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1 TRAUMA RAQUIMEDULAR (TRM) Gizelle Felinto INTRODUÇÃO ➢ Atenção → sempre se deve colocar o colar cervical nesses pacientes ➢ EPIDEMIOLOGIA: • A maioria dos pacientes vítimas de trauma raquimedular são: ▪ Adultos jovens → entre 15 a 40 anos ▪ Sexo masculino (4:1) → na proporção de 4 homens para cada 1 mulher • Localização anatômica: ▪ 55% das lesões → coluna cervical ✓ A mais comum é a lesão de C5 ▪ 15% → coluna torácica ▪ 15% → transição toracolombar ▪ 15% → coluna lombossacra ➢ Segunda lesão → quando um paciente possui uma lesão na coluna, em até 10% dos casos ele terá uma segunda lesão • Assim, quando se detecta uma lesão, deve-se radiografar toda a coluna, e não apenas da região lesada inicialmente encontrada, em busca dessa segunda lesão • Normalmente, essa segunda lesão não é contígua • Exemplo → se ele tem uma lesão cervical, em 10% dos casos ele pode ter uma lesão lombar também ➢ PRINCIPAIS CAUSAS DE TRAUMA RAQUIMEDULAR: • Acidentes automobilísticos (30%) • Quedas de altura (21%) • Ferimento por arma de fogo (12%) • Acidentes esportivos (2%) • Outros (5%) ➢ 5% dos pacientes pioram após chegar à enfermaria → isso se deve à progressão do edema/isquemia ou à manipulação inadequada ➢ Pode-se descartar a lesão em: • Doentes sem déficit neurológico, dor ou hipersensibilidade e sem evidência de intoxicação (Ex: não está alcoolizado) ➢ Realizar Exames de Imagem em pacientes: • Comatosos • Com redução do nível de consciência • Alcoolizados LOCALIZAÇÃO DAS LESÕES ➢ LESÕES CERVICAIS: • São mais comuns em C5 • Lesões cervicais comprometem a respiração do paciente • Lesões acima de C3 → normalmente, são incompatíveis com a vida, pois lesam o nervo frênico e o paciente não consegue respirar • Lesões de C3 a C5 → há comprometimento do diafragma, assim o paciente terá dificuldade ventilatória • Lesões em C6 e C7 e nas primeiras Torácicas → podem comprometer os músculos intercostais, fazendo com que o paciente hipoventile ➢ Atenção → sempre que o paciente tiver lesão nas vértebras cervicais e/ou nas primeiras vértebras torácicas, deve-se avaliar a respiração desse paciente ➢ LESÕES TORÁCICAS: • Lesões nas primeiras vértebras torácicas → podem comprometer os músculos intercostais, fazendo com que o paciente hipoventile ➢ Importante → a medula termina em L1 • Assim, lesões abaixo de L1, normalmente não são tão graves, pois não há risco de lesão medular DERMÁTOMOS ➢ Definição → são regiões em que a sensibilidade da pele está relacionada ao segmento do nervo espinhal ➢ Utiliza-se para determinar o nível da lesão ➢ Localização (as principais utilizadas na urgência para determinar o nível da lesão): • T4 → linha intermamilar • T6 → na linha do processo xifóide • T8 → no rebordo costal • T10 → linha umbilical SEGMENTO DOS NERVOS ESPINHAIS E ÁREAS DE INERVAÇÃO Segmento do nervo espinhal Área de inervação C5 Área sobre o deltoide C6 Dedo polegar C7 Dedo médio C8 Dedo mínimo T4 Mamilo T8 Xifoide T10 Umbigo T12 Sínfise púbica L4 Face medial da perna L5 Espaço entre o primeiro e o segundo pododáctilo S1 Borda lateral do pé S3 Área da tuberosidade isquiática S4 e S5 Região perianal 2 TRAUMA RAQUIMEDULAR (TRM) Gizelle Felinto MIÓTOMOS ➢ Definição → são os músculos relacionados aos níveis da coluna ➢ Relações: • C5 → deltoide • C6 → flexão de antebraço (bíceps) • C7 → extensão do antebraço (tríceps) • C8 → flexor do punho e dedos • T1 → abdutor do dedo mínimo ➢ Esses miótomos apresentam uma GRADUAÇÃO DE FORÇA: GRADUAÇÃO DA FORÇA MUSCULAR Score Achados ao Exame 0 Paralisia total 1 Contração visível ou palpável 2 Movimentação total, desde que eliminada a força da gravidade 3 Movimentação total, contra a força da gravidade 4 Movimentação total, mas com força muscular diminuída 5 Força normal NT Não testável • GRAU 0 → Fraqueza completa/Sem tônus • GRAU 1 → Tônus presente ▪ Contração de repouso (difícil de ser visto na prática) • GRAU 2 → Não vence a gravidade/Rolamento no leito ▪ Paciente que rola o braço no leito, mas não consegue vencer a gravidade • GRAU 3 → Vence a gravidade, mas