Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves TRANSTORNO PSICÓTICO O espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos inclui: Esquizofrenia; Outros transtornos psicóticos e transtorno (da personalidade) esquizotípica. Esses transtornos são definidos por anormalidades em 1 ou mais dos 5 domínios a seguir: Delírios; Alucinações; Pensamento (discurso) desorganizado; Comportamento motor grosseiramente desorganizado ou anormal (incluindo catatonia); e Sintomas negativos. CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS QUE DEFINEM OS TRANSTORNOS PSICÓTICOS DELÍRIOS Os delírios são crenças fixas, não passíveis de mudança à luz de evidências conflitantes. Seu conteúdo pode incluir uma variedade de temas: Persecutório, de referência, somático, religioso, de grandeza. 1. Delírios persecutórios (comum): crença de que o indivíduo irá ser prejudicado, assediado, e assim por diante, por outra pessoa, organização ou grupo; 2. Delírios de referência (comum): crença de que alguns gestos, comentários, estímulos ambientais, e assim por diante, são direcionados à própria pessoa; 3. Delírios de grandeza: quando uma pessoa crê que tem habilidades excepcionais, riqueza ou fama; 4. Delírios erotomaníacos: quando o indivíduo crê falsamente que outra pessoa está apaixonada por ele. 5. Delírios niilistas: convicção de que ocorrerá uma grande catástrofe; 6. Delírios somáticos: preocupações referentes à saúde e à função dos órgãos. 7. Delírios bizarros: considerado quando se claramente implausíveis e incompreensíveis por outros indivíduos da mesma cultura, não se originando de experiências comuns da vida. Exemplo: crença de que uma força externa retirou os órgãos internos de uma pessoa, substituindo-os pelos de outra sem deixar feridas ou cicatrizes. Exemplo de delírio não bizarro: acreditar que a pessoa está sob vigilância da polícia, apesar da falta de evidências convincentes. Os delírios que expressam perda de controle da mente ou do corpo costumam ser considerados bizarros; Eles incluem a crença de que: Pensamentos da pessoa foram “removidos” por alguma força externa (retirada de pensamento); Pensamentos estranhos foram colocados na mente (inserção de pensamento); ou O corpo ou as ações do indivíduo estão sendo manipulados por uma força externa (delírios de controle). Distinguir um delírio de uma ideia firmemente defendida é algumas vezes difícil e depende, em parte, do grau de convicção com que a crença é defendida apesar de evidências contraditórias claras ou razoáveis acerca de sua veracidade. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves ALUCINAÇÕES Alucinações são experiências semelhantes à percepção que ocorrem sem um estímulo externo. São vívidas e claras, com toda a força e o impacto das percepções normais, não estando sob controle voluntário. Podem ocorrer em qualquer modalidade sensorial, embora as alucinações auditivas sejam as mais comuns na esquizofrenia e em transtornos relacionados. Alucinações auditivas costumam ser vividas como vozes, familiares ou não, percebidas como diferentes dos próprios pensamentos do indivíduo. As alucinações devem ocorrer no contexto de um sensório sem alterações; Ocorrem ao adormecer (hipnagógicas) ou ao acordar (hipnopômpicas) são consideradas como pertencentes ao âmbito das experiências normais. Em alguns contextos culturais, alucinações podem ser elemento normal de experiências religiosas. DESORGANIZAÇÃO DO PENSAMENTO (DISCURSO) A desorganização do pensamento (transtorno do pensamento formal) costuma ser inferida a partir do discurso do indivíduo. Este pode mudar de um tópico a outro (descarrilamento ou afrouxamento das associações). As respostas a perguntas podem ter uma relação oblíqua ou não ter relação alguma (tangencialidade). Raras vezes, o discurso pode estar tão gravemente desorganizado que é quase incompreensível, lembrando a afasia receptiva em sua desorganização linguística (incoerência ou “salada de palavras”). Uma vez que o discurso levemente desorganizado é comum e inespecífico, o sintoma deve ser suficientemente grave a ponto de prejudicar de forma substancial a comunicação efetiva. A gravidade do prejuízo pode ser de difícil avaliação quando a pessoa que faz o diagnóstico vem de um contexto linguístico diferente daquele de quem está sendo examinado. Pode ocorrer desorganização menos grave do pensamento ou do discurso durante os períodos prodrômicos ou residuais da esquizofrenia. COMPORTAMENTO MOTOR GROSSEIRAMENTE