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Brasília-DF. Patologias na Endocrinologia, MEtabologia E obEsidadE Elaboração Lustarllone Bento de Oliveira Produção Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração Sumário APrESEntAção ................................................................................................................................. 5 orgAnizAção do CAdErno dE EStudoS E PESquiSA .................................................................... 6 introdução.................................................................................................................................... 8 unidAdE i Etiologia Do MEtabolisMo Corporal .......................................................................................... 11 CAPítulo 1 obEsiDaDE E sua Etiologia DiantE Dos fatorEs soCiais, EConôMiCos E aMbiEntais ......................................................................................................................... 11 CAPítulo 2 sínDroME MEtabóliCa (sM) ................................................................................................. 19 CAPítulo 3 a Evolução E EpiDEMiologia Da sínDroME MEtabóliCa no brasil E no MunDo ......... 21 CAPítulo 4 CaraCtErização ClíniCa E laboratorial Da sínDroME MEtabóliCa ............................. 25 unidAdE ii ClassifiCação Das DoEnças QuE aCoMEtEM os paCiEntEs QuE possuEM problEMas EnDóCrinos E MEtabóliCos – partE i ............................................................................................. 29 CAPítulo 1 DiabEtEs ................................................................................................................................ 29 CAPítulo 2 DislipiDEMias ........................................................................................................................ 36 CAPítulo 3 DoEnças Da tirEoiDE .......................................................................................................... 50 CAPítulo 4 DoEnça DE gravEs (Dg) ..................................................................................................... 53 CAPítulo 5 tirEoiDitE DE HasHiMoto ..................................................................................................... 59 unidAdE iii ClassifiCação Das DoEnças QuE aCoMEtEM os paCiEntEs QuE possuEM problEMas EnDóCrinos E MEtabóliCos - partE ii ............................................................................................. 67 CAPítulo 1 DoEnças Da paratirEoiDE .................................................................................................. 67 CAPítulo 2 fEoCroMoCitoMa ............................................................................................................. 75 CAPítulo 3 HipEralDostEronisMo priMário ........................................................................................ 85 unidAdE iV ClassifiCação Das DoEnças QuE aCoMEtEM os paCiEntEs QuE possuEM problEMas EnDóCrinos E MEtabóliCos - partE iii ............................................................................................ 96 CAPítulo 1 HirsutisMo ........................................................................................................................... 96 CAPítulo 2 insufiCiênCia suprarrEnal (DoEnça DE aDDison) ......................................................... 101 CAPítulo 3 ostEoporosE .................................................................................................................... 104 unidAdE V ClassifiCação Das DoEnças QuE aCoMEtEM os paCiEntEs QuE possuEM problEMas EnDóCrinos E MEtabóliCos - partE iv .......................................................................................... 112 CAPítulo 1 sínDroME DE CusHing ...................................................................................................... 112 CAPítulo 2 açõEs DE saúDE no ControlE Dos Distúrbios MEtabóliCos E EnDóCrinos .............. 120 CAPítulo 3 proMoção à saúDE E prEvEnção DE risCos E DoEnças ............................................. 123 CAPítulo 4 outros bEnEfíCios Da tErapia CoMportaMEntal........................................................... 129 rEfErênCiAS ................................................................................................................................ 131 5 Apresentação Caro aluno A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD. Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo. Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira. Conselho Editorial 6 organização do Caderno de Estudos e Pesquisa Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares. A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa. Provocação Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor conteudista. Para refletir Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões. Sugestão de estudo complementar Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso. Atenção Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a síntese/conclusão do assunto abordado. 7 Saiba mais Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões sobre o assunto abordado. Sintetizando Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos. Para (não) finalizar Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado. 8 introdução Quando falamos de evolução humana, é interessante ressaltar que desde o Período Paleolítico (500.000 a.C. a 1.000 a.C.) o genoma humano permanece praticamente o mesmo. Sendo assim, a porcentagem de mutação espontânea é baixa, em torno de aproximadamente 1x10-5 a 1x10-6 para o Homo sapiens, sendo esse o homem moderno. Porém, o que se observa na verdade são as mudanças nos hábitos e no estilo de vida do homem pós-Revolução Industrial. O homem pré-histórico, do Período Paleolítico, era fundamentalmente um caçador-coletor, onde coletava frutos e raízes para completar sua dieta, sendo esse hábito adquirido, bem provavelmente, pela observação e posterior imitação dos animais silvestres, e eram nômades, precisavam andarde lugar em lugar para a obtenção dos alimentos, devido à hostilidade do meio ambiente no qual deparavam-se constantemente. A alimentação dos Hominídeos, como o Homoerectus e o Cromagnon, dos quais o Homo sapiens evoluiu, era proveniente da carne de caça que abatiam e que era assada diariamente. O Neanderthal, segundo a análise de fósseis, pode ter sido antropófago. Acredita-se, ainda, que a primeira “sobremesa” tenha sido o mel de abelhas, que já existia no Período Cretáceo (há aproximadamente 15 milhões de anos), quando as flores nasceram, milhares de séculos antes da existência do homem no planeta. A dieta rica em proteínas, aliada a um intenso gasto energético, não somente pelo nomadismo, mas também pela despesa de muita energia na procura, seleção, preparação de alimentos e roupas com peles de animais e na manutenção da prole, conferia resistência a algumas doenças e às mudanças climáticas, ou seja, às intempéries. É fato que a expectativa de vida naquela época era muito baixa, entretanto, aqueles indivíduos estavam evolutivamente adaptados àquelas condições de sobrevivência, caracterizada pela baixa ingestão calórica e alto gasto energético, em questões genético- evolutivos, houve pouca mudança no homem contemporâneo. Esse homem contemporâneo mantém, basicamente, o mesmo genoma de seus ancestrais pré-históricos, um grande dilema é gerado nesse contexto, pois em termos evolutivos, ainda não houve tempo suficiente de reprogramar a “máquina do corpo” – genoma, aparato fisiológico, para a vida moderna, caracterizada pela baixa atividade física, alta ingestão de alimentos hipercalóricos e níveis de estresse cotidiano elevadíssimos. Mudanças de estilo de vida abruptas, na escala evolutiva, não acompanharam as mudanças genéticas e fisiológicas, e o aumento da expectativa de vida, promovido 9 principalmente pelo desenvolvimento das ciências médicas e novas tecnologias, provavelmente, são os grandes promotores de doenças crônicas. A Síndrome Metabólica (SM) é definida como um complexo distúrbio metabólico provocado pela quebra da tendência ao equilíbrio, ou seja, a homeostasia corporal, razão pela qual é também é conhecida como a “Síndrome da Civilização”. Por se tratar de um distúrbio que envolve o metabolismo dos macronutrientes, os carboidratos, lipídeos e proteínas provenientes da dieta, bem como programação e predisposição genética. A Biologia Molecular tem proporcionado inúmeros avanços no esclarecimento de questões importantes relacionadas à nutrição, tais como os mecanismos pelos quais os genes influenciam a absorção dos nutrientes, o metabolismo, a excreção e até mesmo o paladar. Muitos estudos genéticos têm demonstrado o quanto vários genes determinam a preferência alimentar e o grau de satisfação, ou seja, a saciedade e apetite dos seres humanos. Estudos antropológicos, nutricionais e genéticos sugerem que a dieta humana, incluindo ingestão energética e gasto energético, vem modificando-se ao longo dos últimos 10 mil anos, período da então Revolução Agrícola, sendo que a maior mudança ocorreu nos últimos 150 anos, principalmente no tipo e ingestão de gorduras e vitaminas, como o ácido ascórbico e tocoferol, vitaminas C e E. A prevalência da obesidade tem crescido rapidamente e representa um dos principais desafios de saúde pública no início desse último século. As complicações incluem o diabetes mellitus tipo 2, a hipercolesterolemia, a hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, apneia do sono, problemas psicossociais, doenças ortopédicas e uma diversificação de tipos de câncer. A escalada vertiginosa da obesidade em diferentes populações, incluindo países industrializados e economias em transição, levanta a questão de que fatores estariam determinando essa epidemia. Considerando-se que o quadro genético da espécie humana não sofreu mudanças importantes nesse intervalo de poucas décadas, certamente os fatores ambientais explicam essa epidemia da obesidade. Quando se avalia clinicamente um paciente obeso, entretanto, deve-se considerar que diversos fatores genéticos predisponentes podem estar desempenhando um papel expressivo no desequilíbrio energético determinante do excesso de peso. Estima-se que os fatores genéticos possam serem responsáveis por 24% a 40% da variância no Índice de Massa Corporal (IMC), por determinarem diferenças em fatores como taxa de metabolismo basal, resposta à superalimentação e outros fatores. 