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Complicações cardiovasculares e renais no diabetes mellitus O diabetes mellitus é uma doença metabólica caracterizada pelo excesso de glicose no sangue e eventualmente na urina. Os dois tipos mais comuns são tipo 1 e tipo 2 e ambos apresentam comprometimento na regulação da glicemia por ação da insulina. O diabetes mellitus é uma síndrome resultante de um distúrbio no metabolismo de açúcares, gorduras e proteínas. O diabetes apresenta altas taxas de morbi-mortalidade na população e tem como principais causas a destruição das células produtoras de insulina e defeito na secreção e/ou ação de insulina. Mudanças no estilo de vida são fundamentais para prevenir ou retardar o surgimento das complicações crônicas do diabetes, além de diminuir o risco de progressão da doença. Trata-se de um distúrbio endócrino que consiste de um defeito de secreção e/ou ação da insulina produzida pelo pâncreas, manifestando-se pela utilização inadequada de glicose pelos tecidos que ocasiona ao organismo a hiperglicemia. O pâncreas é constituído por dois órgãos, o endócrino e o exócrino, sendo o endócrino responsável pela produção do hormônio insulina, entre outros, e qualquer alteração neste órgão resulta em danos ao organismo. Classificações para o diabetes: tipo 1, tipo 2, gestacional e secundário a outras patologias. O tipo 1 da doença geralmente é causado por um processo autoimune e resulta da destruição das células beta do pâncreas, levando a uma deficiência absoluta de insulina. É a forma mais acentuada da doença, é mais frequente em indivíduos mais jovens e adultos não-obesos e é um distúrbio catabólico onde a insulina circulante é praticamente ausente. Em pacientes sintomáticos é comum a poliúria, polifagia, polidipsia, perda de peso e alterações visuais. Além disso, os pacientes podem sofrer complicações crônicas como aterosclerose, infarto do miocárdio e tornam-se mais susceptíveis a infecções como carbúnculos e furunculose generalizada. Nesses pacientes, é necessária a administração de insulina para evitar o desenvolvimento de cetoacidose, coma e morte. Os pacientes com o tipo 2 também podem apresentar poliúria, polidipsia e polifagia, além de alterações visuais e feridas de difícil cicatrização nos estágios mais avançados da doença. É um distúrbio comum em que o fator hereditário e a obesidade apresentam maior importância do que no tipo 1 e apesar desses pacientes produzirem insulina normalmente suas células são incapazes de usar toda essa insulina secretada pelo pâncreas, fazendo com que seus níveis permaneçam altos no sangue, o que é conhecido como resistência à insulina. A fisiopatologia do diabetes gestacional é similar ao tipo 2. As pacientes desenvolvem uma deficiência de receptores de insulina e esse fator juntamente com a elevada concentração de hormônio do crescimento determinam um grau de intolerância à glicose e uma consequente hiperglicemia. Esta patologia se instala mais comumente em gestantes que ganham muito peso durante a gravidez e pode acarretar em complicações tanto para a mãe como para o feto. O diabetes secundário a outras patologias é geralmente decorrente de: defeito genético nas células beta e nos receptores de insulina, doenças no pâncreas, defeitos hormonais no organismo, entre outros. Para prevenir as complicações relacionadas a esta doença é necessária a modificação do estilo de vida. Na doença diabética as alterações vasculares são divididas em duas categorias: microvasculares, principal causa de morte em pacientes com o tipo 1, e macrovasculares, principal causa em pacientes com o tipo 2. O acometimento microvascular está relacionado aos pequenos vasos, capilares e arteríolas, manifestando-se principalmente pelo espessamento da membrana basal capilar. Esse comprometimento microvascular acomete os rins, levando a nefropatia diabética, o sistema vascular sistêmico, entre outros. O envolvimento de grandes vasos, ou seja, o comprometimento macrovascular é essencialmente uma forma acelerada da aterosclerose, sendo responsável pela alta incidência de doenças cardiovasculares, que são responsáveis pelos maiores índices de mortalidade nessa população, e incluem o infarto do miocárdio, o acidente vascular cerebral e a gangrena periférica. Entre os parâmetros laboratoriais mais utilizados