DESORGANIZADO OU ANORMAL (INCLUINDO CATATONIA) Comportamento motor grosseiramente desorganizado ou anormal pode se manifestar de várias formas, desde: O comportamento “tolo e pueril” até a agitação imprevisível. Os problemas podem ser observados em: Qualquer forma de comportamento dirigido a um objetivo, levando a dificuldades na realização das atividades cotidianas. Comportamento catatônico é uma redução acentuada na reatividade ao ambiente. Varia da resistência a instruções (negativismo), passando por manutenção de postura rígida, inapropriada ou bizarra, até a falta total de respostas verbais e motoras (mutismo e estupor). Pode incluir atividade motora sem propósito e excessiva sem causa óbvia (excitação catatônica). Outras características incluem: Movimentos estereotipados repetidos; Olhar fixo; Caretas; Mutismo e eco da fala. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves Ainda que a catatonia seja historicamente associada à esquizofrenia, os sintomas catatônicos são inespecíficos, podendo ocorrer em: Outros transtornos mentais: transtornos bipolar ou depressivo com catatonia; e em Condições médicas: transtorno catatônico devido a outra condição médica. SINTOMAS NEGATIVOS Sintomas negativos respondem por uma porção substancial da morbidade associada à esquizofrenia, embora sejam menos proeminentes em outros transtornos psicóticos. Dois sintomas negativos são especialmente proeminentes na esquizofrenia: Expressão emocional diminuída; e Avolia. 1. Expressão emocional diminuída inclui: Reduções na expressão de emoções pelo rosto, no contato visual, na entonação da fala (prosódia) e nos movimentos das mãos, da cabeça e da face, os quais normalmente conferem ênfase emocional ao discurso. 2. Avolia é uma: Redução em atividades motivadas, autoiniciadas e com uma finalidade. A pessoa pode ficar sentada por períodos longos e mostrar pouco interesse em participar de atividades profissionais ou sociais. Outros sintomas negativos incluem: 3. Alogia: manifestada por produção diminuída do discurso 4. Anedonia: capacidade reduzida de ter prazer resultante de estímulos positivos, ou degradação na lembrança do prazer anteriormente vivido; e 5. Falta de sociabilidade: aparente ausência de interesse em interações sociais, podendo estar associada à avolia, embora possa ser uma manifestação de oportunidades limitadas de interações sociais. DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS Os principais diagnósticos diferenciais dos Transtorno (da Personalidade) Esquizotípica são: Transtorno delirante; Transtorno psicótico breve; Transtorno esquizofreniforme; Esquizofrenia. TRANSTORNO DELIRANTE Delírios são crenças fixas, falsas, que não estão de acordo com a cultura. Eles estão entre os sintomas psiquiátricos mais interessantes devido à grande variedade de crenças falsas que podem ser mantidas por tantas pessoas e porque são difíceis de tratar. O diagnóstico de transtorno delirante é feito quando: Uma pessoa exibe delírios não bizarros de pelo menos1 mês de duração que não podem ser atribuídos a outros transtornos psiquiátricos. A!! Não bizarro significa que o delírio deve ser sobre situações que podem ocorrer na vida real, como ser seguido, infectado, amado a distância, e assim por diante; Ou seja, eles geralmente têm a ver com fenômenos que, mesmo não sendo reais, são possíveis. Vários tipos de delírios podem estar presentes, e o tipo predominante é especificado quando o diagnóstico é feito. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves EPIDEMIOLOGIA Uma avaliação precisa da epidemiologia do transtorno delirante é dificultada por/pela: Relativa raridade; Recentes alterações em sua definição. Além disso, o transtorno pode ser sub-relatado, porque os indivíduos delirantes raramente buscam ajuda psiquiátrica, a não ser que sejam forçados a isso por suas famílias ou por ordens judiciais. Porém a literatura apoia o fato de que essa condição, embora incomum, tem uma taxa bastante estável. A incidência anual é de 1 a 3 novos casos por 100 mil pessoas. A idade média de início é em torno dos 40 anos, mas varia entre os 18 e os 90 anos. Existe leve preponderância de pacientes do sexo feminino. Os homens têm mais probabilidade de desenvolver delírios paranoides do que as mulheres, que tendem mais a desenvolver delírios de erotomania. Muitos pacientes são casados e estão empregados, mas pode haver alguma associação com imigração recente e condição socioeconômica baixa. O subtipo