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DEBATES CONTEMPORÂNEOS EM EDUCAÇÃO

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Debates Contemporâneos em Educação 
 
0 
 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
1 
 
Daniel Skrsypcsak 
Jenerton Arlan Schütz 
Organizadores 
 
 
 
 
 
 
 
DEBATES CONTEMPORÂNEOS EM EDUCAÇÃO 
 
 
 
 
 
 
Dialogar 
São Paulo – SP 
2018 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
2 
 
CONSELHO EDITORIAL 
 
Ivanio Dickmann - Editor Chefe - Brasil 
Aline Mendonça dos Santos - Brasil 
Fausto Franco Martinez - Espanha 
Jorge Alejandro Santos - Argentina 
Miguel Escobar Guerrero - México 
Carla Luciane Blum Vestena - Brasil 
Ivo Dickmann - Brasil 
José Eustáquio Romão - Brasil 
Enise Barth Teixeira – Brasil 
 
 
 
FICHA CATALOGRÁFICA 
 
 
D350 Debates contemporâneos em educação / Daniel Skrsypcsak, 
Jenerton Arlan Schütz (Orgs.). 1.ed. – São Paulo: Dialogar, 2018. 
 
ISBN - 9788593711244 
 
1. Educação. 2. Teorias da educação. I. Skrsypcsak, Daniel. II. Schütz, 
Jenerton Arlan. III. Título. 
 
 CDD 370.1 
 
 
Ficha catalográfica elaborada por Karina Ramos – CRB 14/1056 
 
 
EDITORA DIALOGAR 
dialogar.contato@gmail.com 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
3 
 
 
SUMÁRIO 
 
PREFÁCIO ................................................................................................... 6 
 
CAPÍTULO I - Currículo e Formação de Professores 
 
1 - Formação de professores e educação inclusiva: Possibilidades 
de pensar para além da mesmidade 
Daniel Skrsypcsak, Jenerton Arlan Schütz...........................................................8 
 
2 - Formação inicial de professores de inglês: Prática institucional 
do mistério e o caso dos diários de leitura 
Fernando Silvério de Lima..................................................................................24 
3 - Formação de professores da educação infantil no Rio Grande do 
Sul nas estatísticas educacionais 
Rafaela da Silva Melo.........................................................................................51 
4 - Formação de professores: O papel do ensino e da pesquisa 
da história da educação 
Simone Burioli Ivashita.......................................................................................68 
 
 
CAPÍTULO II - Dimensões políticas da educação brasileira 
 
5 - Princípios da gestão democrática para promover uma 
convivência democrática na escola 
Daniel Skrsypcsak..............................................................................................87 
 
6 - A emenda constitucional 95/2016 e a vinculação constitucional 
de recursos: Involução das políticas de financiamento educacional 
Ivair Fernandes de Amorim, Eder Aparecido de Carvalho...............................102 
 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
4 
 
7 - Caminhos e descaminhos das políticas de currículo e 
escolarização do programa educacional “escola viva” 
Julio César da Silva de Alvarenga, Maria de Fátima Côgo, Marina de Oliveira 
Delmondes........................................................................................................123 
 
8 - Avaliação escolar e políticas educacionais: Considerações 
 e diálogos contemporâneos 
Cláudia Fuchs..................................................................................................138 
 
 
 
CAPÍTULO III - Educação e Diversidade 
 
9 - A multiplicidade cultural do outro 
Luiz Fernando Ferrari.....................................................................................162 
 
10 - Educação, cultura e produção de sujeitos: o papel da 
diversidade cultural no relatório cuéllar e a identidade da educação 
 do e no campo 
Camila Maria Bortot,Kethlen Leite de Moura..................................................179 
 
11 - Contribuições da avaliação neuropsicopedagógica para a 
inclusão escolar de pessoas com necessidades educacionais 
especiais 
Eugênia Santana Pereira, Marta Bramuci de Freitas........................................201 
 
12 - Ensino de línguas na contemporaneidade: Uma reflexão 
sobre linguagem e identidade 
Roma Souza-Dias, Eduardo Dias da Silva......................................................222 
 
 
CAPÍTULO IV - Inter/transdisciplinaridade na Educação 
13 - Pedagogia da interdisciplinaridade 
Leandro Renner de Moura...............................................................................239 
 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
5 
 
14 - Alfabetização midiática e informacional como elementos 
fundamentais na formação dos sujeitos contemporâneos 
Daniele Prates Pereira, Denise Rosana da Silva Moraes...................................251 
15 - O cinema como produtor de conhecimento em sala de aula 
Geovanna Coelho dos Santos, Renato de Oliveira Dering..................................270 
 
16 - Estilos de aprendizagem: Uma crítica as suas compreensões e 
usos 
Rosemary Barbosa da Silva Moura, Luiz Artur dos Santos Cestari.................291 
17 - A ecopedagogia e a educação ambiental 
Ivan Luís Schwengber, Simone Ruppenthal.......................................................312 
 
18 - Tecnologia e hibridismo no ensino superior: 
A contemporaneidade na educação e nos processos de ensino 
e aprendizagem 
Tarcisio Dorn de Oliveira, Felipe Cavalheiro Zaluski.......................................329 
 
19 - O capitão américa: A arte como produto 
Célia Martins da Costa....................................................................................342 
20 - Uma breve reflexão sobre as tecnologias educacionais e o papel 
 da escola diante da cultura digital 
Douglas Orestes Franzen, Leandro Mayer, Mariane Jungblut Fiorentin….......360 
 
 
 
 
 
 
 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
6 
 
PREFÁCIO 
“O escrever é o princípio da pesquisa, tanto no sentido de por onde deve ela 
iniciar sem perda de tempos, quanto no sentido de que é o escrever que a 
desenvolve, conduz, disciplina e faz fecunda” Mario Osorio Marques 
A obra “Debates Contemporâneos em Educação”, organizada por 
Daniel Skrsypcsak e Jenerton Arlan Schütz, testemunha inúmeras experiências 
de escrever na educação, de educar na escrita. Experiências estas que nos 
tocam, nos transformam e nos acontecem, como nos lembra Jorge Larrosa. 
Movidos por essas experiências e inquietações, a obra, organizada em 
quatro sessões e vinte capítulos, aborda inúmeras questões contemporâneas, a 
saber, da formação de professores; educação inclusiva; educação ambiental; 
tecnologias; ensino e pesquisa; gestão; políticas educacionais; currículo; 
avaliação escolar; diversidade cultural; psicopedagogia; ensino de línguas; 
alfabetização; interdisciplinaridade, entre outras. 
É esse caráter interdisciplinar que testemunha as mais variadas 
experiências de escrever e fazer pesquisa. Por isso, esta coletânea não tem 
nenhum propósito revelador, doutrinário ou convertedor. O que ela propõe é 
convidar o leitor a um gesto simples e milenar: Dar a ler! Um gesto que 
possibilita a continuidade e durabilidade do mundo comum. 
Desejo aos leitores desta coletânea de textos afastamento, tempo e 
pensamento para que possam, na leitura, percorrer caminhos que ajudem a 
produzir novas formas de pensar e ser. 
Precisamos clamar para que a força do pensamento não nos 
abandone e que possamos sempre nos interrogar: Por quem queremos ser 
reconhecidos? O que queremos impactar com nossa atividade? Por fim, que 
sejamos capazes de nos manter firmes e dispostos a pensar outramente 
(Touraine) nestes tempos de ignorância militante, de hábeis polegares e escassa 
memória. 
 
Boa leitura! 
Jenerton Arlan Schütz 
Inverno de 2018 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
7 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CAPÍTULO I 
 
 
Currículo e Formação de Professores 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
8 
 
1 - FORMAÇÃO DE PROFESSORES E EDUCAÇÃO INCLUSIVA: 
POSSIBILIDADES DE PENSAR PARA ALÉM DA MESMIDADE 
Daniel Skrsypcsak1 
Jenerton Arlan Schütz2 
 
INTRODUÇÃO 
 
 Refletir sobre a inclusão na educaçãoescolar leva-nos inevitavelmente 
a (re)pensar e (re)significar a relação entre a formação do professor e as 
práticas pedagógicas atuais. A elaboração do presente texto objetiva analisar a 
formação de professores para atuar em um paradigma de educação que busca a 
igualdade de oportunidades e a qualidade nos serviços oferecidos a todos os 
alunos. A compreensão da educação como um direito de todos e do processo de 
inclusão educacional numa perspectiva coletiva da comunidade escolar, reforça 
a necessidade da construção de escolas inclusivas que contam com redes de 
apoio a inclusão. 
 No contexto mundial, a educação caminha na direção de um modelo 
escolar que se fundamenta no paradigma da inclusão. Professores e escolas são 
chamados frequentemente para enfrentar o grande desafio de oferecer 
qualidade a toda a diversidade de alunos. Permitir que os alunos tenham acesso 
e permaneçam na escola não é o suficiente, é preciso tornar fundamental que 
todos eles, de fato, aprendam. Assim, várias são as exigências e desafios postos 
na organização e funcionamento da escola, nas práticas pedagógicas e, 
principalmente, na formação dos professores. 
 
