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Karoline Barbosa TUTORIA 2 - M1 - P6 OBJETIVO 1: Conhecer Transtorno Global de Desenvolvimento (TGD), com enfoque no TEA: epidemiologia, etiologia, fisiopatologia, fatores de risco, quadro clínico, diagnóstico + diferencial, conduta (farmacológica - efeitos colaterais e interações medicamentosas e não farmacológicas) Transtorno Global de Desenvolvimento (TGD): Os TGD englobam os diferentes transtornos do espectro autista, as psicoses infantis, a Síndrome de Asperger, a Síndrome de Kanner e a Síndrome de Rett. Com relação à interação social, crianças com TGD apresentam dificuldades em iniciar e manter uma conversa. Epidemiologia TEA: Etiologia + FISIOPATOLOGIA TEA: O TEA tem etiologia genética e multifatorial, sendo causado por uma combinação entre fatores genéticos e ambientais. Os fatores genéticos têm uma importância singular na patogênese de modo que se estima que tal transtorno seja hereditário em 50-90% dos casos sendo que a chance de uma criança com irmão autista também ser afetada é de 10,1% e havendo 2 irmãos previamente com o transtorno essa prevalência chega a 25%. Existem diversos padrões de herança, variantes genéticas causais (comuns ou raras) e defeitos estruturais no genoma relacionadas ao autismo envolvendo quase todos os cromossomos, sendo os principais que têm apresentado alterações ligadas ao TEA são o 7 e 15. Além disso, há associação do autismo com 1 outras síndromes genéticas como a do X-frágil, Prader-Willi e de Angelman. A síndrome do X-frágil é uma anomalia ligada ao cromossomo X que leva a déficit intelectual e transtornos comportamentais, mais comum em homens. Já a síndrome Prader-Willi carac teriza-se por ter parte do cromossomo 15 faltando acarretando em deficiência intelectual, criptorquidia e comportamentos obsessivos-compulsivos. Enquanto que, a síndrome de Angelman causa sintomatologia diversificada possuindo deficiência intelectual, atraso no desenvolvimento global, movimentos anormais, epilepsia, e também características físicas como cabeça pequena com achatamento posterior, boca grande, queixo proeminente, lábio superior fino, dentre outras. Apesar de importantes, tais fatores genéticos não atuam sozinhos uma vez que estes são influenciados por fatores de risco ambientais, tais como: idade parental avançada no momento da concepção, nascimento prematuro, baixo peso ao nascer, infecção materna na gestação por citomegalovírus e rubéola, inflamação materna e ativação autoimune, exposição na gravidez ao ácido valpróico e ao etanol. No entanto, como vimos na aula de Dra. Nathalia, não existe associação entre autismo e a vacina da tríplice viral. Com isso, a epigenética tem estudado as interações entre o material genético e os fatores ambientais no TEA, pois a variabilidade de expressão dos sintomas dentro do espectro não é suficientemente explicada pelas mutações genéticas. Diante de tais alterações etiológicas,muitas delas ainda imprecisas, busca-se entender como as mesmas repercutem no sistema nervoso central (SNC) de uma criança que desenvolve algumas das apresentações do TEA. Numerosos estudos têm incessantemente buscado onde especificamente está a principal alteração ou mecanismo no SNC responsável pelo quadro clínico do autismo com o intuito de desenvolver medicamentos específicos, no entanto, até então não há um consenso sobre o mecanismo devido a dificuldades na investigação in vivo do cérebro humano em desenvolvimento. Porém, já se sabe que o cérebro de uma pessoa com autismo tem falha na comunicação entre os neurônios dificultando o processamento das informações, pois alterações no corpo caloso levam a problemas na conectividade entre os dois hemisférios cerebrais resultando em zonas de muita e pouca conectividade dificultando a coordenação e processamento das informações. Há também prejuízo em neurotransmissores como a serotonina e glutamato. Um dos fatores que contribui para o surgimento de alguns distúrbios no desenvolvimento neurológico no TEA é a interrupção do equilíbrio de sinalização excitatória e inibitória no cérebro no córtex pré-frontal. E, é no córtex pré-frontal que se localiza parte do sistema executivo capaz de planejar, raciocinar e julgar, permitindo também o desenvolvimento da personalidade, emoções e controle dos comportamentos sociais; tais funções, como veremos em seguida, estão prejudicadas em crianças com TEA. A amigdala também sofre alterações no cérebro de uma criança com TEA, pois tal estrutura começa a se desenvolver normalmente e em dado momento deixa crescer com o passar do desenvolvimento da criança repercutindo nas funções ligadas as emoções, medo e na coordenação das respostas entre córtex (sistema hipotalâmico) e tronco encefálico. Outras estruturas como telencéfalo e cerebelo são subdesenvolvidas, interferindo e culminando nos déficits notados no TEA. 2 Até o momento, o que se sabe é que no cérebro de uma criança com TEA há dificuldade na comunicação entre os dois hemisférios cerebrais, bem como uma dificuldade na coordenação e no processamento das informações. Fatores de risco TEA: Os fatores ambientais associados ao autismo são a exposição a toxinas e medicamentos, infecções da mãe durante a gravidez, a idade dos pais e complicações no parto ou no período neonatal. Resultado de estudos: Houve evidência de associação positiva entre autismo e os seguintes fatores de risco: idade materna acima de 35 anos (RR 1.31, IC 95% 1.18-1.45), hipertensão arterial sistêmica crônica materna (OR 1.48, 1.29-1.70), excesso de peso materno antes ou durante a gravidez (RR 1.28, 1.19-1.36), pré-eclâmpsia (RR 1.32, 1.20-1.45) e uso de inibidor seletivo de recaptação da serotonina durante a gestação (OR 1.84, 1.60-2.11). Contudo, quando os dados foram analisados de forma conjunta, somente o “excesso de peso materno antes ou durante a gravidez” e o “uso de inibidor seletivo de recaptação da serotonina na gestação” mantiveram um alto nível de evidência como relacionados ao risco aumentado de TEA. Quadro clínico TEA: O diagnóstico do TEA deve ser o mais precoce possível o que relaciona-se a melhores prognósticos, apesar de em alguns casos já ser possível notar alterações no comportamento precocemente aos 6 meses, os sintomas tornam-se mais perceptíveis entre os 12-18 meses de vida. Apesar disso, grande parte das crianças só chegam a receber o diagnóstico de TEA entre 4-5 anos de vida, o que é ruim, pois o diagnóstico tardio e consequente intervenção atrasada causam prejuízos no desenvolvimento da criança. Um instrumento importante neste acompanhamento, para além dos relatos dados espontaneamente por pais e cuidadores ao longo da consulta de puericultura, é o acompanhamento desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) através da Caderneta de Saúde da Criança. Tal instrumento é visto como o de maior alcance para a vigilância do desenvolvimento na puericultura, podendo ser uma ferramenta a ser utilizada pelo Pediatra para identificar precocemente alguns sinais de alerta. Acerca disto, vale ressaltar que, a típica fala 3 de pais, profissionais da saúde e educadores de que “vamos aguardar o tempo da criança” deve respeitar os limites pré-definidos da idade máxima de aquisição de cada marco do desenvolvimento de acordo com escalas validadas para o DNPM. Um dos fatores que interfere na detecção precoce é essa espera pelo “tempo da criança” quando a mesma apresenta atrasos evidentes, associado a isso outros fatores são: baixa renda familiar, pouco estímulo, pouca observação da criança pelos pais e profissionais e formas clínicas com sintomas menos evidentes. É fundamental que ao longo da consulta de puericultura o médico busque interagir com a criança avaliando também de forma presencial este desenvolvimento como forma de notar precocemente sinais que talvez