mais frequente é o persecutório. O tipo ciumento é provavelmente mais comum em indivíduos do sexo masculino do que nos do feminino. ETIOLOGIA Como ocorre com todos os transtornos psiquiátricos maiores, a causa do transtorno delirante é desconhecida. Ademais, os pacientes hoje classificados com o transtorno provavelmente apresentem um grupo heterogêneo de condições em que os delírios são o sintoma predominante. O conceito central sobre a causa desse transtorno é: Sua distinção da esquizofrenia e dos transtornos do humor. A!! Ele é muito mais raro do que qualquer um deles, com início mais tardio do que a esquizofrenia e predominância feminina menos pronunciada do que os transtornos do humor. Os dados mais convincentes vêm de estudos de famílias, que relatam prevalência maior de transtorno delirante e traços de personalidade relacionados (p. ex., desconfiança, ciúmes e reserva) nos parentes dos probandos com transtorno delirante. FATORES PSICODINÂMICOS Os médicos têm uma forte impressão clínica de que muitos pacientes com transtorno delirante são: Socialmente isolados e atingiram níveis de realização mais baixos do que o esperado. As teorias psicodinâmicas específicas sobre a causa e a evolução dos sintomas delirantes envolvem suposições a respeito de pessoas hipersensíveis e de mecanismos de defesa do ego, como: Formação reativa, projeção e negação. Legenda: fatores de risco associados com transtorno delirante CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS ESTADO MENTAL DESCRIÇÃO GERAL Os pacientes costumam estar bem arrumados e bem vestidos, sem evidências de desintegração aparente da personalidade ou das atividades MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves diárias, mas podem parecer excêntricos, estranhos, desconfiados ou hostis. Às vezes, são contenciosos e podem deixar essa inclinação clara para o examinador. A característica mais notável é que o: Exame do estado mental mostra que são bastante normais, exceto por um sistema delirante acentuadamente anormal. Eles podem tentar engajar os médicos como aliados em seus delírios, mas estes não devem fingir aceitar os delírios, pois isso confunde ainda mais a realidade e abre caminho para o surgimento da desconfiança entre o paciente e o terapeuta. HUMOR, SENTIMENTOS E AFETO O humor do indivíduo é compatível com o conteúdo de seus delírios. Um paciente com delírio de grandeza é eufórico; Outro com delírios persecutórios é desconfiado. Qualquer que seja a natureza do sistema delirante, o examinador pode perceber algumas características depressivas leves. DISTÚRBIOS PERCEPTUAIS Por definição, pacientes com transtorno delirante não têm alucinações proeminentes ou contínuas. Alguns têm outras experiências alucinatórias – em geral, mais auditivas do que visuais. PENSAMENTO O transtorno do conteúdo do pensamento, na forma de delírios, é o sintoma-chave do transtorno delirante. Os delírios geralmente são: Sistematizados e caracterizados como possíveis: delírios de ser perseguido, de ter um cônjuge infiel, de estar infectado com um vírus ou de ser amado por uma pessoa famosa. A!! Esses exemplos de conteúdo delirante contrastam com o conteúdo delirante bizarro e impossível de alguns indivíduos com esquizofrenia. O sistema delirante em si pode ser complexo ou simples. Os pacientes não apresentam outros sinais de transtorno do pensamento, embora alguns possam ser verborrágicos, circunstanciais ou idiossincrásicos quando falam sobre os delírios. Os médicos não devem pressupor que todos os cenários improváveis sejam delirantes, e a veracidade das crenças deve ser verificada antes de seu conteúdo ser rotulado como delirante. SENSÓRIO E COGNIÇÃO 1. ORIENTAÇÃO: pacientes com transtorno delirante não costumam ter anormalidades na orientação, a menos que tenham um delírio específico sobre uma pessoa, lugar ou tempo. 2. MEMÓRIA: a memória e outros processos cognitivos estão intactos. CONTROLE DOS IMPULSOS Os médicos devem avaliar pacientes com transtorno delirante para a presença de ideação ou planos de agir segundo o material delirante por meio de suicídio, homicídio ou outra violência. Embora a incidência desses comportamentos não seja conhecida, os terapeutas devem perguntar ao paciente sobre esses quesitos. A agressividade destrutiva é mais comum naqueles com história de violência; Se houve sentimentos agressivos no passado, os terapeutas devem investigar como os pacientes lidaram com esses sentimentos. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves A!! Se o indivíduo não puder controlar seus impulsos, é provável que a hospitalização seja necessária. Discutir abertamente como a hospitalização pode ajudar o paciente a obter mais controle sobre seus impulsos ajuda a promover a aliança terapêutica. JULGAMENTO E INSIGHT Pacientes com transtorno delirante praticamente não têm entendimento algum de sua condição e são quase sempre levados ao hospital pela polícia, por membros da família ou por empregadores. O julgamento pode ser mais bem avaliado investigando-se o comportamento passado, presente e planejado do paciente. CONFIABILIDADE Pacientes com transtorno delirante tendem a fornecer informações confiáveis, exceto quando estas contrariam seu sistema delirante. TIPOS O delírio de perseguição é um sintoma clássico do transtorno delirante, e os tipos persecutório e ciumento provavelmente sejam as formas vistas com mais frequência pelos psiquiatras. TIPO PERSECUTÓRIO Os pacientes estão convencidos de que estão sendo perseguidos ou prejudicados. As crenças persecutórias muitas vezes estão associadas com: Rabugice, irritabilidade e raiva e o indivíduo que se deixa levar pela raiva pode às vezes ser agressivo ou mesmo homicida. Outras vezes, esses indivíduos podem se tornar preocupados com litígios formais contra seus supostos perseguidores. Em contraste com os delírios persecutórios da esquizofrenia, a clareza, a lógica e a elaboração sistemática do tema persecutório no transtorno delirante são uma marca notável dessa condição. A ausência de outra psicopatologia, dedeterioração da personalidade ou de déficit na maioria das áreas de funcionamento também contrasta com as manifestações típicas da esquizofrenia. TIPO CIUMENTO O transtorno delirante com delírios de infidelidade foi denominado paranoia conjugal quando limitado ao delírio de que o cônjuge foi infiel. O epônimo síndrome de Otelo foi usado para descrever um ciúme mórbido decorrente de múltiplas preocupações. O delírio em geral afeta os homens, muitas vezes aqueles sem nenhuma história psiquiátrica. Pode aparecer subitamente e serve para explicar uma variedade de eventos presentes e passados envolvendo o comportamento do cônjuge. Essa condição é difícil de tratar e pode diminuir apenas com separação, divórcio ou morte do cônjuge. O ciúme acentuado (ciúme patológico ou mórbido) é um sintoma de muitos transtornos, incluindo: Esquizofrenia (pacientes do sexo feminino apresentam essa característica com maior frequência); Epilepsia; Transtornos do humor; Abuso de drogas e alcoolismo. ...cujo tratamento é direcionado ao transtorno primário. TIPO EROTOMANÍACO Na erotomania, que também tem sido referida como síndrome de Clérambault, o indivíduo tem a convicção delirante de que outra pessoa, em geral de condição social superior, está apaixonada por ele(a). MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves Esses pacientes também tendem a ser: Solitários, retraídos, dependentes e sexualmente inibidos; e a ter níveis baixos de funcionamento social ou ocupacional. Os seguintes critérios operacionais foram sugeridos para o diagnóstico de erotomania: 1. Uma convicção delirante de comunicação amorosa; 2. O objeto de posição muito superior; 3. O objeto sendo o primeiro a se apaixonar; 4. O objeto sendo o primeiro a tomar iniciativas; 5. Início súbito (em um período de 7 dias); 6. O objeto permanece inalterado; 7. O paciente racionaliza o comportamento paradoxal do objeto; 8. Curso crônico; e 9. Ausência de alucinações. Além de ser o sintoma-chave em alguns casos de transtorno delirante, sabe-se que ocorre também na/no: Esquizofrenia, transtorno do humor e em outros transtornos orgânicos. O curso pode ser crônico, recorrente ou breve, e a separação do objeto de amor pode ser a única intervenção satisfatória. TIPO SOMÁTICO O transtorno delirante com delírios somáticos foi chamado de psicose hipocondríaca monossintomática. A condição difere de outros transtornos com sintomas hipocondríacos no grau de comprometimento da realidade. No transtorno delirante, o delírio é fixo, indiscutível e apresentado de forma intensa, pois o paciente está totalmente convencido de sua natureza física. No entanto, pessoas com hipocondria muitas vezes admitem que seu medo da doença é, em grande parte, infundado. O conteúdo do delírio somático pode variar muito de caso para caso. Existem 3 tipos principais: 1. Delírios de infestação (incluindo parasitose); 2. Delírios de