1 Doutorando em Educação nas Ciências (UNIJUI); Mestre em Educação (UNESC). Licenciado em 
Educação Física (UFSM). Professor da Rede Públic do Estado de Santa Catarina e do Centro 
Universitário Fai de Itapiranga-SC. E-mail: dskrsypcsak@hotmail.com 
2 Doutorando em Educação nas Ciências (UNIJUI), Mestre em Educação nas Ciências (UNIJUI), 
Especialista em Metodologia de Ensino de História (UNIASSELVI), Licenciado em História e Sociologia 
(UNIASSELVI), Bolsista CAPES. E-mail: jenerton.xitz@hotmail.com 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
9 
 
 Nesse sentido, escolas, gestores e professores precisam estar 
preparados para enfrentar o desafio, que está para além de acolher os alunos, 
pois, estes merecem condições possíveis para aprender, além das mesmas 
oportunidades para acessar os conhecimentos historicamente constituídos 
(tradição). Contudo, será que os professores estão realmente preparados para 
“dar conta” dessa missão? Sabem eles reconhecer as necessidades educacionais 
especiais dos alunos? Sabem eles identificar estratégias pedagógicas e utilizar 
recursos diferenciados capazes de compensar ou superar as barreiras de 
aprendizagem existentes? Será que estão indo para além da mesmidade, para 
além de uma pedagogia do apagamento? 
 Respostas para tais indagações exigem novas posturas frente à 
Educação Inclusiva, uma vez que estão diretamente relacionadas com a 
formação de professores, a práxis escolar e, principalmente, a aprendizagem de 
todos os alunos envolvidos no processo, destarte, consideramos fundamental 
abordar a formação inicial, isto é, lá onde se constituem os professores e 
demais profissionais da educação. 
 Ademais, para dar conta das indagações e outros desafios lançados à 
Educação Inclusiva, busca-se, num primeiro movimento, apresentar reflexões 
acerca dos desafios e dilemas postos à Educação Inclusiva na 
contemporaneidade, a fim de argumentar a importância da formação inicial 
para uma educação que possibilite a inclusão de todos os alunos e, do mesmo 
modo, garanta a aprendizagem de todos; por conseguinte, o texto estabelece 
conexões e possibilidades de uma prática inclusiva para a diversidade, 
alteridade, para o Outro, enfim, para além da mesmidade. 
 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
10 
 
Desafios e dilemas para a formação de professores e a educação inclusiva 
 Um dos desafios fundamentais que emergem da proposta de escola 
inclusiva é a formação do professor, que para Fávero (2009) é, justamente, o 
de (re)pensar e (re)significar a própria concepção de educador. Isto porque o 
processo educativo consiste na criação e no desenvolvimento de contextos 
educativos que possibilitem a interação coletiva entre os sujeitos singulares, e 
não simplesmente na transmissão e na assimilação disciplinar de conceitos e 
comportamentos estereotipados. 
 A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei nº 
9.394/1996 de 20 de dezembro de 1996, em seu Título I, que trata da 
educação estabelece que: 
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na 
vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de 
ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil 
e nas manifestações culturais. 
 Nesse contexto, buscar a igualdade de condições para o acesso e 
permanência na escola vem sendo um grande desafio para a educação 
brasileira, pois, conforme a LDB, a educação, dar-se-á através da interação 
com a comunidade e da vida em sociedade. Em seu capítulo V, que trata da 
educação especial, a referida Lei estabelece que: 
Art. 58 Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a 
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede 
regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. 
Art. 59 Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades 
especiais: [...] III – professores com especialização adequada em nível 
médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores 
do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas 
classes comuns; 
 
 Em conformidade com a Lei, o professor do ensino regular deve ser 
capacitado, a fim de que se possam garantir os princípios de uma educação 
inclusiva. Cabe aqui analisar quais são as medidas tomadas pelas instituições de 
ensino superior para adequar-se a essa nova realidade, educação igual para 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
11 
 
todos. Por isso, “[...] dentre os inúmeros problemas de educação brasileiras que 
precisam ser resolvidos nenhum sobreleva o da formação dos professores” 
(AZANHA, 1995, p. 193), e a razão é muito simples: a questão da qualidade 
educacional não será enfrentada de modo adequado sem que primeiramente se 
enfrente a questão da formação dos professores. 
Outra preocupação é para a formação continuada dos professores 
atuantes. A formação dos profissionais da educação é tarefa, sem dúvida, 
essencial para a melhoria do processo de ensino e para o enfrentamento das 
diferentes situações que implicam a tarefa de educar. A LDB, em seu Título 
VI, que trata dos profissionais da Educação, estabelece que: 
Art. 62 A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em 
nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em 
universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação 
mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro 
primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na 
modalidade Normal. 
 Fazendo uma reflexão sobre a situação atual da formação dos 
professores, percebe-se a necessidade de que ela se insira no movimento de 
profissionalização fundamentado na concepção de competência profissional. 
O desenvolvimento dessa competência exige a articulação da teoria com a 
prática, na resolução de situações-problema e na reflexão sobre a atuação 
profissional. 
Na Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE), que 
institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, há 
referência à inclusão e à formação de professores: 
A Educação Básica deve ser inclusiva, no sentido de atender a uma política 
de integração dos alunos com necessidades educacionais especiais nas 
classes comuns dos sistemas de ensino. Isso exige que a formação dos 
professores das diferentes etapas da Educação Básica inclua conhecimentos 
relativos à educação desses alunos (BRASIL, 2001, pp. 25-26). 
Não obstante, Freitas (2006, p. 168) apresenta a seguinte análise 
quanto à formação dos professores, ela deve ser: 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
12 
 
[...] uma análise crítica sobre as práticas pedagógicas desenvolvidasatualmente com alunos que possuem necessidades educacionais especiais 
nas salas de aula do ensino comum permite-nos concluir que a formação do 
professor para a educação geral muito pouco tem contribuído para a 
educação desses alunos. 
 Realmente faz sentido, pois, hodiernamente, um professor está sendo 
muito sugado pelos alunos ditos “normais” quanto à questão comportamental, 
e será que na própria educação regular não tem alunos excluídos, não há uma 
pedagogia do apagamento para parafrasear Skliar (2003a, 2003b)? Com essa 
nova situação, faz-se necessário a presença de mais alguém em sala para 
atender as necessidades de alguém “especial”. Nesse sentido, “o especial e o 
comum são vistos como dois problemas distintos que vêm disputando o 
mesmo espaço, o mesmo lugar físico: a escola pública” (KASSAR, 1995, p. 27 
apud FREITAS, 2006, p. 164). Não obstante, a formação do professor de 
modo geral deve incluir programas/conteúdos que desenvolvam competências 
de um profissional intelectual para atuar em situações singulares. 
Conforme Mittler (2003, p. 184): 
Criar oportunidades para a capacitação não significa, necessariamente, 
influenciar o modo como os professores sentem-se em relação à inclusão. 
Tais sentimentos são fundamentais e precisam ser levados a sério. Qualquer 
dúvida ou quaisquer reservas não devem ser consideradas como 
reacionárias ou simplesmente anuladas. Os professores precisam de 
oportunidades para refletir sobre as propostas de mudança que mexem com 
seus valores e com suas convicções, assim como aquelas que afetam sua 
prática profissional cotidiana. 
 Nesse aspecto é de fundamental importância a formação continuada, 
pois, quem já está atuando há anos no ensino regular vai enfrentar certa 
dificuldade para se adequar a nova realidade. São situações completamente 
diferentes e que o professor deverá estar atento para não criar problemas em 
sala, por isso a necessidade de estar com formação correta/concreta/contínua 
para saber o que fazer em determinados momentos. Segundo Freitas (2006, 
p.167), 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
13 
 
Há na educação inclusiva a introdução de outro olhar. Uma maneira nova 
de se ver, ver os outros e ver a educação. Para incluir todas as pessoas, a 
sociedade deve ser modificada com base no entendimento de que é ela que 
precisa ser capaz de atender às necessidades de seus membros. Assim 
sendo, inclusão significa a modificação da sociedade como pré-requisito 
para a pessoa com necessidades especiais buscar seu desenvolvimento e 
exercer sua cidadania. 
 O paradigma inclusivo, ao exigir do professor do ensino regular uma 
especialização para a sua atuação em sala de aula, também mostra que o 
educador da diversidade amplie suas perspectivas, a fim de desempenhar bem 
o papel de professor nessa nova realidade, uma vez que a postura do professor 
precisa mudar. O futuro professor tem de estar preparado teoricamente, saber 
aplicar na prática a teoria conhecida e aprendida, analisando as situações e 
melhorando-as. 
Hoje, um dos grandes desafios dos cursos que formam professores é a 
elaboração de um currículo que venha desenvolver nos acadêmicos 
competências, habilidades e conhecimentos para que possam atuar em uma 
escola realmente das diferenças que apresentarem, dando-lhes as mesmas 
possibilidades de realização humana e social (FREITAS, 2006, p. 176). 
 Para que a inclusão de alunos com necessidades especiais na rede 
regular de ensino seja efetivada, não basta à criação de leis que promulguem a 
criação de cursos de capacitação continuada de professores, nem obrigue os 
alunos a matricularem-se na rede pública de ensino. Estas são medidas 
essenciais, porém, não suficientes. 
 Para Correia (2008, p. 28), convergindo com a perspectiva formativa, 
considera que “[...] os educadores, os professores e os auxiliares de acção 
educativa necessitam de formação específica que lhes permita perceber 
minimamente as problemáticas que seus alunos apresentam, que tipo de 
estratégia devem ser consideradas para lhes dar resposta [...]”. 
A política educacional para a inclusão, através da capacitação, deve 
ser de forma gradativa e contínua, na perspectiva de beneficiar, alunos, 
professores e comunidade escolar. Todavia, vale ressaltar que é de fundamental 
importância a interação da criança com necessidades especiais com o meio 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
14 
 
