Prévia do material em texto
1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 4 2 INTRODUÇÃO A FARMACOLOGIA CLÍNICA: ÊNFASE AO CUIDADO FARMACÊUTICO E PRESCRIÇÃO FARMACÊUTICA .............................................. 5 3 FARMACOCINÉTICA ................................................................................. 7 3.1 Princípios farmacocinéticos .................................................................. 7 3.2 Absorção ............................................................................................ 10 3.3 Distribuição ......................................................................................... 11 3.4 Biotransformação e excreção ............................................................. 12 4 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO E FORMAS FARMACÊUTICAS .................. 13 5 FARMACODINÂMICA............................................................................... 16 5.1 Interação fármaco – receptor ............................................................. 17 6 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS ........................................................ 25 7 FARMÁCIA CLÍNICA ................................................................................ 32 8 PRESCRIÇÃO FARMACÊUTICA ............................................................. 34 8.1 O que é a prescrição farmacêutica? ................................................... 36 8.2 Etapas no processo de prescrição ..................................................... 37 8.3 Benefícios da prescrição farmacêutica para os pacientes e para a sociedade ............................................................................................................38 8.4 Prescrição de medicamentos com venda sob prescrição médica ...... 39 8.5 Prescrição farmacêutica de MIPs ....................................................... 43 8.6 Medicamentos Isentos de prescrição ................................................. 44 8.7 Uso irracional de medicamentos: uma problemática mundial ............ 45 3 8.8 O papel do farmacêutico na Atenção Farmacêutica quanto ao uso racional de medicamentos ..................................................................................... 46 9 A IMAGEM PROFISSIONAL: O FARMACÊUTICO .................................. 48 10 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 54 4 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 2 INTRODUÇÃO A FARMACOLOGIA CLÍNICA: ÊNFASE AO CUIDADO FARMACÊUTICO E PRESCRIÇÃO FARMACÊUTICA Fonte: portal.crfsp.org.br Com o objetivo de aperfeiçoar o conhecimento dos farmacêuticos para a atuação destes como prescritores de medicamentos, foi elaborada a apostila “Farmacologia Clínica e Terapêutica e Boas Práticas de Prescrição”, introduzida com o ideal de relembrar ao aluno alguns conceitos básicos em Farmacologia e atualizá- lo quanto às questões referentes aos Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs), automedicação, o que a legislação fala sobre a prescrição farmacêutica entre outros aspectos importantes. O Conselho Federal de Farmácia (CFF), aprovou em agosto de 2013, uma resolução (RDC 586/13), com o objetivo de incluir um novo conceito às farmácias e drogarias no Brasil. A resolução regulamenta a prescrição farmacêutica no Brasil e prevê que, farmacêuticos habilitados e inscritos no CRF que trabalham em farmácias com e sem manipulação possam prescrever MIPs a pacientes que praticam a automedicação, os quais muitas vezes desconhecem ou ignoram a possibilidade de efeitos indesejáveis ou o potencial de toxicidade dos medicamentos. Assim, ao avaliar a necessidade do MIP e documentar a prescrição em um contexto de individualidade e sigilo, o profissional farmacêutico torna-se corresponsável pelo tratamento indicado 6 e deve fazer o acompanhamento e/ou encaminhamento ao médico caso a queixa do paciente persista. Deste modo, o profissional também responde pelo compromisso de prevenir, identificar e resolver os problemas relacionados aos medicamentos (PRM), o que se traduz em segurança para o usuário. Vista a importância da prescrição responsável, é imprescindível ao farmacêutico conhecer profundamente as formas farmacêuticas e vias de administração de medicamentos, bem como a farmacocinética e a farmacodinâmica, divisões da farmacologia. Fármacos administrados em diferentes formas farmacêuticas e vias de administração são considerados novos medicamentos pela Food and Drug Administration (FDA) e devem ser avaliados individualmente, nos estudos clínicos de determinação da dose eficaz. Na prática terapêutica, os fármacos devem ser capazes de atingir um local de ação específico após a administração por uma via específica. Uma substância química pode ser administrada na forma de pró-fármaco, ou seja, em uma forma inativa e assim somente após absorção e distribuição é então convertida ao fármaco ativo pelos processos biológicos no interior do corpo. Neste material didático abordaremos o assunto, mostrando que existem vantagens para administração do fármaco na forma inativa. Sobretudo iremos abordar tópicos importantes para uma boa prática de prescrição, como: • Conceitos mais importantes em Farmacologia. • Compreender a conformação e estrutura dos receptores. • Compreender locais de ação de medicamentos. • Discutir sobre o uso racional de medicamentos. • Apresentar aspectos sobre interações medicamentosas. • Finalizar com os conceitos e aspectos da automedicação responsável de MIPs. 7 3 FARMACOCINÉTICA Fonte: pixabay.com.br A farmacocinética está inserida na dinâmica de interação entre fármaco e corpo. Consiste na absorção, distribuição, biotransformação e excreção de fármacos. Estes fatores, associados à dose, determinam a concentração da droga em seus locais de ação e, portanto, a intensidade dos seus efeitos em relação ao tempo (GOODMAN; GILMAN, 2012). 3.1 Princípios farmacocinéticos Na prática terapêutica, os fármacos devem ser capazes de atingir um local de ação especifico após a administração por uma via própria. Em termos bem simplistas, a farmacocinética costuma ser referida como "o que o corpo faz com o fármaco" - envolve processos que vão desde a absorção até a excreção do medicamento. Quando um fármaco é administrado por via enteral, especialmente a via oral, ele deve ser absorvido no sangue a partir do seu sítio de administração (como o intestino), distribuído para o tecido alvo, onde será o sítio de ação (como o cérebro, no caso de um medicamento benzodiazepínico, como o clonazepam), e finalmente, 8 depois de provocar o seu efeito, o fármaco deve ser eliminado a uma velocidaderazoável por excreção do corpo. Em alguns casos, a substância química administrada é absorvida imediatamente e distribuída e somente depois é convertida no fármaco ativo pelos processos biológicos no interior do corpo. Esses são chamados de pró-fármaco. Os pró-fármacos são derivados química e farmacologicamente inativo da molécula matriz, que requer transformação no organismo para liberar o fármaco ativo, processo chamado de latenciação (KOROLKOVAS, 1988, apud CHIN 1998. p. 75). A latenciação é a modificação química utilizada para converter um composto biologicamente ativo em forma de transporte inativo. O pró-fármaco que é uma forma inativa do fármaco sofre um ataque enzimático ou químico liberando assim a forma ativa. Alguns critérios devem ser considerados durante o planejamento do pró- fármaco: • Existência de grupos funcionais na molécula matriz capazes de sofrer derivatização; • Existência de mecanismos e/ou sistemas no organismo capazes de bioativar o pró-fármaco; • Facilidade e simplicidade da síntese e purificação do pró - fármaco; • Estabilidade química do pró-fármaco; • Regeneração, in vivo, da molécula matriz, em quantidades ideais; • Toxicidade do transportador e do pró-fármaco per se. Dessa forma, a latenciação permite, mediante a escolha de transportadores adequados, via de regra desprovidos de atividade biológica, o aprimoramento das propriedades do fármaco (CHUNG, 2005, apund CHIN 1998. p. 76). Pró – fármacos são subdivididos em: • Pró- fármacos clássicos; • Bioprecursores; • Pró- fármacos mistos; • Fármacos dirigidos; 9 • Fármacos recíprocos. Pró-fármacos clássicos promovem a melhoria da atividade terapêutica por aumento de biodisponibilidade, diminuição da toxicidade, prolongamento da ação, aumento da seletividade, mediante a escolha de transportador adequado, geralmente de caráter lipofílico. Um exemplo é o Valaciclovir, pró-fármaco do Aciclovir. Bioprecursores: não apresentam transportadores e são obtidos por modificações moleculares. Como exemplo são os medicamentos: Azitromicina (AZT), Metronidazol e Enalapril. Pró-fármacos mistos: têm características de pró-fármacos clássicos e de bioprecursor. É uma molécula inerte que requer várias reações químicas para a sua conversão à forma ativa. O sistema CDS (Chemical Delivery System) é um exemplo. Foi originalmente empregado para liberação da forma ativa no cérebro. Nesse sistema, o transportador é biotransformado após atravessar a barreira hematoencefálica (BHE), sofrendo primeiramente oxidação e assim tornando-se positivamente carregado e acumulando-se no SNC, onde sofre em seguida, reação de biotransformação para liberar o fármaco ativo. Vários fármacos foram desenvolvidos utilizando o sistema CDS, como por exemplo, para doença de Alzheimer foram desenvolvidos vários pró-fármacos anti- inflamatórios derivados de diclofenaco e do ibuprofeno. Fármacos dirigidos, os transportadores utilizados nesta forma latente são capazes de transportar os fármacos seletivamente do local de administração até o sítio de ação (receptores específicos). O objetivo principal do fármaco dirigido é minimizar as reações adversas provocadas pela ação inespecífica do fármaco em outros alvos, diminuindo, pois, a toxicidade. Pró - fármacos recíprocos, caracterizam-se por seu transportador, diferentemente dos pró-fármacos clássicos, também possuir atividade terapêutica. Dessa forma, pode-se obter pró-fármaco com atividades terapêuticas diferentes ou semelhantes, atuando por mecanismos da ação diferentes ou iguais (SINGH, 1994, apund CHIN 1998. p. 76). Exemplo: pró-fármaco de sulfapiridina e ácido aminossalicílico (5- ASA). 