dismorfofobia, como deformidade, feiura e tamanho exagerado de partes do corpo (essa categoria parece mais próxima do transtorno dismórfico corporal); e 3. Delírios de odores corporais desagradáveis ou halitose. A!! O 3º, às vezes denominada síndrome de referência olfativa, parece ser um pouco diferente da categoria dos delírios de infestação, uma vez que pacientes com a primeira têm idade de início mais precoce (média de 25 anos), predominância masculina, estado civil solteiro e ausência de tratamento psiquiátrico anterior. Em outros aspectos, os três grupos, embora individualmente baixos em prevalência, parecem se sobrepor. O início dos sintomas com o tipo somático do transtorno delirante pode ser gradual ou súbito. Na maioria dos pacientes, a doença é contínua, ainda que a gravidade do delírio possa variar. Estado de alerta exacerbado e alta ansiedade também caracterizam indivíduos com esse subtipo. Alguns temas se repetem como: Preocupações com infestação, na parasitose delirante; Preocupação com aspectos corporais, com os delírios dismórficos; e Preocupações delirantes com odor do corpo, que às vezes são referidas como bromose. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves TIPO GRANDIOSO O tema central do delírio é a convicção de: Ter algum grande talento ou conhecimento; ou de Ter feito alguma descoberta importante. Menos comum, a pessoa pode ter o delírio de manter uma relação especial com alguém renomado ou de ser uma pessoa famosa (caso em que o indivíduo verdadeiro pode ser visto como impostor). Delírios grandiosos podem ter conteúdo religioso. TIPO MISTO A categoria tipo misto se aplica a pacientes com 2 ou mais temas delirantes. Esse diagnóstico deve ser reservado para casos em que não predomine um único tipo de delírio. TIPO NÃO ESPECIFICADO Essa categoria é reservada para casos em que o delírio predominante não se encaixa nas categorias anteriores. Exemplo: delírios de identificação equivocada, como a síndrome de Capgras. O delírio dessa síndrome é a crença de que uma pessoa familiar foi substituída por um impostor. Outros descreveram variantes da síndrome, especificamente o delírio de que perseguidores ou familiares podem assumir a aparência de estranhos (fenômeno de Frégoli) e o delírio muito raro de que pessoas conhecidas podem se transformar em outras por vontade própria (intermetamorfose). A!! Esses transtornos são raros e podem estar associados com esquizofrenia, demência, epilepsia e outros transtornos orgânicos. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS A. A presença de um delírio (ou mais) com duração de 1 mês ou mais. B. O Critério A para esquizofrenia jamais foi atendido. NOTA: Alucinações, quando presentes, não são proeminentes e têm relação com o tema do delírio: sensação de estar infestado de insetos associada a delírios de infestação. C. Exceto pelo impacto do(s) delírio(s) ou de seus desdobramentos, o funcionamento não está acentuadamente prejudicado, e o comportamento não é claramente bizarro ou esquisito. D. Se episódios maníacos ou depressivos ocorreram, eles foram breves em comparação com a duração dos períodos delirantes. E. A perturbação não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância ou a outra condição médica, não sendo mais bem explicada por outro transtorno mental, como transtorno dismórfico corporal ou transtorno obsessivo- compulsivo. Determinar o suptipo: 1. Tipo erotomaníaco: tema central do delírio é o de que outra pessoa está apaixonada pelo indivíduo. 2. Tipo grandioso: tema central do delírio é a convicção de ter algum grande talento (embora não reconhecido), insight ou ter feito uma descoberta importante. 3. Tipo ciumento: tema central do delírio do indivíduo é o de que o cônjuge ou parceiro é infiel. 4. Tipo persecutório: tema central do delírio envolve a crença de que o próprio indivíduo está sendo vítima de conspiração, enganado, espionado, perseguido, envenenado ou drogado, difamado maliciosamente, assediado ou obstruído na busca de objetivos de longo prazo. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves 5. Tipo somático: tema central do delírio envolve funções ou sensações corporais. 6. Tipo misto: não há um tema delirante predominante. 