10 Acredita-se que as mudanças de comportamento alimentar e os hábitos de vida sedentários atuando sobre genes de susceptibilidade sejam o determinante principal do crescimento da obesidade no mundo. É provável que a obesidade ocorra como a resultante de fatores poligênicos complexos e um ambiente obesogênico. O chamado mapa gênico da obesidade humana está em processo constante de evolução, à medida que se identificam novos genes e regiões cromossômicas associadas com a obesidade. As duas síndromes genéticas que estão associadas com a obesidade mais bem caracterizada são resultantes de defeitos de um gene único – a síndrome de Prader- Willi (SPW) e a síndrome de Bardet-Biedl (SBB). Na SPW, a expressão do gene depende do progenitor de origem, ocorrendo na ausência de uma expressão normal dos genes da região cromossômica 15q11-q13. A SPW caracteriza-se por retardo constitucional, hipogonadismo, disfunção hipotalâmica e obesidade grave hiperfágica. A SBB é uma doença genética caracterizada por obesidade, retinopatia pigmentada, polidactilia, retardo mental, hipogonadismo e manifestações renais (GREEN et al. 1989). Mutações em sete diferentes loci já foram identificadas, sendo denominados genes da SBB 1 a 7. A mutação mais comum é a do gene SBB, localizado no 11q13. A maioria dos casos se apresenta com um padrão de herança do tipo autossômico recessivo. Estudos com uma série de 129 pacientes com a SBB e seus familiares, relataram que na maioria dos casos foram encontradas mutações de um único gene, herdadas com padrão autossômico recessivo. objetivos » Estudar os conceitos, causas, tipos, incidências e prevenção das doenças que acometem os pacientes que possuem problemas endócrinos e metabólicos. » Demonstrar as principais estratégias de diagnóstico existentes para a descoberta das doenças endócrinas e metabólicas. » Classificar as doenças metabólicas que acometem os pacientes que possuem algum tipo de problema endócrino ou metabólico. » Contextualizar sobre as internações hospitalares causadas por causa de algum distúrbio endócrino ou metabólico. 11 unidAdE i EtiologiA do MEtAboliSMo CorPorAl CAPítulo 1 obesidade e sua etiologia diante dos fatores sociais, econômicos e ambientais As etiologias da obesidade: análise sob a histórica A obesidade faz parte da nossa sociedade desde a pré-história, simbolizando, por vezes, beleza e fertilidade. No Período Neolítico as “deusas” eram cultuadas e admiradas por mamas, quadris e coxas volumosas. Hipócrates, na medicina greco-romana, já alertava, no entanto, sobre os malefícios da obesidade para a saúde humana ao afirmar que a morte súbita era mais comum em indivíduos com excesso de gordura corporal. Já no Império Romano, o corpo belo tinha que ser um corpo magro e esbelto, o que obrigava as damas a fazerem prolongados jejuns. Essa mudança no padrão de beleza, também é possível ser verificada por meio da História da Arte, uma vez que, as obras do século XIII a XX retratam poucas figuras mitológicas ou pessoas obesas. Ao longo dos anos, devido ao surgimento de novas necessidades humanas, os padrões de beleza e a composição corporal dos homens foram sendo modificandos. Nas últimas décadas, a prevalência de obesidade aumentando exponencialmente, atingindo homens e mulheres de todas as faixas etárias, já sendo caracterizada como uma epidemia mundial. A obesidade pode ser conceituada como o acúmulo anormal ou excessivo de gordura no organismo que pode levar a um comprometimento da saúde, de acordo com aOrganização Mundial da Saúde (OMS). Essa condição corporal pode provocar o desenvolvimento de diversas doenças no ser humano, dentre várias, podemos evidenciar: diabetes mellitus do tipo II e disfunções cardiovasculares, que são, evidentemente, as principais causas de morte no Brasil. 12 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl O indivíduo obeso tem alta probabilidade de desenvolver vários distúrbios de ordem psicossocial, como por exemplo: depressão, transtornos de ansiedade e alteração de imagem corporal. Todas essas são consequências, atribuídas e associadas ao excesso de gordura corporal, fazendo com que a obesidade, na sociedade contemporânea, seja classificada como um grave problema de saúde pública. Inúmeras são as pesquisas científicas direcionadas ao estudo das etiologias do desenvolvimento da obesidade. Fato que expressa uma realidade, podendo indicar uma possível imprecisão no que diz respeito à identificação das reais causas dessa doença. A concepção materialista-histórica instaura uma compreensão inteiramente diferente das outras correntes teórico-filosóficas, pois explica a raiz mais profunda do ser social e de sua realidade. É uma ideia que está em sintonia com os interesses históricos da classe proletária, porque, ao permitir a compreensão do processo histórico-social como totalidade, fundamenta uma concepção revolucionária de sociedade. Essa concepção de história tem como categoria fundamental a totalidade. Sendo assim, não podemos compreender um objeto isoladamente. A realidade social é uma totalidade e nenhuma de suas partes pode ser compreendida sem que sejam feitas as relações com os outros momentos da realidade social. A premissa básica da concepção materialista-histórica é que não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência. O ponto de partida para compreender a história, então, deve ser o concreto, o real, o que é objetivo. A história humana é construída, de acordo com essa perspectiva, por meio do trabalho, atividade com a qual os homens se criam e criam toda a realidade social. Assim, tudo se desenvolve a partir das relações sociais estabelecidas entre os homens, de sua realidade social concreta: A causa não está na consciência, mas na vida; a causa não está na evolução e na conduta empírica do indivíduo que, por sua vez, dependem das condições universais. Se as circunstâncias em que este indivíduo evoluiu só lhe permitem um desenvolvimento unilateral, de uma qualidade em prejuízo das demais, este indivíduo só conseguirá alcançar um desenvolvimento unilateral e mutilado. Podemos entender com isso, que o mesmo acontece em relação ao desenvolvimento das patologias: se as circunstâncias em que o indivíduo evoluiu estimulam e potencializam o desenvolvimento das doenças, sua saúde, diante desses fatores, poderá comprometer-se. 13 Etiologia Do MEtabolisMo Corporal │ UNiDaDE i A dinâmica da sociedade capitalista e o desenvolvimento de patologias Para discorrer sobre as causas da obesidade na sociedade capitalista, precisamos entender, primeiramente, o funcionamento dessa sociedade. O mundo capitalista é composto por duas classes sociais opostas entre si: classe burguesa, formada pelos patrões e donos da produção e classe proletária, formada pelos trabalhadores assalariados. Além dessas duas classes, existe também classes intermediárias. Após a implementação da privatização, surgiu uma forte divisão do trabalho e, por conta disso, o estabelecimento da sociedade formada por classes, do Estado, a indiferença da atividade social e divisão não igualitária do trabalho e seus produtos. Essa desigualdade na repartição de trabalhos acaba gerando todos os problemas de desigualdade social. Desse modo, uma classe obterá suas necessidades atendidas já em outra classe, não; uma dessas classes conseguirá obter seu alimento de forma adequada tanto na parte nutricional quanto na qualidade dos mesmos, porém a outra apenas se manterá com os alimentos que poderá comprar. A saúde é tratada da mesma forma, uma conseguirá ter maior atenção em saúde, já a outra, não conseguirá. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística sobre os gastos das famílias brasileiras com remédios, de acordo com a renda mensal, informam que o gasto mensal de uma família com a compra de remédios, sendo esta com renda mensal de até R$ 1.245,00, é de 4,4% desse valor mensal. Já para grupos familiares que possuem renda de até R$ 10.375,00, o valor é de 1,19%. Tais resultados desse último grupo relacionam-se com gastos de planos e seguros de saúde. Já com as famílias que possuem renda menor, gastam 0,3% da renda que ganham com tais serviços de saúde, famílias com rendas superiores podem gastar até 2,3% da renda com serviços de saúde. Esses dados demonstram que as famílias com renda maior gastam menos com medicamentos, comparadas com as famílias de baixa renda, pois as de alta renda conseguem manter uma alimentação mais adequada, nutrindo assim o corpo, evitando ou postergando doenças, ao passo que as de baixa renda não têm essa condição favorável ao seu dispor. Inúmeros são os fatores que contribuem para a obesidade, alguns desses fatores estão descritos na tabela a seguir. 