não tenham sido percebidos pelos pais. Alguns marcadores importantes no primeiro ano de vida chamam atenção para um possível quadro de TEA: anormalidades e/ou atrasos no controle motor, sensibilidade reduzidaa recompensas sociais, afeto negativo e dificuldade no controle da atenção. Com isso, é importante identificar alguns sinais de alerta dentro do 1o ano de vida:A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda, portanto, que toda criança seja triada para autismo entre 18 e 24 meses mesmo que não tenha sinais clínicos de alerta ou atrasos no DNPM. Para isto, a principal escala utilizada para esta triagem é a Modifield Checklist fo Autism in Toddlers (M-CHAT). Este instrumento é validado para triagem e não diagnóstico sendo direcionado para identificar sinais precoces de autismo e não para uma análise global do neurodesenvolvimento. Deve ser aplicado pelo Pediatra durante a consulta de puericultura com o objetivo de detectar o maior número de casos suspeitos de TEA o que pode levar a falsos positivos. Diante disto, uma outra ferramenta foi criada para aumentar a especificidade no diagnóstico de TEA através do M-CHAT- R/F a ser realizada com crianças entre 16 e 30 meses de idade. Ainda assim, com teste triagem positiva algumas crianças não têm diagnóstico de TEA, no entanto, possivelmente as mesmas possuem outros atrasos/transtornos no desenvolvimento que devem ser investigados também o quanto antes. 4 Diagnóstico + Diagnóstico diferencial TEA: O diagnóstico de TEA é dado de acordo com os critérios do DSM-V. Em jovens que não tiveram o diagnóstico dado previamente, ao seguirem para avaliação com médico que o acompanha deve ter esses dados colhidos com base em história pregressa, tentando resgatar junto aos familiares elementos do início do seu desenvolvimento, o que pode ser difícil de garantir devendo ser levada em conta as dificuldades autorrelatadas. Os critérios diagnósticos são: • Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, conforme manifestado pelo que segue, atualmente ou por história prévia; • Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, conforme manifestado por pelo menos dois dos seguintes, atualmente ou por história prévia; • Os sintomas devem estar presentes precocemente no período desenvolvimento; • Os sintomas causam prejuízos clinicamente significativos no funcionamento social; Essas perturbações não são mais bem explicadas por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento. Estudo realizado em 2014 por Huebner e Dunn apontou 6 fatores que caracterizam 6 principais comportamentos observados em crianças com TEA, são eles: 1. Baixa energia/fraqueza parecendo ter músculos fracos; 2. Sensibilidade tátil diversa reagindo agressivamente ao toque, evita andar descalço; 5 3. Sensibilidade gustativa/olfativa que leva a escolha por texturas e sabores específicos de alimentos rejeitando outros diferentes destes; 4. Sensibilidade auditiva/visual de modo que não consegue trabalhar com barulho ao fundo, fica incomodado com luzes e sons; 5. Procura sensorial ficando animado com atividades com movimento, tem dificuldade em prestar atenção; 6. Hiporresponsividade não percebendo quando está sujo ou quando pessoas chamam seu nome. A gravidade da apresentação clínica do paciente pode ser utilizada para uma melhor descrição do quadro clínico, no entanto, não é a gravidade que irá determinar as estratégias de tratamento a serem adotadas isto só pode ser resolvi de forma individual e mediante discussão de prioridades para cada paciente e sua família. NÍVEIS DE GRAVIDADE COMUNICAÇÃO E COMPORTAMENTO Nível 3: “Exigindo apoio muito substancial” Déficits graves na comunicação verbal e não verbal causando prejuízos graves de funcionamento. Inflexibilidade de comportamento, extrema dificuldade para lidar com mudanças ou comportamentos repetitivos/restritos interferem muito no funcionamento. Nível 2: “Exigindo apoio substancial” Prejuízos sociais são aparentes e possuem respostas anormais a abertura social que parte dos outros. Os comportamentos repetitivos/restritos são frequentes e são perceptíveis por observadores casuais, interferindo em alguns contextos. Nível 1: “Exigindo apoio” Na ausência de apoio os déficits causam prejuízos notáveis, parece apresentar interesse reduzido por interações sociais. A inflexibilidade de comportamentos causa interferência no funcionamento em alguns contextos, problemas para organização e planejamento são obstáculos à independência. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL E COMORBIDADES 6 Alguns diagnósticos diferenciais devem ser feitos diante de uma criança com suspeita de TEA. O DSM-V elenca alguns como sendo os principais: • Síndrome de Rett: Comum em meninas, esta síndrome costuma apresentar uma ruptura com a interação social entre 1-4 anos de idade. No entanto, após esse período há uma melhora das habilidades de comunicação social de modo que não se tem mais o protagonismo das características do TEA. • Mutismo seletivo: Neste caso o desenvolvimento precoce não costuma estar comprometido e, mesmo nos contextos em que a criança é muda, a reciprocidade social não está prejudicada e em outros contextos suas habilidades comunicacionais não estão alteradas. Também não há presença de comportamentos restritos ou repetitivos. • Transtornos da linguagem e da comunicação: Em alguns transtornos da linguagem o comportamento social está prejudicado, mas não costuma ocorrer alteração na comunicação não verbal, sequer presença de comportamentos estereotipados. Quando há prejuízo na interação e comunicação social, mas não há presença de comportamentos restritos/repetitivos, o diagnóstico é de transtorno de comunicação social (pragmática) e não de TEA. • Deficiência intelectual sem TEA: Este é um diagnóstico diferencial difícil de fazer, pois muitas vezes crianças com deficiência intelectual acabam por apresentar também movimentos repetitivos/restritos. O diagnóstico de deficiência intelectual é dado quando não há discrepância entre a comunicação social e outras habilidades intelectuais. • Transtorno de déficit de atenção /hiperatividade (TDAH): Este diagnóstico deve ser considerado quando dificuldades atencionais ou hiperatividade excedem o encontrado em indivíduos de idade comparável. Porém, muitos indivíduos com diagnóstico de TEA apresentam associações com outros diagnósticos de transtorno mental comórbidos, como por exemplo, associação com TDAH, ansiedade, depressão, transtorno alimentar restritivo/evitativo. Além disso, pode haver outras condições médicas como: epilepsia, distúrbio do sono, constipação, etc. Conduta farmacológica TEA + efeitos colaterais e interações medicamentosas e não farmacológicas: As classes de medicamentos mais prescritos, em ordem de frequência, são antipsicóticos, seguidos pelos antidepressivos, anticonvulsivantes e estimulantes (ARIMA, 2009; BRENTANI et al., 2013; MANDELL et al., 2008). Entretanto, com fundamentos em amplas revisões, sabe-se que a 7 farmacoterapia não trata propriamente o TEA, mas apenas contribui para o alcance de melhora nas características cen- trais – determinados comportamentos (sintomas-alvo), tais como hiperativi- dade, agressividade, crises epiléticas, insônia, comportamento opositor desa- fiante, autolesivo e estereotipado, entre outros (BRENTANI et al., 2013; EISSAet al., 2018; MANDELL et al., 2008; MASI et al., 2017), qualificando o convívio social desses indivíduos, tais como o familiar, o escolar etc. Embora os medicamentos sejam a tecnologia sanitária mais utilizada no processo de cuidado, especificamente no que se refere à população com TEA, as intervenções farmacológicas não devem ser de uso universal, reservando-se apenas para situações particulares, pois o tratamento de primeira escolha ainda são as intervenções comportamentais