10 3.2 Absorção A absorção consiste na passagem da droga do seu local de aplicação até a corrente sanguínea. Raramente, o fármaco é administrado diretamente em seu tecido alvo como acontece, por exemplo, na aplicação tópica de um agente anti-inflamatório na pele ou na membrana mucosa. O mais comum é a administração em um compartimento diferente do corpo. Exemplo: um fármaco com ação no SNC, que foi administrado por uma via oral, necessita que a substância seja absorvida no intestino, e ao chegar no sangue, seja distribuída para seu local de ação, permeando através das barreiras que separam esses compartimentos. Quando um fármaco é administrado por via oral, para que produza um efeito no Sistema Nervoso Central (SNC), vai precisar passar pelas: Barreiras da parede do intestino → barreiras das paredes dos capilares que perfundem o intestino → barreira hematoencefálica → paredes dos capilares que perfundem o cérebro. E normalmente após fazer surgir o efeito desejado, um fármaco deve ser eliminado a uma taxa razoável por meio de inativação metabólica conhecido como processo de biotransformação e assim com a formação de metabólitos inativos poderá ser eliminado do corpo, através do processo de excreção. Normalmente, cerca de 75% de um fármaco administrado por via oral são absorvidos em 1-3 horas, entretanto, numerosos fatores alteram essa absorção, alguns fisiológicos e outros relacionados com a formulação do fármaco (RANG., 2010). Os fatores que influenciam, incluem: • Fatores físico-químicos; • Transito gastrintestinal; • Tamanho das partículas e tipo de formulação; • Fluxo sanguíneo esplâncnico. Para atravessar a luz do intestino delgado para a circulação sistêmica, a substância não apenas deve penetrar na mucosa intestinal, como também deve passar por uma gama de enzimas que podem inativá-la na parede intestinal e no fígado. O termo biodisponibilidade é utilizado para indicar a proporção da substância que passa para a circulação sistêmica após administração oral, levando em 11 consideração tanto a absorção quanto a degradação metabólica local. A absorção diretamente a partir da cavidade oral, que acontece nas administrações sublinguais, é muito útil quando existe necessidade de obter uma resposta rápida, particularmente quando o fármaco é instável em pH gástrico ou é rapidamente metabolizado pelo fígado. Como por exemplo, o Trinitrato de glicerina que é absorvido pela boca (via sublingual) e passa diretamente para a circulação sistêmica sem penetrar no sistema portal, escapando, do metabolismo de primeira passagem. 3.3 Distribuição O conceito de biodisponibilidade, no sentido restrito, é o termo empregado para descrever a fração da dose administrada de um produto farmacêutico capaz de alcançar a circulação sistêmica e exercer ação terapêutica. Este parâmetro expressa a extensão e a velocidade das fases biofarmacêutica e farmacocinética da substância ativa (REYNOLDS, 1993, apud MOURA, 2002). Após ser absorvido ou injetado na corrente sanguínea, o fármaco distribui-se para os líquidos intersticial e celular. Padrões de distribuição dependem de determinados fatores fisiológicos e propriedades físico-químicas das substâncias. Pode ser diferenciada uma fase inicial de distribuição que remete o débito cardíaco e o fluxo sanguíneo regional. O coração, o fígado, os rins, o cérebro e outros órgãos bem profundidos recebem a maior parte dos fármacos durante os primeiros minutos após a sua absorção. O aporte do fármaco à musculatura, à maioria das vísceras, à pele e ao tecido adiposo é mais lento, e estes tecidos exigem de minutos a algumas horas para ser atingido um estado de equilíbrio dinâmico. Os principais compartimentos são: • O plasma (5% do peso corporal). • O líquido intersticial (16%). • O líquido intracelular (35%). • O líquido transcelular (2%). • A gordura (20%). O volume de distribuição (Vd) é um outro parâmetro fundamental na discussão dos processos de distribuição farmacológica. O volume de distribuição (Vd) relaciona 12 a concentração de fármaco no organismo com a concentração de fármaco (C) no sangue e no plasma, dependendo do líquidomedido. Este volume não se refere necessariamente a um volume fisiológico identificável, mas apenas ao volume de líquido que seria necessário para conter todo o fármaco no organismo na mesma concentração em que se encontra no sangue ou no plasma: Vd = Quantidade de fármaco no organismo /C Substâncias insolúveis em lipídios estão principalmente confinadas no plasma e ao líquido intersticial; a maioria não penetra no cérebro após administração aguda, assim tem sua distribuição limitada e seus locais de ação potenciais, também são limitados. Outro fator que limita a distribuição do fármaco é a ligação às proteínas plasmáticas, principalmente, à albumina no caso de fármacos ácidos, e à alfa-ácido- glicoproteína no caso de substâncias básicas. Os fármacos podem acumular-se nos tecidos de acordo com a dose administrada e afinidade com os tecidos. As substâncias lipossolúveis, por exemplo, alcançam todos os compartimentos e podem acumular-se no tecido adiposo para substâncias que acumulam fora do compartimento plasmático, (por exemplo, no tecido adiposo ou por estarem ligados a tecidos), o Vd pode ultrapassar o volume corporal total. 3.4 Biotransformação e excreção O metabolismo de fármacos compreende o conjunto de reações enzimáticas que biotransformam fármacos e outros compostos estranhos (xenobióticos) em metabólitos de polaridade crescente, para que sejam excretados pela urina. O metabolismo desempenha, assim, um importante papel na eliminação de fármacos, e impede que estes compostos permaneçam por tempo indefinido no nosso organismo. As reações metabólicas são divididas em fase 1 (oxidação, redução e hidrólise) e fase 2 (conjugação). Os produtos de degradação (metabólitos), por sua vez, podem ser inativos ou ativos. Em relação ao fármaco de origem, os metabólitos ativos podem agir por mecanismos de ação similares ou diferentes, ou até mesmo por antagonismo. O conhecimento da cinética da formação dos metabólitos ativos é importante não apenas para previsão do resultado terapêutico, mas também para explicar a toxicidade de um dado fármaco (LIN, 1997, apud PEREIRA, 2007). 13 Os compostos são removidos do organismo para o meio externo através do processo chamado excreção. A remoção de um fármaco do organismo humano pode ocorrer através de várias vias: renal, biliar, intestinal, pulmonar, além do suor, saliva, secreção nasal, e, leite materno. A principal via de excreção de fármacos é constituída pelo sistema renal, entretanto há outras vias de grande importância, como por exemplo, a via pulmonar (muito importante para fármacos voláteis como o álcool e anestésicos gasosos), leite materno, sistema biliar (é uma via muito importante para fármacos que dependem do ciclo enterohepático como os contraceptivos hormonais, cloranfenicol, tetraciclinas, rifampicina e digoxina), lágrimas, saliva (atualmente muitos fármacos e substâncias endógenas tem sido monitorados por meio de sua concentração salivar), suor, fecal entre outras. 4 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO E FORMAS FARMACÊUTICAS Fonte: NatueLife.com.br Vias de administração correspondem ao local que o fármaco entra em contato com o organismo, liberando a quantidade adequada do medicamento para que ocorra o efeito terapêutico desejado. A resposta terapêutica depende de fatores como a concentração do princípio ativo, seu transporte pelos líquidos corporais através das membranas biológicas, bem como a resistência à degradação metabólica. A via de 14 administração e a formulação terapêutica influenciam diretamente na biodisponibilidade de um medicamento. Além disso, ambos podem ser fatores importantes na adesão do paciente ao tratamento. A forma farmacêutica e a via de administração podem influenciar a seletividade de um medicamento e, portanto, suas indicações clinicas. As três principais vias de administração são: Oral ou per os, parenteral e retal (MAGALHÃES, 1985 apud MONTANHA 2013). A partir da forma farmacêutica e a via de administração, a dose eficaz de um medicamento pode mudar, considerando que os fármacos administrados por via intravenosa entram diretamente na circulação sistêmica e aqueles administrados por via oral raramente são absorvidos de forma completa até a circulação sistêmica, devido às diversas barreiras físicas, químicas e fisiológicas presentes. Dessa forma, uma dose mais baixa é indicada para a administração parenteral (injetável) em relação à oral, para obter os mesmos níveis sanguíneos e efeitos clínicos. A escolha da via de administração de um medicamento é norteada pelos seguintes fatores: tipo de ação desejada se é local ou geral, rapidez da ação desejada, esta orienta, por exemplo, se deve ser preferida a via