social, desde que sejam respeitadas as suas possibilidades e limites. Caso 
contrário, este indivíduo poderá ter sérios problemas emocionais e sociais. 
 O professor é um agente fundamental no processo da inclusão, nesse 
contexto Silva e Reis (2011, p. 11) afirmam que “os aspectos ligados à 
formação do professor devem ser especialmente considerados, uma vez que, 
este deve estar preparado e seguro para trabalhar com o aluno com 
necessidade educacional especial”, o profissional da educação deve estar em 
constante formação, para atender as diferentes necessidades educacionais da 
atualidade. Além de todos esses aspectos ligados a formação dos professores e 
sua importância em tal contexto, vale ressaltar que as escolas também devem 
estar preparadas para receber tais alunos. 
Nessa direção, conforme Mittler (2003, p. 34) “a inclusão implica 
uma reforma radical nas escolas em termos de currículo, avaliação, pedagogia e 
formas de agrupamento dos alunos nas atividades em sala de aula”. Desta 
forma, a inclusão implica também, que todos os professores têm o direito de 
receber preparação apropriada na formação inicial em educação e 
desenvolvimento profissional contínuo durante sua vida profissional. 
 A aceitação generalizada da proposta de inclusão, e a reconhecida 
necessidade de ampliação do acesso à Educação àqueles que, tradicionalmente, 
têm sido excluídos do sistema de ensino, refletem uma tendência atual em se 
acreditar no potencial dos alunos com necessidades especiais. A educação 
inclusiva, apesar de encontrar, ainda, sérias resistências por parte de muitos 
educadores, constitui, sem dúvida, uma proposta que busca resgatar valores 
sociais fundamentais, condizentes com a igualdade de direitos e de 
oportunidades para todos. 
 
Conexões e possibilidades para pensar uma educação para além da 
mesmidade 
 A partir das reflexões acerca de uma formação de professores que 
esteja comprometida com a diversidade presente na escola e em cada sala de 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
15 
 
aula, precisamos considerar que uma formação inicial e continuada de 
professores que busca acumular certificados, horas, cursos, técnicas 
inovadoras, não dará conta de uma educação que se quer realmente inclusiva, 
pois, segundo Nóvoa (1995, p. 25): 
A formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos 
ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica 
sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade 
pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao 
saber da experiência [...]. Práticas de formação que tomem como referência 
as dimensões colectivas contribuem para a emancipação profissional e para 
a consolidação de uma profissão que é autônoma na produção dos seus 
saberes e dos seus valores. 
 Desse modo, a formação de professores deve ter como foco a 
reflexividade das práticas e diferentes situações que constituem a prática 
pedagógicas, pois, a reflexão coletiva cria possibilidades de (re)pensar as 
soluções para as questões presentes. Não obstante, as constantes reflexões 
teórico-práticas possibilitam alicerçar projetos e novas possibilidades 
transformadoras para a Educação Inclusiva. 
 Nesse sentido, Santos (2007) reitera a importância de buscar sinais, 
pistas, movimentos, ou seja, o “ainda-não”, aquilo que ainda não foi pensado 
ou instituído, mas que, a partir da ação/reflexão coletiva pode emergir e 
mostrar rumos,sinais e possibilidades antes não pensadas. Somente assim 
teremos uma escola aberta para todos, uma “[...] instituição que tem a 
preocupação de não descartar ninguém, de fazer com que se compartilhem os 
saberes que ela deve ensinar a todos. Sem nenhuma reserva” (MEIRIEU, 
2005, p. 44). 
 Em consonância, Mittler (2003, p. 20, grifo nosso), considera que a 
inclusão depende do trabalho 
[...] cotidiano dos professores na sala de aula e do seu sucesso em garantir 
que todas as crianças possam participar de cada aula e da vida da escola como 
um todo. Os professores, por sua vez, necessitam trabalhar em escolas que 
sejam planejadas e administradas de acordo com linhas inclusivas e que 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
16 
 
sejam apoiadas pelos governantes, pela comunidade local, pelas autoridades 
educacionais e acima de tudo pelos pais. 
 Não obstante, podemos considerar que a possibilidade de uma 
Educação Inclusiva está para além da sala de aula e não depende apenas do 
professor. A Educação Inclusiva deve ser construída diariamente com o auxílio 
de todas esferas políticas e sociais. Nesse contexto, a possibilidade de inclusão 
não diz respeito a colocar as crianças nas escolas, mas sim em mudar as escolas 
a fim de torná-las mais responsivas a todos aqueles que nela adentrarem, dito de 
outra forma, é ajudar todos os professores a serem responsáveis pela 
aprendizagem de todas as crianças que estão na e fora da escola por qualquer 
razão. Isto é, aquelas crianças que não são “beneficiadas” pela escolarização, e 
não apenas aquelas rotuladas, geralmente, com o termo de “necessidades 
especiais”, essas são possíveis conexões para sonharmos e estabelecermos uma 
Educação Inclusiva para todos. 
 Nessa direção, a escola deve ter por finalidade instituir os cenários 
políticos e pedagógicos para possibilitar o acesso universal ao conhecimento, 
constituindo esforços contínuos de universalização da cultura (MEIRIEU, 
2002). Assim, é preciso buscar a concretude escolar, onde os alunos, 
professores, gestores e demais profissionais da educação habitam e atuam sob 
o horizonte ético da inclusão escolar, em outras palavras, “todos devem estar 
comprometidos com o jogo”. 
 Neste jogo em que todos jogam, constitui-se um espaço de 
diferenças, de qualquer natureza, e é lá onde tais diferenças podem existir, ou 
seja, é preciso construir possibilidades, ao invés de mantermos antigos e 
ultrapassados estigmas e práticas. Ademais, “[...] descobrir novos meios para 
que a educação seja um lugar de partilha e não de exclusão (MEIRIEU, 2002, 
p. 34), por isso, mesmo que a escola presentifique tensões e desafios, ela deve 
se constituir em um espaço de conhecimento capaz de criar possibilidades e 
alternativas para garantir uma proposta de aprendizagem para todos os alunos. 
 Retomando a passagem de Nóvoa (1995) no início deste item, para 
efetivarmos uma proposta para a inclusão, faz-se necessário estabelecer 
vínculos de encontros; encontros de reflexões, saberes, fazeres, estratégias, 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
17 
 
recursos, avaliações, metodologias, pois, assim estaremos tornando os sujeitos 
responsáveis pela aprendizagem em sujeitos coletivos, interativos agindo no 
contexto da diversidade. 
 Para Santos (2007), estamos vivenciando o tempo da tradução, ou 
seja, o momento de criarmos diálogos entre os diferentes conhecimentos e 
experiências disponíveis neste mundo que é tão plural e heterogêneo. Por isso 
mesmo, a ação educativa deve buscar consolidar a diversidade, a pluralidade, o 
Eu, o Outro, os tantos Outros presente em cada sala de aula, de tal modo que, 
[...] deve se pautar no respeito e no convívio com as diferenças, preparando 
os educandos para uma sociedade mais justa e solidária, contrária a todos os 
tipos de discriminação. [...] os professores precisam tratar das relações entre 
os alunos. Formar crianças para o convívio com as diferenças (ZOÍA, 2006, 
p. 23). 
 Desse modo, nas experiências escolares estamos constantemente nos 
deparando com o Outro, com as diferenças, com encontros, com a alteridade 
etc. A questão que levantamos é: quando falamos do Outro nas experiências 
da educação escolar, estamos falando, de fato, no/do Outro e na possibilidade 
de encontros (todos aqueles que já citamos), ou estamos nos referindo da 
redução do outro, assim, sem possibilidade nenhuma de encontro? É possível 
encontrar um meio, no qual o Outro não seja esvaziado, excluído e 
neutralizado na sua alteridade? 
Skliar (2003b, p. 39), nos mostra que tudo é possível com a mudança 
na educação escolar, até mesmo, 
a insistência em uma única espacialidade e em uma única temporalidade, 
mas com outros nomes; a infinita transposição do outro em temporalidades 
e espacialidades homogêneas; a aparente magia de alguma palavra que se 
instala pela enésima vez, ainda que não nos diga nada; a pedagogia das 
supostas diferenças em meio a um terrorismo indiferente; chamar ao outro 
para uma relação escolar sem considerar as relações do outro com outros; e 
a produção de uma diversidade e uma alteridade que é pura exterioridade de 
nós mesmos; uma diversidade que apenas se nota, apenas se entende, 
apenas se sente. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
18 
 