psicoterápicas, psicossociais e educacionais, em razão das evidências de obtenção de melhores resultados na aquisição da linguagem, das habilidades sociais e comunicativas e na diminui- ção de comportamentos desviantes quando iniciada precocemente. Portanto,o uso de medicamentos no TEA se dá como terapia adjuvante, no que se refere às intervenções no âmbito da psicologia comportamental, fonoterapia e terapia ocupacional. A inexistência de um tratamento eficaz para o tratamento do autismo, capaz de reverter o quadro, somada à ausência de clareza das diretrizes de manejo do TEA, ao uso concomitante e à carência de intervenções farmacoló- gicas baseadas em evidências além da risperidona e da periciazina, tem torna- do comum a prática de prescrição fora dos limites estabelecidos pela bula pelas autoridades regulatórias. Trata-se do off label, que coopera para elevação do risco de ocorrência de efeitos adversos (EISSA et al., 2018; VOHRA et al., 2016), bem como para um maior dispêndio financeiro por parte dos sistemas de saúde. Logo após o diagnóstico é fundamental comunicar adequadamente à família, oferecendo amparo a mesma e estabelecendo um bom vínculo que seja capaz de repercutir de forma positiva no modo como os familiares irão enfrentar o diagnóstico, encorajando os mesmos a realizar questionamentos e a participar da tomada de decisão quanto ao tratamento. Algumas ferramentas de apoio foram criadas para este momento, como por exemplo o “kit dos 100 primeiros dias” disponível no site www.autismspeaks. org e o site www.autismo.instituto-pensi.org.br onde é possível acessar manuais que auxiliam nos cuidados cotidianos à criança. A intervenção precoce está associada a ganhos significativos no funcionamento cognitivo e adaptativo da criança, aumentando seus potenciais de desenvolvimento, reduzindo danos intelectuais, melhorar a qualidade de vida das mesmas, além de diminuir as angústias da família. Com isso, é possível uma maior capacidade de organização neural através da neuroplasticidade e potencial de mielinização cerebral já que é nos primeiros anos de vida que a formação sináptica possui maior velocidade e resultados satisfatórios. A terapia cognitiva comportamental, por exemplo, como vimos na aula de Dra. Nathalia, tem resultados melhores se iniciada antes dos 3 anos de idade, resultando em melhora da linguagem e função social da criança. Para a melhor abordagem terapêutica deve-se contar com uma equipe interdisciplinar com profissionais da Psicologia, Fonoaudiologia, Terapia Ocupacional, Psicopedagogia, Fisioterapia, Assistência Social e Educação Física. O pediatra deve gerar essa articulação não somente entre os 8 profissionais, mas entre as terapias adotadas. Os pais também devem ser capacitados por estes profissionais para estimular a criança no ambiente domiciliar. A terapia cognitiva comportamental é o cerne do tratamento já que não há medicamentos específicos para o tratamento da TEA. Diversas são os programas terapêuticos disponíveis que visam estimular a criança, promover sua interação e estabelecendo rotinas agregando a participação dos pais, cuidadores e educadores. Um destes é a Análise do Comportamento Aplicada (ABA) que visa promover interações sociais positivas e naturalistas para aumentar a motivação da criança para competências sociais, aprendizagem e desenvolvimento da comunicação receptiva e expressiva das habilidades cognitivas e motoras. O tratamento medicamentoso é direcionado para o tratamento de condições associadas ao TEA (comorbidades) ou controle de comportamentos disruptivos como: irritabilidade, impulsividade, agitação, auto e/ou heteroagressividade e destrutividade. Os antipsicóticos costumam ser utilizados, no entanto, apenas a Risperidona e o Aripipazol são indicados para sintomas relacionados ao TEA. OBJETIVO 2: Compreender TOC: epidemiologia, etiologia, fisiopatologia, fatores de risco, quadro clínico, diagnóstico + diferencial, conduta (farmacológica - efeitos colaterais e interações medicamentosas e não farmacológicas) Compreender TOC: Transtorno obsessivo-compulsivo e transtornos relacionados incluem transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), transtorno dismórfico corporal, transtorno de acumulação, trico- tilomania (transtorno de arrancar o cabelo), transtorno de escoriação (skin-picking), transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno relacionado induzido por substância/medicamento, trans- torno obsessivo-compulsivo e transtorno relacionado devidos a outra condição médica, outro transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno relacionado especificado e transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno relacionado não especificado (p. ex., transtorno de comportamento repetitivo focado no corpo, ciúme obsessivo). Alguns outros transtornos obsessivo-compulsivos e transtornos relacionados também são caracterizados por preocupações e por comportamentos repetitivos ou atos mentais em resposta a preocupações. Outros transtornos obsessivo-compulsivos e transtornos relacionados são caracterizados principalmente por comportamentos repetitivos recorrentes focados no corpo (p. ex., arrancar os cabelos, beliscar a pele) e tentativas repetidas de reduzi-los ou pará-los. 9 Obsessão x Compulsão: O TOC é caracterizado pela presença de obsessões e/ou compulsões. Obsessões são pensamen- tos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que são vivenciados como intrusivos e indese- jados, enquanto compulsões são comportamentos repetitivos ou atos mentais que um indivíduo se sente compelido a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser aplicadas rigidamente. Os indivíduos com esses transtornos podem ter graus variados de consciência do comportamento enquanto o praticam, com alguns exibindo atenção mais focada no comportamento (com a tensão precedendo e alívio posterior), e outros, comportamento mais automático (com os comportamentos parecendo ocorrer sem consciência completa). Além do mais, existem relações íntimas entre os transtornos de ansiedade e alguns dos transtornos obsessivo-compulsivos e transtornos relacionados, p. ex., TOC. Os transtornos obsessivo-compulsivos e transtornos relacionados diferem das preocupações e rituais típicos das diferentes fases de desenvolvimento por serem excessivos e persistirem além dos períodos apropriados ao nível de desenvolvimento. A distinção entre a presença de sintomas subclínicos e um transtorno clínico requer a avaliação de inúmeros fatores, incluindo o nível de sofrimento do indivíduo e o prejuízo no funcionamento. Embora o conteúdo específico das obsessões e compulsões varie entre os indivíduos, certas dimensões dos sintomas são comuns no TOC, incluindo as de limpeza (obsessões por contami- nação e compulsões por limpeza); simetria (obsessões por simetria e compulsões de repetição, organização e contagem); pensamentos proibidos ou tabus (p. ex., obsessões agressivas, sexuais e religiosas e compulsões relacionadas); e ferimentos (p. ex., medo de ferir a si mesmo ou aos outros e compulsões de verificação relacionadas). Tricotilomania: A tricotilomania (transtorno de arrancar o cabelo) é caracterizada pelo comportamento re- corrente de arrancar os próprios cabelos resultando em perda de cabelo e tentativas repetidas de reduzir ou parar de arrancá-los. Os comportamentos repetitivos focados no corpo que caracterizam esses dois transtornos não são desencadeados por obsessões ou preocupações; entretanto, podem ser precedidos ou acompanhados por vários estados emocionais, como sentimentos de ansiedade ou tédio. Diagnóstico TOC: ● Presença de obsessões, compulsões ou ambas: Obsessões são definidas por (1) e (2): 1. Pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que, em algum momento durante a perturbação, são experimentados como intrusivos e indesejados e que, na maioria dos indivíduos, causam acentuada ansiedade ou sofrimento. 