inta-muscular ou a intravenosa em determinados casos, e a natureza do medicamento, os voláteis pela via pulmonar (anestésicos inalatórios); os que resistem ao sulco gástrico podem ser dados pela via oral, os que não resistem ao sulco gástrico devem ser administrados por via parenteral, se cáustico, só deve ser dado por via intravenosa; os insolúveis não devem ser administrados por via parenteral. As vias de administração dos fármacos podem ser a grupados da seguinte maneira. A via oral é a administração do fármaco através da cavidade bucal, sua principal finalidade é conduzir o medicamento ao estomago e intestino, para aí ser absorvidos e levado por via sanguínea aos tecidos susceptíveis. Embora algumas soluções para uso oral, em forma aquosa ou de elixir, e suspensão estejam comercialmente disponíveis, a maioria das formas para a dosagem oral são sólidas. Como limitações desta via temos: inativação do medicamento pelo suco digestivo, incerteza da quantidade absorvida e possibilidade de ação irritante sobre a mucosa. A via sublingual permite a retenção do fármaco por tempo mais prolongado. Propicia uma rápida absorção de pequenas doses de alguns fármacos, 15 devido à vasta vascularização sanguínea e a pouca espessura da mucosa sublingual, permitindo a absorção direta na corrente sanguínea (LIMA, 2008 apud MONTANHA, 2013). As vias transmucosas ou tópicas são utilizadas normalmente para a obtenção de efeitos terapêuticos não sistêmicos, isto é, localizados, no entanto pode haver absorção de certos medicamentos pela pele integra. A via parenteral entende se por todas as vias de administração que exigem que se pratiquem uma abertura na pele ou nas mucosas para se atingir os tecidos susceptíveis (MAGALHÃES, 1985, apud MONTANHA, 2013). A administração parenteral das drogas implica evitar-se o trato gastrointestinal. As vias parenterais incluem injeções intravenosas (IV), intramuscular (IM), e subcutânea (SC). A via intravenosa tem como vantagem a obtenção rápida de efeitos, a possibilidade de administração de grandes volumes, em infusão lenta, e de substancias irritantes. Tem como desvantagem riscos de embolia, infecções por contaminação, sendo imprópria para substâncias oleosas ou insolúveis. A via subcutânea é preferível quando se necessita quem medicamento seja absorvido de forma lenta e continua. Esta via tem como desvantagem a absorção constante para soluções e lenta para suspensões e “pellets”, tem como vantagem a facilidade de produzir sensibilização e, ainda, dor e necrose, quando utilizadas substâncias irritantes. A via intramuscular tem a vantagem de absorção relativamente rápida, sendo adequada para administração de volumes moderados, de veículos aquosos, oleosos, suspensão ou preparação de depósitos. Suas desvantagens são a dor e o aparecimento de lesões musculares pela aplicação de substâncias irritantes ou de pH distante da neutralidade, promovendo o aparecimento de processos infamatórios. A via inalatória pode ser utilizada normalmente quando o agente terapêutico é um gás, tendo, em medicina veterinária, utilização restrita à anestesia. Estes agentes anestésicos gasosos e líquidosvoláteis, administrados por inalação, são rapidamente absorvidos na circulação sistêmica através do epitélio alveolar. A via retal é a administração de medicamentos através do reto, para que sejam absorvidas pelo plexo hemorroidal, o quadro abaixo resume as principais vias de administração de fármaco e suas respectivas formas farmacêuticas. 16 Fonte: ANSEL, 2007. 5 FARMACODINÂMICA Fonte: uss.cl/medicina/curso-farmacocinetica-aplicada/ A Farmacodinâmica investiga os efeitos dos fármacos nos organismos, seus mecanismos de ação e a relação entre a dose e efeito (GOODMAN; GILMAN, 2012). Princípios gerais: • As moléculas do fármaco precisam estar ligadas a constituintes específicos http://www.uss.cl/medicina/curso-farmacocinetica-aplicada/ 17 das células para produzirem efeito. • Receptores: qualquer molécula a qual uma substância se liga para iniciar seus efeitos. Sítios de ligação: • Proteínas alvo; • Enzima; • Molécula transportadora; • Canal iônico; • Receptor. 5.1 Interação fármaco – receptor A ativação do receptor é a capacidade da molécula ligada de desencadear uma resposta tecidual, exemplificando temos como modelo “chave-fechadura”. O termo “relação estrutura-atividade” compreende o estudo dos efeitos que a estrutura química de um composto ligante pode causar durante sua interação com o receptor biológico e, assim, racionalizar os principais fatores que comandam esta interação (ARROIO, 2010, apud BENITE,2019, p.574). A ligação de um fármaco com seu receptor biológico é determinada por forças intermoleculares, como: interações lipofílicas, polares, eletrostáticas entre outros. Sendo assim, substâncias que apresentam propriedades farmacológicas e terapêuticas ao interagirem com um alvo específico que pode ser uma enzima, um receptor, um canal iônico ou qualquer outra macromolécula biológica, devem possuir uma estrutura tridimensional de forma que as disposições de seus grupos funcionais permitam uma maior complementariedade ao sítio de ligação. Quanto melhor o “encaixe” e a complementaridade das propriedades de um fármaco, maior será sua afinidade e logo maior será sua atividade biológica. Agonista: substância biologicamente ativa que ao ligar-se ao receptor causa efeito. Antagonista: substância que ao ligar-se ao receptor não produz efeito. 18 Figura adaptada: BARREIRO, 2001. Mecanismos de ação dos fármacos A interação fármaco-receptor compreende duas fases: 1. Complexação do fármaco com o receptor. 2. Produção do efeito. Além da afinidade ao receptor é necessário que o fármaco tenha atividade intrínseca, isto é, capacidade de formar um complexo fármaco-receptor que produza efeito biológico. Logo somente o agonista possui atividade intrínseca. Existem dois centros no receptor farmacológico: • Específico ou crítico que interage com os grupos farmacológicos do agonista. • Inespecífico ou não crítico que se complexa principalmente com os grupos apolares do antagonista. Os fármacos ditos estruturalmente inespecíficos são aqueles que dependem única e exclusivamente de suas propriedades físico-químicas, (coeficiente de partição, pKa) para promoverem o efeito biológico. Os anestésicos gerais são um exemplo clássico de substâncias que pertencem a esta classe de fármacos, uma vez que seu mecanismo de ação envolve a depressão inespecífica de biomembranas lipo-protéicas, elevando o limiar de excitabilidade celular ou a interação inespecífica com sítios hidrofóbicos de proteínas do sistema nervoso central, provocando perda da consciência. Neste caso específico, em que a complexação do fármaco com 19 macromoléculas da biofase dá-se predominantemente através de interações de Van der Walls, a potência do fármaco está diretamente relacionada com a sua lipossolubilidade (FOYE, 1995 apud BARREIRO, 2001). Em alguns casos, a alteração das propriedades físico-químicas decorrentes de modificações estruturais de um fármaco pode alterar seu mecanismo de interação com a biofase. Um clássico exemplo encontra-se na classe dos anticonvulsivantes. O pentobarbital é estruturalmente específico e tem ação sobre o receptor Ácido gama- aminobutírico (GABA) ionóforo. A simples substituição de um átomo de oxigênio por um átomo de enxofre produz o tiopental, cuja lipossolubilidade é maior e tem ação anestésica inespecífica. Os fármacos estruturalmente específicos exercem seu efeito biológico pela interação seletiva com uma determinada biomacromolécula alvo, que apresenta na maior parte dos casos propriedades de enzima, proteína sinalizadora (receptor), canal iônico ou ácido nucléico. O reconhecimento do fármaco (micromolécula) pela biomacromolécula depende do arranjo espacial dos grupamentos funcionais e das propriedades de superfície da micromolécula, que devem ser complementares ao sítio de ligação localizado na macromolécula, o sítio receptor. A complementaridade necessária para a interação da micromolécula com a biomacromolécula receptora pode ser ilustrada simplificadamente pelo modelo “chave-fechadura”. Neste modelo podemos comparar a biomacromolécula com a fechadura, o sítio receptor com o “buraco da fechadura” e as diferentes chaves com ligantes do sítio receptor, isto é, regiões da micromolécula que vão interagir diretamente com a macromolécula. Neste caso específico “abrir a porta” ou “não abrir a porta” representariam as respostas biológicas desta interação. Na imagem a seguir, pode ser evidenciado três principais tipos de chaves: a) a chave original, que se encaixa adequadamente com a fechadura, permitindo a abertura da porta, corresponderia ao agonista natural (endógeno) ou substrato natural, que interage com o sítio receptor da biomacromolécula localizado respectivamente em uma proteína ou enzima, desencadeando uma resposta biológica; b) a chave modificada, com propriedades estruturais que a tornam semelhantes à chave original e permitem seu acesso à fechadura e a abertura da porta, corresponderia a um agonista modificado da biomacromolécula, sintético ou de origem natural, capaz de reconhecer complementarmente o sítio receptor e javascript:%20void(0); javascript:%20void(0); 20 desencadear uma resposta biológica qualitativamente idêntica àquela do agonista natural; e c) a chave falsa, que apresenta propriedades estruturais mínimas que permitem seu acesso à fechadura, sem ser capaz, entretanto de permitir a abertura da porta, corresponderia ao antagonista, sintético ou de origem