14 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl tabela 1. fatores identificáveis causadores de obesidade. Fatores causadores de obesidade Porcentagem Sedentarismo e alimentação inadequada 82,66% Fatores genéticos 30,6% Nível socioeconômico 30,6% Fatores psicológicos 21,3% Fatores demográficos 16% Nível de escolaridade 5% Desmame precoce 5% Pais obesos 3% Estresse 2% Fumo/Álcool 1% fonte: barbieri; Mello, 2012. Sedentarismo e alimentação inapropriada como fatores desencadeadores da obesidade Em termos fisiológicos, obesidade é uma condição do corpo que é caracterizada pelo acúmulo de tecido adiposo corporal. A literatura concorda que a obesidade é uma doença que resulta da falta de equilíbrio nutricional advinda do balanço de energia positivo, uma vez que o indivíduo consome mais energia do que realmente consegue gastar. Desse modo, o corpo acumula energia e pela ação da insulina, essa energia é transformada em gordura, sendo seu excesso armazenado nas células adiposas. Por causa desse comportamento fisiológico, estudos dizem que o desenvolvimento da obesidade é causado principalmente pelo estilo de vida, relacionando-se com a prática de atividade física e aos hábitos alimentares. Desse modo, pode-se concluir que quanto mais ativo o estilo de vida, menores serão as chances desse indivíduo se tornar uma pessoa obesa, consequentemente, quando mais açúcares, gorduras e consumo de alimentos industrializados essa pessoa ingerir, maiores serão as probabilidades desse sujeito ser obeso. Diante dos fatos já mencionados, pergunto: o que é “estilo de vida”, termo tão utilizado por autores que tratam da obesidade? Dentre os significados da palavra “estilo”, encontrada nos dicionários de língua portuguesa, destaca-se: “maneira de exprimir os pensamentos e comportamentos, falando ou escrevendo”. Isso indica que o termo “estilo de vida” se refere à maneira de viver das pessoas, remetendo-nos a uma questão de comportamento individual, de escolhas do sujeito; como se as pessoas pudessem escolher livremente sua maneira de viver, os alimentos componente de sua dieta, os horários e locais para a prática de exercício físico, sua moradia e entre outros. 15 Etiologia Do MEtabolisMo Corporal │ UNiDaDE i Certamente essas escolhas são possíveis às pessoas, desde que elas sejam providas de recursos financeiros. Nesse sentido, entendemos que a classe trabalhadora não pode ter um “estilo de vida” em consonância com os seus desejos, uma vez que as condições materiais impostas por essa sociedade impossibilitam obter esse padrão de estilo de vida. O aumento do número de obesos tem relação com a fartura de alimentos ricos em gorduras e açúcares, isso é aliadoà ação das empresas em fabricar alimentos industrializados cada vez mais rico em gorduras, açúcares e sal, pois são agradáveis ao paladar. Na verdade, os produtores tentam encontrar um ponto em que as pessoas comam certo produto e fiquem com vontade de comê-lo mais vezes. Assim, salgadinhos, doces e refeições prontas podem ter o mesmo efeito sobre o cérebro que o tabaco. E com isso, a ingestão de nutrientes inadequados à saúde se torna cada vez mais rotineiro. No que se refere à obesidade infantil, vários autores destacam que ela está fortemente ligada ao desmame precoce e a introdução inadequada de alimentos, ainda no início da infância. Faz-se necessário, no entanto, considerar que a excessiva jornada de trabalho das mães e o tempo gasto no transporte até o local de trabalho podem contribuir para o desmame precoce das crianças e, consequentemente, a introdução inadequada de alimentos na dieta. Outro aspecto relacionado por autores da literatura científica é a falta de percepção parental a respeito do estado de obesidade da criança. Além desses fatores, ainda são indicados outros, como: o peso pré-gestacional materno, o fumo durante a gestação e o estado nutricional na infância. Sobre a obesidade no público adolescente, cientistas afirmam que isso se deve ao consumo de lanches em excesso mal-balanceados e à enorme suscetibilidade dessa população à propaganda consumista. Estamos diante de uma sociedade obesogênica, uma vez que ela nos estimula ao consumo alimentar. O fato é que houve, ao longo dos últimos anos, uma redução progressiva da prática de atividade física combinada ao maior tempo dedicado às atividades de baixa intensidade, como assistir televisão, usar o computador e jogar videogame. Salienta- se ainda a influência da evolução tecnológica no estabelecimento de um “estilo” predominantemente inativo da população. Além do “estilo de vida hipoativo”, nos últimos anos houve uma tendência da população de um modo geral, em substituir as principais refeições por lanches rápidos, conhecidos como fast-food. Os pais, devido ao trabalho e às transformações provocadas pela vida moderna, transferem esses hábitos ditos incorretos para seus filhos, prejudicando a alimentação adequada das crianças. A educação dos pais é um fator importante nos 16 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl hábitos alimentares das crianças. O horário das principais refeições bem como a seleção dos alimentos consumidos são passados de pais para filhos. Nota-se, de uma forma geral, uma forte tendência na literatura científica a associar a obesidade a uma questão comportamental, a uma questão de escolha do sujeito. Nesse sentido, Fagundes, Ribeiro e Naspitz afirmam que o desenvolvimento de obesidade se dá por conta de hábitos e comportamentos de vida inadequados no que se refere ao plano alimentar e à prática de atividade física. Diversos autores destacam que, por muitas vezes, ocorre um comportamento inadequado do sujeito quanto ao controle de seu peso corporal. Esses autores não abordam, porém, o porquê desse “comportamento inadequado”, ou melhor, o que determina essa prática. Dados apresentados pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde indicaram que no Brasil, no ano de 2008, um total de 56.263.735 conseguiam sobreviver com valores inferiores a meio salário mínimo por mês, essa população estava principalmente concentrada na região Norte do país. A inserção de calorias advindas de frutas, verduras e legumes na região Norte era apenas de 1,7%. No entanto, na região Sul, essa porcentagem aumentou, porém, não a níveis significativos, pelo contrário, níveis considerados baixos para uma boa alimentação, apenas 2,7%. Por conta desses resultados apresentados, pode-se fazer uma associação entre e renda mensal das famílias com o consumo de frutas, verduras e legumes, esse consumo com relação negativa ao ganho de massa adiposa. Além dessa correlação acima citada, outra relação pode ser feita com a renda mensal da população e a prática de exercícios físicos. Hoje em dia, o Brasil conta com mais de 7 mil academias que trabalham regulamentadas, no entanto, apenas 2% da população frequentam esse tipo de local. Em relação à realização de exercícios físicos fora dos estabelecimentos feitos para isso, temos que levar em consideração o alto índice de violência urbana no Brasil. Conforme dados apresentados pelo IBGE, violências como agressões e acidentes urbanos representam 12,5% de mortes no país, sendo que em 15 Unidades Federativas, esses fatores causam mais mortes que o câncer. Diante desses fatos, é evidente que os hábitos de alimentação, assim como a prática de atividades físicas, não estão apenas relacionados com o indivíduo ou sua vontade, mas também às condições de vida em que ele está inserido na sociedade, condições essas impostas pelo capitalismo e organização social existente. 17 Etiologia Do MEtabolisMo Corporal │ UNiDaDE i fatores genéticos, fisiológicos e hereditários como causadores da obesidade Causas relacionadas à genética populacional precisam ser inseridas como um dos fatores mais importantes para o acometimento do excesso de peso. Pesquisadores consideram que o surgimento da obesidade do indivíduo pode ter vindo de uma “herança familiar”. O sobrepeso presente numa família composta de pais e filhos é evidente e isso é explicado pelo compartilhamento de hábitos, pela genética e pelo meio onde vivem. Continuando a falar sobre a genética no aparecimento da obesidade, tem-se ciência de que fatores hormonais e neurais também são determinados pela herança genética, esses fatores influenciam sinais de curto e de longo prazos, esses relacionados à saciedade e a regulação do peso corporal. Anormalidades na interação e também na expressão desses fatores acabam influenciando no aumento do peso corporal. Ainda há estudos que demonstram que a genética também interfere no gasto de energia – na taxa metabólica. O hormônio leptina, de acordo com estudos já publicados, age na diminuição do consumo alimentar juntamente com o aumento do gasto energético, com isso, trabalhos publicados têm associado a obesidade com a presença desse hormônio, uma vez que ele se encontra aumentado nesses indivíduos, mas esse aumento está associado com falha em seus receptores ou mesmo a diminuição da sensibilidade do corpo aos seus efeitos fisiológicos. Além da presença da leptina, outros problemas relacionados aos hormônios, como hipotireoidismo, alterações no metabolismo dos corticosteroides, problemas relacionados ao hipotálamo, hipogonadismo no sexo masculino e a retirada dos ovários nas mulheres, síndrome de Cushing e a SOP (síndrome dos ovários policísticos), podem contribuir para o aparecimento da obesidade. Questões genéticas, aspectos fisiológicos e a relação com a hereditariedade fazem parte apenas de uma pequena parcela de questões que podem estar relacionadas com o aparecimento da obesidade e que necessitam de atenção dos estudiosos da área, para que haja o conhecimento de inúmeros mecanismos que influenciam direta ou indiretamente no desenvolvimento dessa enfermidade. Estudos revelaram que o desenvolvimento da humanidade em relação a leis sociais, interferem nas mudanças do mecanismo fisiológico do homem, ao invés das leis biológicas. Sendo assim, a hominização, cada dia mais, age sobre a humanidade por meio de suas condições sociais e históricas. Logo, o que pode provocar variações entre os homens – sendo uma dessas variações a condição corporal (obeso ou não obeso) – são as desigualdades que a sociedade 18 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl impõe para a distinção entre os mais ricos e os menos favorecidos. Com os animais isso não ocorre, uma vez que eles não são biologicamente determinados por fatores de comunidade ou mesmo sociedade. Logo, leva-se a crer que o ser humano não é um ser biológico, mas social, uma vez que as nossas condições biológicas são influenciadas por tais fatores. Já é comprovadoque todos os seres humanos nascem com um certo grau de disposição para o desenvolvimento de determinadas patologias. Porém, nesse caso, é importante levar em consideração que o que realmente irá determinar o desenvolvimento ou não dessas doenças é o fator social, concretos e materiais, incluindo o grau de acesso da população a melhores tratamentos. 