2. O indivíduo tenta ignorar ou suprimir tais pensamentos, impulsos ou imagens ou neutralizá -los com algum outro pensamento ou ação. ● As compulsões são definidas por (1) e (2): 1. Comportamentosrepetitivos(p.ex.,lavarasmãos,organizar,verificar)ouatosmentais(p.ex., orar, contar ou repetir palavras em silêncio) que o indivíduose sente compelido a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser rigidamente aplicadas. 2. Os comportamentos ou os atos mentais visam prevenir ou reduzir a ansiedade ou o sofri- 10 mento ou evitar algum evento ou situação temida; entretanto, esses comportamentos ou atos mentais não têm uma conexão realista com o que visam neutralizar ou evitar ou são claramente excessivos. Nota: Crianças pequenas podem não ser capazes de compreender os objetivos desses comportamentos ou atos mentais. ● As obsessões ou compulsões tomam tempo (p. ex., tomam mais de uma hora por dia ou causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. ● Os sintomas obsessivo-compulsivos não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento) ou a outra condição médica. ● A perturbação não é mais bem explicada pelos sintomas de outro transtorno mental (p. ex., preo- cupações excessivas, como no transtorno de ansiedade generalizada; preocupação com a apa- rência, como no transtorno dismórfico corporal; dificuldade de descartar ou se desfazer de perten- ces, como no transtorno de acumulação; arrancar os cabelos, como na tricotilomania [transtorno de arrancar o cabelo]; beliscar a pele, como no transtorno de escoriação [skin-picking]; estereo- tipias, como no transtorno de movimento estereotipado; comportamento alimentar ritualizado, como nos transtornos alimentares; preocupação com substâncias ou jogo, como nos transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos; preocupação com ter uma doença, como no transtorno de ansiedade de doença; impulsos ou fantasias sexuais, como nos transtornos parafí- licos; impulsos, como nos transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da conduta; rumina- ções de culpa, como no transtorno depressivo maior; inserção de pensamento ou preocupações delirantes, como nos transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos; ou padrões repetitivos de comportamento, como no transtorno do espectro autista). Especificar se: Com insight bom ou razoável: O indivíduo reconhece que as crenças do transtorno obsessivo -compulsivo são definitiva ou provavelmente não verdadeiras ou que podem ou não ser verdadeiras. Com insight pobre: O indivíduo acredita que as crenças do transtorno obsessivo-compulsivo são provavelmente verdadeiras. Com insight ausente/crenças delirantes: O indivíduo está completamente convencido de que as crenças do transtorno obsessivo-compulsivo são verdadeiras. Especificar se: Relacionado a tique: O indivíduo tem história atual ou passada de um transtorno de tique. Especificadores Muitos indivíduos com TOC têm crenças disfuncionais. Essas crenças podem incluir senso au- mentado de responsabilidade e tendência a superestimar a ameaça; perfeccionismo e intolerân- cia à incerteza; e importância excessiva dos pensamentos (p. ex., acreditar que ter um pensamen- to proibido é tão ruim 11 quanto executá-lo) e necessidade de controlá-los. Os indivíduos com TOC variam no grau de insight que têm quanto à exatidão das crenças subjacentes aos seus sintomas obsessivo-compulsivos. Muitos têm insight bom ou razoável (p. ex., o indivíduo acredita que a casa definitivamente não irá, provavelmente não irá ou pode ou não incendiar se o fogão não for verificado 30 vezes). Alguns têm insight pobre (p. ex., o indivíduo acredita que a casa provavelmente irá incendiar se o fogão não for verificado 30 vezes), e poucos (menos de 4%) têm insight ausente/crenças delirantes (p. ex., o indivíduo está convencido de que a casa irá incendiar se o fogão não for verificado 30 vezes). O insight pode variar em um indivíduo durante o curso da doença. O insight mais pobre foi vinculado à pior evolução no longo prazo. Até 30% dos indivíduos com TOC têm um transtorno de tique ao longo da vida. Isso é mais comum no sexo masculino com início do TOC na infância. Esses indivíduos tendem a diferir daqueles sem história de transtornos de tique nos temas dos seus sintomas obsessivo-compulsivos, comorbidade, curso e padrão de transmissão familiar. Características Diagnósticas O sintoma característico do TOC é a presença de obsessões e compulsões (Critério A). Obsessões são pensamentos repetitivos e persistentes (p. ex., de contaminação), imagens (p. ex., de cenas violentas ou horrorizantes) ou impulsos (p. ex., apunhalar alguém). É importante observar que as obsessões não são prazerosas ou experimentadas como voluntárias: são intrusivas e indesejadas e causam acentuado sofrimento ou ansiedade na maioria das pessoas. O indivíduo tenta ignorá- -las ou suprimi-las (p. ex., evitando os desencadeantes ou usando a supressão do pensamento) ou neutralizá-las com outro pensamento ou ação (p. ex., executando uma compulsão). Compulsões (ou rituais) são comportamentos repetitivos (p. ex., lavar, verificar) ou atos mentais (p. ex., contar, repetir palavras em silêncio) que o indivíduo se sente compelido a executar em resposta a uma ob- sessão ou de acordo com regras que devem ser aplicadas rigidamente. A maioria das pessoas com TOC tem obsessões e compulsões. As compulsões são geralmente executadas em resposta a uma obsessão (p. ex., pensamentos de contaminação levando a rituais de lavagem ou pensamentos de que alguma coisa está incorreta levando à repetição de rituais até parecer “direita” [just right)]. O objetivo é reduzir o sofrimento desencadeado pelas obsessões ou evitar um evento temido (p. ex., ficar doente). Contudo, essas compulsões não estão conectadas de forma realista ao evento temido (p. ex., organizar itens simetricamente para evitar danos a uma pessoa amada) ou são claramente excessivas (p. ex., tomar banho durante horas todos os dias). As compulsões não são executadas por prazer, embora alguns indivíduos experimentem alívio da ansiedade ou sofrimento. O Critério B enfatiza que as obsessões e compulsões devem tomar tempo (p. ex., mais de uma hora por dia) ou causar sofrimento ou prejuízo clinicamente significativos para justificar um diagnóstico de TOC. Esse critério ajuda a distinguir o transtorno dos pensamentos intrusivos ocasionais ou comportamentos repetitivos que são comuns na população em geral (p. ex., verifi- car duas vezes se a porta está trancada). A frequência e a gravidade das obsessões e compulsões variam entre os indivíduos com TOC (p. ex., alguns têm 12 sintomas leves a moderados, passando 1 a 3 horas por dia com obsessões ou executando compulsões, enquanto outros têm pensamentos intrusivos ou compulsões quase constantes que podem ser incapacitantes). Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O conteúdo específico das obsessões e compulsões varia entre os indivíduos. Entretanto, certos temas, ou dimensões, são comuns, incluindo os de limpeza (obsessões por contaminação e com- pulsões por limpeza); simetria (obsessões por simetria e compulsões por repetição, organização e contagem); pensamentos proibidos ou tabus (p. ex., obsessões agressivas, sexuais ou religiosas e compulsões relacionadas); e danos (p. ex., medo de causar danos a si mesmo ou a outros e compulsões de verificação). Algumas pessoas também têm dificuldades em descartar e acumulam objetos como uma consequência de obsessões e compulsões típicas, como o medo de causar danos a outras pessoas. Esses temas ocorrem em diferentes culturas, são relativamente consistentes ao longo do tempo em adultos com o transtorno e podem estar associados a diferentes substratos neurais. É importante observar que os indivíduos com frequência têm sintomas em mais de uma dimensão. As pessoas com TOC experimentam uma gama de respostas afetivas quando confrontadas com situações que desencadeiam obsessões e compulsões. Por exemplo, muitos indivíduosexperimen- tam ansiedade acentuada que pode incluir ataques de pânico recorrentes. Outros relatam fortes sen- timentos de nojo. Enquanto executam as compulsões, algumas pessoas relatam uma angustiante sensação de “incompletude” ou inquietação até que as coisas pareçam ou soem “direitas” (just right). É comum que indivíduos com o transtorno evitem pessoas, lugares e coisas que desenca- deiam obsessões e compulsões. Por exemplo, indivíduos com preocupações com contaminação podem evitar situações públicas (p. ex., restaurantes, banheiros públicos) para reduzir a exposi- ção aos contaminantes temidos; pessoas com pensamentos intrusivos sobre causar danos podem evitar as interações sociais. EPIDEMIO/Prevalência: A prevalência de 12 meses do TOC nos Estados Unidos é de 1,2%, com uma prevalência similar internacionalmente (1,1 a 1,8%). O sexo feminino é afetado em uma taxa um pouco mais alta do que o masculino na idade adulta, embora este seja mais comumente afetado na infância. Nos Estados Unidos, a idade média de início do TOC é 19,5 anos, e 25% dos casos iniciam-se até os 14 anos de idade. O início após os 35 anos é incomum, mas ocorre. Indivíduos do sexo mascu- lino têm idade mais precoce de início do que os do sexo feminino: cerca de 25% dos homens têm o transtorno antes dos 10 anos. O início dos sintomas é geralmente gradual; entretanto, um início agudo também tem sido relatado. Quando o TOC não é tratado, seu curso é, em geral, crônico, frequentemente com sintomas, tendo aumentos e diminuições de intensidade. Alguns indivíduos têm um curso episódico, e uma minoria tem um curso de deterioração. Sem tratamento, as taxas de remissão em adultos são baixas (p. ex., 20% para aqueles reavaliados 40 anos depois). O início na infância ou na adolescência pode fazer o TOC permanecer durante a vida inteira. No entanto, 40% dos indivíduos com início do transtorno na infância ou na adolescência podem experimentar remissão até o início da idade adulta. O curso do TOC é com frequência complicado pela 13 concomitância de outros transtornos (ver a seção “Comorbidade” para esse transtorno). As compulsões são mais facilmente diagnosticadas em crianças do que as obsessões porque as primeiras são observáveis. No entanto, a maioria das crianças têm obsessões e compulsões (como a maioria dos adultos). O padrão de sintomas em adultos pode ser estável ao longo do tempo, porém é mais variável em crianças. Algumas diferenças no conteúdo das obsessões e compulsões foram relatadas quando amostras de crianças e adolescentes foram comparadas com amostras de adultos. Essas diferenças provavelmente refletem um conteúdo apropriado aos diferentes estágios do desenvolvimento (p. ex., taxas mais altas de obsessões sexuais e religiosas em adolescentes do que em crianças; taxas mais altas de obsessões por danos [p. ex., medo de eventos catastróficos, como doença ou a própria morte ou de pessoas amadas em crianças e adolescentes do que em adultos). Fatores de Risco e Prognóstico - Temperamentais: Mais sintomas internalizantes, afetividade negativa mais alta e inibição do comportamento na infância são possíveis fatores de risco temperamentais. - Ambientais: Abuso físico e sexual na infância e outros eventos estressantes ou traumáticos fo- ram associados a um risco aumentado para o desenvolvimento de TOC. Algumas crianças podem desenvolver o início abrupto de sintomas obsessivo-compulsivos, o que foi associado a diferentes fatores ambientais, incluindo vários agentes infecciosos e uma síndrome autoimune pós-infecciosa. Genéticos e fisiológicos. A taxa de TOC entre parentes de primeiro grau de adultos com o transtorno é aproximadamente duas vezes a de parentes de primeiro grau daqueles sem o transtorno; no entanto, entre os parentes de primeiro grau de indivíduos com início de TOC na infância ou adolescência, a taxa é aumentada em 10 vezes. A transmissão familiar deve-se, em parte, a fatores genéticos (p. ex., uma taxa de concordância de 0,57 para gêmeos monozigóticos vs. 0,22 para gêmeos dizigóticos). Disfunção no córtex orbitofrontal, no córtex cingulado anterior e no estriado tem sido mais fortemente envolvida. Diagnóstico Diferencial Transtornos de ansiedade: Pensamentos recorrentes, comportamentos de esquiva e solicitações repetitivas de tranquilização também podem ocorrer nos transtornos de ansiedade. Entretanto, os pensamentos recorrentes que estão presentes no transtorno de ansiedade generalizada (i.e., preo- cupações) são geralmente relacionados a preocupações 14 da vida real, enquanto as obsessões do TOC não costumam envolver preocupações da vida real e podem incluir conteúdo estranho, irracional ou de natureza aparentemente mágica; além disso, as compulsões frequentemente estão presen- tes e em geral são ligadas às obsessões. Assim como os indivíduos com TOC, aqueles com fobia específica podem ter uma reação de medo a objetos ou situações específicas; no entanto, na fobia específica, o objeto temido está geralmente muito mais circunscrito, e os rituais não estão presentes. No transtorno de ansiedade social (fobia social), os objetos ou situações temidas estão limitados às interações sociais, e a esquiva ou busca de tranquilização é focada na redução desse medo social. Transtorno depressivo maior: O TOC pode ser diferenciado da ruminação do transtorno de- pressivo maior, no qual os pensamentos são geralmente congruentes com o humor e não necessa- riamente experimentados como intrusivos ou angustiantes; além disso, as ruminações não estão ligadas a compulsões, como é típico no TOC. Outros transtornos obsessivo-compulsivos e transtornos relacionados. No transtorno dismórfico corporal, as obsessões e compulsões estão limitadas a preocupações acerca da apa- rência física, e, na tricotilomania (transtorno de arrancar o cabelo), o comportamento compulsivo está limitado a arrancar os cabelos na ausência de obsessões. Os sintomas do transtorno de acu- mulação focam exclusivamente na dificuldade persistente de descartar ou dispor dos pertences, no sofrimento acentuado associado ao descarte de itens e na acumulação excessiva de objetos. No entanto, se um indivíduo tem obsessões típicas de TOC (p. ex., preocupações acerca de incomple- tude ou danos), e essas obsessões conduzem a comportamentos compulsivos de acumulação (p. ex., adquirindo todos os objetos de um conjunto para alcançar uma sensação de completude ou não descartar jornais velhos porque eles podem conter informações que poderiam evitar danos), um diagnóstico de TOC deve ser dado. Transtornos alimentares: O TOC pode ser diferenciado da anorexia nervosa na medida em que no TOC as obsessões e compulsões não estão limitadas a preocupações acerca do peso e dos alimentos. Tiques (no transtorno de tique) e movimentos estereotipados: Um tique é um movimento motor ou vocalização súbito, rápido, recorrente e não rítmico (p. ex., piscar os olhos, pigarrear). Um movimento estereotipado é um comportamento motor repetitivo, aparentemente impulsivo, não funcional (p. ex., bater a cabeça, balançar o corpo, morder a si mesmo). Os tiques e os mo- vimentos estereotipados são geralmente menos complexos do que as compulsões e não visam neutralizar as obsessões. Entretanto, a distinção entre tiques e compulsões complexos pode ser difícil. Enquanto as compulsões costumam ser precedidas por obsessões, os tiques são, com fre- quência, precedidos por impulsos sensoriais premonitórios. Alguns indivíduos têm sintomas de TOC e transtorno de tique, em cujo caso ambos os diagnósticos devem ser indicados. Transtornos psicóticos: Alguns indivíduos com TOC têm insight pobre ou mesmo crenças de TOC delirantes. Contudo, eles têm obsessões e compulsões (distinguindo sua condição do trans- torno delirante) e não têm outras características de esquizofrenia outranstorno esquizoafetivo (p. ex., alucinações ou transtorno do pensamento formal). 