Assim, as mudanças educativas nos pensam agora como uma reforma 
do mesmo, como uma reforma para nós mesmos. Elas nos olham agora como 
esse rosto que vai despedaçando-se de tanta maquiagem sobre maquiagem. As 
mudanças têm sido, então, a burocratização do Outro, sua inclusão curricular, 
seu dia no calendário, seu folclore, seu exotismo. 
E [...] esquecemos do Outro, agora detestamos sua lembrança, maldizemos 
a hora de sua existência, corremos desesperados para aumentar o número 
de carteiras das salas de aula, mudamos as capas de livros que publicamos 
[...], reuniformizamos o Outro sob a sombra de novas terminologias sem 
sujeitos (SKLIAR, 2003a, p. 195). 
 Cremos que o discurso da “pedagogia do apagamento” (SKLIAR, 
2003a, 2003b) está muito presente e próximo de cada um de nós, uma vez que 
o “problema” é sempre o Outro, isto é, que seja o Outro que tenha que ficar 
nu, que seja o Outro que se distancie de si mesmo, que seja o Outro que negue 
sua alteridade, que seja o Outro que fale em nome da igualdade, do respeito, da 
aceitação, do reconhecimento, da tolerância, que seja sempre o Outro. Que 
relações escolares então queremos? Podemos pensar em uma experiência 
escolar para além da mesmidade? 
Do mesmo modo, no pensamento de Levinas (1980, 1997, 1998), 
pensar as diferenças é abrir-se para (re)pensar a educação escolar, a formação 
humana, o conhecimento, as nossas relações e o mundo comum. A 
contribuição desse autor para a educação incide na ressignificação de uma 
abordagem embasada no ensinamento que provém do Outro, pois seu esforço 
teórico abre-se para traçar caminhos que tentam reconstruir um horizonte 
alternativo. 
Tematizar a educação, na perspectiva de Levinas, é um modo de resgatar e 
garantir a humanização do ser humano respeitando-o na sua diferença. O 
Outro é deduzido, muitas vezes, a partir do eu, visto como ameaça, 
negação, que questiona e se confronta com o poderio do eu. Nesse sentido, 
é que emerge a grande virada à capacidade do ser humano de se fazer e 
refazer nesse movimento. Uma educação que não trabalha o ato de pensar, 
também a partir do Outro, mas que se relega à boa sorte do que encontra 
como constituído nas subjetividades totalizadoras dos processos 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
19 
 
educacionais e na perda do sentido do humano, reduzindo a possibilidade 
de alteridade (DIEZ; COSTA, 2016, p. 190). 
Realizar a experiência educativa como um gesto de acolhimento e 
reconhecimento, significa manter uma relação de proximidade e abordar o 
Outro na relação face a face. Necessariamente, implica em construir no âmbito 
educacional uma relação de proximidade não alérgicaà alteridade. Assim, a 
relação pedagógica tecida na forma de acolhimento é como a carícia que toca a 
pele do Outro sem com isso violentar sua integridade ou ferir sua alteridade 
(MIRANDA, 2008). 
Portanto, numa educação anônima, isto é, numa educação que não é 
inclusiva, não compreende as diversidades, as diferenças, o Outro, a alteridade 
etc, não há pessoas que se revelam, nem experiências sobre as quais possamos 
pensar e nas quais possamos encontrar algum sentido para a educação e o 
Outro. Muitas vezes, há experiências e momentos significativos que surgem, de 
modo inesperado, em alguma escola, em alguma sala de aula - algumas luzes. 
Assim, quem pensa o Outro e nele sua educação, tem de tomar cuidado para 
não apagar essas luzes, pois elas nos lembram a tarefa da educação: cuidar de 
um mundo que não dispensa as pessoas (o Outro), mas depende delas. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 Discutir as questões relativas à função social da escola e à importância 
de seu trabalho, considerando a diversidade dos alunos e a complexidade da 
prática pedagógica, são dimensões essenciais a serem garantidas na formação 
do professor. No entanto, não basta que uma proposta se torne lei para que a 
mesma seja imediatamente aplicada. 
Inúmeras são as barreiras que impedem que a política de inclusão se 
torne realidade na prática cotidiana de nossas escolas. Entre estas, a principal, 
sem dúvida, é o despreparo dos professores do ensino regular para receber em 
suas salas de aula, geralmente repletas de alunos com problemas de disciplina e 
aprendizagem. Portanto, importa, neste momento histórico de educação para 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
20 
 
todos, que a formação seja de um professor comprometido com sua função 
social de educar todos os alunos. Acolher a diversidade de indivíduos e contar 
com professores preparados para a escola inclusiva! Eis o grande desafio da 
educação na atualidade. 
A educação é, necessariamente, um empreendimento coletivo. Para 
educar – e para ser educado – é necessário que haja ao menos duas 
singularidades em contato. Educar é um encontro de singularidades. O direito 
à diferença está baseado na ideia de que todos são diferentes entre si; e, 
propriamente, isto é ser humano, em sua singularidade. Para Arendt (2010, p. 
8), “Homens, e não o Homem, vivem na Terra e habitam o mundo”. 
O fato da pluralidade nos leva a agir e a nos relacionar com os Outros 
com os quais (con)vivemos. Viver na pluralidade, significa se basear na 
igualdade e na diferença3 ao mesmo tempo. O fato de todos sermos seres 
humanos é que possibilita nos comunicar. Porém, também somos singulares, o 
que significa que com cada novo ser que neste mundo chega, vem também 
algo totalmente novo ao mundo. Assim, a pluralidade é formada por 
singularidades, e o fato de estarmos entre-outros é o que nos impele a 
comunicarmos uns com os outros. 
Ademais, nas palavras de Hannah Arendt (2013, p. 247), “a educação 
é o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos 
responsabilidade por ele [...] e [...] onde decidimos se amamos nossas crianças 
o bastante para não expulsá-las de nosso mundo”. Uma educação 
comprometida com o mundo comum (eu, o Outro, e tantos outros), dá as 
boas-vindas a todos na esperança de que possam amá-lo à sua maneira 
singular. 
Finalmente, gostaríamos de ressaltar que o objetivo de abordar a 
educação inclusiva e nela a formação de professores, permanece ainda um 
caminho aberto a ser percorrido, por mim, você, nós, o Outro e tantos outros. 
É um tema bastante fecundo, que incide na ampliação dos horizontes 
 
3 Todos somos seres humanos, mas de um modo estranho: nenhum dos seres humanos se igualará 
(jamais) a Outro que já viveu, vive ou viverá. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
21 
 
compreensivos dos sujeitos no âmbito da educação. Temos ciência de que há 
muitos aspectos aqui abordados que merecem um maior aprofundamento. 
Todavia, o primeiro passo foi dado. 
Fica aqui o registro para que as preocupações assumidas neste estudo, 
e as inquietações e a ânsia por novos horizontes provocativos, possam levar a 
outros caminhos, novas pesquisas, novos problemas e possibilidades. 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
22 
 
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Debates Contemporâneos em Educação 
 
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25. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
24 
 
2 - FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES DE INGLÊS: PRÁTICA 
INSTITUCIONAL DO MISTÉRIO E O CASO DOS DIÁRIOS DE LEITURA 
 
Fernando Silvério de Lima4 
 
INTRODUÇÃO 
 
"Não. Não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas. 
Mas voam faíscas e lascas como aços espelhados". 
(Clarice Lispector: A Hora da Estrela) 
 
No campo de pesquisas do letramento acadêmico5, Lillis (1999) 
problematizou o conjunto de expectativas presentes em atividades escritas, 
tendo em vista tanto a perspectiva de quem avalia e decide os critérios que 
representam uma produção de qualidade, quanto dos alunos que buscam 
desvendar essas expectativas e produzir textos que atendam esses critérios que 
nem sempre são explicitados no ensino superior. Essa dimensão ficou 
conhecida como prática institucional do mistério. Paraeste artigo, tomamos como 
base diferentes estudos da escrita acadêmica sobre essas lacunas (LILLIS, 
1999) bem como dimensões “escondidas” (STREET, 2010) para compreender 
em um curso de Letras, quais expectativas em torno da produção de diários de 
leitura em língua inglesa podem ser apreendidas como parte daquela prática 
institucional do mistério e como essas estudantes lidam com essas lacunas ao 
produzir esses diários. 
 
4 Doutor em Estudos Linguísticos pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” UNESP 
– São José do Rio Preto. Professor colaborador da UNESPAR de Apucarana. limafsl@hotmail.com 
5 Capacidades de leitura e produção textual no contexto acadêmico considerando suas especificidades 
(LEA; STREET, 2006; STREET, 2009, 2010). Numa perspectiva etnográfica, atenta ainda para a 
compreensão de professores e alunos sobre esse processo. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
25 
 
Nossa discussão é iniciada com a retomada desse conceito chave que 
foi cunhado por Lillis (1999), e a partir dele buscamos um diálogo com outros 
trabalhos sobre escrita acadêmica realizados em diferentes países (FISCHER, 
2011, 2012; LEA; STREET, 2006; LILLIS, 1999; RAMIRES, 2007; STREET, 
2009) e mais especificamente no contexto do curso de Letras do Brasil (FIAD, 
2011; FIAD; SILVA, 2009; FIAD; MIRANDA, 2014). Em seguida, 
apresentamos o contexto investigado e os procedimentos de geração de dados. 
Posteriormente, analisamos as expectativas acerca da produção dos alunos 
com base nas orientações da prática institucional (orientação da atividade) e os 
conflitos que as alunas vivenciam ao buscar atender as expectativas da 
instituição (representada na figura da avaliadora) e como a atividade é 
organizada. 
 