natural, capaz de ligar- se ao sítio receptor sem promover a resposta biológica e bloqueia a ação do agonista endógeno e/ou modificado, ocasionando uma resposta qualitativamente inversa àquela do agonista. Fonte: qnint.sbq.org.br/novo/index.php?hash=tema.15 Receptores Os receptores consistem em elementos sensoriais no sistema de comunicações químicas que coordena a função de todas as diferentes células do corpo, sendo que os mensageiros químicos são representados por vários hormônios, transmissores e outros mediadores. Os receptores podem induzir diversos efeitos celulares. Classificação: • Tipo 1: canais iônicos regulados por ligantes - Inotrópicos. • Tipo 2: receptores acoplados à proteína G - Metabotrópicos. • Tipo 3: receptores ligados à proteína quinase e receptores relacionados. http://qnint.sbq.org.br/novo/index.php?hash=tema.15 21 • Tipos 4: receptores nucleares. Fonte: RANG, 2012. Características importantes dos receptores Tipo 1: canais iônicos regulados por ligantes - Inotrópicos: • Regulados por ligantes; • Ligantes = fármaco ou substância endógena. • Receptor = proteína de membrana: • Sítio de ligação extracelular. • São acoplados a canais iônicos. • São receptores de ação rápida: Exemplos: Nicotínico, Glutamato e Gaba (figura abaixo).22 Fonte: WordPress.com Receptor tipo 2 ou metabotrópico ou acoplado à proteína G, contêm sete α hélices transmembrana (hepta-helicoidal) com um domínio N-terminal extracelular e um domínio C terminal intracelular. A proteína G se liga no domínio intracelular e vai atuar no sistema efetor (proteínas efetoras) que podem ser enzimas ou canais iônicos. A proteína G, portanto, é responsável em propagar a informação veiculada pela substância que se ligou ao domínio extracelular (FANELLI,2005, apud HOELZ, 2013 p. 983). Exemplos de receptores metabotrópicos: • Receptores hormonais; • Receptores muscarínicos da acetilcolina (lentos); • Receptores adrenérgicos; • Receptores opioides. A ação desses receptores é lenta porque necessitam de mensageiros (proteína G) para propagar a informação. Proteína G, são proteínas ancoradas a membrana interna que atuam como transdutores celulares reconhecendo o receptor tipo 2 e enviando a informação ao alvo final. É formada por três subunidades (α, β e γ). https://www.google.com/url?sa=i&source=images&cd=&ved=2ahUKEwjJj8mZ5NvlAhVYJrkGHXudDGcQjB16BAgBEAM&url=https%3A%2F%2Fwaitimstudying.wordpress.com%2F2017%2F05%2F30%2Fsistema-nervoso-somatico-e-autonomo%2F&psig=AOvVaw1NzmqHiqiCWn6FWSokqCJf&ust=1573342634707445 https://www.google.com/url?sa=i&source=images&cd=&ved=2ahUKEwjJj8mZ5NvlAhVYJrkGHXudDGcQjB16BAgBEAM&url=https%3A%2F%2Fwaitimstudying.wordpress.com%2F2017%2F05%2F30%2Fsistema-nervoso-somatico-e-autonomo%2F&psig=AOvVaw1NzmqHiqiCWn6FWSokqCJf&ust=1573342634707445 23 Fonte: RANG, 2007. A cascata de ativação intracelular começa com a ação de uma proteína auxiliar: GEF. A proteína GEF desloca GDP e dá lugar à ligação de GTP, configurando o estado ativo da proteína. A subunidade α dissocia-se do dímero βγ e inicia cascatas de sinalização intracelular, como pode ser observado na figura acima. O início da cascata de sinalização intracelular resulta em ativação dos efetores (aqueles que recebem o estímulo) como: • Adenilato ciclase; • GTPase; • Fosfolipases; • Cinases ou Quinases. Os receptores ligados à proteína quinase do tipo 3, estão ligados a quinases. É um composto de uma cadeia com até mil resíduos. O domínio extracelular é ligado por uma α hélice ao domínio intracelular, e este possui atividade enzimática. Esses receptores estão relacionados às ações de fatores de crescimento, citocinas e hormônios como a insulina, cujos efeitos são realizados, principalmente, em nível de transcrição gênica (RANG, 2003, apud HOELZ, 2013 p. 985). As proteínas quinases têm como função fosforilar proteínas efetoras intracelulares e, como resultado há alterações na atividade bioquímica destas, já que receberam fosfato, e sofreram interações com outras. Principais tipos de receptores tipo 3: 24 • Receptores tirosina quinase (RTKs) incorporam uma porção de tirosina quinase na região intracelular desse receptor. Fosforilam proteínas que tenham resíduos de tirosina. Os receptores de insulina são RTKs, assim como os receptores para fator de crescimento epidérmico e neural. • Receptores de serina/treonina quinases fosforilam resíduos de serina e/ou treonina. Exemplo: fator de transformação de crescimento. • Receptores de citocinas não possuem atividade enzimática intrínseca. Atuam ativando proteínas quinases citosólicas. Exemplo: receptores de citocinas, fatores estimuladores de colônias e hormônios do crescimento. • Receptores associados à guanilil ciclase: a porção enzimática é guanilil ciclase, e regula a formação de GMPc através da hidrólise de GTP. Mecanismo da fosforilação: • Fosforilação = quinases = adição de fosfato • Desfosforilação =fosfatases = retirada de fosfato Fonte: RANG, 2003. 25 6 INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS Fonte: jornaldoreboucas.com.br Uma interação medicamentosa é definida como o fenômeno que ocorre quando os efeitos ou a farmacocinética de um fármaco são alterados pela administração prévia ou coadministração de um segundo fármaco. As associações medicamentosas podem ser benéficas quando proporcionam um melhor efeito terapêutico ou uma redução da toxicidade, entretanto, podem ser prejudiciais quando favorecem o aparecimento de reações adversas ou diminuição do efeito de um ou ambos os fármacos. 6.1 Interações farmacocinéticas Interações que afetam a absorção Geralmente as interações que afetam a absorção, são provocadas por medicamentos administrados por via oral (ROE, 1984, apud MOURA 2002). A absorção pode ser alterada devido à: formação de complexos não absorvíveis: como exemplo a combinação de tetraciclinas (antibiótico) com íons metálicos provenientes de antiácidos e suplementos minerais. Nesse caso, ocorre a eliminação do antibiótico e prejuízo do seu efeito. Alteração do pH gástrico ou 26 intestinal: que afetam o equilíbrio de dissociação de medicamentos ácidos ou bases fracas. Como exemplo, a administração de antiácidos diminui a absorção de fenobarbital, pois ao aumentar o pH, predomina a forma ionizada que é menos lipossolúvel. Alteração da velocidade do esvaziamento gástrico e ou motilidade intestinal: Alguns medicamentos inibem o esvaziamento gástrico, como a escopolamina ou opiáceos como morfina e codeína, ou podem acelerar o esvaziamento como metoclopramida. Os medicamentos que aumentam a velocidade de esvaziamento, geralmente promovem um aumento da eliminação da substância, diminuindo seus efeitos e aqueles que diminuem o esvaziamento são perigosos no caso de ingestão de substâncias tóxicas que poderão ficar mais tempo no organismo, assim potencializando seus efeitos. Interações que afetam a distribuição Ao chegar à circulação sanguínea, o princípio ativo é transportado pelas proteínas plasmáticas, podendo atravessar barreiras para alcançar determinados tecidos onde será armazenado, transformado ou exercerá seus efeitos. Parte do medicamento administrado vai ficar ligado às proteínas e essa porção não será ativa farmacologicamente. Somente a porção que estiver livre no plasma, poderá atravessar as barreiras e chegar aos compartimentos. Assim, quando dois medicamentos que se ligam fortemente às proteínas são administrados simultaneamente, produzirão uma interação competitiva. Um dos medicamentos será deslocado da ligação às proteínas, aumentando a proporção de medicamento livre e dessa forma, aumentando sua atividade. Interações que afetam a biotransformação No processo de biotransformação, os medicamentos são transformados pelas enzimas microssomais hepáticas em frações menores, hidrossolúveis. As interações que acontecem nessa fase, geralmente são originadas por medicamentos com potencial de inibirem ou induzirem o sistema enzimático (FINE, 1981, apud SECOLI, 2001). 27 A inibição enzimática de sistemas como, por exemplo, do citocromo p450, das colinesterases e monoaminoxidases (MAO), promovem a lentificação da biotransformação do próprio medicamento e de outros que tenham sido administrados concomitantemente. Nesse processo, ocorre o acúmulo de substâncias no organismo, podendo assim ocorrer potencialização dos seus efeitos e aumento de toxicidade. Um exemplo interessante é a administração de alguns medicamentos com suco de toranja (grapefruit), que reduz a biotransformação da terfenadina e de outros fármacos como paroxetina, por inibir a enzima Citocromo CYP3A4 e assim esses medicamentos não são biotransformados e têm o efeito potencializado por não serem excretados do organismo. Já na indução enzimática, um fármaco promove o aumento da ação de algum sistema enzimático, promovendo o aceleramento do processo de biotransformação de fármacos que serão eliminados do organismo mais rapidamente e assim seus efeitos serão diminuídos ou não apresentarão efeito. A indução enzimática pode causar toxicidade de umsegundo fármaco, se os seus efeitos tóxicos são mediados por um metabólito. A toxicidade do paracetamol é o caso, ela é causada pela N-acetil-p-benzoquinonaimina, que é formada pelo citocromo p450. Consequentemente, o risco de lesão hepática séria após uma dose excessiva de paracetamol e aumentada em pacientes cujo sistema citocromo p450 tenha sido induzido, por exemplo, com o uso crônico de álcool. Aqui então temos dois exemplos diferentes, no primeiro caso, o próprio medicamento (paracetamol) está gerando a indução, pois o aumento da dose