15 Outros comportamentos do tipo compulsivo: Certos comportamentos são ocasionalmente descritos como “compulsivos”, incluindo comportamento sexual (no caso das parafilias), jogo (i.e., transtorno do jogo) e uso de substância (p. ex., transtorno por uso de álcool). No entanto, tais comportamentos diferem das compulsões do TOC, pois a pessoa costuma obter prazer com a atividade e pode ter desejo de resistir à sua execução apenas em razão de suas consequências prejudiciais. Transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva: Embora o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva e o TOC tenham nomes semelhantes, suas manifestações clínicas são bem diferentes. O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva não é caracterizado por pensa- mentos intrusivos, imagens ou impulsos ou por comportamentos repetitivos que são executados em resposta a essas intrusões; em vez disso, ele envolve um padrão mal-adaptativo duradouro e disseminado de perfeccionismo excessivo e controle rígido. Se um indivíduo manifesta sintomas de TOC e transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, ambos os diagnósticos podem ser dados. O espectro obsessivo-compulsivo: O conceito de espectro está fundamentado na similaridade do TOC com determinados quadros, considerando a psicopatologia, a idade de início, as comorbidades, o curso clínico, a resposta e tipo de tratamento e, talvez, até a etiologia.10 Várias categorias nosográficas como, por exemplo, transtornos somatoformes, transtornos alimentares, tricotilomania e transtornos do controle dos impulsos têm sido alocadas no espectro.10 Além disso, pensar num continuum entre os transtornos dos movimentos repetitivos, variando dos tiques simples à ideação obsessiva, constitui um modelo eficaz para o avanço do conhecimento fisiopatológico. A seguir, abordaremos apenas a associação entre o TOC e a síndrome de Tourette (ST). Esta associação entre TOC e ST tem sido descrita há vários anos mas, apenas recentemente, tem sido comprovada através de estudos clínicos, genéticos, de neuroimagem e neurofisiológicos. Quanto mais jovem for a amostra, maiores as chances dos pacientes apresentarem tiques. A ST é diagnosticada quando o paciente apresenta múltiplos tiques motores e ao menos um tique vocal, por um período mínimo de um ano no qual os tiques não estiveram ausentes por mais de três meses consecutivos. Pacientes com TOC associado a tiques apresentam mais frequentemente obsessões de agressividade e sexuais, além de compulsões de simetria, ordenação e arranjo, colecionismo e "tic-like". Compulsões "tic-like" são comportamentos semelhantes a tiques complexos, mas precedidos por obsessões. 16 Fisiopatologia: Neuroanatomia e neuroimagem: A fisiopatologia do TOC está relacionada aos gânglios da base, estruturas de localização subcortical profunda representadas pelo estriado (caudado e putâmen), globo pálido, substância negra e núcleo subtalâmico. Estudos de neuroimagem têm demonstrado alterações morfológicas e funcionais nos núcleos caudados.23 Um modelo teórico interessante propõe a existência de uma disfunção na circuitaria fronto-córtico-estriato-tálamo-cortical. De acordo com esse modelo, o núcleo caudado (a porção estriatal da alça) não filtraria adequadamente os impulsos corticais, acarretando uma certa liberação na atividade talâmica, por ausência de inibição das estruturas estriatais. Assim, os impulsos excitatórios originados no tálamo atingiriam o córtex órbito-frontal, criando um "reforço" que impediria o sujeito de retirar do foco de sua atenção certas preocupações que normalmente seriam consideradas irrelevantes.24 O mesmo modelo tem sido proposto para crianças e adolescentes, apesar das possíveis diferenças nas diversas etapas do desenvolvimento ainda não terem sido delineadas. Imuno: A partir da descrição de prevalências aumentadas de SOC e TOC em crianças com coréia de Sydenham, surgiu a proposta de que ao menos um subgrupo de pacientes com TOC estaria relacionado a alterações na resposta imune. Alguns trabalhos chegaram a apontar que entre 10% a 30% das crianças com TOC apresentaram também alterações imunológicas. Foi então proposto o acrônimo PANDAS (Pediatric autoimmune neuropsychiatric disorders associated with streptococcal infections) para uma melhor identificação desses casos.21 Os critérios propostos para esse diagnóstico incluem início abrupto, pré-puberal, seguido de curso com dramáticas exacerbações e remissões, documentada relação com infecção estreptocócica anterior ao início do quadro e presença de alterações motoras, como movimentos coreiformes, em crianças que preencham critérios para TOC ou ST. Desta hipótese nosográfica têm surgido propostas terapêuticas dirigidas à resposta imune que, no entanto, ainda precisam de confirmação. Psicoterapia: O tratamento psicoterápico considerado de primeira escolha para o TOC é a Exposição com Prevenção de Respostas (EPR), uma técnica da terapia comportamental. A EPR consiste na apresentação contínua de estímulos ansiogênicos (situações, objetos ou o próprio pensamento obsessivo) combinada com a prevenção da resposta compulsiva. Quando há um contato prolongado e repetitivo com um estímulo ansiogênico, gradativamente ocorre diminuição da ansiedade diante do mesmo estímulo. Este fenômeno é chamado habituação. A EPR pode incluir também técnicas cognitivas, como a correção de crenças disfuncionais, 17 experimentos comportamentais e reavaliação das probabilidades de risco, abordagem conhecida como cognitivo- comportamental. No entanto, estudos recentes seguem incluindo a EPR como elemento chave do tratamento psicoterápico do TOC. Recomendação No tratamento psicoterápico dos sintomas do TOC, recomenda-se indicar a exposição sistemática e repetida aos estímulos temidos, com prevenção dos rituais compulsivos, terapia comportamental de EPR, de preferência associada à abordagem cognitiva, que consiste na modificação das crenças errôneas subjacentes aos sintomas manifestos. Conduta farmacológica : O tratamento de primeira linha para o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) consiste na farmacoterapia com Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS) e/ou a Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) de exposição e prevenção de resposta. Outros medicamentos que podem ser usados são: a clomipramina, um antidepressivo tricíclico que inibe a recaptação tanto de serotonina quanto de noradrenalina, e a venlafaxina, que apesar de poucas evidências em ensaios randomizados, tem sido utilizada também como segunda linha de tratamento. De maneira geral, o tratamento farmacológico do TOC segue os seguintes passos: 1. Monoterapia com ISRS; 2. Aumento de dose do medicamento em uso; 3. Troca de ISRS por outro ISRS; 4. Troca do ISRS por clomipramina; 5. Associação de clomipramina com ISRS; 6. Potencialização com antipsicóticos; 7. Outras estratégias de potencialização; 8. Neurocirurgia. Pode-se iniciar um ISRS (fluoxetina, fluvoxamina, sertralina, paroxetina, citalopram e escitalopram) em dose baixa e aumentar até doses médias em quatro a cinco semanas, a depender da resposta do paciente. Em caso de resposta favorável, manter a dose e reavaliar em oito a nove semanas. Se em até dois meses o paciente não apresentar resposta ou apresentar resposta parcial ou insignificante, avaliar a possibilidade de troca de ISRS. As doses iniciais e a sugestão de titulação de dosagem podem ser consultadas na Tabela 1. (ver tabelas na aba ao lado) Normalmente, quando