para nortear as decisões terapêuticas é utilizado o teste oral de tolerância à glicose (TOTG), método de referência, considerando-se a presença de diabetes ou tolerância à glicose diminuída, quando a glicose plasmática de 2h após a ingestão de 75g de glicose for e” 200mg/dl ou e” 140 e <200mg/dl, respectivamente. Quando este teste não puder ser realizado, utiliza-se a medida da glicose plasmática em jejum, considerando-se como diabetes ou glicose alterada em jejum quando os valores forem e” 126mg/ dl ou e” 100 e <126mg/dl, respectivamente. O retardo para o início do tratamento pode acarretar no desenvolvimento de doenças cardiovasculares, retinopatias, neuropatias autonômicas e periféricas, nefropatias, doença vascular periférica, aterosclerose, doença cerebrovascular, hipertensão, susceptibilidade a infecções e doenças periodontais, sendo responsável por gastos expressivos em saúde, além de substancial redução da capacidade de trabalho e da expectativa de vida. ENVOLVIMENTO CARDIOVASCULAR As doenças cardiovasculares associadas à diabetes incluem a doença coronária, o acidente vascular cerebral e a doença arterial periférica. Entre 50 a 80% da mortalidade na população diabética é atribuída a estas patologias, que tem como principais fatores de risco: a idade, o sedentarismo, hábitos alimentares inadequados, excesso de peso/obesidade, tabagismo, hiperglicemia, hipertensão arterial e dislipidemia. Os indivíduos com o tipo 2 apresentam incidência duas a três vezes maior de doença cardiovascular, uma vez que as complicações macrovasculares nestes pacientes equivalem a duas vezes as complicações microvasculares. Por se tratar de uma patologia que é um importante problema de saúde pública se torna evidente a importância das prevenções primária e secundária. A prevenção primária está relacionada com os fatores de risco, ou seja, na modificação dos estilos de vida (sedentarismo, hábitos alimentares inadequados), cessação tabágica e controle da tensão arterial, glicemia e perfil lipídico. Já a prevenção secundária define-se como a detecção precoce de uma doença para que o tratamento possa começar antes que tenham ocorrido lesões irreversíveis. ENVOLVIMENTO RENAL Os rins são órgãos fundamentais para a manutenção da homeostase do corpo humano, logo, a diminuição progressiva da função renal implica em comprometimento de essencialmente todos os outros órgãos. A fisiopatologia da doença renal diabética é complexa, abrangendo fatores hemodinâmicos, concentração plasmática dos produtos finais de glicolisação avançada, disfunção endotelial, entre outros, e os principais fatores de risco são hiperglicemia, hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e susceptibilidade genética. A nefropatia diabética é uma importante complicação crônica do diabetes, sendo uma das principais causas dos novos casos de diálise e está associada ao aumento da mortalidade nos pacientes. - Nos pacientes com o tipo 2, o curso da doença é mais variável devido à dificuldade na determinação da data exata do início da diabetes e também à existência de comorbidades que contribuem para a doença renal. Por esse motivo, nesses doentes devem ser excluídas, primeiramente, outras causas de patologia renal. Estudos comprovam que a disponibilidade genética contribui para o aparecimento da nefropatia diabética, em ambos os tipos, outros fatores de risco que contribuem para a progressão da nefropatia são a duração da diabetes, a idade, sexo masculino, tabagismo, hipertensão arterial, hiperglicemia e dislipidemia. A prevenção e o tratamento da nefropatia diabética se baseiam numa intervenção multifatorial, que envolve o controle de fatores de risco como a hipertensão arterial, hiperglicemia, dislipidemia, tabagismo, nefrotoxinas, bem como a utilizaçãode agentes nefroprotetores e a modificação de estilos de vida com cessação tabágica, dieta, exercício físico, que não só contribuem para a diminuição da progressão da lesão renal como também modulam o risco de morbidade e mortalidade cardiovasculares. A hemodiálise teve sucesso limitado no tratamento da insuficiência renal na diabetes por causa da nefropatia, porém o transplante renal frequentemente é bem sucedido em casos de doadores compatíveis. RANG & DALE O diabetes tipo 1 pode ocorrer em qualquer idade, mas os pacientes são normalmente jovens (crianças ou adolescentes) e não obesos quando surgem os primeiros sintomas. Existe uma predisposição genética, com uma incidência de 10-15% nos familiares de primeiro grau, e uma forte associação com determinados antígenos histocompatíveis (tipos HLA). O diabetes tipo 2 é acompanhado tanto de resistência à insulina (a qual precede a manifestação franca da doença) quanto de comprometimento da secreção de insulina. Esses pacientes são frequentemente obesos, e, em geral, a doença se manifesta na vida adulta, sendo que a incidência aumenta progressivamente com a idade, à medida que declina a função das células B. Tratamento do diabetes melito A insulina é essencial para o tratamento do diabetes tipo 1 e é um importante componente do tratamento de muitos pacientes portadores do tipo 2 da doença. Fármacos orais são utilizados para controlar os sintomas da hiperglicemia, bem como para limitar as complicações microvasculares, e, para isso, são introduzidos precocemente. É essencial a introdução de medidas dietéticas e de estatinas para a prevenção da doença ateromatosa Tratamento com insulina Aspectos farmacocinéticos e preparação de insulina A insulina é degradada no trato gastrointestinal e habitualmente administrada por injeção subcutânea, mas também por via intravenosa ou intramuscular em situações de emergência. Insulina por via intraperitoneal é utilizada em pacientes diabéticos portadores de insuficiência renal em estágio terminal, tratados com diálise peritoneal ambulatorial. Uma vez absorvida, a insulina possui meia-vida de eliminação de aproximadamente 10 minutos. É inativada enzimaticamente no fígado e no rim, e 10% são eliminados na urina. A presença de comprometimento renal reduz as necessidades de insulina. Um dos principais problemas no uso da insulina consiste em evitar as amplas flutuações observadas nas concentrações plasmáticas e, consequentemente, na glicemia. A insulina lispro é um análogo de insulina no qual os resíduos de lisina e prolina são “trocados”. Ela age mais rapidamente, porém por um período mais curto de tempo do que a insulina normal, o que permite que os pacientes possam injetá-la neles mesmos imediatamente antes de uma refeição. A insulina glargina é outro análogo de insulina modificada desenvolvido com a intenção oposta, ou seja, a de propiciar um aporte basal constante de insulina e mimetizar a secreção fisiológica basal pós-absortiva de insulina. Efeitos adversos O principal efeito adverso da insulina é a hipoglicemia. É comum e, se muito grave, pode causar danos cerebrais ou morte súbita cardíaca. Em casos de hipoglicemia, ingere-se uma bebida ou um alimento doce ou, se o paciente estiver inconsciente, administra-se glicose por via intravenosa ou glucagon por via intramuscular. A alergia à insulina humana não é comum, muito embora possa ocorrer. Ela pode manifestar-se sob a forma de reações locais ou sistêmicas. A resistência à insulina como consequência da formação de anticorpos é rara. Usos clínicos da insulina e outros fármacos hipoglicemiantes injetáveis • Os pacientes portadores de diabetes tipo 1 necessitam de tratamento com insulina em longo prazo: – com frequência, combina-se uma preparação de ação intermediária (p. ex., a insulina isófana) ou um análogo de ação prolongada (p. ex., a insulina glargina) com uma insulina solúvel ou um análogo de curta duração (p. ex., a insulina lispro), administrada antes das refeições. • A insulina solúvel é utilizada (por via intravenosa) no tratamento de emergências diabéticas hiperglicêmicas (p. ex., a cetoacidose diabética). • Aproximadamente um terço dos pacientes portadores de diabetes tipo 2 acaba necessitando de tratamento com insulina. • Utiliza-se a insulina no tratamento em curto prazo de pacientes portadores de diabetes tipo 2 ou com intolerância à glicose durante eventos intercorrentes (p. ex., cirurgias, infecções, infarto do miocárdio). • Durante a gravidez, para o diabetes gestacional não é controlado apenas com a dieta. • Tratamento de emergência da hipercalemia: a insulina é administrada juntamente com a glicose com a finalidade de reduzir o K+ extracelular através de redistribuição para o interior das células. • Além dos fármacos orais, pode ser utilizada a exenatida no diabetes tipo 2, com a finalidade de melhorar o controle da glicemia e estimular a perda