19 CAPítulo 2 Síndrome Metabólica (SM) Conceito A Antropologia, e a Biologia, tem muito a nos dizer a respeito dos hábitos, comportamentos e estilo de vida do ser humano moderno, pois a primeira, que deriva do grego anthropos (homem/pessoa) e logos (razão/pensamento), é a ciência centralizada no estudo do homem, estabelecendo interface com a segunda em dois momentos: (1) como ciência humana, voltando-se especificamente para o homem como um todo, desvendando sua história, crenças, usos, costumes, filosofia, linguagem, etc.;(2) como ciência natural, interessando-se pelo conhecimento da evolução do homem e da sua genética. Em se tratando de evolução humana, é importante comentar que desde o Período Paleolítico (500.000 a.C. a 1.000 a.C.) o genoma humano continua basicamente o mesmo; ou seja, a taxa de mutação espontânea é baixa, sendo de aproximadamente 1x10-5 a 1x10-6 para o Homosapiens (o homem moderno). Ao longo do tempo, o que na verdade vem mudando são os hábitos e estilo de vidado homem pós-Revolução Industrial. O pré-histórico, do Período Paleolítico, era essencialmente caçador, coletor (coletava frutos e raízes para complementar sua dieta, hábito adquirido, muito provavelmente, através da imitação de outros animais silvestres) e nômade (andava de lugar em lugar à procura de alimentos, devido à hostilidade do meio ambiente). Hominídeos como o Homo erectus e o Cromagnon, dos quais o Homo sapiens teria evoluído, se alimentavam da carne de caça que abatiam e assavam diariamente. O homem de Neanderthal, segundo análise de fósseis, parece ter sido antropófago. Além disso, acredita-se que a primeira “sobremesa” tenha sido o mel de abelhas, que já existia no Período Cretáceo (há 135milhões de anos), quando as flores nasceram, milhares de séculos antes do homem. Com a alimentação rica em proteínas, aliada a um intenso gasto energético, não somente pelo nomadismo, como também pelo gasto de muita energia na procura, seleção, preparação de alimentos e roupas (peles) e no cuidado à prole, conferia resistência a doenças e a mudanças climáticas. Mesmo tendo uma expectativa de vida baixa naquela época, aqueles indivíduos estavam evolutivamente adaptados às condições de sobrevivência (baixa ingestão calórica e alto gasto energético), o que, em termos genético-evolutivos, pouco mudou no homem contemporâneo. 20 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl Esse mantém basicamente o mesmo genoma de seus ancestrais pré-históricos, gerando um grande dilema, pois, evolutivamente, ainda não tivemos tempo de reprogramar a “máquina” (genoma, aparato fisiológico) para a vida moderna, com baixa atividade física, alta ingestão de alimentos hipercalóricos e níveis de estresse cotidiano elevados. A mudança de estilo de vida de forma rápida, em escala evolutiva, não acompanhada de mudanças genéticas e fisiológicas, e o aumento da expectativa de vida, promovido principalmente pelo desenvolvimento das ciências médicas e novas tecnologias, provavelmente, são os grandes promotores das cronicidades das doenças. De acordo com a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, a síndrome metabólica pode ser definida como um conjunto de fatores de risco metabólico que se manifestam num indivíduo e aumentam as chances de desenvolver doenças cardíacas, derrames e diabetes. A Síndrome Metabólica tem como base a resistência à ação da insulina, daí também ser conhecida como síndrome de resistência à insulina. Isto é: a insulina age menos nos tecidos, obrigando o pâncreas a produzir mais insulina, elevando o seu nível no sangue. Algumas circunstâncias contribuem para o seu aparecimento: os genéticos, peso exagerado (principalmente na região abdominal) e a ausência de atividade física. Já Gottlieb e colaboradores definem a síndrome metabólica como um complexo distúrbio metabólico provocado pela quebra da homeostasia corporal, razão pela qual é também definida como a “Síndrome da Civilização”. Por se tratar de um distúrbio que envolve o metabolismo dos carboidratos, lipídeos e proteínas provenientes da dieta, bem como programação e predisposição genética, a síndrome metabólica é fonte de inúmeros estudos na atualidade. 21 CAPítulo 3 A evolução e epidemiologia da síndrome metabólica no brasil e no mundo Aspectos históricos e evolutivos da síndrome metabólica A evolução do homem está intimamente ligada à procura, seleção e consumo do alimento, assim como ao sentimento de autopreservação, sendo composta também por mudanças e adaptações de comportamento. O ancestral conhecido mais antigo do homem contemporâneo é o do gênero Australopithecus, que viveu na África por volta de 4 milhões de anos atrás. Os Australopithecus possuíam alguns traços de macacos, tais como ossos dos dedos curvos, caninos levemente projetados e crânios pequenos. O atributo mais notável é que eram bípedes, demonstrado pela estrutura da pelve, perna e pé, e pela descoberta de pegadas datadas de 3,6 milhões de anos. Possivelmente, o bipedalismo tenha surgido como uma postura para alimentação, uma vez que proporcionava o acesso a alimentos antes não alcançados. A locomoção sobre as duas pernas liberou os braços para carregar crianças e objetos. Ao ficarem em pé, os antigos humanos puderam regular melhor a temperatura corporal, expondo menos o corpo ao calor abrasador africano. Contudo, tornar-se bípede permitiu um menor gasto energético, comparado ao de um quadrúpede, quando se caminha, mas, por outro lado, maior gasto quando se corre à mesma velocidade. A possibilidade de ser bípede, nesse contexto, pode ser vista como uma das primeiras estratégias na evolução nutricional humana, um padrão de movimento que teria reduzido substancialmente o número de calorias despendidas na coleta de alimentos. Pesquisas antropológicas e paleontológicas também permitiram desvendar que, há cerca de 0,2 milhão de anos para cá, os fósseis hominídeos apresentam traços tão modernos que já são caracterizados como Homo sapiens. Durante esse período, as arcadas supraciliares ficaram menores, a posição do forâmen magno mais anterior, o queixo evidenciou-se e a capacidade craniana aumentou de 1.175 cm3 para 1.400 cm3, sendo esse o valor médio atual. Sob o ponto de vista nutricional, o cérebro do homem moderno responde por 10 a 12% da demanda de energia de um corpo parado, comparado ao cérebro do Australopithecus. 22 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl Um Australopithecus típico, pesando entre 35 e 40kg, com um cérebro de 450 cm3, teria reservado cerca de 11% de sua energia em repouso para o cérebro; enquanto um Homo erectus, pesando entre 55 e 60 kg, com um cérebro de cerca de 850 cm3, teria reservado cerca de 16% de sua energia em repouso – ou seja, cerca de 250 das 1.500 kcal diárias – para esse órgão. Além disso, o bipedalismo permitiu aos hominídeos resfriar o sangue cranial e, consequentemente, liberar o cérebro do calor de temperaturas agressivas, que haviam colocado em cheque o seu tamanho. No entanto, a expansão do cérebro não teria ocorrido se os hominídeos não tivessem adotado uma alimentação rica em calorias e nutrientes. Estudos comparativos apontaram que espécies com cérebros maiores ingerem alimentos mais calóricos, provenientes principalmente de alimentos de origem animal, como leite, carne e ovos. É aceitável, então, que para o antigo Homo fazer crescer a sua massa cinzenta fosse necessária uma dieta variada, não somente composta por frutos, tubérculos e raízes, mas alimentos de origem animal, como forma de aumentar a densidade calórica e nutricional. Pois, a nutrição é um dos fatores ambientais demaior importância no processo evolutivo. Contudo, a genética determina a suscetibilidade a doenças, no mesmo momento que fatores ambientais determinam qual indivíduo, geneticamente suscetível, será afetado. Nos últimos 10.000 anos, desde a Revolução Agrícola, o genoma humano basicamente não mudou, ou seja, a taxa de mutação espontânea para o DNA nuclear está estimada em 0,5% por milhão de anos. Logo, os 10.000 anos passados ainda não foram suficientes para causar mudanças importantes sem nossos genes, que são muito similares aos dos nossos ancestrais que viveram no Período Paleolítico, há 40.000 anos, no tempo em que nosso perfil genético foi estabelecido. Hoje em dia, a nossa dieta difere muito daquela para a qual nossos genes foram selecionados. Ela mudou essencialmente no que diz respeito ao tipo, à quantidade de ácidos graxos essenciais e à constituição