Prática institucional do mistério e a escrita acadêmica 
Antes mesmo do despontar das pesquisas sobre letramento 
acadêmico no território nacional, os desafios relacionados ao processo de 
escrita de alunos universitários já faziam parte das inquietações de linguistas. 
Segundo Fiad (2011), nos anos 80 já encontramos discussões acerca dessa 
problemática e como podemos observar em trabalhos contemporâneos 
(CASTELLÓ et al, 2012; CORRÊA, 2011; FISCHER, 2011, 2012; FISCHER; 
DIONÍSIO, 2011; RAMIRES, 2007; KOMESU, 2013), apesar dos avanços 
conquistados, o desafio de compreender os problemas dos universitários 
persiste e requer novos estudos que se debrucem sobre as complexidades desse 
processo. 
Com a chegada ao ensino superior, a expectativa inicial é que após 
anos de escolarização formal, os universitários seriam capazes de produzir com 
confiança os gêneros tradicionais da academia (FIAD; SILVA, 2009) tais como 
relatórios, resenhas, relatos, apenas para citar alguns. O evidenciado, na 
realidade, foi um cenário oposto. Apesar de dominarem os processos de leitura 
e escrita em outras práticas letradas, encontraram nas produções acadêmicas 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
26 
 
diversas lacunas6 que enfatizaram a não familiaridade com esses novos gêneros 
(RAMIRES, 2007). 
Apesar de algumas dessas lacunas serem mais claras para quem 
produzia os textos escritos (o aluno que sente a dificuldade ao produzir o 
texto), várias outras se encontravam em uma dimensão imperceptível, que por 
muito tempo era interpretada como senso comum por aqueles já familiarizados 
com o contexto acadêmico e suas práticas institucionais (LILLIS, 1999), como 
é o caso dos professores (CORRÊA, 2011), investidos de autoridade naquele 
contexto. Fazer parte desse senso comum significa dizer que havia um 
conjunto de expectativas permeando determinada produção escrita, e que para 
os professores essas expectativas seriam de conhecimento dos alunos, sendo 
facilmente atendidas ao produzir o texto escrito. No entanto, percebeu-se que 
o processo de escrita era prejudicado pelo fato de que essas expectativas não 
eram explícitas no conhecimento dos alunos durante o processo da escrita, 
como inicialmente suposto. 
Esse descompasso entre o que se espera de um determinado texto e 
como ele realmente se apresenta, foi denominado como prática institucional do 
mistério. Para Lillis (1999), uma prática institucional do mistério atinge ainda uma 
dimensão ideológica, concebendo que o professor/avaliador é investido com 
voz de autoridade e poder pela instituição. E como impacto significativo, ela 
“prejudica aqueles que não estão familiarizados com as convenções que 
cercam a escrita acadêmica, limitando a participação deles no ensino superior 
[...] (LILLIS, 1999, p.127)”. Nessa relação assimétrica, cabe ao aluno desvendar 
quais expectativas seu avaliador ou avaliadora tem sobre a produção escrita que 
é solicitada em sua disciplina. 
Um paliativo mais significativo para lidar inicialmente com esse 
problema veio de uma abordagem prescritiva, em que professores ofereciam 
aos seus alunos listas e diretrizes com orientações de como produzir um texto 
 
6 Lacunas são entendidas, a partir de Lillis (1999), como a distância entre as convenções de professores 
e alunos que regem e organizam as práticas dentro de um contexto, considerando a maneira como elas 
são compreendidas e interpretadas por ambos. Quando essas convenções não são negociadas ou 
esclarecidas propriamente, ou seja, tratadas como pressupostos, as lacunas tendem a ser bastante 
acentuadas. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
27 
 
considerado bom. A crítica a esse paliativo, como bem salienta Lillis (1999) é 
que além das diretrizes ou moldes não serem suficientes, essa abordagem 
tratou das expectativas e convenções com autonomia em relação ao contexto e 
aos sujeitos, e não como parte constitutiva da produção textual na 
universidade. 
Nota-se também, que além das questões de lacunas e expectativas, 
outro aspecto importante ao abordarmos uma prática institucional do mistério é a 
clareza. Mesmo com a insuficiência da abordagem anterior (prescrição), 
percebemos nela a preocupação com a clareza como traço marcante das 
produções textuais. No entanto, entendemos ser necessário compreender que 
a escrita não envolve apenas uma simples relação sujeito e disciplina, mas 
também com gêneros e discursos institucionais mais amplos (LEA; STREET, 
2006). Ser explícito vai além de apenas seguir orientações gerais de uma 
prescrição e implica “aprender como construir significados, através de uma 
gama de convenções inter-relacionadas, resultante do contexto sócio-
discursivo particular da educação superior (LILLIS, 1999, p.131)”, que no caso 
deste artigo é o curso de Letras. 
Outros trabalhos, como o de Street (2009) contribuem para este 
diálogo acerca das convenções e expectativas que permeiam a escrita 
acadêmica. O autor propõe o estudo das dimensões “escondidas”7 que 
compreendem facetas da produção textual que permanecem desconhecidas 
por quem produz o texto e que fazem parte dos critérios elencados pelos 
professores no processo de avaliação. Assim como Lillis (1999), Street (2009, 
2010) ressaltou o poder institucional investido ao professor, destacando 
principalmente como as noções de poder e de autoridade influenciam a escrita 
discente. 
Sua proposta de análise sinaliza seis aspectos da produção escrita para 
o estudo das dimensões “escondidas”: 1) enquadramento (considerando o 
contexto de produção, a disciplina e o público alvo); 2) contribuição (o texto 
produzido em relação aos outros textos e discursos, propósito); 3) voz do 
autor (o sujeito situado e as marcas de sua subjetividade, sua maneira de 
 
7 Outros autores como Corrêa (2011) e Komesu (2013) têm traduzido o termo como aspectos “ocultos”. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
28 
 
interpretar o mundo); 4) ponto de vista (sua argumentação e credibilidade 
desenvolvida no texto, avaliação e tomada de posição); 5)marcas linguísticas 
(organização e construção textual) e 6) estrutura (forma e estrutura concreta do 
texto). Nos últimos anos, pesquisadores brasileiros têm dialogado com as 
dimensões “escondidas” e a prática institucional do mistério para o estudo de 
lacunas e problemas no processo da escrita em relação às convenções não 
explícitas. A seguir vamos retomar esses estudos. 
Em Fischer (2011, 2012) encontramos dois estudos sobre as 
dimensões “escondidas” em relatórios universitários. No primeiro trabalho 
(FISCHER, 2011), a autora examinou essas dimensões em relatórios escritos 
por alunos de um curso de engenharia têxtil e o posicionamento de 
professores e alunos a respeito desse gênero. Dos resultados apresentados, a 
autora salienta a presença de expectativas implícitas acerca do gênero relatório 
e que muitas vezes os alunos recorrem a modelos prontos como diretrizes de 
produção escrita, aspecto corroborado por Castelló et al (2012). Já em Fischer 
(2012) ao combinar o estudo das dimensões “escondidas” e da instrução 
explícita, a autora analisou os relatórios de alunos de um curso de mestrado em 
Engenharia. Dentre os resultados, cabe ressaltar que mesmo com a instrução 
explícita os alunos demonstraram dificuldades ao produzir textos condizentes 
com as expectativas institucionais, ao passo que assim algumas dimensões 
permaneceram ocultas mesmo com transformações. 
Komesu (2013), com base em Corrêa (2011), propôs um diálogo no 
estudo dos aspectos “ocultos” no ensino da escrita universitária com conceitos 
do filósofo da linguagem Mikhail Bakhtin para o estudo das concepções de 
texto de alunos de Pedagogia em curso semipresencial. Seus resultados 
mostraram o forte traço tradicional da instituição, tanto nas atividades e 
procedimento de realização das mesmas, quanto nos alunos que revelam nas 
produções escritas uma concepção tradicional de texto. 
Encontramos também trabalhos voltados para o processo da escrita 
cursos de formação inicial de professores de línguas. Fiad e Miranda (2014) 
analisaram as dimensões “escondidas” e a prática institucional do mistério nas 
vozes de alunos de Letras (questionários) acerca das disciplinas do curso. Os 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
29 
 
resultados corroboraram outras pesquisas como a de Lillis (1999), Street 
(2010), Fischer (2011) e Castelló et al (2012), mostrando que poucos 
professores esclarecem ou fornecem instruções mais detalhadas dos gêneros 
que solicitam para produção escrita, o que favorece para que mais dimensões 
permaneçam ocultas (STREET, 2009). 
Esses trabalhos e seus resultados reiteram nossa discussão nesta 
seção. De maneira geral, atentam para as convenções e expectativas que por 
não serem problematizadas, sistematizadas ou esclarecidas aos alunos como 
parte necessária do processo, fazem parte de uma prática institucional do mistério 
(LILLIS, 1999). Na próxima seção, apresentamos os procedimentos 
metodológicos da pesquisa e em seguida nossa análise de dados. 
 