ponderal. Outros agentes hipoglicemiantes - Biguanidas A metformina, é a única biguanida utilizada clinicamente no tratamento do diabetes tipo 2, para o qual é agora um fármaco de primeira escolha. Ações e mecanismo O alvo ou alvos moleculares através dos quais as biguanidas atuam permanecem pouco claros, mas as suas ações bioquímicas estão bem compreendidas e incluem: •redução da produção da glicose hepática (gliconeogênese; a gliconeogênese está aumentada de forma acentuada no diabetes tipo 2); • aumento da captação de glicose e utilização no músculo esquelético (i. e., reduz a insulino-resistência); • redução da absorção de carboidratos pelo intestino; • aumento da oxidação de ácidos graxos; • redução das lipoproteínas circulantes de baixa e alta densidades (LDL e VLDL, respectivamente). A redução da gliconeogênese hepática é especialmente importante. O principal efeito da metformina é reduzir a produção da glicose hepática ao inibir o complexo I da cadeia respiratória mitocondrial. A consequente diminuição nos níveis de energia hepática ativa a AMPK (proteína cinase ativada pela AMP), uma enzima importante no controle metabólico. A ativação da AMPK aumenta a expressão de genes que são importantes para a gliconeogênese no fígado. A metformina possui uma meia-vida de cerca de 3 horas e é eliminada de forma inalterada na urina. Efeitos indesejáveis A metformina, ao mesmo tempo em que previne a hiperglicemia, não causa hipoglicemia, e os efeitos indesejáveis mais comuns incluem os distúrbios gastrointestinais relacionados com a dose (p. ex., anorexia, diarreia, náuseas), os quais são em geral, mas nem sempre, transitórios. A ocorrência de acidose lática é rara, mas pode ser um efeito tóxico potencialmente fatal, e a metformina não deve ser administrada de rotina a pacientes portadores de doença renal ou hepática, doença pulmonar hipóxica ou choque. Usos clínicos A metformina é utilizada para tratar pacientes portadores de diabetes tipo 2. Esse fármaco não estimula o apetite (pelo contrário) e, dessa forma, é o fármaco de primeira escolha na maioria dos pacientes com diabetes tipo 2 que são obesos, assumindo-se que não apresentem comprometimento das funções renal ou hepática. Pode ser utilizada em combinação com as sulfonilureias, as glitazonas ou com a insulina. Além do diabetes tipo 2, outros usos em potencial incluem outras síndromes que acompanham a resistência à insulina, incluindo a síndrome dos ovários policísticos, a esteatose hepática não alcoólica, diabetes gestacional e algumas formas de puberdade prematura. Sulfonilureias As sulfonilureias foram desenvolvidas após a observação casual de que um derivado da sulfonamida (utilizado no tratamento da febre tifóide) causava hipoglicemia. Estão disponíveis no mercado diversas sulfonilureias. As primeiras a serem utilizadas terapeuticamente foram a tolbutamida e a clorpropamida. A clorpropamida tem uma duração de ação longa e uma fração substancial é eliminada na urina. Consequentemente, ela pode causar hipoglicemia grave, especialmente nos pacientes idosos cuja função renal declina de forma inevitável, mas insidiosa. Provoca rubor apóso consumo de álcool, devido a um efeito semelhante ao do dissulfiram, e exerce ação semelhante à do hormônio antidiurético sobre o néfron distal, produzindo hiponatremia e intoxicação hídrica. As assim denominadas sulfonilureias de segunda geração (p. ex., glibenclamida e glipizida; ver Tabela 31.3) são mais potentes, todavia seu efeito hipoglicemiante máximo não é maior, e o controle da glicemia não é melhor do que o obtido com a tolbutamida. Todos esses fármacos contêm uma porção de sulfonilureia e agem da mesma forma, porém diferentes substituições resultam em diferenças na farmacocinética e, portanto, na duração da ação. Mecanismo de ação A principal ação das sulfoniluréias se dá sobre as células B, estimulando a secreção de insulina e reduzindo, dessa forma, os níveis de glicose no plasma. Existem locais de ligação de alta afinidade para as sulfonilureias nos canais de KATP na superfície da membrana das células B; o grau de afinidade de várias sulfonilureias correlaciona-se com a sua potência na estimulação da liberação de insulina. O bloqueio da ativação dos canais KATP pelas sulfonilureias causa despolarização, entrada de Ca 2+ e secreção de insulina. Aspectos