antioxidante dos alimentos (Quadro 1). Estudos com marcadores biomoleculares têm proporcionado inúmeros avanços na elucidação de questões importantes relacionadas à nutrição, tais como os mecanismos pelos quais os genes influenciam a absorção dos nutrientes, o metabolismo, a excreção e até mesmo o paladar. Além disso, geneticistas têm demonstrado o quanto determinados genes determinam a preferência alimentar e o grau de satisfação (saciedade e apetite) dos seres humanos. Estudos populacionais, nutricionais e genéticos sugerem que a dieta humana, incluindo ingestão energética e gasto energético, vem mudando ao longo dos últimos 10.000 23 Etiologia Do MEtabolisMo Corporal │ UNiDaDE i anos (Revolução Agrícola), sendo que a maior mudança ocorreu nos últimos 150 anos, principalmente no tipo e ingestão de gorduras e vitaminas C e E. Quadro 1. Comparação entre características do estilo de vida (dieta e atividade física) entre o homem pré- histórico e o contemporâneo. Estilo de vida Homem pré-histórico Período Paleolítico Homem contemporâneo Atividade física Alta Baixa DIETA Densidade energética Ingestão Energética Proteína Animal Vegetal Carboidrato Fibra Gordura Animal Vegetal Ácidos Graxos Ômega 3 e 6 Proporção ômega 3-6 Vitaminas mg por dia-1 Riboflavina Folato Timamina Ascorbato Caroteno (Retinol Equivalente) Vitamina A (Retinol Equivalente) Vitamina E Baixa Moderada Alta Alta Muito baixa De baixa a moderada Alta Baixa Baixa Muito Baixa Alta (2,3 g/por dia-1) Baixa (2,4) 6,49 0,357 3,91 604 5,56 (927) 17,2 (2870) 32,8 Alta Alta Baixa a moderada Baixa a moderada Baixa a moderada Moderada Baixa Alta Alta Moderada a alta Baixa (0,2g/por dia-1) Alta (12,0) Abaixo do recomendado Abaixo do recomendado Abaixo do recomendado Abaixo do recomendado Abaixo do recomendado - Abaixo do recomendado - - fonte: adaptado de gottlieb, 2008. dados epidemiológicos da síndrome metabólica no brasil e no mundo Estudos realizados em Vitória, no Espirito Santo, tendo como amostra 1.663 indivíduos com idades de 25 a 64 anos, tiveram como resultados uma prevalência para síndrome metabólica de 30% para a população geral, essa prevalência era maior nas pessoas que possuíam idades mais avançadas; 15,5% estavam entre 25 e 34 anos e 48,3% entre as idades de 55 e 64 anos. Outro estudo realizado com 1.561 pessoas de área urbana obteve uma prevalência de 25,4%, sendo que essa prevalência aumenta à medida que a idade vai avançando, principalmente em mulheres com nível econômico mais baixo. 24 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl Pesquisadores realizaram estudos para fazer a análise bioquímica e a caracterização da síndrome metabólica levando em consideração os critérios que foram propostos pelo NCEP/ATPIII e IDF, tendo como objetivo averiguar a predisposição de problemas cardiovasculares em 340 indivíduos (200 pacientes e 140 controles). A proporção de casos existentes de síndrome metabólica nos pacientes foi de 35,5%. Resultados de um estudo transversal que teve com objetivo determinar novos casos de síndrome metabólica foram publicados nos Estados Unidos seguindo critérios pré-estabelecidos pela ATPIII. Nesse estudo foram analisados 8.814 indivíduos, todos com 20 anos de idade ou mais. O resultado de casos encontrados foi 21,8% sem idade ajustada e 23,7% com a idade ajustada, sendo que a prevalência maior foi encontrada em pessoas com idade mais avançada, um total de 43,5%. Já em outro estudo publicado em 2003, foi demonstrado que a síndrome metabólica estava presente em mais de 20% dos adultos americanos e com variação significativa conforme a etnia: homens afrodescendentes um total de 13,9%, mulheres de origem hispânica com 27,2%. Em 2003, outro estudo transversal com um total de 2.100 pessoas, na Itália, demonstrou um número de casos de síndrome metabólica de 18% na população feminina e 15% na masculina. Com esses dados publicados, foi possível evidenciar que pessoas mais velhas tinham maior prevalência, total de 25% da população. Já em 2004, a avaliação de 11 coortes, um total de 6.156 homens e de 5.356 mulheres, sem diabetes, e idades que variavam entre 30 e 69 anos, com 8 anos de acompanhamento. O número de casos encontrados foi de 15%, destes, 15,7% de homens e 14,2% de mulheres. figura 1. prevalência de sM nos Estados unidos, segundo faixa etária. 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 20-70+ 20-29 30-39 40-49 50-59 60-69 Maior 70 Homens Mulheres Coluna1 fonte: adaptado de ford, 2002. 25 CAPítulo 4 Caracterização clínica e laboratorial da síndrome metabólica Como já mencionado anteriormente, a SM pode ter como definição um grupo de fatores de risco inter-relacionados, de origem metabólica, que diretamente contribuem para o desenvolvimento de doença cardiovascular (DCV) e/ou diabetes do tipo 2. São considerados como fatores de risco metabólicos: dislipidemia aterogênica (hipertrigliceridemia, níveis elevados de apolipoproteína B, partículas de LDL-colesterol pequenas e densas e níveis baixos de HDL-colesterol), hipertensão arterial, hiperglicemia e um estado pró-inflamatório e pró-trombótico. Ainda não se estabeleceu uma causa única ou múltiplas causas para o desenvolvimento da SM, mas já se sabe que a obesidade abdominal e a resistência à insulina parecem ter um papel fundamental na origem dessa síndrome. Existem muitas definições para a síndrome metabólica (SM): NCEP/ATP III1; IDF2, OMS3 e outras, porém, a definição da NCEP/ATP III é a mais amplamente usada, tanto na prática clínica como em estudos epidemiológicos. Trata-se de um guideline com foco no risco cardiovascular, que não usa como critério obrigatório a evidência de anormalidades na insulina ou na glicemia. Por mais que esse guideline considere a doença cardiovascular como desfecho primário da SM, muitos dos portadores dessa síndrome apresentam resistência à insulina, o que lhes confere um risco aumentado para o desenvolvimento do diabetes do tipo 2. Os critérios da NCEP/ATP III encontram-se na Tabela 2. tabela 2. Critérios da nCEp/atp iii. Parâmetro Número de alterações ≥ 3 de: Glicose ≥ 100mg/dL ou em tratamento para hiperglicemia HDL – Colesterol Homens: ≤ 40mg/dL ou em tratamento para HDL baixo Mulheres: ≤ 40 mg/dL ou em tratamento para HDL baixo Triglicérides ≥ 150 mg/dL ou em tratamento para Triglicérides elevados Obesidade Cintura ≥ 102 cm para homens ou ≥ 88 cm para mulheres Hipertensão ≥ 130x85 mmHg ou em tratamento medicamentos para HAS fonte: adaptado de penalva, 2008. Sendo um estado pró-inflamatório no organismo, a síndrome metabólica é caracterizada pelo aumento dos níveis de citocinas produzidas pelas células de defesa, principalmente a Proteína C Reativa, FNT alfa, IL-6. Sendo de extrema importância ressaltar que a síndrome metabólica tem forte associação com doenças cardiovasculares, aumentando 26 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl seus índices de mortalidade. Por mais que seja um grave problema de saúde, pouco se sabe sobre essa síndrome. Há fatores genéticos, alimentação de formaerrada e a falta de exercícios físico contribuem para o aparecimento da síndrome. Há muitos anos, alguns pesquisadores propuseram a hipótese de que a origem de diversas doenças crônicas e morbidades em adultos, também o surgimento da síndrome metabólica e patologias que envolvem o sistema cardiovasculares, fosse embrionária ou fetal. Tal hipótese sugere que fatores ambientais, especialmente a nutrição, agem desde a vida dentro do útero, programando o risco para o desenvolvimento de síndrome metabólica, doenças cardíacas ou mesmo morte prematura na vida adulta. A ecologia evolutiva e a biologia molecular afirmam que um certo genótipo pode resultar em diferentes fenótipos sob determinada condição ambiental. Além do mais, o impacto de fatores ambientais experimentado em uma geração pode determinar o desenvolvimento e o comportamento da geração seguinte. Logo, fatores ambientais na gestante podem afetar diretamente o desenvolvimento do feto, o que pode perdurar por várias gerações. Isto é, o conceito de que existe uma resposta adaptativa, em embriões ou fetos, a um ambiente intrauterino inadequado, que resulta em consequências adversas, é consistente com uma definição de “programação” proposta por Lucas em 1991. [...] tanto a indução, quanto a deleção ou falha no desenvolvimento de estruturas somáticas ou de um sistema fisiológico, através de estímulos ou danos ocorridos em períodos sensíveis ou críticos, resultam em consequências funcionais ao longo do desenvolvimento. A existência de períodos críticos, nos quais a nutrição tem grande influência, pode ter consequências para o crescimento e o metabolismo do embrião ou feto. Pesquisas em camundongos mostraram que a desnutrição em estágios iniciais de desenvolvimento influencia de modo permanente o crescimento desses animais, enquanto que a desnutrição em fases de desenvolvimento mais tardias apenas afeta de modo transitório ou passageiro o animal. A teoria do “fenótipo econômico” proposta por Hales e Barker, sugere que o desenvolvimento fetal seja sensível ao ambiente nutricional. Quando ele é precário, surge uma resposta adaptativa que promove o crescimento de órgãos-chave, como o cérebro, em detrimento de outros, como as vísceras. Essa programação fetal teria como objetivo aumentar as chances de sobrevivência do feto e resultaria em um metabolismo pós-natal alterado, que também teria como propósito aumentar as chances de sobrevivência sob condições de nutrição precárias e inconsistentes. 