7. Tipo não especificado: crença delirante dominante não pode ser determinada com clareza ou não está descrita nos tipos específicos: delírios referenciais sem um componente persecutório ou grandioso proeminente. Especificar se: Com conteúdo bizarro: os delírios são considerados bizarros se são claramente implausíveis, incompreensíveis e não originados de experiências comuns davida: a crença de um indivíduo de que um estranho retirou seus órgãos internos, substituindo-os pelos de outro sem deixar feridas ou cicatrizes. Especificar se: Os especificadores de curso a seguir devem ser usados somente após 1 ano de duração do transtorno: 1. Primeiro episódio, atualmente em episódio agudo: Primeira manifestação do transtorno preenchendo os sintomas diagnósticos definidores e o critério de tempo. Um episódio agudo é um período de tempo em que são satisfeitos os critérios de sintomas. 2. Primeiro episódio, atualmente em remissão parcial: Remissão parcial é o período de tempo durante o qual uma melhora após um episódio prévio é mantida e em que os critérios definidores do transtorno estão preenchidos apenas parcialmente. 3. Primeiro episódio, atualmente em remissão completa: Remissão completa é um período de tempo após episódio prévio durante o qual não estão presentes sintomas específicos do transtorno. 4. Episódios múltiplos, atualmente em episódio agudo 5. Episódios múltiplos, atualmente em remissão parcial 6. Episódios múltiplos, atualmente em remissão completa 7. Contínuo: Os sintomas que satisfazem os critérios para o diagnóstico do transtorno persistem durante a maior parte do curso da doença, com períodos de sintomas abaixo do limiar muito breves em relação ao curso geral. 8. Não especificado Especificar a gravidade atual: A gravidade é classificada por uma avaliação quantitativa dos sintomas primários de psicose, o que inclui delírios, alucinações, discurso desorganizado, comportamento psicomotor anormal e sintomas negativos. Cada um desses sintomas pode ser classificado quanto à gravidade atual (mais graves nos últimos 7 dias) em uma escala com 5 pontos, variando de 0 (não presente) a 4 (presente e grave). NOTA: O diagnóstico de transtorno delirante pode ser feito sem a utilização desse especificador de gravidade. DESENVOLVIMENTO E CURSO Em média, a função global é geralmente melhor que a observada na esquizofrenia. Embora o diagnóstico costume ser estável, parte das pessoas evolui para desenvolver esquizofrenia. O transtorno delirante tem uma relação familiar significativa com a esquizofrenia e o transtorno da personalidade esquizotípica. TRATAMENTO O transtorno delirante costumava ser considerado resistente a tratamento, e as intervenções muitas vezes focalizavam o manejo da morbidade do transtorno por meio da redução MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves do impacto do delírio na vida do paciente (e de sua família). Porém, nos últimos anos a perspectiva se tornou menos pessimista ou restrita ao planejamento do tratamento efetivo. Os objetivos do tratamento são: Estabelecer o diagnóstico; Decidir sobre as intervenções adequadas; e Lidar com complicações. Legenda: Diagnóstico e tratamento de transtorno delirante O sucesso dessas metas depende de uma relação médico-paciente efetiva e terapêutica, que está longe de ser fácil de estabelecer. Os indivíduos não se queixam de sintomas psiquiátricos e muitas vezes entram em tratamento contra sua vontade; Até mesmo os psiquiatras podem ser atraídos para suas redes delirantes. PSICOTERAPIA O elemento essencial da psicoterapia eficaz é: Estabelecer um relacionamento que os pacientes confiem no terapeuta. A terapia individual parece ser mais eficaz do que a de grupo; As terapias orientadas ao insight, de apoio, cognitiva e comportamental muitas vezes são eficazes. No início, o terapeuta não deve nem concordar, nem questionar os delírios do paciente, e, embora deva fazer perguntas sobre o conteúdo para estabelecer sua extensão, o questionamento persistente deve ser evitado. O objetivo é ajudar os pacientes a refletir sobre a possibilidade de dúvida quanto a suas percepções Os médicos podem estimular a motivação para receber ajuda, enfatizando a disposição de colaborar com os pacientes ansiosos ou irritados sem sugerir que os delírios sejam tratados, mas sem apoiar ativamente a noção de que sejam reais. HOSPITALIZAÇÃO Indivíduos com transtorno delirante geralmente podem ser tratados como pacientes ambulatoriais, mas os médicos devem considerar a hospitalização por várias razões: 1. Os pacientes podem necessitar de uma avaliação médica e neurológica completa para determinar se uma condição não psiquiátrica está causando os sintomas delirantes. 