farmacocinéticos As sulfonilureias são bem absorvidas após a administração por via oral, e a maioria alcança as concentrações plasmáticas máximas em 2 a 4 horas. Todas se ligam fortemente à albumina plasmática e estão envolvidas em interações com outros fármacos (p. ex., salicilatos e sulfonamidas) que competem por esses pontos de ligação. A maior parte das sulfonilureias (ou seus metabólitos ativos) é eliminada na urina, de forma que sua ação está aumentada e prolongada nos idosos e nos pacientes portadores de doença renal. A maioria das sulfonilureias atravessa a placenta e está presente no leite materno, de forma que seu uso está contraindicado durante a gravidez e a lactação. Efeitos indesejáveis As sulfonilurérias são geralmente bem toleradas. Os efeitos indesejáveis são descritos na Tabela 31.3. O efeito adverso mais comum é a hipoglicemia, a qual pode ser grave e prolongada; a incidência é maior com os fármacos de longa duração como a clorpropamida e a glibenclamida e as menores incidências ocorrem com a tolbutamida. É melhor evitar o uso da glibenclamida no indivíduo idoso e nos pacientes que apresentam comprometimento renal, mesmo que leve, devido ao risco de hipoglicemia. Interações medicamentosas Diversos fármacos aumentam os efeitos hipoglicemiantes das sulfonilureias. Foi relatado que fármacos anti-inflamatórios não esteroidais, varfarina, alguns fármacos uricosúricos (p. ex., a sulfimpirazona), álcool, inibidores da monoamino-oxidase, alguns agentes antibacterianos (incluindo sulfonamidas, trimetoprima e cloranfenicol) e alguns antifúngicos imidazólicos produzem hipoglicemia grave quando administrados em conjunto com as sulfonilureias. Os agentes que diminuem a ação das sulfoniluréias sobre a glicemia incluem os diuréticos tiazídicos em doses elevadas e os corticosteróides (interações farmacodinâmicas). Uso clínico As sulfonilureias são utilizadas para tratar o diabetes tipo 2 em seus estágios mais iniciais, todavia, uma vez que esses fármacos requerem a presença de células B funcionantes, eles não são úteis no tratamento do diabetes tipo 1 ou nos estágios mais tardios do diabetes tipo 2. Eles podem ser associados à metformina ou às tiazolidinadionas. Outros fármacos que estimulam a secreção de insulina Recentemente, foram desenvolvidos diversos fármacos que agem da mesma forma que as sulfonilureias, através do bloqueio do receptor das sulfonilureias nos canais KATP nas células B pancreáticas; no entanto, tais fármacos não possuem a porção sulfonilureia. Esse grupo de fármacos inclui a rapaglinida e a nateglinida, as quais, embora muito menos potentes do que a maioria das sulfonilureias, possui rápido início e fim de ação, o que leva a uma curta duração de ação e baixo risco de hipoglicemia. Diferentemente da glibenclamida, esses fármacos são relativamente seletivos para os canais KATP presentes nas células B em detrimento aos KATP existentes no músculo liso vascular. Tiazolidinadionas (glitazonas): pioglitazona As tiazolidinadionas (ou glitazonas) foram desenvolvidas após a observação casual de que um análogo do clofibrato, a ciglitazona, que estava sendo estudada devido aos seus efeitos sobre os lipídeos, reduziu de forma inesperada a glicemia. A ciglitazona provocava toxicidade hepática e esta classe de fármacos (apesar de um considerável sucesso comercial) foi marcada por efeitos adversos (principalmente cardiovasculares), retirada dos mercados regulamentares e controvérsias. A pioglitazona é o único fármaco desta classe que continua a ter uso clínico; os seus predecessores, rosiglitazona e troglitazona, foram retirados devido, respectivamente, ao risco aumentado de ataques cardíacos e de danos hepáticos. Efeitos Os efeitos das tiazolidinadionas sobre a glicemia são de início lento, sendo o efeito máximo atingido apenas com 1-2 meses após o início do tratamento. Atuam através do reforço da eficácia da insulina endógena e, desse modo, reduzindo a produção de glicose hepática e aumentando a captação da glicose no músculo. Mecanismo de ação As tiazolidinadionas ligam-se a um receptor nuclear denominado receptor-γ ativado por proliferadores de peroxissomo (PPARγ, do inglês peroxisome proliferator-activated receptor-γ), o qual forma um complexo com o receptor de retinoide X. O PPARγ está presente principalmente no tecido adiposo, mas