27 Etiologia Do MEtabolisMo Corporal │ UNiDaDE i Logo, a “impressão metabólica” que a nutrição causa nos embriões e fetos é uma resposta adaptativa do organismo para ajustá-lo a condições nutricionais específicas em estágios iniciais do desenvolvimento, que se caracterizam por: » uma suscetibilidade limitada para uma janela ontogênica crítica no início do desenvolvimento; » um efeito persistente ao longo da vida adulta; » uma consequência específica e mensurável, a qual pode ser diferente entre indivíduos; e » uma relação, dose-dependente ou linear, entre uma exposição específica e o resultado. Nesse contexto, é importante destacar que a ação ambiental sobre um genótipo resulta em plasticidade fenotípica; isto é, retrata a capacidade de um indivíduo em adequar sua fisiologia/metabolismo e morfologia em decorrência da ação de fatores ambientais, gerando variabilidade genética. Essa plasticidade é essencial para processos biológicos e para a sobrevivência de uma espécie, uma vez que pode criar vantagens adaptativas em condições ambientais diferentes, instáveis ou adversas, como no caso de fetos submetidos a um aporte nutricional escasso. Alguns estudos publicados, mostram que o efeito do baixo peso ao nascer sobre algumas doenças (como as cardiovasculares e o diabetes mellitus tipo II) é influenciado pela maneira em que acontece o crescimento na infância. Por exemplo, o rápido ganho de peso nesse período aumenta o risco associado a essas doenças. Além disso, o autor descobriu que o baixo peso ao nascer, combinado com o rápido ganho de peso na infância, entre os 3 e 11 anos de idade, prediz grandes diferenças na incidência cumulativa de doença cardiovascular, diabetes tipo II e hipertensão arterial. Uma vez que a SM é um conjunto de fatores de risco cardiovascular, que inclui resistência à insulina (com ou sem intolerância à glicose), hipertensão arterial, dislipidemia e obesidade abdominal, a teoria do fenótipo econômico satisfaz alguns questionamentos sobre o desenvolvimento desse distúrbio. Estudos têm mostrado que a privação nutricional pré-natal promove perda estrutural em órgãos importantes, como néfrons, cardiomiócitos e células (Figura 2). Essas perdas, ao longo do envelhecimento, podem induzir ao surgimento da SM. Entretanto, parece que a teoria do fenótipo econômico apresenta uma contradição evolutiva: como um porte nutricional intrauterino inadequado (escassez de nutrientes) 28 UNIDADE I │ EtIologIA Do MEtAbolIsMo CorporAl pode afetar de forma decisiva o metabolismo pós-natal de um indivíduo, desencadeando doenças, uma vez que, evolutiva e geneticamente, já fomos selecionados e adaptados para uma baixa ingestão calórica e um ótimo aproveitamento dos nutrientes? Ou seja, esse défice nutricional pré-natal não deveria afetar a saúde do adulto, a não ser que ele, ao longo do seu desenvolvimento, adquira um estilo de vida não saudável (sedentarismo e alta ingestão calórica/obesidade). Dessa forma, parece que a dieta exerce um papel importante na regulação gênica que, dependendo da qualidade e quantidade de nutrientes, atuará de forma diferencial, por exemplo, ativando/desativando genes. Por isso, no caso da SM, a prevenção é muito mais complexa, porque além de sofrer forte influência pré-natal, também está ligada à idade e à dieta, essa um fator ambiental determinante. figura 2. Esquema de representação do fenótipo econômico sobre o desenvolvimento do Diabetes tipo 2 e síndrome Metabólica. Inanição/ Desnutrição Gestante/Feto Fenótipo Econômico Perda de função e Crescimento Células β Cardimiócitos Néfrons Diminuição do Tamanho e pesodo feto ou Recém-nascido Alta Ingestão Calórica/ obesidade Vida Adulta Diabetes Tipo 2 Síndrome Metabólica fonte: adaptado gottlieb, 2008. 29 unidAdE ii ClASSifiCAção dAS doEnçAS quE ACoMEtEM oS PACiEntES quE PoSSuEM ProblEMAS EndóCrinoS E MEtAbóliCoS – PArtE i CAPítulo 1 diabetes diabetes mellitus dados epidemiológicos A diabetes mellitus é definida de acordo com a Organização Mundial da Saúde como uma síndrome que possui várias causas por causa da ausência de insulina e/ou sua falta de capacidade em exercer suas funções, caracterizando, dessa maneira, um quadro de hipoglicemia crônica e com alterações no metabolismo dos carboidratos, proteínas e lipídios. Diabetes possui os seguintes sintomas: polidipsia, poliúria, visão embaçada e diminuição no peso. No continente americano, foi estimado que cerca de 35 milhões de pessoas seriam acometidas para o ano 2000 e com projeção de aumento para 64 milhões em 2025. Em países desenvolvidos, a maior incidência será na população mais idosa, por causa do aumento da expectativa de vida e pelo crescimento populacional. Nos países em desenvolvimento, esse aumento será observado em todas as faixas etárias. Em decorrência da diabetes estar associada à elevação da taxa de hospitalização, existe uma maior necessidade de cuidados terapêuticos, além disso, o aumento de novos casos de doenças cardiovasculares e cerebrovasculares, insuficiência renal, cegueiras e amputações não decorrentes de trauma dos membros inferiores. Toda essa problemática poderá representar uma sobrecarga nos sistemas de saúde da América Latina, países que possuem extrema dificuldade no controle de doenças infecciosas. 30 UNIDADE II │ ClAssIfICAção DAs DoENçAs QUE AComEtEm os PACIENtEs QUE PossUEm ProblEmAs ENDóCrINos E mEtAbólICos – PArtE I A maioriados países da América Latina possuem um sistema de vigilância epidemiológica deficiente para doenças crônicas na população adulta, principalmente quando se trata de diabetes mellitus. O número de casos dessa patologia é originado a partir de inquéritos que são feitos de forma pontual e não em bases regulares. A grande parte dos inquéritos possuem apenas abrangência local. Apenas 54% dos casos identificados como diabetes são realmente diagnosticados, logo, 46% deles não detinham o diagnóstico, sendo esse feito provavelmente por causa de alguma manifestação clínica crônica da doença. Os Estados da região Sul e Sudeste, consideradas de maior desenvolvimento econômico e financeiro, apresentam o maior número de casos no Brasil. A obesidade, o envelhecimento da população e o histórico familiar têm sido apontados como os principais contribuintes para o grande número de casos Brasil, além disso, tem sido observado um elevado número de hospitalização por causa da diabetes, essas hospitalizações são superiores às hospitalizações decorrentes de outras causas. O número de óbitos decorrentes da doença vem aumentando quando relacionada com outras afecções. Existem estudos que evidenciam que como causa de morte, o diabetes tem sido subnotificado, pois pessoas portadoras dessa patologia frequentemente morrem por causa de doenças secundárias, porém, devido a complicações crônicas da diabetes. Classificação Conforme é dito pela Sociedade Brasileira de Diabetes, essa patologia pode ser classificada em dois principais tipos: Diabetes mellitus do tipo 1 e Diabetes mellitus do tipo 2. Em determinadas pessoas, o sistema imunológico ataca equivocadamente as células beta. Sendo assim, pouca ou nenhuma insulina é liberada para o corpo. Logo, a glicose fica no sangue ao invés de ser utilizada como fonte de energia. Esse processo que caracteriza o Tipo 1 de diabetes, que concentra cerca de 5 a 10% das pessoas que possuem a doença. O tipo 1 geralmente aparece na fase infantil ou mesmo na adolescência, mas pode ser também diagnosticada em adultos. Essa variedade é sempre tratada com insulina, medicamentos, boa alimentação e práticas de atividade física, todos esses métodos ajudam no controle do nível da glicose no sangue. Já a diabetes tipo 2, também conhecida como metabólica, surge a partir do momento em que o organismo, por algum motivo, não consegue utilizar de forma adequada a insulina produzida ou mesmo não consegue produzir insulina de forma eficiente para manter controlada as taxas de glicose na corrente sanguínea. A diabetes mellitus está 31 ClassifiCação Das Doenças Que aCometem os PaCientes Que Possuem Problemas enDóCrinos e metabóliCos – Parte i │ uniDaDe ii presente em aproximadamente 90% dos indivíduos que possuem essa patologia. Prevalente em adultos, mas pode aparecer alguns casos em crianças. De acordo com gravidade, a doença pode ser controlada com a prática de atividades físicas e equilíbrio alimentar. Já em outros casos mais graves exigirá o uso de fármacos para o controle nos níveis de glicose no sangue. diabetes mellitus tipo 2 Tanto nos países mais ricos, quanto nos países em desenvolvimento, o diabetes mellitus do tipo 2 é considerada uma importante epidemia que acomete todo o mundo no século XXI, consequentemente, um grave problema de saúde pública. O crescente número de novos casos e os já existentes são em decorrência do envelhecimento da população e o avanço na área médica em relação ao tratamento, principalmente, aos hábitos de vida, esses caracterizados com a falta de atividade física e aos maus hábitos na alimentação, isso leva ao aumento do peso corporal pelo excesso de tecido adiposo. Por causa da capacidade de sobrevivência das pessoas portadoras da doença, faz com que as possiblidades do desenvolvimento de complicações crônicas aumentem, essas correlacionadas ao período de exposição à elevação dos níveis de glicose no sangue. Essas alterações tais como macroangiopatia, alterações renais, problemas na retina e alterações neurológicas são demasiadamente debilitantes e muito onerosas para sistema de saúde. Problemas cardiovasculares são as principais causas de morte em pessoas portadoras de diabetes mellitus do tipo 2. A retinopatia diabética é a mais importante causa de perda de visão, além disso, a nefropatia diabética é uma grande responsável pelo ingresso das pessoas em serviços de diálises e mais gravemente, transplantes. Uma das mais importantes causas de amputações dos membros inferiores é a presença do “pé diabético”. Sendo assim, metodologias diagnósticas e estratégias terapêuticas conciliadas com hospitalizações, casos de invalidez e até mesmo a morte prematura de pessoas com essa doença acaba por elevar consideravelmente os custos da assistência à saúde das pessoas portadoras da doença. Existem ainda outras morbidades que somadas à diabetes, aumentam ainda mais os custos totais. Atualmente, há grandes provas de que a prevenção da diabetes e de suas complicações é possível de ser realizada. A quantidade de pessoas portadoras de diabetes mellitus faz com que seja possível avaliar o grau de gravidade e o seu acometimento. Com isso, dados estatísticos têm sido publicados em diversas regiões do planeta, inclusive no Brasil. Mundialmente, soube-se que cerca de 135 milhões de indivíduos apresentavam diabetes no ano de 1995, já em 2005, esse número aumentou para 240 milhões e existem estimativas 32 UNIDADE II │ ClAssIfICAção DAs DoENçAs QUE AComEtEm os PACIENtEs QUE PossUEm ProblEmAs ENDóCrINos E mEtAbólICos – PArtE I que em 2030 esse número de pessoas com a doença seja de 366 milhões, ou seja, dois terços das pessoas que viverão no planeta. Dados esses apresentados na figura 3. figura 3. 