Procedimentos metodológicos 
Instrumentos de geração de dados 
 
Os dados que aqui apresentamos foram gerados a partir de narrativas 
orais (CZRARNIAWSKA, 2004) registradas em áudio e posteriormente 
transcritas para análise qualitativa8. Essas narrativas foram compartilhadas 
pelas participantes em duas sessões de grupos focais.9Cada grupo focal teve 
uma duração média de 90 a 120 minutos em que as participantes eram 
incentivadas a compartilhar diferentes experiências no curso de formação. O 
foco deste trabalho serão as narrativas das alunas de Letras sobre as 
experiências de produzirem e serem avaliadas na disciplina de língua inglesa a 
partir do gênero diário de leitura. Consideramos a perspectiva das participantes 
para compreender quais lacunas elas percebiam na prática institucional do 
 
8Os critérios de transcrição das narrativas orais seguem algumas convenções metodológicas como a 
demarcação de ações no ato da geração de dados que complementam o contexto interacional. Isso 
inclui, por exemplo, demarcar nas transcrições momentos de riso e outras reações emocionais, pausas e 
interrupções no fluxo narrativo, dentre outras possibilidades. 
9Estes dados fazem parte de um corpus longitudinal disponível em Lima (2017). Processo FAPESP – 
2013/04431-6 com avaliação do comitê de ética CEP-UNESP/IBILCE parecer nº 392.085. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
30 
 
mistério desde a solicitação do trabalho escrito pela professora da disciplina até 
a divulgação da nota numérica obtida. 
Na análise das narrativas tomamos como referência as quatro 
categorias de Connely e Clandinin (1990) para eventos narrativos em contextos 
educacionais. Noções de tempo e espaço são consideradas enquanto cenário e 
roteiro, ou em outras palavras, o ambiente e a estrutura temporal dos eventos 
narrados (neste caso sendo retrospectivo). O outro par de categorias inclui os 
personagens e os eventos. Para este estudo, no entanto, optamos pelo uso do 
termo sujeitos ao invés de personagens, conservando o caráter biográfico 
(histórico) das narrativas. Essas categorias possibilitam a apreensão de 
diferentes eventos compartilhados em um contínuo narrativo. Ao demarcar 
dentro desse contínuo os eventos relacionados ao processo de produzir diários 
de leitura, a análise da narrativa busca nos estudos sobre escrita acadêmica os 
subsídios teóricos para compreensão dos relatos. 
Considerando que os diários de leitura ganham o foco dos relatos das 
alunas de Letras, torna-se necessário também definir sob qual perspectiva esse 
instrumento10 era trabalhado no curso de formação. A orientação teórica para 
o uso dos diários na disciplina de inglês era o ensino de línguas com base em 
gêneros textuais (MACHADO; LOUSADA; ABREU-TARDELLI, 2007; 
MACHADO, 2005; BUZZO, 2010). Nessa perspectiva, os diários são 
pensados para o ensino e a aprendizagem de línguas tendo em vista uma 
otimização do processo de leitura que professores e aprendizes se engajam, ou 
em outras palavras, se voltam para “o desenvolvimento de suas capacidades de 
leitura quanto para a instauração de novos papéis para o professor e para os 
alunos (MACHADO, 2005, p.62)”. 
 
10Na perspectiva dos estudos de gêneros textuais, a noção de instrumento retoma o conceito vigotskiano 
de mediação, que explica o desenvolvimento da consciência humana a partir da relação mediatizada de 
instrumentos. No plano psicológico, Vygotsky considerou a linguagem e o uso de signos como 
transformadores das condições de existência do sujeito sócio-histórico. Os gêneros são considerados 
megainstrumentos, pois além de seu potencial de desenvolvimento das capacidades de leitura e escrita, 
são constituídos de outras ferramentas psicológicas como palavras e conceitos que operam em um todo 
significativo. Para mais detalhes retome Vygotsky (1999). 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
31 
 
Outros autores definem esse gênero enquanto “um texto de cunho 
subjetivo ou íntimo, escrito em primeira pessoa do singular, na medida em que 
se lê um texto indicado ou exposto pelo professor ou pelo próprio aluno, a 
partir de instruções pré-estabelecidas” (BUZZO, 2010, p.16). De maneira 
geral, a ênfase recai no processo dialógico do leitor com o texto (MACHADO, 
2005), que registra suas impressões, dúvidas, inquietações e opiniões, como 
faria semelhantemente se pudesse ter um encontro face a face com o autor. 
Com estes pressupostos teóricos, o trabalho com o gênero diário de leitura foi 
proposto em uma turma no segundo ano de Letras, conforme o perfil que será 
apresentado a seguir. 
 
As professoras em formação e o curso de letras 
 
O estudo contou com a participação de três estudantes, (Amanda, 
Júlia e Sarah11) matriculadas no segundo ano de um curso de Letras com 
habilitação dupla (Português e Inglês) de uma universidade estadualbrasileira 
localizada na região sul do Brasil. Com duração mínima de quatro anos, este 
curso atende alunos de mais de vinte municípios vizinhos do pólo 
universitário. As três estudantes cursaram a disciplina de Língua Inglesa ao 
longo de quatro bimestres, totalizando 144 horas. Nesse curso de licenciatura 
em Letras, as estudantes eram avaliadas na disciplina de inglês por meio de 
pelo menos quatro instrumentos em cada bimestre, tais como avaliação formal 
escrita, exercícios gramaticais, diários de leitura e apresentações orais 
(seminários e contação de histórias). Dentre esses instrumentos avaliativos 
bimestrais, os diários de leitura tinham o menor valor numérico, sendo a 
avaliação formal a de maior valor. Tendo em vista este breve perfil, a análise 
das narrativas será apresentada nas próximas seções. 
 
 
 
11 Esses pseudônimos foram escolhidos para preservar a identidade das participantes, em acordo 
estabelecido no termo de consentimento assinado por elas. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
32 
 
Reconstituição narrativa 
Práticas institucionais do mistério: Expectativas institucionais e lacuna inicial 
A primeira vez que as participantes tiveram contato com um diário de 
leitura foi no primeiro ano da faculdade, no entanto, por não produzirem esse 
gênero frequentemente, poucos detalhes são recordados sobre aquele período. 
No ano seguinte é que as experiências com os diários surgem nas narrativas 
compartilhadas durante o grupo focal. Eles foram selecionados pela professora 
da disciplina como instrumento de avaliação, que exigia dos acadêmicos a 
capacidade de produzir textos em língua estrangeira ao discutir um texto-base. 
A orientação preambular sugeria que os alunos iriam realizar ao 
menos um diário de leitura por bimestre (totalizando quatro) e que os textos-
base seriam artigos com temática sobre o ensino de línguas. Apenas um deles 
envolveria leitura e produção na língua materna. Os demais seriam exigidos em 
inglês. Cada diário receberia uma nota numérica12 e faria parte das avaliações 
formais bimestrais. 
Sem mais instruções detalhadas por parte da professora de língua 
inglesa, as três participantes tinham como diretriz o texto-base, um artigo de 
Machado (2005) em português que apresentava uma definição de diário de 
leitura e discutia em nível teórico sua relevância para a aprendizagem. Dessa 
forma, identificamos como primeira expectativa institucional (representada na 
figura da professora) que as alunas apreendessem do texto, enquanto liam, e 
por elas próprias, aspectos que os seus diários de leitura deveriam apresentar. 
Para ilustrar, podemos indicar as seguintes características: a) opinião pessoal 
acerca do texto, com exposição de ideias pessoais e apresentação de ponto de 
vista com justificativa; b) questionamentos sobre trechos ou informações que 
não foram compreendidas no processo de leitura do texto-base; c) o 
estabelecimento de relações do tema do texto com a experiência de vida do 
leitor e d) observância a respeito de novas informações que o texto traz na 
formação acadêmica. 
 
12Cada diário equivalia uma média de dois pontos (sendo dez a nota máxima de cada bimestre). 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
33 
 
Considerando que essas características não foram problematizadas na 
forma de instruções, ou apresentando um exemplo ou amostra (LILLIS, 1999) 
do tipo de texto a ser produzido, entendemos que essas configuram a primeira 
expectativa institucional do avaliador (não explicitada) sobre os diários a serem 
produzidos, e que caberia às alunas identificarem e seguirem esses passos no 
momento de escrita. O trecho a seguir mostra uma primeira reação de uma das 
participantes. 
 
Excerto 1 
[As alunas comentam sobre o momento em que leram, pela primeira vez, a definição do 
conceito de diário de leitura em um texto teórico] 
JÚLIA: Mas foi o que... no segundo diário de leitura desse ano que a gente foi 
descobrir o que era um diário de leitura. Porque ela deu um diário de leitura 
sobre o que era o diário de leitura. Sabe? 
 
Neste excerto, Júlia explica na sessão de grupo focal que a partir da 
leitura de um texto que definia o gênero diário de leitura, ela acreditava ter 
entendido como seria o texto produzido (da perspectiva da expectativa do 
professor, representante da instituição). Contudo, ao receber as primeiras 
notas, ela e as demais colegas começaram a questionar se realmente haviam 
entendido a proposta, uma vez que não gostaram do resultado. Essa 
insatisfação fez surgir nas alunas a sensação de que o que produziam até então 
não condizia com o que a professora (voz da prática institucional) esperava, já 
que o primeiro parâmetro foi apenas a nota, a qual, na avaliação das alunas, 
não foi boa. A este respeito elas comentam: 
Excerto 2 
[As alunas comentam sobre a experiência de fazer um diário de leitura a partir de um artigo 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
34 
 
teórico cujo tema era introduzir o conceito de diário de leitura] 
JULIA: Era isso que faltava, sabe? [um texto sobre diário de leitura]. E antes 
não, antes a gente fazia um resumo com as nossas palavras de boa. Não tinha 
essa relação, sabe? 
AMANDA: Só que não alterou muito não, porque, chega na hora da avaliação 
era a mesma coisa [de quando elas não sabiam o que era um diário de leitura]. 
JULIA: É, era a mesma coisa. Mas tipo assim, pra gente saber o que era, [até 
que] ajudou. Mas não nos dava muita nota. 
AMANDA: Não dava pra saber se estava muito certo ou não. (...) 
JULIA: Aí esse ano ela passou um artigo sobre o que era o diário de leitura. 
Daí que a gente foi cair a ficha do que era um diário de leitura. 
PESQUISADOR: E era em Português esse diário que ela passou? 
JULIA: Era. 
AMANDA: Esse foi do começo do ano. 
SARAH: Ah, achei que tivesse falando do... 
JULIA: Aí eu ainda comentei com ela: “nossa, esse artigo deveria ser o 
primeiro lá do primeiro ano”, sabe? Porque já que é pra trabalhar o diário de 
leitura, a gente sabe pelo menos o que é né? 
PESQUISADOR: Aham. 
JULIA: Igual, por exemplo, diário de leitura... a gente pegava o texto e fazia 
um resumo com nossas palavras e tal. Isso era o nosso diário de leitura. 
AMANDA: [risos] 
JULIA: Aí [risos], com esse artigo a gente ficou sabendo que o diário de leitura 
era como se a gente pegasse lá um artigo e eu só escrevesse a minha opinião e 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
35 
 
relacionasse a minha opinião com a minha realidade. 
 