também pode ser encontrado no músculo e no fígado. Ele promove diferenciação dos adipócitos (tal fato contribui para o ganho ponderal, que é um efeito indesejado com o uso do fármaco), aumenta a lipogênese e estimula a captação de ácidos graxos e de glicose. Ele também promove a reabsorção de sódio sensível à amilorida nos ductos coletores renais, o que explica a retenção hídrica. Aspectos farmacocinéticos A pioglitazona é rápida e quase completamente absorvida, atingindo concentração plasmática máxima em menos de 2 horas. Circula ligada a proteínas plasmáticas (> 99%), sofre metabolismo hepático, e o fármaco principal possui meia-vida de eliminação curta (inferior a 7 horas), sendo que seu metabólito possui meia-vida substancialmente maior (de até 24 horas). A pioglitazona é metabolizada principalmente por uma isoenzima CYP2C e pela CYP3A4, dando origem a metabólitos ativos que são eliminados principalmente na bile. Efeitos adversos Foram notificados casos muito raros de disfunção hepática induzida pela pioglitazona; recomenda-se monitoração da função hepática antes do tratamento e periodicamente após o tratamento, principalmente se surgirem sintomas, como urina escura, que indiquem a possibilidade de doença hepática. Os efeitos adversos mais comuns da pioglitazona são aumento de peso e retenção de líquidos. A pioglitazona está contraindicada em mulheres grávidas, ou a amamentar, e em crianças. É teoricamente possível que estes fármacos possam causar ovulação em mulheres sem ovulação devido à resistência à insulina (p. ex., síndrome do ovário poliquístico). Uso clínico A pioglitazona tem um efeito aditivo com outros antidiabéticos orais em termos de efeitos glicemia e existe em comercialização um comprimido combinado com metformina. Pode diminuir a progressão da intolerância à glicose e pode reduzir a necessidade de insulina exógena nos pacientes com diabetes tipo 2. A combinação com insulina pode aumentar o risco de doenças cardíacas. Inibidores da α-glicosidase A acarbose, um inibidor da α-glicosidase intestinal, é utilizada nos pacientes portadores de diabetes tipo 2 cuja doença é controlada de forma inadequada com a dieta ou sem outros agentes. Ela retarda a absorção de carboidratos, reduzindo a elevação da glicemia pós-prandial. Os efeitos adversos mais comuns estão relacionados com a sua ação principal e consistem em flatulência, fezes ecidas ou diarreia, dor abdominal e sensação de plenitude. De forma semelhante à metformina, esse fármaco pode ser de particularimportância nos pacientes obesos portadores de diabetes tipo 2, além de poder ser administrado em conjunto com a metformina. Fármacos que mimetizam as incretinas e outros fármacos relacionados A exenatida mimetiza os efeitos do GLP-1 (ver anteriormente), mas com maior duração. A liraglutida é um agonista do GLP-1 e uma alternativa injetável. Estes fármacos diminuem a glicose no sangue após uma refeição ao aumentar a secreção de insulina, suprimindo a secreção de glucagon e atrasando o esvaziamento gástrico. A exenatida não é absorvida pelo intestino e é administrada subcutaneamente. É muito mais estável que o GLP-1 e é administrada duas vezes por dia antes da primeira e última refeição do dia. A exenatida ou a liraglutida são utilizados em pacientes com diabetes tipo 2 em combinação com outros fármacos (metformina com ou sem sulfonilureia, pioglitazona, insulina); Gliptinas As gliptinas (p. ex., sitagliptina, vildagliptina, saxagliptina, linagliptina) são fármacos sintéticos que inibem competitivamente a dipeptidil proteinase-4 (DPP-4). Desse modo, diminuem a glicose no sangue ao potenciar as incretinas endógenas (GLP-1 e GIP, ver pág. 385) que estimulam a secreção de insulina. Não provocam perda ou aumento de peso. São absorvidas pelo intestino e administradas uma vez (ou, no caso da vildagliptina, duas vezes) por dia, oralmente. São eliminadas parcialmente através de excreção renal e também são metabolizadas pelas enzimas hepáticas CYP. São normalmente bem toleradas com uma série de efeitos gastrointestinais adversos; Fármacos utilizados no tratamento do diabetes melito Insulina e outros fármacos injetáveis • A insulina humana é produzida através da tecnologia do DNA recombinante. Para o uso rotineiro é administrada por via subcutânea (por via intravenosa em situações de