33,0 66,8 +102% 7,0 18,2 +160% População diabética em 2000 População diabética em 2030 % Crescimento 33,3 48,0 +44% 15,2 42,6 +180% 82,7 190,5 +130% fonte: adaptado de Wild, 2004. Números sobre os casos já existentes da doença em pessoas que vivem e residem em 9 capitais do Brasil com data dos anos 1980 foram publicados. Nessa década uma estimativa de 7,6% dos brasileiros entre 30 e 69 anos tinham a doença, tendo uma incidência similar em ambos os sexos que iria aumentando com o passar da idade. Os maiores valores foram relatados na cidade de São Paulo e Porto Alegre. Esses resultados sugerem que o nível de industrialização da localidade, além do nível socioeconômico pode influenciar na incidência do diabetes tipo 2. Dados demonstrados na figura 4. figura 4. prevalência de diabetes no brasil segundo o estudo multicêntrico de prevalência de diabetes – 1986-1988. Prevalência média nacional= 7,6% Pr ev al ên cia % fonte: adaptado de Malerbi, 1992. 33 ClassifiCação Das Doenças Que aCometem os PaCientes Que Possuem Problemas enDóCrinos e metabóliCos – Parte i │ uniDaDe ii fisiopatologia da diabetes mellitus tipo 2 O diabete tipo 2 é uma doença metabólica complexa caracterizada por uma diminuição da secreção pancreática de insulina e uma diminuição da ação da insulina ou resistência à insulina nos órgãos periféricos, resultando em hiperglicemia e glicotoxicidade. Esta última é responsável por um estresse oxidativo crônico ao nível tecidual, tendo um importante papel na gênese das complicações crônicas do diabete. Embora, por vezes, seja difícil caracterizar qual dos mecanismos fisiopatológicos predomina em um determinado paciente, a característica principal do diabete tipo 2 é a resistência periférica. A resistência à insulina é inicialmente observada no tecido muscular, onde a concentração crescente de insulina é necessária para permitir a captação de glicose pelo miócito. A resistência à insulina é influenciada tanto por fatores adquiridos (obesidade, inatividade física) como por fatores genéticos. Frequentemente ocorre uma associação de outras condições como aterosclerose, dislipidemia (elevação da concentração de LDL e triglicérides e redução da concentração de HDL),hipertensão arterial e obesidade abdominal. Pacientes com essa gama de sintomas são rotulados como portadores da síndrome plurimetabólica. figura 5. fisiopatologia do diabetes mellitus tipo 2. Alimento Baixa taxa de Glicose Alta taxa de glicose Célula Alfa Célula Beta Fígado quebra o glicogênio e libera glicose Fígado absorve a glicose e armazena na forma de glicogênio Pâncreas Inibe Célula Beta Célula Alfa fonte: Disponível em: <http://www.tiabeth.com/index.php/o-que-e-diabetes/>. Os resultados do Diabetes Control and Complications Trial, publicados em 1993, demonstraram claramente que uma redução da hemoglobina A1c (HbA1c) de 9,1% 34 UNIDADE II │ ClAssIfICAção DAs DoENçAs QUE AComEtEm os PACIENtEs QUE PossUEm ProblEmAs ENDóCrINos E mEtAbólICos – PArtE I em um grupo de diabéticos tipo 2 tratados convencionalmente para 7,2% em um grupo tratado rigorosamente, resultou em uma redução de 63% no risco relativo de desenvolvimento de retinopatia, 54% em nefropatia e 60% em neuropatia. O United Kingdom Prospective Diabetes Study (UKPDS) demonstrou que a redução da HbA1c em 1% reduziu o risco das complicações microvasculares em 37%. Entretanto, para que haja também uma redução das complicações crônicas decorrentes da macroangiopatia, é necessário também reconhecer a sua presença e proporcionar um tratamento adequado. O desenvolvimento acelerado da aterosclerose encontrado no diabete tipo 2, assim como na obesidade, é decorrente de uma interação complexa de diversos elementos, a maior parte deles influenciados pela hiperglicemia e pela deficiência relativa de insulina. Critérios diagnósticos O diabete tipo 2 é diagnosticado por uma glicemia de jejum > 126 mg/dl ou uma glicemia pós-prandial > 200 mg/dl. Quando realizado o diagnóstico, devem ser pesquisadas as complicações microvasculares (nefropatia, retinopatia e neuropatia) e macrovasculares, principalmente a coronariopatia, bem como outros fatores de risco para a síndrome plurimetabólica (dislipidemia e hipertensão arterial). Abaixo, segue o quadro 2 ilustrando quais seriam as metas laboratoriais para o tratamento adequado do diabete mellitus tipo 2. Quadro 2. Metas laboratoriais para o tratamento adequado do DM2. PARAMETRO METAS LABORATORIAIS NIVEIS DESEJÁVEIS NÍVEIS TOLERÁVEIS Hemoglobina Glicada < 7% (em adultos) 7,5-8,5%: de 0 a 6 anos1 < 8%: de 6 a 12 anos1; < 7,5%: de 13 a 19 anos1; 8%: em idosos1. Glicemia de Jejum < 110 mg/dL Até 130 mg/dL2 Glicemia pré-prandial < 110 mg /dL Até 130 mg/dL2 Glicemia pós-prandial < 140 mg/dL Até 180 mg/dL2 Grupo Interdisciplinar de Padronização da Hemoglobina Glicada – A1C. Atualização sobre hemoglobina Glicada (A1C) para Avaliação do Controle Glicêmico e para Diagnóstico do Diabetes: Aspectos Clínicos e Laboratoriais. Posicionamento Oficial 3ª Edição. SBD – SBEM – SBPC/ML – FENAD, janeiro de 2009. American Diabetes Association. Standards of Medical Care in Diabetes – 2009. Diabetes Care 32 (Suppl1): S13-S61, 2009. Sociedade Brasileira de Diabetes. fonte: adaptado de <http://slideplayer.com.br/slide/3170595/>. 35 ClassifiCação Das Doenças Que aCometem os PaCientes Que Possuem Problemas enDóCrinos e metabóliCos – Parte i │ uniDaDe ii tratamento O tratamento não farmacológico do diabete tipo 2 consiste em alterações dos hábitos comportamentais que incluem atividade física e programas de reeducação alimentar, sendo esses os pontos fundamentais de qualquer abordagem terapêutica. Entretanto, uma vez presente, a hiperglicemia de jejum e manifestações de um estado catabólico, mesmo que de leve intensidade, dieta e exercícios falham em normalizá-la na maior parte dos casos. Nos últimos anos, novos fármacos de administração oral surgiram para o tratamento do diabete, não estando demonstrada a superioridade de uma determinada droga sobre outra como monoterapia. Essas drogas podem ser divididas em três grupos de acordo com o seu mecanismo de ação básica: estímulo da produção de insulina pelo pâncreas (sulfonilureias e meglitinidas), sensibilizadoras da ação da insulina (metformina e tiazolidinedionas) e redutoras da absorção de carboidratos (inibidores da α glucosidase). 36 CAPítulo 2 dislipidemias Conceito Hiperlipidemia, ou mesmo dislipidemia, é uma alteração nos níveis de gordura (lipídeos) no plasma. Essas moléculas gordurosas são transportadas dentro da circulação sanguínea através de uma cápsula de proteína, e é o tipo de proteína e a densidade das moléculas de gordura que vão orientar a direção da partícula e como essas influenciam o metabolismo corporal. Alterações que envolvem as moléculas lipídicas e as lipoproteínas são mais comuns do que imaginamos, elas são consideradas um grande fator de risco para doenças que envolvem o sistema cardiovascular; por causa da forte influência que o colesterol tem na formação de placas de gordura (ateroma) para o desencadeamento da aterosclerose. Alguns casos de alterações nas dosagens dos lipídios podem também levar ao aparecimento de pancreatite aguda e ainda ser um fator que agrave o aparecimento de embolia pulmonar. Metabolismo lipídico Tanto clinicamente quanto fisiologicamente, os lipídios mais importantes são os fosfolipídios, os triglicerídeos (TG) e o colesterol, juntamente com os ácidos graxos. Um deles, os fosfolipídios, faz parte da arquitetura da membrana citoplasmática. Por sua vez, as moléculas de colesterol são as precursoras dos hormônios esteroides, como a testosterona e o estrógeno, além de fazerem parte da síntese dos ácidos biliares e da vitamina D. O colesterol ainda possui mais uma função, que é a de estar inserido nas membranas celulares e permitir a fluidez dessas e na ativação de enzimas nelas localizadas. A origem dos triglicérides é a junção de três ácidos graxos juntamente com uma molécula de glicerol. Os TG fazem parte de um dos principais mecanismos de armazenamento de energia, sendo essa depositada nos tecidos adiposo e muscular. A classificação das moléculas de ácido graxo é feita da seguinte maneira: saturados – quando não possui em sua arquitetura química duplas ligações; mono ou mesmo poli-insaturados – varia de acordo com a quantidade de duplas ligações que existe em sua cadeia química. Os ácidos graxos mais comuns em nossa dieta são o ácido láurico, o mirístico e o palmítico. 