2. Eles precisam de uma avaliação de sua capacidade de controlar impulsos violentos (p. ex., de cometer suicídio ou homicídio) que possam estar relacionados ao material delirante. 3. O comportamento do paciente em relação aos delírios pode ter afetado significativamente sua capacidade de funcionar no ambiente familiar ou no contexto ocupacional, o que pode requerer intervenção profissional para estabilizar relacionamentos sociais ou ocupacionais. Se um médico estiver convencido de que o paciente receberia o melhor tratamento para seu caso em um hospital, deve tentar convencê-lo a aceitar a hospitalização; Caso não consiga, uma ordem judicial para internação pode ser indicada. MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves Caso o médico convença o paciente de que a hospitalização é inevitável, muitas vezes ele vai para o hospital voluntariamente para evitar a ordem judicial. FARMACOTERAPIA Em uma emergência, indivíduos gravemente agitados devem receber um antipsicótico por via IM. Os pacientes tendem a recusar a medicação porque podem incorporar com facilidade a administração de drogas em seus sistemas delirantes, e os profissionais não devem insistir nela logo após a hospitalização. Os médicos devem explicar os possíveis efeitos adversos aos pacientes, para que mais tarde eles não suspeitem que lhes mentiram. A história de resposta à medicação é o melhor guia para a escolha de um medicamento. Muitas vezes, o médico deve começar com doses baixas (p. ex., 2 mg de haloperidol ou 2 mg de risperidona) e aumentá-las de maneira progressiva. Se não houver resposta a uma dosagem razoável no período de 6 semanas, antipsicóticos de outras classes devem ser tentados - pimozida. Se o paciente não obtiver benefícios com a medicação antipsicótica, seu uso deve ser descontinuado. Em pacientes que respondem, alguns dados indicam que as doses de manutenção podem ser baixas. A!! Uma causa comum de falha do medicamento é a falta de adesão, que também deve ser avaliada. A psicoterapia concomitante facilita esse processo de cooperação com o tratamento medicamentoso. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO E TRANSTORNOS RELACIONADOS Se um indivíduo com transtorno obsessivo- compulsivo está totalmente convencido da veracidade das crenças de seu transtorno, o diagnóstico de transtorno obsessivo-compulsivo, com o especificador com insight ausente/crenças delirantes, deve ser feito, em vez do diagnóstico de transtorno delirante. Da mesma forma, se uma pessoa com transtorno dismórfico corporal está totalmente convencida da veracidade das crenças de seu transtorno, deve ser feito o diagnóstico de transtorno dismórfico corporal, com especificador com insight ausente/crenças delirantes, em vez de transtorno delirante. DELIRIUM, TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO MAIOR, TRANSTORNO PSICÓTICO DEVIDO A OUTRA CONDIÇÃO MÉDICA E TRANSTORNO PSICÓTICO INDUZIDO POR SUBSTÂNCIA/MEDICAMENTO Pessoas com esses transtornos podem apresentar sintomas sugestivos de transtorno delirante. Por exemplo, delírios persecutórios simples, no contexto de transtorno neurocognitivo maior, seriam diagnosticados como transtorno neurocognitivo maior com perturbações comportamentais. Um delírio psicótico induzido por substância/medicamento pode, em uma observação transversal, ter sintomatologia idêntica ao transtorno delirante, mas pode ser diferenciado pela relação cronológica do uso da substância com o aparecimento e a remissão das crenças delirantes. ESQUIZOFRENIA E TRANSTORNO ESQUIZOFRENIFORME Pode-se diferenciar transtorno delirante de esquizofrenia e de transtorno esquizofreniforme MÓDULO PROBLEMAS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO – P2 | Luíza Moura e Vitória Neves pela ausência dos demais sintomas característicos da fase ativa da esquizofrenia. TRANSTORNOS DEPRESSIVO E BIPOLAR E TRANSTORNO ESQUIZOAFETIVO Esses transtornos podem ser diferenciados do transtorno delirante pela relação temporal entre a perturbação do humor e os delírios e pela gravidade dos sintomas de humor. Quando os delírios ocorrem exclusivamente durante os episódios de humor, o diagnóstico é transtorno depressivo ou transtorno bipolar com características psicóticas. Os sintomas de humor que satisfazem todos os critérios de um episódio de humor podem estar sobrepostos ao transtorno delirante. Este só pode ser diagnosticado se a duração de todos os episódios de humor permanece curta em relação à duração total da perturbação delirante.
Compartilhar