emergência). • As diferentes formulações da insulina diferem na sua duração de ação: – insulina solúvel de ação rápida e curta: pico de ação obtido em 2-4 h após administração da dose por via subcutânea, com duração de 6-8 h; é a única formulação que pode ser administrada por via intravenosa – insulina de ação intermediária (p. ex., insulina isófana) – formas de ação prolongada (p. ex., suspensão de insulina zinco). • O principal efeito indesejável consiste no desenvolvimento de hipoglicemia. • A alteração da sequência de aminoácidos (análogos da insulina, como, por exemplo, a insulina lispro e a insulina glargina) pode convenientemente modificar a cinética da insulina. • As insulinas são utilizadas em todos os pacientes portadores de diabetes tipo 1 e em aproximadamente um terço dos pacientes portadores de diabetes tipo 2. • A exenatida e a liraglutida são agonistas do GLP-1 injetáveis utilizados como tratamento complementar em determinados pacientes com diabetes tipo 2 controlados inadequadamente. Ao contrário da insulina, podem causar perda de peso. Fármacos hipoglicemiantes orais • Esses fármacos são utilizados no diabetes tipo 2. • Biguanidas (p. ex., a metformina): – exercem ações periféricas complexas na presença de quantidades residuais de insulina, aumentando a captação de glicose pelo músculo estriado e inibindo a liberação de glicose pelo fígado e a absorção de glicose pelo intestino – causam anorexia e estimulam a perda de peso – podem ser utilizados em associação às sulfonilureias. • Sulfonilureias e outros fármacos que estimulam a secreção de insulina (p. ex., tolbutamida, glibenclamida, nateglinida): – podem causar hipoglicemia (o que estimula o apetite, levando a ganho de peso); – são eficazes apenas na presença de células B funcionais – bloqueiam os canais de potássio sensíveis ao ATP nas células B – são em geral bem tolerados, embora promovam aumento de peso e estejam associados a mais doenças cardiovasculares que a metformina. • As tiazolidinedionas têm sido associadas à toxicidade hepática e cardíaca graves. A única ainda comercializada é a pioglitazona. – aumentam a sensibilidade à insulina e reduzem a glicemia nos pacientes portadores de diabetes tipo 2 – podem causar ganho ponderal e edema – aumentam o risco de fraturas por osteoporose – são agonistas dos receptores ativados por proliferadores de peroxissoma-γ (um receptor nuclear). • Gliptinas (p. ex., sitagliptina): – potencializam as incretinas endógenas ao bloquear a DPP-4 – são adicionadas a outros fármacos ativos por via oral para melhorar o controle glicêmico de pacientes portadores de diabetes tipo 2 – são neutras em termos de peso; são normalmente bem toleradas, mas a pancreatite permanece uma preocupação. • Inibidor da α-glicosidase, acarbose: – reduz a absorção de carboidratos – causa flatulência e diarreia. Usos clínicos dos fármacos hipoglicemiantes orais • Diabetes melito tipo 2, com a finalidade de reduzir os sintomas da hiperglicemia (p. ex., sede, micção excessiva). (O controle “rígido” da glicemia possui apenas um pequeno efeito sobre as complicações vasculares nesse quadro.) • A metformina é de escolha especialmente para pacientes obesos, a não ser que estejam presentes fatores que contra indiquem o seu uso por predispõem ao desenvolvimento de acidose lática (insuficiência renal ou hepática, insuficiência cardíaca descompensada, hipoxemia). • A acarbose (inibidor da α-glicosidase) reduz a absorção de carboidratos; provoca flatulência e diarreia. • Os fármacos que atuam sobre o receptor de sulfonilureias (p. ex., tolbutamida, glibenclamida) são bem tolerados, porém frequentemente promovem ganho ponderal. Estão associados a um maior risco cardiovascular em comparação com a metformina. • A pioglitazona melhora o controle (reduz a hemoglobina A1C ), mas aumenta o peso, provoca retenção de líquidos e aumenta o risco de fraturas. Os agonistas do GLP-1 (exenatida ou liraglutida) são injetados uma vez por dia ou (exenatida de liberação modificada) uma vez por semana em pacientes obesos, controlados inadequadamente e sujeitos com dois antidiabéticos orais. • Os inibidores da DPP4 (gliptinas, p. ex., sitagliptina) melhoram o controle, são bem tolerados e não provocam alterações no peso, mas faltam experiência a longo prazo e evidência. A pancreatite constitui uma preocupação.