do medicamento proporciona um aumento na biotransformação pelo sistema citocromo p450, considerando que em doses terapêuticas a maior parte do fármaco é conjugado ao ácido glicurônico ou ao sulfato, porém o organismo não promove a formação dos metabólitos conjugados quando em doses acima da terapêutica, assim o sistema citocromo p450 é recrutado mas promove formação do metabólito tóxico citado anteriormente que causa morte celular. No outro exemplo, o álcool que é um indutor enzimático do citocromo p450, quando administrado junto com o paracetamol, promove a biotransformação por essa via, promovendo a formação dos metabólitos tóxicos. Em alguns casos, essas interações podem ser benéficas como por exemplo a indução enzimática provocada pela administração de fenobarbital em prematuros para induzira 28 glucuronil transferase, portanto, aumentando a conjugação da bilirrubina e reduzindo o risco de icterícia. Interações que afetam a excreção Os principais mecanismos pelos quais um fármaco pode afetar a taxa de excreção renal de outro são: • alterando a ligação à proteína e, por consequência, a filtração. • inibindo a secreção tubular. • alterando o fluxo urinário e/ou o pH urinário. Os diuréticos tendem a aumentar a excreção urinária de outros fármacos. A alteração do pH urinário interfere no grau de ionização de bases e ácidos fracos, afetando as respostas farmacológicas e promovendo um aumento da reabsorção ou da excreção dos fármacos. As drogas ácidas são reabsorvidas em urina ácida e excretadas em urina alcalina, já as drogas alcalinas são reabsorvidas em urina alcalina e excretadas em urina ácida. Como exemplo, é comum o uso de bicarbonato de sódio para aumentar a excreção de ácidos fracos em casos de intoxicação com barbitúricos (TROVATO, 1991, apud MOURA 2002). Interações farmacodinâmicas A interação farmacodinâmica causa modificação do efeito bioquímico ou fisiológico do medicamento. Geralmente ocorre no local de ação dos medicamentos (receptores farmacológicos) ou através de mecanismos bioquímicos específicos, sendo capaz de causar efeitos semelhantes (sinergismo) ou opostos (antagonismos). Sinergismo é um tipo de resposta obtida a partir da associação de dois ou mais medicamentos, resultando em efeito maior do que os efeitos isolados. Pode ocorrer efeitos: • Aditivo: medicamentos com mesmo mecanismo de ação. • Somação: medicamentos que agem por diferentes mecanismos. • Potencialização: medicamentos que atuam em diferentes receptores farmacológicos. Do sinergismo podem surgir associações com efeitos terapêuticos ou tóxicos. 29 Antagonismo: o efeito de um fármaco pode ser diminuído ou abolido na presença de outro, e isso pode ocorrer através de vários mecanismos: Antagonismo competitivo: descreve a situação comum em que uma substância é ligada seletivamente a determinado tipo de receptor sem ativá-lo e impede a ligação deum fármaco agonista. Antagonismo não competitivo: o antagonista bloqueia, em algum ponto, a cadeia de eventos que leva à produção de uma resposta pelo agonista. Antagonismo químico: nesse caso, duas substâncias se combinam em solução, de forma que o efeito do fármaco ativo é perdido. Como por exemplo, o uso do quelante dimercaprol que se liga a metais pesados e, assim, reduz a sua toxicidade. Antagonismo fisiológico: é a interação de duas substâncias cujas ações opostas no organismo tendem a anular uma à outra. Por exemplo, a histamina atua sobre os receptores das células parietais da mucosa gástrica, estimulando a secreção de ácido, enquanto, o lanzoprazol bloqueia esse efeito ao inibir a bomba de prótons, assim podemos dizer que as duas substâncias atuam como antagonistas fisiológicos. Interação medicamentos e nutriente A interação medicamento-nutriente é definida como uma alteração da cinética ou da dinâmica de um medicamento ou nutriente, ou ainda, o comprometimento do estado nutricional como resultado da administração de um medicamento, compreendendo-se a farmacocinética como a descrição quantitativa de um medicamento ou sua disposição, o que inclui a absorção, distribuição, metabolismo e excreção. A farmacodinâmica caracteriza-se pelo efeito clínico ou fisiológico do medicamento (SCHWEIGERT, 2008, apud LOPES, 2010). A maioria das drogas e dos nutrientes é absorvida no intestino delgado. As interações droga-nutriente podem alterar essa absorção por meio da redução do tempo de esvaziamento do trato digestório e pela formação de quelatos, originados a partir de reações entre cátions metálicos, presentes na matriz dos alimentos, com os fármacos, devido às suas características físico-químicas, bem como pelas mudanças na absorção de gorduras, das vitaminas lipossolúveis e do colesterol devido às lesões produzidas na mucosa intestinal. 30 Por sua vez, pode também ocorrer interação fármaco nutriente durante a fase farmacocinética de distribuição plasmática. Estudos demonstram que a ligação da droga a uma proteína plasmática pode ser alterada por uma dieta hiperlipídica. Já as alterações no metabolismo das drogas são geralmente afetadas pela inibição enzimática ou pela formação de complexos insolúveis com os nutrientes. Algumas drogas podem aumentar ou diminuir a excreção renal de certos nutrientes, por meio da filtração glomerular, interferindo na reabsorção renal dos nutrientes. As possíveis interações dos medicamentos com a alimentação dos pacientes podem levar ao prejuízo da ação do medicamento e/ou alimento, podendo causar um aumento da necessidade de utilização dos fármacos em tratamentos crônicos ou desnutrição, ocasionados aumentos no custo e no tempo de internação hospitalar. Interações medicamentos e álcool O álcool é um indutor enzimático da enzima citocromo p450 e dessa forma acelera a biotransformação de alguns medicamentos como, por exemplo, antibióticos, acarretando na redução do efeito do medicamento, por esse motivo que muitos medicamentos não podem ser associados como o etanol. Existe uma contraindicação específica ao uso de álcool simultâneo com certos antimicrobianos, como metronidazol, sulfas e cloranfenicol, pois causam uma reação semelhante ao dissulfiram na presença de álcool. (WANNMACHER, 2007, apud SILVA 2017 p.16). O dissulfiram é um fármaco utilizado no tratamento do alcoolismo, sua ação é exercida quando existe ingestão simultânea de álcool. Este medicamento inibe de maneira irreversível a enzima aldeído-desidrogenase (ALDH) responsável por metabolizar o álcool, promovendo o acúmulo de acetaldeído, provocando a reação etanol-dissulfiram (RED). Causando efeitos como sudorese, cefaleia, tonturas, náusea, dispneia. Os anestésicos gerais, anticonvulsivantes, antidepressivos, hipno-sedativos, ansiolíticos, entre outros psicotrópicos, podem apresentar interações sinérgicas com o álcool, fazendo com que a depressão central seja aumentada. Outro fato indiscutível 31 é que o uso simultâneo de etanol com outros depressores do sistema nervoso central acentua efeitos como sedação, agravo de coordenação motora e comprometimento da memória, risco de quedas, entre outros. O álcool potencializa a ação da loperamida e ivermectina frente ao sistema nervoso central. Aumenta a tendência dehemorragia gástrica resultante do uso de AAS e anti-inflamatórios não esteroides, devido destruir a mucosa gástrica e eleva a retrodifusão de íons hidrogênio (H+). Em pacientes com diabetes mellitus o álcool pode causar efeitos similares ao dissulfiram. O uso intenso de etanol estende a ação dos hipoglicemiantes, já o uso crônico inibe os mesmos. Pode-se notar que a interação entre fármacos e o álcool é prejudicial, e infelizmente hoje essa associação ainda é extremamente frequente entre a população. O álcool etílico altera o metabolismo de muitos medicamentos, afetando as concentrações desses fármacos no corpo e, além de que, pode prejudicar a eficácia de certas drogas, aumentando seus efeitos colaterais. Esta combinação pode causar efeitos colaterais graves, incluindo efeitos potencialmente fatais. Interação medicamento e nicotina A nicotina é uma droga psicotrópica, de uso comum através do cigarro, tem ações farmacológicas diversas devido à ação em vários efetores, podendo produzir ações estimulantes e depressoras sequenciais e dose dependente (JUSTO, 1979, apud FRANKEN, 1996 p. 371). A nicotina age sobre o sistema enzimático hepático e intestinal estimulando sua ação e aumentando a velocidade de biotransformação de fármacos exógenos e produtos endógenos. Estimula ainda a liberação de prolactina, hormônio de crescimento, vasopressina, beta endorfinas e cortisol. É biotransformação primeiramente no fígado e, parcialmente eliminada in natura, pelos rins. O principal metabólito e a cortinina excretada pelos rins. Devido às diferentes ações farmacológicas, a nicotina independente da via de administração, interage com uma série de medicamentos, modificando sua ação ou exigindo a administração de maiores doses para produção do efeito desejado. 32 Estudos mostraram que pacientes fumantes que utilizam benzodiazepínicos experimentam menor ação tranquilizadora, comparados aos pacientes não fumantes. Os fumantes também apresentam menor tolerância à dor, necessitando de maiores doses de analgésicos narcóticos. Os antagonistas de H2 como cimetidina e ranitidina não produzem efeitos em fumantes à noite. Em pacientes diabéticos, dependentes de insulina, que fumam, o efeito da insulina é diminuído, e isso faz que com necessitem de doses maiores. 