 Ao discutir com as colegas, Júlia reformula sua ideia anterior ao 
pensar o que foi apontado neste momento por Amanda, que apesar de 
acreditar ter compreendido o que seria um diário de leitura, viu a nota 
contrariar sua expectativa. A explicação de Júlia sugere que seu texto 
produzido se caracterizava muito mais como um simples resumo. Ainda 
assim, ela demonstra sua preocupação maior em mostrar ao avaliador sua 
capacidade de sintetizar os pontos centrais da obra mostrando domínio 
teórico, evitando assim comprometer sua nota com críticas ou comentários 
pessoais sobre a obra que marcassem sua voz, já que os principais gêneros 
produzidos nos cursos de Letras (resumos, resenhas, dentre outros), conforme 
afirmam Fiad e Silva (2009) focam outros aspectos voltados mais para a 
objetividade de sintetizar e reproduzir ideias. 
De maneira geral, as primeiras experiências com diários de leitura já 
sinalizavam uma lacuna entre o que as alunas efetivamente produziam e o que 
era esperado pela professora da disciplina. Apesar de acreditarem que a partir 
da leitura o conceito tenha ficado mais claro, como vemos na explicação dada 
por Júlia no excerto anterior, ao serem divulgadas as notas, sentiram uma 
surpresa. Esse desencontro de expectativas se revela também na maneira como 
elas caracterizam a experiência de elaborardiários de leitura, em dois 
momentos da discussão: 
Excerto 3 
PESQUISADOR: Como era fazer esses diários de leitura? 
AMANDA: Ai, um trauma. 
JULIA: (gargalhadas). 
PESQUISADOR: Um trauma? 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
36 
 
SARAH: Eu queria sair correndo 
 
Excerto 4 
[Momentos depois da discussão feita no trecho apresentado acima, Amanda explica, em seu 
ponto de vista, porque usou a palavra “trauma”] 
AMANDA: E a gente sabia que não gerava nota, então acabou virando um 
trauma. A gente tinha que fazer sabendo que precisava. E foi um ano em que 
praticamente a sala toda pegou exame. 
 
Amanda preferiu definir sua experiência como trauma, que acabou 
gerando o riso de Júlia e em Sarah revelando o desejo de se manter cada vez 
mais distante da proposta de fazer os diários (a vontade de sair correndo). Apesar 
de outros trabalhos mostrarem que esse desencontro entre o texto produzido e 
o que foi solicitado é comum (FISCHER, 2011; CASTELLÓ et al, 2012), 
encontramos aqui os primeiros traços de uma prática institucional do mistério 
cada vez mais evidente ao longo daquele ano letivo. Esse será o foco da nossa 
próxima seção. 
 
Práticas institucionais do mistério: Expectativas e experiências sobre a 
própria produção escrita 
Após o diário de leitura em língua portuguesa, as participantes 
produziram ainda uma média de três diários para o resto do ano letivo,13 todos 
em inglês. A prescrição permaneceu a mesma, com a diferença que a turma 
questionou a professora sobre um possível feedback das produções individuais, 
uma vez que vários estudantes não estavam satisfeitos com as primeiras notas. 
Relatos nas narrativas apontam um momento em que uma lista geral foi 
 
13 Sarah não fez um dos diários do terceiro bimestre. No quarto bimestre, fez um diário extra. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
37 
 
apresentada, com problemas mais recorrentes (inclusive linguísticos), ainda 
assim, a nota permanecia o principal indicativo de qualidade dos diários 
produzidos. No entanto, como salientado em outros trabalhos, a própria 
instrução explícita (FISCHER, 2012) ou análise de listas com dicas e 
problemas (LILLIS, 1999) acaba não sendo suficiente e não garante os 
verdadeiros benefícios que o feedback tem na escrita do aluno (LEA; STREET, 
2006). Nesta seção, discutiremos outras expectativas no ponto de vista das 
alunas (avaliadas) e como elas se relacionavam ou não com as da professora 
(avaliadora) e das práticas institucionais daquele curso de Letras. 
Em primeiro lugar, as alunas esperavam que os textos-base fossem 
previamente discutidos em sala, ou que, apesar de serem tópicos teóricos sobre 
ensino e aprendizagem, estivessem relacionados com o que vinham 
desenvolvendo na disciplina de língua inglesa. Essa expectativa das alunas está 
relacionada a um dos momentos mais propícios do curso de formação do 
professor de línguas, a construção de seu saber docente ou seu pensamento 
conceitual (LIMA, 2017). A ausência do trabalho de conceitos teóricos 
integrados às atividades práticas de ensino permanece como um dos desafios 
contemporâneos dos cursos de Letras. Entender os saberes produzidos em 
áreas como a Linguística Aplicada pode ser um possível caminho alternativo 
para tratar a problemática da incompatibilidade de teoria e prática, argumento 
frequente entre alunos em cursos de formação inicial (veja LIMA 2017 para 
exemplos no Brasil e KORTHAGEN, 2010 para exemplos no exterior). 
Em diferentes momentos, as alunas em formação enfatizaram ainda 
que o “problema”14 dos diários era a compreensão do texto-base, pois caso 
houvesse uma discussão com o grupo a respeito dos temas desses textos 
(alguns dos quais eram novidades para as participantes), as produções escritas 
 
14O uso de aspas se justifica pelo ponto de vista dos novos estudos de Letramentos, atentando para a 
diversidade e especificidade das diferentes práticas institucionais (LEA; STREET, 2006) e contextos. 
Problemas são entendidos não como falta de competência dos alunos para escrever, mas como o não 
engajamento em uma determinada prática de letramento acadêmico. Dessa forma, concordamos com 
Komesu (2013) ao argumentar que os “erros” podem ser entendidos a partir da noção dos aspectos 
“ocultos” da escrita (cf. STREET, 2009; CORRÊA, 2011) como caminhos a serem desvendados na 
prática. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
38 
 
se aproximariam mais da expectativa institucional, ou seja, do que a avaliadora 
desejava. O excerto a seguir exemplifica a crítica de Amanda: 
Excerto 5 
[A participante explica ao pesquisador sobre a rotina estabelecida entre a solicitação do 
diário, a escrita e a entrega] 
AMANDA: Até porque um texto nunca foi... porque assim, se ela pegasse o 
texto e discutisse em sala pelo menos. 
PESQUISADOR: Não teve as discussões? 
AMANDA: Nunca teve isso. 
 
De acordo com Amanda não houve momentos em que o grupo 
chegava a discutir os textos que seriam o foco dos diários, nem antes nem 
depois de fazê-los. Como salienta Machado (2005), a problematização de 
temas é importante, pois permite ao aluno relacionar seus conhecimentos 
cotidianos com aqueles apresentados no contexto acadêmico. E neste 
momento, Júlia e Sarah não discordaram da colega. Amanda procura 
exemplificar mais adiante como a proposta avaliativa dos diários era feita ao 
seu grupo de alunos de Letras. O excerto a seguir mostra outros detalhes: 
 
Excerto 6 
[O pesquisador pediu que a participante explicasse com suas palavras como eram as 
instruções dadas pela professora] 
AMANDA: Era uma coisa assim, ela falava que estava postando um trabalho 
diferenciado. Porque ela postava no e-mail, mandava a gente fazer o diário e 
entregar. Mas igual a gente falou, nunca foi questionado. Nunca ninguém leu 
aquele texto, nunca ninguém debateu aquele assunto, pra poder produzir um 
texto com a sua opinião. Ou até mesmo poderia aproveitar isso para os testes 
orais. Você falar sobre o que você está [estudando]... Mas não, ela 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
39 
 
simplesmente mandava no e-mail e dava uma data para entregar. 
 
Os trabalhos eram enviados para um e-mail coletivo que o grupo 
mantinha, o qual todos os alunos tinham acesso, ou versões impressas eram 
deixadas na pasta de turma em uma fotocopiadora. Os e-mails, de acordo com 
as alunas, apresentavam breves orientações enfatizando principalmente prazos, 
valores e uso da língua-alvo (inglês). No entanto, as alunas sentiam falta de 
uma conexão entre as produções anteriores e o que poderia ser melhorado 
para as produções futuras do mesmo gênero. Mesmo assim, sem um estímulo 
para continuar produzindo esses textos – já que ao mesmo tempo suas 
expectativas não eram atendidas e não entendiam o que a professora esperava 
dos diários – as alunas relataram que tentavam ao máximo compreender o 
artigo teórico (texto-base), salientando informações mais importantes para 
retomá-las em seus diários, na tentativa de desvendar as expectativas de quem 
avalia e ao mesmo tempo cumprir a tarefa institucional. Os próximos excertos 
detalham essa questão. 
Excerto 7 
PESQUISADOR: Vocês não recebiam os diários de vocês com uma opinião? 
SARAH: Não. 
AMANDA: Não. 
 