não sustenta ▪ Paciente levanta o braço, mas logo em seguida o braço cai • GRAU 4 → Sustenta na gravidade, mas não vence a resistência ▪ Paciente levanta o braço e consegue manter, mas quando se aplica uma força sobre esse braço ele perde a força • GRAU 5 → Força normal ➢ Normalmente, na emergência não se utiliza os miótomos, utiliza- se mais os dermátomos AVALIAÇÃO CLÍNICA ➢ Deve-se considerar lesão medular em: • Todo paciente inconsciente ou alcoolizado → deve-se subentender que ele tem lesão medular até que se prove o contrário • Em pacientes conscientes com fraqueza, sinais de entorpecimento, paralisia dos braços, mãos ou pés ➢ Assim, deve-se realizar o exame nesses pacientes em que se suspeita de lesão medular → como a lesão cervical é a mais comum, normalmente se radiografa ou tomografia a região cervical. E depois, se houver lesão na cervical, realiza-se esses exames em toda a coluna ➢ Exame Neurológico criterioso: • Sempre deve ser realizado após a fase de ressuscitação • Reflexos que podem ser testados para avaliar o nível da lesão (em algumas lesões eles estão ausentes): ▪ Reflexo Bulbocavernoso → tração testicular (ou estímulo na glande) ou estimulação clitoriana que faz com que haja uma contração da musculatura anal ✓ Ausência → indica lesão sacral ▪ Reflexo Superficial Anal → passa-se um “cotonete” no ânus do paciente, e tem-se uma contração anal ✓ Ausência → indica lesão sacral ▪ Reflexo Cremastérico → faz-se um estimulo na face medial da coxa do paciente, de baixo para cima, e ocorrerá uma tração testicular ▪ Reflexo de Babinski → faz-se um estímulo no pé do paciente e o pé dele se abre como um leque (extensão do hálux), indicando a lesão do neurônio motor superior ✓ Normalmente, é o que é realizado na emergência para saber se há lesão de neurônio motor superior ➢ Conceitos importantes em relação ao trauma raquimedular: • Choque Medular • Choque Neurogênico → é caracterizado por hipotensão e bradicardia • Choque medular e neurogênico são choques do trauma raquimedular, assim o paciente não apresentará hipovolemia ou qualquer outro sinal parecido decorrente da lesão medular CHOQUE NEUROGÊNICO E CHOQUE MEDULAR ➢ CHOQUE NEUROGÊNICO → Hipotensão + Bradicardia • Definição → lesão das vias descendentes do sistema simpático da medula espinhal cervical ou torácica alta • É raro de ocorrer em lesões abaixo de T6 • Sinais e Sintomas: ▪ Perda do tônus vasomotor → causa tanto uma dilatação periférica quanto visceral. Assim, com essa vasodilatação o paciente ficará: ✓ Hipotenso ▪ Perda da inervação simpática do coração → isso faz com que o corpo não consiga responder a essa hipovolemia com taquicardia. Assim, ele irá apresentar: ✓ Bradicardia ▪ Atenção → esse paciente está em choque, mas não vai apresentar extremidades frias, pois ele não está hipovolêmico e se apresenta com uma dilatação periférica, sendo perfundido normalmente ▪ Não há hipovolemia • Conduta: ▪ Hidratação moderada: ✓ Deve-se ter cuidado na hidratação desses pacientes, pois eles não apresentam hipovolemia 3 TRAUMA RAQUIMEDULAR (TRM) Gizelle Felinto ✓ Assim, eles não irão responder bem a uma hiper- hidratação, podendo até mesmo causar um edema agudo pulmonar ▪ Vasopressores: ✓ Melhoram a contratilidade do vaso ▪ Atropina: ✓ Para a Bradicardia do paciente ➢ CHOQUE MEDULAR: • Definição → perda do tônus muscular e dos reflexos abaixo do nível da lesão • Pode ser um estado transitório CLASSIFICAÇÃO DAS LESÕES MEDULARES ➢ São classificadas de acordo com: • Nível • Gravidadedo déficit neurológico • Tipo de síndrome medular • Morfologia ➢ NÍVEL NEUROLÓGICO: • Definição → segmento mais caudal da medula com funções motoras e sensoriais normais • Classifica-se as lesões como acima e abaixo de T1 → justamente pela gravidade das lesões cervicais, principalmente pelo comprometimento ventilatório • Pode haver discrepância na avaliação do nível ósseo e do nível neurológico • Lesões entre C3 e C5 → lesão do diafragma • Lesões acima de C3 → lesões do nervo frênico ➢ GRAVIDADE DO DÉFICIT NEUROLÓGICO: • Lesão Torácica → déficit dos membros inferiores: ▪ Paraplegia incompleta ▪ Paraplegia completa • Lesão Cervical → déficit dos 4 membros: ▪ Quadriplegia incompleta ▪ Quadriplegia completa • Completa → não se tem nenhuma resposta motora e nem sensitiva abaixo do nível da lesão • Incompleta → a perda de qualquer um dos seguintes determina uma paraplegia ou quadriplegia incompleta: ▪ Reconhecimento de posição ▪ Movimentos voluntários ▪ Preservação sacral ▪ Contração esfincteriana voluntária ▪ Flexão do hálux ➢ SÍNDROMES MEDULARES: • Síndrome Centro-Medular: ▪ Definição → é uma lesão cervical incompleta, sendo caracterizada por uma perda sensorial e de força em membros superiores maior que nos membros inferiores (MMSS > MMII) ▪ Localização → normalmente, ocorre de C4 a C7 ▪ Mecanismo da lesão → paciente com estenose do canal medular que sofre uma hiperextensão ▪ Tratamento: ✓ Imobilização ✓ Anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) ✓ Fisioterapia ▪ Prognóstico → é bom, e os pacientes conseguem uma boa recuperação • Síndrome Medular Anterior: ▪ Definição → é uma lesão incompleta, tendo-se lesão de vias motoras e sensitivas na parte anterior da medula ▪ Paciente apresenta: ✓ Paraplegia com perda bilateral da sensação térmica e dolorosa ▪ O paciente continua com a percepção de vibração, propriocepção, nocicepção e pressão ▪ Prognóstico → é uma lesão que tem um pior prognóstico • Síndrome de Brown-Séquard: ▪ Definição → trata-se de uma hemissecção da medula, decorrente, frequentemente, de um trauma penetrante (ferimento por arma branca) ▪ Caracteriza-se por: ✓ Paralisia espástica ipslateral/homolateral (com manutenção do tônus) e perda da sensibilidade postural e profunda do mesmo lado ✓ Perda contralateral da sensibilidade superficial, térmica e a dor (pode ocorrer em até 1 ou 2 níveis abaixo da lesão) ▪ Costuma ocorrer algum grau de recuperação do paciente ➢ MORFOLOGIA: • Podem ser classificadas em: ▪ Fraturas ▪ Fraturas-Luxações ▪ Lesões medulares sem anormalidades neurológicas ▪ Lesões penetrantes • Podendo ser estáveis ou instáveis, sendo que, geralmente, no trauma sempre se classifica como lesões instáveis até que se prove o contrário TIPOS ESPECÍFICOS DE LESÃO ➢ LUXAÇÃO ATLANTO-OCCIPITAL: • Nível → C1 • Mecanismo da lesão → ocorre por um mecanismo de flexão e tração • 19% dos pacientes apresentam lesão fatal da coluna 4 TRAUMA RAQUIMEDULAR (TRM) Gizelle Felinto • É a lesão característica da Síndrome do bebê sacudido • Sinais e sintomas: ▪ Grave comprometimento respiratório ▪ Lesão neurológica grave • Tratamento → deve-se apenas identificar a lesão e encaminhar para o especialista ➢ LESÕES DO ATLAS: • Nível → C1 • Mecanismo da lesão → ocorrem por sobrecarga axial (alguma força sobre a cabeça do paciente) • São responsáveis por 5% das fraturas cervicais • 40% dos casos de associam a fratura de C2 • A mais comum é a fratura de Jefferson → a fratura causa uma dissociação entre a parte anterior e a posterior de C1 (atlas) com deslocamento lateral • Para identificar essas lesões em C1 e C2 deve-se realizar: ▪ Raio-x transoral ou ▪ Tomografia computadorizada • Tratamento → nessas lesões é preciso apenas identificar, não havendo necessidade de tratamento na urgência, devendo-se encaminhar ao especialista ➢ FRATURA DO AXIS: • Nível → C2 • Correspondem a 18% de todas as fraturas cervicais • 60% acometem o processo odontóide → esse acometimento é quem determina o tipo da fratura em tipo I, tipo II ou tipo III • Deve-se solicitar: ▪ Raio-x Transoral ou ▪ Tomografia Computadorizada • Fratura do Enforcado (Espondilolistese traumática do áxis): ▪ Lesão da parte posterior de C2 (axis) ▪ Mecanismo → hiperextensão e distração, havendo um deslizamento de C2 sobre C3 ➢ FRATURAS E LUXAÇÕES DE C3 A C7: • São fraturas de corpos vertebrais com ou sem luxações • 80% dos casos podem apresentar lesão neurológica • Há comprometimento respiratório, devido ao acometimento da inervação do diafragma e dos músculos intercostais ➢ FRATURAS DE COLUNA TORÁCICA: • A maioria é estável, porém no trauma sempre se considera como sendo instáveis • Podem ser: ▪ Fraturas em Cunha → por explosão de corpo vertebral ▪ Fraturas de Chance → são fraturas horizontais ▪ Fraturas-Luxações ➢ FRATURAS DA TRANSIÇÃO TORACOLOMBAR: • Mecanismo → caracterizam-se por hiperflexão e rotação • São bastante instáveis • Porém, podem não ser tão graves, pois a medula termina em L1, podendo não haver lesão medular AVALIAÇÃO RADIOLÓGICA ➢ Deve-se sempre pensar em lesão medular quando o paciente vítima de trauma apresentar: • Dor local • Sensibilidade a palpação • Déficit neurológico • Alteração do nível de consciência • Suspeita de intoxicação • Traumas significativos ➢ Nesses casos acima, deve-se realizar o exame de imagem para avaliar a presença ou não de lesão ➢ Exames de Imagem: • Raio-x • Tomografia Computadorizada (TC) ➢ O que determina a escolha do exame e qual a região em que ele será realizado: • Onde o paciente está sentindo dor: ▪ Paciente com dor em todo o corpo → realizar exame na coluna cervical ✓ Pois 60% das lesões raquimedulares são cervicais ▪ Se o paciente apresenta alguma lesão no nível da coluna em que ele sente dor → deve-se fazer o exame de imagem de toda a coluna, pois pode-se ter uma lesão secundária em até 10% dos casos • Paciente chega na urgência com o colar cervical → a avaliação médica deve ser feita visando retirar o mais rapidamente a prancha e o colar cervical do paciente. Assim, na avaliação, conversa-se com o paciente e segue-se o seguinte passo a passo: 1. Você está sentindo dor em algum local da coluna? Paciente com Fator de risco que indica necessidade de radiografia? → presença de 1 dos seguintes: - Idade > 65 anos - Mecanismo perigoso do trauma (Ex: colisão, queda de altura, queda de um peso na cabeça do paciente) - Parestesia em extremidades RADIOGRAFIA Paciente com baixo fator de risco? - Ex: colisão em baixa velocidade, paciente sentado na emergência Paciente consegue rotacionar sozinho o pescoço de um lado para o outro em um ângulo de 45°? Não é necessário radiografar SIM SIM SIM NÃO NÃO NÃO 5 TRAUMA RAQUIMEDULAR (TRM) Gizelle Felinto 2. Paciente afirmou que não está sentindo dor → retira- se o colar cervical e realiza-se a palpação 3. Paciente não referiu dor à palpação → pedir para que o paciente tente virar o pescoço de um lado para o outro, sozinho 4. Paciente conseguiu virar o pescoço → pode-se retirar o colar cervical ▪ Atenção → se o paciente referir dor na etapa 1, 2 ou 3 ou se ele não conseguir virar o pescoço, deve-se recolocar o colar cervical e encaminhar o paciente para a avaliação radiológica, por meio do raio-x ou da tomografia ➢ RESSONÂNCIA MAGNÉTICA: • Quando solicitar → nos seguintes casos: ▪ Raio-x normal e paciente continua com dor ▪ Presença de déficit neurológico → para detectar lesões compressivas (Ex: herniações ou hematomas) e/ou contusões da medula espinhal • É um exame demorado, levando 30 minutosapenas para a cervical e cerca de 1 hora se for da coluna toda → assim, na emergência a ressonância não é um exame padrão-ouro, pois é muito demorado • Se o paciente estiver hemodinamicamente instável → não se pode entrar na sala de ressonância com o suporte necessário para esse paciente CONDUTA TERAPÊUTICA ➢ IMOBILIZAÇÃO → medidas: • Deve ser feita desde acima até abaixo do local suspeito de estar lesionado • Manter o paciente em posição neutra • Não tentar corrigir deformações • Evitar a extensão e flexão do pescoço • Usar sedativos e bloqueadores neuromusculares • Remover a prancha rígida ➢ FLUIDOS ENDOVENOSOS: • Deve-se ter bastante cuidado nos casos de choque neurogênico (hipotensão + bradicardia) → a hiper- hidratação desses pacientes pode causar um edema agudo de pulmão • Drogas Vasoativas ➢ MEDICAMENTOS: • As evidências são insuficientes para sustentar o uso de Esteroides ➢ Informações e Medidas importantes: • Deve-se encaminhar o paciente para centros de referência • Sempre se deve avaliar a ventilação desses pacientes, principalmente quando eles apresentam lesões cervicais ou torácicas altas • Colar cervical → deve ser colocado mesmo que o paciente não tenha sido admitido com ele
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