7 FARMÁCIA CLÍNICA Fonte: pixabay.com.br A farmácia clínica, caracterizada nos anos 1960 nos Estados Unidos, compreende atividades voltadas para maximizar a terapia e minimizar os riscos e os custos, promovendo o uso seguro e racional de medicamentos. O farmacêutico clínico trabalha promovendo a saúde, prevenindo e monitorando eventos adversos, intervindo e contribuindo na prescrição de medicamentos para a obtenção de resultados clínicos positivos, melhorando a qualidade de vida dos pacientes sem, contudo, perder de vista a questão econômica relacionada à terapia (HOLLAND, 1999 apud FERRACIN, 2011 p. 456). 33 Segundo a Comissão de Farmácia Clínica do Conselho Regional de Farmácia, a Farmácia Clínica é uma área da farmácia voltada à ciência e prática do uso racional de medicamentos, na qual os farmacêuticos prestam cuidado ao paciente, de forma a otimizar a farmacoterapia, promover saúde e bem-estar e prevenir doenças. O farmacêutico clínico é aquele profissional apto a identificar sinais e sintomas, implementar, monitorar a terapia medicamentosa e orientar o paciente, atuando em conjunto com outros profissionais de saúde visando a efetividade do tratamento. Exige um amplo conhecimento em práticas terapêuticas, aliado à capacidade de julgamento e tomada de decisão. A Comissão Assessora de Farmácia Clínica tem por objetivos desenvolver discussões sobre a prática clínica, o aperfeiçoamento técnico e a proposição de normas e procedimentos (CRF SP, 2015). A Resolução 585, de 29 de agosto de 2013, regulamenta as atribuições clínicas do farmacêutico e dá outras providências, considerando a RDC Anvisa no 7, de 24 de fevereiro de 2010, que na seção IV, artigo 18, estabelece a necessidade da assistência farmacêutica à beira do leito da Unidade de Terapia Intensiva e, em seu artigo 23, dispõe que a assistência farmacêutica deve integrar a equipe multidisciplinar. Em 2000, a American College of Clínical Pharmacy publicou que a Farmácia Clínica é uma disciplina da saúde em que o farmacêutico presta assistência ao paciente por meio da prática do uso racional de medicamentos com a adequação da terapia medicamentosa da prevenção de doenças. E somente em 2013, no Brasil, foi aplicada uma resolução para regulamentar as atribuições clínicas do farmacêutico. Os termos Farmácia Clínica e Atenção Farmacêutica se confundem, mas a Farmácia Clínica surgiu em 1960 nos Estados Unidos por um grupo de professores da Universidade da Califórnia, devido à necessidade de mudança no currículo de farmácia como uma forma de ligar o aluno à prática clínica e dessa forma, a Farmácia Clínica passou a ser o meio onde o farmacêutico atua junto a uma equipe de saúde, avaliando e monitorando a resposta terapêutica do paciente, fazendo intervenções, recomendações e fornecendo informações sobre os medicamentos. Já a ideia da Atenção Farmacêutica surgiu como uma nova necessidade do profissional 34 farmacêutico frente à industrialização dos medicamentos. Atenção Farmacêutica foi definida por Cipolle e seus colaboradores (2004) como uma prática profissional que inclui uma filosofia um processo de cuidados e um sistema de gestão. Existem dois métodos de Atenção Farmacêutica utilizados por vários profissionais no mundo todo, são eles o Método de Dader (espanhol) e o Modelo de Minesota (americano) e segundo o Consenso de Granada de 2004 (PEREIRA; FREITAS, 2008), os seis problemas relacionados aos medicamentos – PRM são: • Paciente usa medicamentos que não necessita; • Idiossincrasia; • O paciente apresenta uma reação adversa; • Dose inferior/ paciente interrompe a medicação. 8 PRESCRIÇÃO FARMACÊUTICA Fonte: hipolabor.com.br Segundo a resolução 586, de 29 de agosto de 2013, os farmacêuticos assumem autorização para selecionar, iniciar, adicionar, substituir, ajustar, repetir ou interromper a terapia farmacológica. Essa resolução surgiu devido à necessidade de ampliar a cobertura dos serviços de saúde e aumentar a capacidade de resolução desses serviços. A resolução se apoiou na informação de que a literatura internacional 35 aponta os benefícios da prescrição farmacêutica segundo diferentes modelos, tanto quando realizada individualmente como em conjunto com uma equipe multidisciplinar de saúde. Os relatos descrevem que o farmacêutico prescreve medicamentos definidos em programas de saúde no âmbito dos sistemas públicos, em rotinas de instituições ou conforme protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas pré- estabelecidas. A resolução legaliza a prática que acontece desde os tempos dos boticários, em que o profissional recomenda algo ao paciente e essa recomendação pode ser a seleção de uma opção terapêutica, a oferta de serviços farmacêuticos ou o encaminhamento a outros profissionais de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica os Medicamentos Isentos de Prescrição (MIPs) como substâncias aprovadas pelas autoridades sanitárias para tratar sintomas e males menores, disponíveis sem prescrição ou receita médica, desde que utilizados conforme as orientações disponíveis nas bulas e rotulagens. A ANVISA regulamentou estes medicamentos pela RDC 138/03. A Resolução nº 586, de 29 de agosto de 2013 (publicada em setembro 2014), do Conselho Federal de Farmácia (CFF), com amparo na lei 13.021 / 14 e resolução 585, do CFF altera o ato de prescrever como apenas uma recomendação de determinado medicamento ao paciente. Com a medida, os farmacêuticos podem realizar a prescrição de medicamentos (não tarjados e que nãoexijam prescrição médica), além de outros produtos, com finalidade terapêutica. Fazem parte da resolução os medicamentos industrializados e preparações magistrais (alopáticos ou dinamizados), plantas medicinais, drogas vegetais e outras categorias ou relações de medicamentos que venham a ser aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para prescrição do farmacêutico. O profissional de saúde pode também prescrever medicamentos cuja dispensação exija prescrição médica, desde que condicionado à existência de diagnóstico prévio e apenas quando estiver previsto em programas, protocolos, diretrizes ou normas técnicas, aprovados para uso no âmbito de instituições de saúde ou quando da formalização de acordos de colaboração com outros prescritores ou instituições de saúde. Mas para o exercício da prescrição farmacêutica em casos de 36 medicamentos que exijam prescrição médica, será exigido, pelos Conselhos Regionais de Farmácia (CRFs), o reconhecimento de título de especialista na área clínica, com comprovação de formação que inclua conhecimentos e habilidades em boas práticas de prescrição, fisiopatologia, semiologia, comunicação interpessoal, farmacologia clínica e terapêutica. Para prescrição de medicamentos homeopáticos e manipulados, a exigência será o título de especialista em Homeopatia ou Antroposófica. 8.1 O que é a prescrição farmacêutica? O artigo 3º da Resolução CFF nº 586/2013 define prescrição farmacêutica como: Ato pelo qual o farmacêutico seleciona e documenta terapias farmacológicas e não farmacológicas, e outras intervenções relativas ao cuidado à saúde do paciente, visando à promoção, proteção e recuperação da saúde, e à prevenção de doenças e de outros problemas de saúde. Trata-se de uma das atribuições clínicas do farmacêutico, estabelecida no Capítulo I, art.7º, inciso XXVI da Resolução CFF nº 585/2013. Esta definição estabelece uma compreensão ampliada do que é prescrição farmacêutica. A prescrição é vista como um ato que está inserido no contexto do cuidado do paciente e das atribuições clínicas do profissional, e que não se restringe à escolha e recomendação documentada de medicamentos, mas também de terapêuticas não farmacológicas e outras intervenções em saúde. Os farmacêuticos têm uma formação específica em matérias que permitem um conhecimento adequado sobre o medicamento, desde o seu desenvolvimento, indicação, mecanismos de ação, doses, características farmacocinéticas e condições seguras de uso. Além disso, face aos diferentes níveis de complexidade da prescrição farmacêutica e à constante evolução do arsenal terapêutico, é necessário desenvolver ações que aperfeiçoem a sua qualificação para prescrever. A regulamentação desta atribuição pelo CFF influenciou positivamente a inserção do conteúdo correspondente nos currículos de graduação de vários cursos de Farmácia do país, bem como a busca 37 de aperfeiçoamento pelos farmacêuticos analistas clínicos que optaram por atuar nesta área. 8.2 Etapas no processo de prescrição Segundo o Art. 7º, 8º e 9º da Resolução CFF nº586/2013. O processo de prescrição farmacêutica é constituído das seguintes etapas: I - identificação das necessidades do paciente relacionadas à saúde; II - definição do objetivo terapêutico; III - seleção da terapia ou intervenções relativas ao cuidado à saúde, com base em sua segurança, eficácia, custo e conveniência, dentro do plano de cuidado; IV - redação da prescrição; V - orientação ao paciente; VI - avaliação dos resultados; VII - documentação do processo de prescrição. No ato da prescrição, o farmacêutico deverá adotar medidas que contribuam para a promoção da segurança do paciente, entre as quais se destacam: I - Basear suas ações nas melhores evidências científicas; II - tomar decisões de forma compartilhada e centrada no paciente; III - considerar a existência de outras condições clínicas, o uso de outros medicamentos, os hábitos de vida e o contexto de cuidado no entorno do paciente; IV - estar atento aos aspectos legais e éticos relativos aos documentos que serão entregues ao paciente; V - comunicar adequadamente ao paciente, seu responsável ou cuidador, as suas decisões e recomendações, de modo que estes as compreendam de forma completa; VI - adotar medidas para que os resultados em saúde do paciente, decorrentes da prescrição farmacêutica, sejam acompanhados e avaliados. A prescrição farmacêutica deverá ser redigida em vernáculo, por extenso, de modo legível, observados a nomenclatura e o sistema de pesos e medidas oficiais, sem emendas ou rasuras, devendo conter os seguintes componentes mínimos: 38 I - identificação do estabelecimento farmacêutico ou do serviço de saúde ao qual o farmacêutico está vinculado; II - nome completo e contato do paciente; III - descrição da terapia farmacológica, quando houver, incluindo as seguintes informações: a) nome do medicamento ou formulação, concentração/dinamização, forma farmacêutica e via de administração; b) dose, frequência de administração do medicamento e duração do tratamento; c) instruções adicionais, quando necessário. IV - descrição da terapia não farmacológica ou de outra intervenção relativa ao cuidado do paciente, quando houver; V - nome completo do farmacêutico, assinatura e número de registro no Conselho Regional de Farmácia; VI - local e data da prescrição. 