: taquicardia, sem sopros ou atrito pericárdico; abdome: normal; osteoarticular: normal; músculos: sem mialgia, e força muscular normal; extremidades: boa perfusão; neurológico: sensibilidade normal, reflexos normais. EXAMES COMPLEMENTARES hemograma completo: hemoglobina 6,7g/dL, hematócrito 15%, contagem de leucócitos 6.400/mm (segmentados 78%, linfócitos 21% e monócitos 1%), plaquetas 250.000/mm ; reticulócitos 10%; teste de Coombs direto positivo; VHS: 25mm/1ª hora; PCR: 35mg/L; urina tipo I: normal; proteinúria de 24 horas: 0,2g; EXAMES COMPLEMENTARES ureia e creatinina: normais; ecocardiograma (ECO) com Doppler: pericardite discreta; fator antinuclear (FAN) 1/640: padrão homogêneo; anticorpo anti-DNA de dupla hélice: positivo; anticorpo anti-Sm: negativo; anticorpos antifosfolípides: anticorpo anticardiolipina (IgM e IgG) e anticoagulante lúpico negativos; complemento sérico (C3, C4 e CH50): todas as três frações reduzidas. CONDUTA CASO 2 O paciente do caso clínico 2 foi diagnosticado como LESJ e recebeu os seguintes tratamentos na enfermaria pediátrica: pulsoterapia com metilprednisolona* 30mg/kg/dia em 1 hora (uma dose diária por 3 dias consecutivos); ranitidina* 5mg/kg/dia de 12 em 12 horas; hidroxicloroquina* 5mg/kg/dia, dose única, às 8 horas. EVOLUÇÃO CASO 2 Após o 3º dia de tratamento, o paciente evoluiu afebril, com melhora importante da palidez mucocutânea e do estado geral. Os resultados de alguns exames foram repetidos no 3º dia de hospitalização: hemograma completo: hemoglobina 9,8g/dL, hematócrito 26%, contagem de leucócitos 18.500/mm (segmentados 82%, linfócitos 18%), plaquetas 350.000/mm ; reticulócitos 8%. PRESCRIÇÃO CASO 2 Após o 3º dia de tratamento, deu-se início a doses altas de prednisona* (2mg/kg/dia de 12 em 12 horas) e manteve-se hidroxicloroquina* (5mg/kg/dia, dose única), havendo melhora progressiva das manifestações cutâneas, hematológicas e laboratoriais; com um mês de seguimento ambulatorial, a prednisona* (2mg/kg/dia) foi modificada para dose única diária (8h); em todas as consultas, foram reforçadas adesão aos fármacos e uso de bloqueadores solar diariamente; PRESCRIÇÃO CASO 2 Nas consultas ambulatoriais subsequentes, a prednisona* foi progressivamente reduzida (10mg/dia no 6º mês e 5mg/dia no 8º mês de tratamento), e suspensa com um ano de tratamento para minimizar os eventos adversos relacionados ao glicocorticoide; nos dois anos seguintes, hidroxicloroquina* foi mantida. O paciente manteve-se em remissão clínica e laboratorial da doença. REFERÊNCIA Silva CAA. Lúpus eritematoso sistêmico juvenil. In: Sociedade Brasileira de Pediatria; Leone C, Cabral SA, organizadores. PROPED Programa de Atualização em Terapêutica Pediátrica: Ciclo 3. Porto Alegre: Artmed Panamericana; 2017. p. 11-41. (Sistema de Educação Continuada a Distância, v. 4)
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