37 ClassifiCação Das Doenças Que aCometem os PaCientes Que Possuem Problemas enDóCrinos e metabóliCos – Parte i │ uniDaDe ii Já o ácido graxo monoinsaturado mais frequentemente encontrado é o oleico. Ele possui 18 átomos de carbono. Em se tratando dos poli-insaturados, eles podem ser classificados em ômega 3 (Eicosapentaenoico − EPA, Docosahexaenoico − DHA e linolênico), ou ômega 6 (linoleico), essa definição irá depender da presença da primeira ligação dupla entre os carbonos que compõe a molécula, isso a partir do grupo oxidrila. Os lipídeos são compostos lipofílicos, ou seja, hidrofóbicos, logo, uma das principais funções das lipoproteínas é permitir a solubilização e o transporte desses no meio aquoso do plasma. As lipoproteínas são formadas pela junção de moléculas de lipídeos e proteínas denominadas Apolipoproteínas (apo). Essas possuem inúmeras atribuições no metabolismo das lipoproteínas, uma dessas é fazer parte da formação intracelular das partículas lipoproteicas, exemplo das apos B100 e B48, agindo também como ligantes a receptores de membrana, além de serem cofatores enzimáticos. Há quatro classes de lipoproteínas, elas são divididas em dois grupos, sendo o primeiro o das lipoproteínas que são ricas em triglicerídeos, com diâmetro maior e menor densidade. Essas características são representativas dos quilomícrons, possuindo origem no intestino, e das VLDL, que são as lipoproteínas de muito baixa densidade, esta última, originada no fígado. O outro grupo é representado pelas lipoproteínas, que são ricas em moléculas de colesterol, sendo elas LDL e HDL, lipoproteínas de baixa densidade e a lipoproteínade alta densidade, respectivamente. Há ainda uma lipoproteína de classe intermediária, a IDL, a lipoproteína (a) –resultante da ligação covalente do LDL com a apo(a). Sua função no organismo está relacionada com a síntese e progressão das placas de ateroma. Metabolismos das lipoproteinas Via intestinal Grande parte das gorduras que são ingeridas pela alimentação é representada pelos triglicerídeos. Depois de ingeridos, as lipases, sintetizadas pelo pâncreas, hidrolisam os TG em ácidos graxos livres, mono e diglicerídeos. Sais biliares, produzidos pela vesícula biliar, são liberados dentro do intestino onde irão emulsificar os próprios TG e outras moléculas de lipídios que advêm da alimentação e da circulação entero-hepática, formando, dessa forma, as micelas. A solubilização dos lipídeos sob a forma de micelas facilita seu transporte por meio da borda em escova dos enterócitos. A proteína Niemann-Pick C1-like 1 (NPC1-L1), que compõe um transportador de colesterol intestinal, está situada na membrana apical da célula intestinal e promove a passagem do colesterol por meio da borda em escova 38 UNIDADE II │ ClAssIfICAção DAs DoENçAs QUE AComEtEm os PACIENtEs QUE PossUEm ProblEmAs ENDóCrINos E mEtAbólICos – PArtE I dessa célula, facilitando a absorção intestinal do colesterol. A repressão da proteína NPC1-L1, com consequente inibição seletiva da absorção intestinal do colesterol, fez com que pesquisadores a reconhecessem como importante alvo terapêutico no controle da elevação dos níveis de colesterol no sangue. Assim que são absorvidas pelos enterócitos, as diversas partículas lipídicas, principalmente os ácidos graxos, são determinantes para a produção dos quilomícrons, que também contêm ApoB48, o componente amino-terminal da ApoB100. Logo após, os quilomícrons são secretados pelos enterócitos e vão em direção ao sistema linfático e de lá seguem em direção à circulação por meio do ducto torácico. Durante a circulação, os quilomícrons passam por um processo de hidrólise pela lipase lipoproteica (LPL), essa, localizada na superfície do endotélio capilar do tecido adiposo e muscular. Após essa hidrólise, há a liberação de ácidos graxos, glicerol e de moléculas de colesterol não esterificados das superfícies dessas partículas. Assim que os quilomícrons passam por esse processo de lise, os ácidos graxos liberados são captados por células do tecido muscular (miócitos) e pelos adipócitos – sendo estes a principal fonte de armazenamento de TG, confeccionados a partir dos ácidos graxos. O que sobrou dos quilomícrons e ácidos graxos também são direcionados ao fígado, onde são utilizados para a síntese de VLDL. Via hepática Os lípides são transportados pelas lipoproteínas VLDL, IDL e LDL. Começando a falar delas, a lipoproteína que tem maior concentração de triglicerídeos e que contém a ApoB 100 como sua apolipoproteína principal é a VLDL. Confeccionadas e secretadas pelo fígado, as VLDL são lançadas na circulação sanguínea. A síntese de moléculas de VLDL pelo fígado necessita da ação de uma proteína intracelular, a proteína de transferência de triglicéride microssomal (MTP), sendo essa capaz de transferir as partículas de triglicérides para a apolipoproteína B, formando dessa maneira as VLDL. Essa síntese hepática das VLDL também tem sido utilizada como alvo terapêutico para o tratamento da elevação dos níveis de colesterol no sangue, seja inibição da proteína MTP, ou pela inibição da produção de Apo B 100. Uma vez na circulação sanguínea, os triglicerídeos das VLDL, assim como acontece com os quilomícrons, são então hidrolisados pela LPL, enzima estimulada pela ApoC-II e inibida pela ApoC-III. Os ácidos graxos quando livres são redistribuídos para os tecidos, onde podem ser armazenados, ou rapidamente utilizados, como nos músculos esqueléticos. As VLDL, por ação direta da lipase lipoproteica, extremante repleta de partículas de TG, transformam-se em remanescentes, também retirados pelo fígado 39 ClassifiCação Das Doenças Que aCometem os PaCientes Que Possuem Problemas enDóCrinos e metabóliCos – Parte i │ uniDaDe ii por meio de receptores específicos. Uma parcela das VLDL dá origem às IDL, que são retiradas prontamente do plasma. O processo de catabolismo se segue e ainda conta com a ação da lipase hepática, obtendo como resultado a formação do LDL. As VLDL estão propensas a trocas lipídicas com as HDL e as LDL durante o seu processo de hidrólise. Por meio da ação da proteína de transferência de ésteres de colesterol (CETP), é realizada uma troca de triglicérides por ésteres de colesterol com as HDL e LDL. Assim como outras enzimas e proteínas que estão envolvidas na síntese/formação das moléculas lipoproteicas, a CETP também tem sido usada como potencial alvo terapêutico para o tratamento de dislipidemias, em especial no tratamento de baixos níveis de HDL, consequentemente na redução do risco de doenças cardiovasculares. ldl A LDL possui apenas um pequeno conteúdo de TG e sua composição é basicamente de colesterol e uma única apo, a ApoB100. As LDL são capturadas por células hepáticas ou periféricas pelos receptores de LDL (LDLR). Dentro das células, o colesterol livre pode ser esterificado para depósito por ação da enzima acil-CoA:colesterol aciltransferase (ACAT). A expressão dos receptores de LDL nas células do fígado é a principal responsável pelo nível de colesterol no sangue e irá depender da ação da enzima hidroximetilglutaril coenzima A (HMGCoA) redutase, enzima-chave para a produção intracelular do colesterol hepático. A inibição da HMG-CoA redutase e, portanto, da síntese intracelular do colesterol, é um importante alvo terapêutico no tratamento da hipercolesterolemia. Com diminuição do conteúdo intracelular do colesterol, ocorre a elevação da expressão de LDLR nos hepatócitos e a maior captura de LDL, IDL e VLDL circulantes por essas células. Há pouco tempo, a identificação e a caracterização da Pró-proteína Convertase Subtilisina/Kexina Tipo 9 (PCSK9) possibilitaram à introdução de novos conhecimentos ao metabolismo do colesterol. A PCSK9 é uma protease expressa principalmente pelo fígado, intestino e rins, que é capaz de inibir a reciclagem do LDLR de volta à superfície celular, ocasionando um menor número de receptores e elevação dos níveis plasmáticos de LDL. A inibição da PCSK9, outro potencial foco na terapêutica da hipercolesterolemia, bloqueia a degradação do LDLR, com maior capacidade de clearance da LDL circulante. Hdl As moléculas de HDL são produzidas no fígado, no interior do intestino e na circulação sanguínea. Seu principal conteúdo proteico é representado pelas apoliproteínas AI e 40 UNIDADE II │ ClAssIfICAção DAs DoENçAs QUE AComEtEm os PACIENtEs QUE PossUEm ProblEmAs ENDóCrINos E mEtAbólICos – PArtE I AII. Por meio da ação da enzima Lecitina Colesterol Aciltransferase (LCAT) o colesterol livre da HDL, advindo das membranas celulares, é esterificado. A ApoA-I, principal proteína que constitui a HDL, é cofator dessa enzima. Para que sua estabilização aconteça, e consequentemente o seu transporte pelo plasma sanguíneo, é necessário que haja o processo de esterificação no centro dessa partícula do colesterol, o que acontece principalmente nas HDL. A HDL leva o colesterol até o fígado, onde é captada pelos receptores SR-B1. O trajeto do colesterol, que acontece dos tecidos periféricos para o fígado, é denominado transporte reverso do colesterol. Nesse transporte, é importante a ação do complexo ATP-Binding Cassette A1 (ABC-A1) que facilita a extração do colesterol da célula pelas HDL. A HDL também tem outras funções que auxiliam na proteção da vasculatura contra a formação de placas de ateroma, como a remoção de lipídeos oxidados da LDL, a inibição da fixação de moléculas de adesão e monócitos na parede do endotélio vascular e o estímulo realizado para que haja a liberação na corrente de óxido nítrico. Não só há dissemelhança de tamanho na densidade e composição