8.3 Benefícios da prescrição farmacêutica para os pacientes e para a sociedade A ausência ou carência de assistência ocasiona, frequentemente, a tomada de decisões de tratamento, pela população, por conta própria, selecionando terapias que em muitos casos não são efetivas, seguras e, portanto, contraindicadas, implicando desfechos negativos na saúde e elevando os custos para os sistemas de saúde, o que pode favorecer o agravamento da condição clínica, gerar novos problemas de saúde e até mesmo retardar o diagnóstico precoce e o início de terapia efetiva e segura. Os estabelecimentos farmacêuticos, pela capilaridade de sua distribuição geográfica, e o farmacêutico, pela sua competência e disponibilidade, representam, muitas vezes, a primeira e única possibilidade de acesso das pessoas ao cuidado em saúde, especialmente para as famílias com piores condições socioeconômicas. Ao regulamentar a prescrição farmacêutica, o Conselho Federal de Farmácia possibilita ao farmacêutico cumprir sua missão perante a sociedade, qual seja a de proporcionar aos pacientes o máximo de benefício possível dos medicamentos que utilizam e o acesso a um serviço qualificado. A boa atuação clínica do farmacêutico, que inclui o ato de prescrever, relaciona–se ao desenvolvimento de competências (colocar em prática 39 conhecimentos e habilidades específicas em benefício do paciente), da existência de processos de trabalho bem delineados, ambiente propício para o desempenho das atividades, acesso à informação, gestão da prática, fiscalização sanitária e profissional como instrumento de identificação de falhas, proposição de soluções e de capacitação, assim como para coibir a má prática profissional. 8.4 Prescrição de medicamentos com venda sob prescrição médica Fonte: pixabay.com.br Para prescrição farmacêutica de medicamentos com faixa vermelha (dispensação exige a prescrição médica) o farmacêutico prescritor deverá: a) Possuir título de especialista ou de especialista profissional farmacêutico na área clínica com comprovação de formação que inclua conhecimentos e habilidades em boas práticas de prescrição, fisiopatologia, semiologia, comunicação interpessoal, farmacologia clínica e terapêutica; b) Ter o diagnóstico prévio; c) Seguir programas, protocolos, diretrizes clínicas ou normas técnicas, aprovados para uso no âmbito das instituições de saúde ou formalização de acordosde colaboração com outros prescritores como médicos e odontólogos. 40 Quando o farmacêutico decide como conduta encaminhar o paciente a outro profissional da saúde, ele precisa garantir que, tanto o usuário, quanto o profissional compreendam o motivo da recomendação feita pelo farmacêutico. Este procedimento tem como objetivo a compreensão do outro profissional a respeito do raciocínio clínico utilizado pelo farmacêutico, assim como, da conduta selecionada. O documento formaliza a comunicação com outros profissionais. A garantia da provisão de serviços e produtos para o cuidado das pessoas é um problema de saúde coletiva. A dimensão da necessidade de acesso e utilização a recursos terapêuticos e propedêuticos é superior à capacidade de financiamento e provisão dos sistemas de saúde. A população, em decorrência da ausência ou carência de assistência médica, frequentemente, toma decisões de tratamento por conta própria, selecionando terapias que em muitos casos não são efetivas, seguras e, portanto, contraindicadas. Isto pode favorecer o agravamento da sua condição clínica, gerar novos problemas de saúde e até mesmo retardar o diagnóstico precoce e o início de terapia efetiva e segura. A carência de acesso e da utilização dos recursos assistenciais implicam desfechos negativos dos problemas de saúde das pessoas, elevando os custos para os sistemas de saúde. Os estabelecimentos farmacêuticos, pela capilaridade de sua distribuição geográfica, e o farmacêutico, pela sua competência e disponibilidade, representam, muitas vezes, a primeira possibilidade de acesso das pessoas ao cuidado em saúde, especialmente para as famílias com piores condições socioeconômicas. O farmacêutico, apesar de representar um profissional estratégico para o sistema de saúde, nesta conjuntura, costuma ser subutilizado. No mundo contemporâneo, os modelos de assistência à saúde passam por profundas transformações resultantes da demanda por serviços, da incorporação de novas tecnologias e dos desafios de sustentabilidade do seu financiamento. Esses fatores provocam mudanças na forma de produzir o cuidado à saúde das pessoas, a um tempo em que contribuem para redefinição da divisão social do trabalho entre as profissões da saúde. A ideia de expandir para outros profissionais, entre os quais o farmacêutico, maior responsabilidade no manejo clínico dos pacientes, intensificando o processo de 41 cuidado, tem propiciado alterações nos marcos de regulação em vários países. Com base nessas mudanças, foram estabelecidas, entre outras, a autorização para que distintos profissionais possam selecionar, iniciar, adicionar, substituir, ajustar, repetir ou interromper a terapia farmacológica. Essa tendência surgiu pela necessidade de ampliar a cobertura dos serviços de saúde e incrementar a capacidade de resolução desses serviços. É fato que, em vários sistemas de saúde, profissionais não médicos estão autorizados a prescrever medicamentos. É assim que surge o novo modelo de prescrição como prática multiprofissional. Esta prática tem modos específicos para cada profissão e é efetivada de acordo com as necessidades de cuidado do paciente, e com as responsabilidades e limites de atuação de cada profissional. Isso favorece o acesso e aumenta o controle sobre os gastos, reduzindo, assim, os custos com a provisão de farmacoterapia racional, além de propiciar a obtenção de melhores resultados terapêuticos. Apesar disso, discutir prescrição farmacêutica não é tarefa fácil. Nós, os farmacêuticos, muitas vezes tivemos receio de usar termos como: consulta farmacêutica, diagnóstico farmacêutico, consultório farmacêutico, prescrição farmacêutica. Estes termos e expressões, que ainda são considerados como "tabus" no Brasil, fazem parte da linguagem técnica dos farmacêuticos em vários países, há mais de uma década. Em nosso país, frequentemente, justificamos a não pertinência de utilizá-los, recorrendo a eufemismos, tais como: atendimento farmacêutico, sala de serviços farmacêuticos, indicação farmacêutica, automedicação responsável, orientação farmacêutica, dispensação documentada, entre outros. Em outras profissões da saúde, como a enfermagem, a nutrição e a fisioterapia, não se percebe este mesmo receio. Isso pode ter contribuído para o avanço significativo das mesmas em seu papel no cuidado dos pacientes. Após a análise das 229 manifestações encaminhadas em resposta à Consulta Pública no. 06 de 2013, decidiu-se pela elaboração deste documento, com o objetivo de discorrer não somente sobre o posicionamento favorável de 85% das contribuições enviadas, mas também, e principalmente, a respeito das questões mais recorrentes, e que, em síntese, versam sobre: 42 1. A definição e o escopo da prescrição; 2. A competência do CFF em regular este tema e a legalidade da regulação; 3. A formação/qualificação/certificação do farmacêutico para prescrever; e, 4. O alegado conflito de interesse entre prescrever e comerciar medicamentos. A prescrição é uma das atribuições clínicas do farmacêutico e deverá ser realizada com base nas necessidades de saúde do paciente. Esta resolução encerra a concepção de prescrição como a ação de recomendar algo ao paciente. Tal recomendação pode incluir a seleção de opção terapêutica, a oferta de serviços farmacêuticos ou o encaminhamento a outros profissionais ou serviços de saúde. O ato de prescrever não constitui um serviço clínico per se, mas uma das atividades que compõem o processo de cuidado à saúde. Esta é uma concepção ampliada da prescrição, para além da seleção de medicamentos. Visão similar a esta é adotada por outras profissões da saúde e representa uma estratégia para a inserção desta atividade no sistema de saúde, na medida em que atendem às necessidades dos pacientes de forma ampla e minimiza a sobreposição de áreas de atuação exclusivas de outras categorias profissionais. Com relação aos medicamentos e outros produtos para à saúde que podem ser prescritos por farmacêutico, a presente proposta de resolução está alinhada com a regulamentação sanitária vigente. Além disso, cria a base legal para a prescrição farmacêutica de novas categorias de medicamentos que venham a ser aprovadas pelo órgão sanitário federal. Em todos os países em que ocorre prescrição farmacêutica de medicamentos, esta foi implantada com base em uma hierarquização clara da autonomia do farmacêutico em prescrever, de acordo com a complexidade da terapia, do serviço, da formação e certificação do profissional, e dos tipos de produtos autorizados pelo órgão sanitário. Com base nessas experiências internacionais, foram estabelecidos dois tipos possíveis de prescrição farmacêutica de medicamentos: a) O farmacêutico poderá realizar de forma independente a prescrição de medicamentos cuja dispensação não exija prescrição médica. 