Excerto 8 
JULIA: A gente via as notas e o máximo que ela dava era um comentário 
breve. Tinha [comentário] linguístico e textual, os dois [tipos]. Só que a parte 
textual era mais um comentário, não era tanto sobre o gênero, mas o assunto 
[do texto base]. 
 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
40 
 
As três alunas explicam não terem recebido seus diários com 
comentários ou detalhes de onde a produção escrita deixou a desejar, ou o que 
precisariam atentar mais para a produção escrita seguinte. Sem o ponto de vista 
do avaliador, que poderia variar de uma observação escrita até um comentárioinformal, as alunas não percebiam o percurso do próprio desenvolvimento ao 
longo de suas produções. Esse fator está presente em outros trabalhos, 
mostrando que a ausência de feedback é constante. Em Street (2010), vemos nos 
relatos de participantes como alguns aspectos da escrita permanecem 
implícitos nas expectativas do avaliador e ocultos principalmente para os 
alunos. O autor sugere que o desencontro de expectativas entre avaliador e 
avaliado prejudica a produção dos alunos, uma vez que eles não compreendem 
se o que produzem corresponde ao tipo de texto considerado bom para o 
avaliador (maneira de posicionamento e raciocínio do texto, escolhas 
linguísticas e de estrutura do gênero, dentre outros exemplos de dimensões 
escondidas). 
Por fim, as alunas realizavam a tarefa com finalidade exclusiva de 
obter nota, relegando para segundo plano o objetivo principal dos diários, de 
ser um instrumento mediador e propulsor dos processos de leitura e escrita. 
Uma vez que a nota era a única referência que as alunas tinham sobre a 
produção escrita, a qualidade das discussões que elas promoviam, ou o quanto 
aquela atividade poderia ter contribuído para aquisição de vocabulário ou para 
sua formação docente, eram esquecidos. As experiências que prevaleciam eram 
voltadas para um instrumento de aprendizagem que não gerava tantos 
benefícios como elas esperavam. Elas já haviam lido teorias sobre esses 
benefícios, mas ainda esperavam vivenciá-los. Esse aspecto é abordado no 
próximo excerto. 
Excerto 9 
[Sobre as decepções com o gênero, a disciplina e as instruções da professora na disciplina de 
língua inglesa] 
SARAH: E o que me decepciona com os diários de leitura principalmente (...) 
é que a gente nunca vai bem. E a gente nunca sabe onde a gente não foi bem. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
41 
 
AMANDA: Ela não mostra pra gente... 
SARAH: ...porque a gente nunca viu... as correções dela. 
JULIA: As correções dela... ela sempre falou que ia postar e ia postar. 
SARAH: ...ia postar e ia postar e a gente ia atrás. Tipo assim, porque igual em 
Português. A professora corrige e fica lá, né? “Olha, isso aqui você errou. Isso 
aqui você tem que melhorar”. Então não é... 
AMANDA: A gente não sabe... 
SARAH: ...a gente não sabe. Você vai assim meio que... 
JULIA: Essa é a diferença. 
PESQUISADOR: Vocês não sabiam se estavam conseguindo desenvolver o 
que era proposto? 
JULIA: E porque que a gente não conseguia saber... 
AMANDA: ...qual que era o objetivo. 
 
Apesar de não obter um retorno de como estava produzindo o seu 
diário em inglês, Sarah demonstra sua decepção e falta de estímulo com os 
seus diários de leitura, pois geravam a sensação de ser avaliada “às cegas”, ou 
seja, alguma nota era obtida, mas ela pouco sabia como tinha obtido aquilo. 
Apesar do desejo do diálogo através do feedback, percebemos nessa relação 
assimétrica que o avaliador concentra toda negociação para si, caracterizada no 
que Lillis (1999, p.143) chama de relação monológica. A autora explica que a falta 
de negociação implica essencialmente na negação dos alunos no processo de 
escrita do qual eles são sujeitos principais. Por mais que um diário de leitura 
favoreça um diálogo entre sujeito e interlocutor (MACHADO, 2005) a falta de 
um feedback e da possibilidade de recebê-lo resultava em frustração para as 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
42 
 
participantes que tinham pela frente outros diários de leitura. Produzir textos 
nessas condições intensificava ainda mais as “lacunas” encontradas. 
A respeito da ausência de um retorno sobre os textos produzidos, 
Amanda e Sarah concordam com Júlia, reiterando que também não tiveram 
acesso aos diários corrigidos por fatores que também desconheciam. Quando 
questionadas se em algum momento elas sentiam que não estavam 
conseguindo melhorar a qualidade do gênero solicitado pelo fato de não terem 
acesso às correções, Júlia e Amanda complementam a resposta uma da outra, 
afirmando que mesmo elaborando os diferentes diários (visando 
complementar a nota bimestral), elas ainda não entendiam o real propósito de 
fazê-los, já que não os viam posteriormente, acreditando que eles eram usados 
pela professora apenas como mais uma alternativa de complementar as 
atividades avaliativas do bimestre e apenas isso. 
Até aqui, é possível visualizar que o principal motivo para continuar 
investindo na elaboração dos diários era a obtenção de uma nota (de 
preferência, a considerada “boa” da perspectiva delas). Ao serem questionadas 
acerca do motivo pelo qual faziam os diários, elas fazem uma breve pausa 
antes de deliberarem, como pode ser observado no excerto a seguir: 
Excerto 10 
AMANDA: Boa pergunta! 
SARAH: Pra tentar ganhar nota. 
JULIA: (gargalhada). 
SARAH: um fracasso. 
JULIA: Tentava ajudar. 
PESQUISADOR: Mas pra que vocês acham que servia o diário de leitura? 
Assim, não só pra você e pela nota. O que vocês achavam que ela fazia com 
isso? 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
43 
 
SARAH: Eu acho que ela pensava que a gente estava aprendendo muita coisa. 
 
Amanda nos lança a expressão “boa pergunta!” mostrando que ainda 
não iria definir um real motivo. Sarah, por sua vez, ressalta que o motivo de 
continuar produzindo seus diários reflete sua tentativa de ganhar nota e 
acredita que, da expectativa da avaliadora (representante da instituição), algo 
estaria sendo aprendido. Sua resposta gera o riso de Júlia, que complementa a 
ideia da colega de que o esforço visava a tentativa de complementar a nota 
bimestral (advinda dos outros instrumentos avaliativos), mas que segundo 
Sarah acabava sendo um fracasso, ou seja, jamais tiravam uma nota que 
mostrasse terem produzido o texto que a professora considerava “bom”. No 
entanto, ao serem questionadas mais uma vez, Amanda volta a pensar e chega 
a uma conclusão, partilhando com todos no grupo focal: 
Excerto 11 
AMANDA: Pode falar a verdade? 
PESQUISADOR: Pode, claro. 
AMANDA: Eu li [o texto-base] só pra fazer o trabalho. Era assim mesmo, 
aquela coisa justamente para... igual eu estou falando... entregar... 
JULIA: Alguns artigos eram bem longos. Teve uns que tinham 50 páginas. Era 
um monte e era tudo em inglês.15 
SARAH: Esse em inglês eu nem fiz. 
 
Sua resposta confirma mais uma vez a motivação para a elaboração 
dos diários visando a nota em detrimento da possibilidade de desenvolver 
 
15 O artigo que Júlia menciona tinha, na verdade, trinta e duas páginas; Interpretamos esta estimativa 
como uma estratégia de enfatizar o esforço que envolvia a produção do gênero. 
Debates Contemporâneos em Educação 
 
44 
 
tanto sua capacidade de leitura quanto de escrita em inglês, propósito original 
pensado para esse gênero. No entanto, mesmo que as suas produções escritas 
não atendessem ao conjunto de expectativas da instituição e de seus 
avaliadores, Sarah, Amanda e Júlia conseguiam ver todo esse potencial na 
prática. No entanto, eram essas lacunas entre o que se esperava das produções 
e como elas efetivamente se apresentavam que causava a estranheza e o 
descontentamento nessa disciplina. 
Excerto 12 
PESQUISADOR: E os temas discutidos nos diários? Como vocês viam isso? 
SARAH: Porque olha... o assunto era interessante, tipo metodologias do 
ensino de inglês. É uma coisa que a gente vai precisar. Então os conteúdos 
eram interessantes pra nós. Só que a forma como que ela trabalhava com a 
gente. 
JULIA: Não tinha relação. 
SARAH: Não tinha. 
JULIA: Por exemplo, a gente estava vendo, por exemplo, o gênero resumo e 
fazendo diário de leitura sobre como trabalhar uma metodologia de inglês na 
sala de aula, sabe? Ou a importância do diário na sala de aula. Então, não tinha 
assim muita relação. É isso que a gente está falando, não tem sequência. 
 
Sarah reconhecia os temas selecionados para o gênero a ser 
produzido como algo

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