se compara ao tratamento de depressão, as doses utilizadas no TOC tendem a ser mais elevadas (duas a três vezes), conforme Tabela 2, e a resposta pode demorar 18 mais de 12 semanas para atingir a eficácia máxima. A duração do tratamento sugerida é de um a dois anos e, em caso de tentativa de retirada da medicação, esta deve ser diminuída lentamente em cerca de 10% a 25% da dose acada um a dois meses. O paciente deve ser encaminhado para o especialista nos seguintes casos: ● caso refratário: ausência de resposta ou resposta parcial a duas estratégias terapêuticas efetivas (psicoterapia e/ou psicofármacos em dose terapêutica e por pelo menos oito semanas); ● caso associado a transtorno por uso de substâncias grave; ● paciente com ideação suicida persistente. Efeitos colaterais mais comuns: Os efeitos colaterais mais comuns da fluoxetina, da sertralina, da paroxetina, da fluvoxamina, citalopram e escitalopram são náuseas, dor abdominal, diarreia, sonolência e, eventualmente, insônia, inquietude, dor de cabeça e suores noturnos. Com frequência, também causam disfunção sexual (diminuição do desejo, dificuldades para atingir o orgasmo, retardo na ejaculação e impotência) e, mais raramente, tremores das mãos. Em 2012 foi emitido um alerta em relação a doses maiores de citalopram e escitalopram no sentido da possibilidade de prolongamento do intervalo QT e complicações cardíacas. Por esses motivos recomenda-se cautela (indicações e benefícios claros) e controle através de eletrocardiograma (para todos os pacientes utilizando mais que 40mg/dia de citalopram ou 20mg/dia de escitalopram; se o paciente tiver mais que 60 anos, em doses acima da 20mg/dia de citalopram, e em pacientes que utilizam inibidores da bomba de prótons juntamente com estes medicamentos) 19. Ao utilizar-se doses máximas dos ISRS é preciso atentar para sintomas de síndrome serotonérgica (letargia, inquietude, sudorese, tremores, confusão mental, podendo evoluir para hipertermia, hipertonicidade, coagulação intravascular e insuficiência vascular). A clomipramina pode provocar tonturas, queda da pressão arterial, boca seca, visão turva, constipação intestinal, sonolência, ganho de peso, retardo na ejaculação, retenção urinária, diminuição da libido e confusão mental. Mais raramente, causa tremores das mãos, suores noturnos e galactorréia (eliminação espontânea de leite). Em doses elevadas, pode provocar convulsões e está contraindicada em pacientes com infarto do miocárdio recente, glaucoma de ângulo fechado, bloqueio de ramo, prostatismo, íleo paralítico e feocromocitoma18. Não deve ser usada em crianças, em obesos e em idosos em função de seu perfil de efeitos colaterais. Diante da indicação de um medicamento ou procedimento médico sempre haverá a necessidade do balanço entre riscos e benefícios, pois todos os fármacos até agora citados possuem algum 19 efeito colateral. A maioria deles costuma diminuir com o tempo, desta forma não há necessidade imediata de sua retirada. Por vezes uma simples redução da dose pode ser suficiente. Administrar os medicamentos à noite (quando não provocam insônia), junto ou após as refeições ou também pode diminuir efeitos colaterais, ao tornar sua absorção mais gradual. Avaliação de resposta: A recomendação é de que a avaliação de resposta a uma conduta medicamentosa no TOC seja feita após 12 semanas de tratamento. Contudo, em 8 a 9 semanas, já se pode ter uma ideia. O paciente deve prestar bem atenção à intensidade dos sintomas durante esse período – se houve ou não diferenças. Se perceber que as obsessões estão menos intensas ou ocupam a mente por menos tempo, se está sentindo menos aflição e consegue resistir melhor a elas e, se em algumas ocasiões, deixa de realizar algum ritual, é porque o tratamento está dando resultado. O fato de ainda apresentar obsessões e rituais depois desse período não significa que o tratamento não deu certo ou que o remédio não funcionou. A mudança não é súbita, mas ocorre aos poucos e, às vezes, depois de longos períodos de uso. O importante é saber se, após esse período de teste, houve alguma diferença, por menor que seja. Nesse caso, em geral, mantém-se a dose que vinha sendo utilizada. Se, no entanto, depois de 8 a 9 semanas, não houver nenhuma diminuição dos sintomas, a situação deve ser discutida, podendo-se solicitar que o paciente aguarde até completar 12 semanas ou, então, aumente a dose, prescrevendo doses máximas (alguns indivíduos só melhoram com as doses máximas), ou o máximo de dose que consegue suportar8. Antecipar o aumento da dose pode significar ganho de tempo, o que é recomendável, principalmente, caso não se tenha obtido praticamente nenhuma redução nos sintomas em dois meses, se os sintomas são muito intensos ou se já houve outros tratamentos farmacológicos sem resultados. Por outro lado, antecipar aumentos de doses pode aumentar a possibilidade de efeitos colaterais que dificultem o uso do fármaco, além de aumentar custos e eventualmente não representar nenhum ganho adicional. Um método mais exato de avaliar se houve ou não diminuição dos sintomas é a aplicação das escalas Y-BOCS ou OCI-R (Formulários 3 e 4). Estas escalas podem ser respondidas antes do inicio do medicamento e, novamente, após um mês ou dois meses. Comparando-se as pontuações pode-se avaliar objetivamente os critérios de resposta, resposta parcial ou não resposta. FALHA NOS TRATAMENTOS DE PRIMEIRA LINHA O entusiasmo com os resultados obtidos nas primeiras pesquisas com o uso da clomipramina e, posteriormente, com os ISRSs deu lugar, na atualidade, a uma visão menos otimista em relação à efetividade dos fármacos no TOC. Na medida que os estudos foram se repetindo, percebeu-se que 20 a eficácia e ‘’resposta ao tratamento’’ não significavam ‘’cura’’ do TOC9,25. Várias alternativas tem sido propostas para a resposta insatisfatória. Resposta ‘’insatisfatória’’ ao uso de fármacos Um dos maiores ‘’inconvenientes’’ dos fármacos é fato de que a redução dos sintomas costuma ser em média 50% na maioria dos casos. Apenas um grupo menor, em torno de 20% dos pacientes, atinge remissão completa com o uso somente de medicação. O que se observa na prática é que muitos pacientes acabam utilizando a medicação em dose adequada, por tempo adequado, preenchendo critérios de resposta (redução da Y-BOCS > 35%) e ainda assim apresentam sintomas graves de TOC que interferem em suas vidas. Diante desta situação as seguintes condutas podem ser adotadas: 1) revisar se a dose do ISRS está na máxima indicada (ou tolerada) e por tempo adequado: se não estiver tentar utilizar as doses máximas recomendadas; 2) trocar de inibidor da recaptação da serotonina (ISRS ou clomipramina): mesmo não respondendo a um primeiro medicamento o paciente pode responder a um outro; 3) pensar nas possibilidades de potencialização (descritas a seguir); 4) ou associar TCC (talvez a principal conduta, também discutida na sequencia do capítulo). Aumento da dose dos Inibidores da Recaptação da Serotonina Caso o paciente não esteja utilizando as doses máximas recomendadas, uma primeira conduta é elevar a dose do medicamento para esses níveis. O aumento da dose dos medicamentos de primeira linha para doses ‘’além da máxima’’ (fluoxetina 120mg/dia, paroxetina 100mg/dia, sertralina 400mg/dia e outras) pode ser uma alternativa. Enquanto alguns guidelines consideram as evidencias para esta conduta embasada em estudos mais ‘’fracos’’ (estudos de caso não controlados, estudos randomizados pequenos), outros consideram que esta pode ser a primeira medida a ser tentada, uma vez que possivelmente já se está em uma dose alta e seria uma conduta ‘’fácil’’ elevá-la um pouco mais7,14. Diante dessa opção há necessidade de especial atenção para possíveis reações adversas, particularmente quando o medicamento é a clomipramina, ou