43 b) Com relação aos medicamentos tarjados ou cuja dispensação exija a prescrição médica, a resolução possibilita que o farmacêutico especialista exerça o papel de prescritor, tanto para iniciar como para fazer modificações na farmacoterapia, desde que existam programas, protocolos, diretrizes clínicas ou normas técnicas aprovadas para uso no âmbito das instituições de saúde, ou quando da formalização de acordos de colaboração com outros prescritores, como médicos e odontólogos. 8.5 Prescrição farmacêutica de MIPs Os Manuais para Dispensação de MIPs disponibilizados pelo CRF têm o objetivo de auxiliar os farmacêuticos na dispensação desses medicamentos. Eles foram desenvolvidos a partir de doenças ou sintomas que normalmente acometem a população, como os seguintes: • Cefaleia e enxaqueca. • Diarreia. • Dor. • Febre. • Gripe. • Infecções fúngicas de pele. • Resfriado. • Rinite alérgica. • Tosse. ABIMIP – Associação Brasileira da Indústria dos MIPsé uma entidade que congrega os principais fabricantes de origem nacional e internacional destes medicamentos que são conhecidos internacionalmente como Over-the-Conter (OTCs). A associação zela pelo uso responsável desses medicamentos e é contra a prática da automedicação, que é a prática de utilizar medicamentos tarjados, isto é, aqueles que exigem prescrição sem orientação de um médico. A ABIMIP apresenta os benefícios do uso responsável de MIPs: • Diminuição de custos pelo sistema de saúde. • Otimização de recursos governamentais. 44 • Diminuição de custos aos usuários. • Conforto ao usuário que não vai precisar procurar um serviço de saúde para tratar um problema conhecido. • Melhor qualidade de vida, quando tratamos de produtos de caráter preventivo como vitaminas e antioxidantes. Na prática clínica, quando devemos avaliar que o uso do MIP deve ser sucedido por uma consulta médica: • Quando os sintomas persistirem. • Quando os sintomas piorarem ou se o paciente tiver uma recaída. • Se o paciente tiver dores agudas. • Se o paciente tiver tentado um ou mais medicamentos sem sucesso. • Quando surgirem reações adversas. • Quando o paciente apresentar sintomas psicológicos como: ansiedade, depressão, agitação entre outros. • Se o paciente estiver convencido da gravidade dos seus sintomas. Lembrando que se deve dar uma atenção especial nos casos de gravidez e aleitamento, assim como em bebês e crianças. 8.6 Medicamentos Isentos de prescrição Em 2010, o Conselho Regional de Farmácia publicou o Fascículo II do Projeto Farmácia Estabelecimento de Saúde – Medicamentos Isentos de Prescrição, nesse documento apresenta os MIPs e apresenta nove manuais para dispensação de MIPs. Os Medicamentos Isentos de Prescrição (MIP), também chamados de OTC (sigla em inglês – over the conter que quer dizer sobre o balcão) e segundo o Ministério da Saúde são aqueles cuja dispensação não requerer autorização, ou seja, receita expedida por profissional. Como os MIPs são indicados para doenças que podem ser consideradas de alta morbidade e baixa gravidade e são considerados de elevada segurança de uso, eficácia comprovada cientificamente ou de uso tradicionalmente reconhecido, de fácil utilização e baixo risco de abuso, como os analgésicos e antiácidos, podem ser vendidos ou comprados sem apresentação de receita médica. 45 Assim, o fácil acesso a esses medicamentos torna-os diretamente ligados à automedicação. A prática da automedicação tornou-se comum devido à dificuldade de conseguir atendimento médico, e embora essa prática seja condenada por muitas pessoas, quando realizada de forma correta, pode ser desejável. Segundo o documento apresentado pelo CRF (2010), a dispensação de medicamentos, isentos ou não de prescrição, deve ser entendida como um processo de atenção à saúde. Quando a dispensação for acompanhada de uma orientação adequada, os riscos referentes aos medicamentos diminuem, contribuindo para que os estabelecimentos farmacêuticos sejam verdadeiros estabelecimentos de saúde. 8.7 Uso irracional de medicamentos: uma problemática mundial De todos os medicamentos, cerca de 50% são prescritos e dispensados de forma incorreta. A falta de implementação de políticas básicas para promover o uso racional de medicamentos e o uso abusivo, insuficiente ou impróprio desses produtos acabam lesionando a população e desencadeando desperdícios dos recursos públicos. Diversos fatores contribuem para essa prática incomum como: pouco conhecimento teórico-prático que desencadeia diagnósticos incompletos das doenças podendo resultar na escolha inadequada do tratamento, muitos prescritores obtêm informações sobre o tratamento a partir de campanhas farmacêuticas, não se reportando às fontes baseadas em evidências, a fácil aquisição e disponibilidade de medicamentos sem a necessidade de apresentação da receita médica, a busca através da internet por medicamentos caros, com preços mais convidativos e sem qualidade assegurada, a ausência de políticas farmacêuticas que induzem medidas e infraestruturas apropriadas para monitorar e regulamentar o uso de medicamentos e a sobrecarga de trabalho dos profissionais da saúde que pode resultar em ações de saúde deficientes. Toda essa ausência de estrutura acaba conduzindo os pacientes a adotarem novos hábitos culturais, induzindo ao uso incorreto de medicamentos como a polifarmácia, o uso indiscriminado de antibióticos, a prescrição não orientada por 46 diretrizes, a automedicação inapropriada e o fácil acesso ao desmedido armamentário terapêutico disponibilizado no comércio. O uso irracional de medicamentos além de afetar diretamente todos os países, pode desencadear graves consequências que se tornam gradativamente nocivas à saúde dos pacientes, como a resistência a antibióticos, a presença de reações adversas, o desperdício de recursos e a perda de confiança, muitas vezes gerada pela ausência da ação farmacológica esperada, já que houve, anteriormente, um uso excessivo do fármaco em questão. Para que toda essa problemática tenha seu impacto na saúde reduzido, é necessária a elaboração de estratégias que facilitem a comunicação entre o prescritor, paciente e o farmacêutico, proporcionando, assim, o uso racional do medicamento. 8.8 O papel do farmacêutico na Atenção Farmacêutica quanto ao uso racional de medicamentos Entre as intervenções fundamentais para promover o uso racional de medicamentos está a prática da Atenção Farmacêutica. Esse processo é conceituado como uma atividade profissional em que o paciente é o principal beneficiário das ações do farmacêutico. Nela são incluídas atitudes, cuidados, compromissos, comportamentos, funções, conhecimentos, valores éticos, responsabilidades e habilidades do profissional farmacêutico na prestação da farmacoterapia, buscando obter resultados terapêuticos baseados nos indicadores de saúde e na qualidade de vida dos pacientes. Para o desenvolvimento dessa prática, são necessárias ações que, ancoradas ao tripé farmacêutico-paciente-medicamento, possibilitem usar estratégias educativas como o aconselhamento terapêutico que irá contribuir não só para o uso correto de medicamentos, mas também propiciar benefícios individuais, institucionais e nacionais. No caso do usuário, a escolha racional proporciona mais garantia de benefício terapêutico (eficácia e segurança) com menor custo, contribuindo para o cuidado integral à saúde. Para os órgãos institucionais há melhora no padrão de atendimento, maior resolução do sistema e redução dos gastos. 47 Em nível nacional, essas atitudes racionais acarretam consequências positivas sobre a morbimortalidade e qualidade de vida da população, aumentando a confiança do usuário na atenção à saúde pública. Para que o uso racional de medicamentos seja estabelecido, é necessário que a concepção de medicamento seja consolidada como instrumento de saúde e não como uma mercadoria. É preciso confirmar a necessidade do uso do medicamento para que o mesmo seja receitado de forma apropriada de acordo com a eficácia e segurança comprovadas e aceitáveis. O fármaco deve ser prescrito adequadamente na forma farmacêutica correspondente, dose e período de duração do tratamento, que esteja disponível a um preço acessível, que responda sempre aos critérios de qualidade exigidos, se dispense em condições adequadas, com responsabilidade e com todas as informações necessárias para que se cumpra a terapêutica prescrita da melhor maneira possível. A partir dessas informações, pode-se enfatizar a importância da humanização no atendimento pelo profissional farmacêutico, proporcionando ao paciente a habilidade de seguir seu tratamento corretamente, tendo acesso às informações de que necessita, a fim de ser capaz de desenvolver, de forma correta, o