quando se tratar de pacientes idosos. Se o medicamento for citalopram ou escitalopram os cuidados anteriormente referidos quanto ao intervalo QT devem ser observados. Troca por outro medicamento Inibidor da Recaptação da Serotonina Outra estratégia para os pacientes com resposta insatisfatória aos medicamentos de primeira escolha (utilizados por tempo adequadoe em doses adequadas – isto é dose máxima) pode ser a troca por outro fármaco desta mesma linha14. Até 20% dos pacientes que não respondem a um medicamento podem responder a outro. A troca pode ser por outro ISRS ou pela clomipramina (possibilidade de alguma resposta mais efetiva, mas também possibilidade de mais efeitos colaterais)81. Tratamento potencialização com antipsicóticos 21 Os antipsicóticos podem ser utilizados como tratamento de potencialização aos fármacos que atuam na recaptação da serotonina. Em monoterapia não há comprovação de sua eficácia. Uma meta-análise recente (2012) incluiu ensaios clínicos randomizados que avaliaram esta estratégia. Foram revisados 12 estudos com haloperidol (1 estudo), quetiapina (5 estudos), olanzapina (2 estudos) e risperidona (3 estudos)29. Cerca de 1/3 dos pacientes considerados resistentes ao tratamento com ISRS responderam à potencialização com este tipo de fármaco. A risperidona foi considerado a primeira escolha nesta indicação em função do nível de evidência, relação risco-benefício e tolerabilidade. Doses médias seriam preferíveis a doses baixas. Outros medicamentos que podem ser utilizados como adjuvantes no TOC Alguns medicamentos têm sido testados em estudos com menos evidência e apresentado resultados ‘’promissores’’, embora ainda necessitem investigações bem mais consistentes para sua indicação no TOC. Há estudos com a ondansetrona, um antagonista do receptor da serotonina,; com a memantina e o riluzole, antagonistas glutamatérgicos; e com o topiramato. Há relatos mistos a respeito da possibilidade de se utilizar D-cicloserina, um agonista parcial do receptor N-metil-D-aspartato (NMDA), como tratamento adjuvante à TCC, mas o conjunto de resultados ainda faz com que esta conduta deva ser considerada com evidências inconsistente de eficácia35-37. ADIÇÃO DE TCC AOS MEDICAMENTOS A adição de terapia cognitivo-comportamental é um dos primeiros recursos (talvez o mais efetivo e de maior concordância entre diferentes guidelines e protocolos) quando a resposta ao medicamento é insatisfatória. Na verdade, a TCC deve ser adicionada à farmacoterapia sempre que possível desde o início do tratamento. Estudos mais recentes indicam que os resultados são superiores quando os dois métodos terapêuticos são utilizados em conjunto. Portadores de TOC com resposta parcial também apresentam redução na intensidade dos sintomas se for acrescentada TCC à terapia farmacológica em curso. Por todos estes motivos, mais uma vez reforça-se a ideia da importância da TCC no tratamento do TOC. DURAÇÃO DO TRATAMENTO MEDICAMENTOSO É importante lembrar que as recaídas são bastante comuns ao se interromper o medicamento, especialmente nos tratamentos em que ele está sendo utilizado de forma isolada. Com base nesse fato, os especialistas fazem algumas recomendações, a fim de preveni-las. Em princípio, pacientes com transtorno crônico e que apresentaram resposta satisfatória usando apenas medicamentos devem manter o fármaco por, pelo menos, um a dois anos após o desaparecimento dos sintomas. Depois desses períodos, a retirada deve ser gradual, com 25% da dose a menos a cada 2 meses, orientando o paciente para que esteja atento ao reaparecimento dos sintomas. Para pacientes com 3 ou 4 episódios de recaída 22 leve ou moderada, ou 2 a 4 recaídas graves, deve-se pensar na possibilidade de manter o tratamento por períodos maiores ou, talvez por toda a vida. No caso de tratamento de longo prazo, as evidências indicam o uso contínuo da dose efetiva, isto é, doses altas. Os antiobsessivos não causam dependência, o que pode ocorrer é a síndrome de descontinuação se suspensos abruptamente (o que deve ser diferenciado dos sintomas de recaída); a fluoxetina é menos propensa a provocar essa reação. Além disso, não há problemas maiores em utilizá-los por longos períodos. É importante que tanto o médico clínico quanto o médico psiquiatra estejam sempre a par de todos os demais medicamentos que estão sendo utilizados, pois pode haver interações medicamentosas significativas. ALTERNATIVAS DE TRATAMENTO PARA PACIENTES REFRATÁRIOS Neurocirurgia Uma alternativa que tem sido testada em pacientes refratários é a neurocirurgia. Uma vez que existe um circuito neurofisiológico ativado de modo disfuncional no TOC, envolvendo áreas do lobo frontal e gânglios localizados na base do cérebro. Imaginou-se que a secção de fibras nervosas ou de estruturas cerebrais desse circuito, mediante neurocirurgia, pudesse diminuir esta hiperatividade e, consequentemente, os sintomas OC. Várias formas de cirurgia foram testadas, como cingulectomia, capsulotomia e leucotomia límbica, entre outras. As taxas de melhora variam entre os estudos, que referem benefícios para 27 a 100% dos pacientes, com média de redução dos sintomas em torno de 40%42-47. Até agora, não se sabe qual técnica cirúrgica é a mais efetiva. Contudo, este é um tratamento ainda experimental, cujos riscos e benefícios, principalmente a longo prazo, não são bem conhecidos e por esse motivo, é reservado exclusivamente para pacientes refratários. Recentemente, técnicas inovadoras têm sido desenvolvidas, as quais dispensam a abertura do crânio, como a capsulotomia anterior por faca de raios gama48, cuja efetividade entretanto necessita ser comprovada. Acredita-se, ainda, que indivíduos que não responderam à TCC e à farmacoterapia possam se tornar responsivos depois da neurocirurgia. Estimulação elétrica e estimulação magnética Em pacientes que são refratários às modalidades usuais de tratamento (psicofármacos e TCC), e como uma alternativa à neurocirurgia, tem sido utilizada a estimulação cerebral profunda da cápsula interna do núcleo caudado e do nucleus accumbens, com a vantagem de serem procedimentos menos invasivos e reversíveis. São técnicas ainda em estudo, tidas como ‘’promissoras’’ no TOC refratário, mas que também necessitam investigações mais sistemáticas. 23 RESUMO E DESTAQUES ● Os fármacos inibidores da recaptação da serotonina apresentam ação antiobsessiva comprovada; ● Educar o paciente a respeito da indicação do fármaco e discutir vantagens e desvantagens é uma atitude importante e que pode melhorar o resultado desta conduta; ● A maioria dos estudos apresenta como critério de resposta de um fármaco no TOC a redução maior que 35% nos escores iniciais da Y-BOCS; entretanto podem persistir sintomas OC em nível clínico, mesmo tendo havido esse grau de redução; ● Os ISRS são os medicamentos de primeira escolha no TOC (eficácia comparável à clomipramina com menos efeitos colaterais); ● Os medicamentos podem ser aumentados gradualmente até as doses médias recomendadas. Avalia-se o resultado em 8-9 semanas e decide-se mantê-las se houve alguma resposta ou usar doses máximas se não houve nenhuma modificação na intensidade dos sintomas; ● Se efetivo o medicamento, deve ser mantida na dose de resposta por pelo menos 1-2 anos; em pacientes com múltiplos episódios considerar a possibilidade de manter o tratamento para o resto da vida; ● Diante da resposta incompleta ou não resposta a um primeiro ISRS pode-se: 1)elevar as doses do medicamento para as doses máximas recomendadas ou toleradas; 2)trocar por outro ISRS ou pela clomipramina; 3)associar medicamentos antipsicóticos (risperidona como 1a escolha); ● Sempre que possível deve-se associar TCC. *Interações medicamentosas e não-farmacológicas (não encontrado) * 24
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