Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Considerações iniciais A principal inspiração do Código de Defesa do Consumidor é a Resolução 39/248 da ONU, de 1985, que apresenta os direitos básicos dos consumidores, trazendo diretrizes para a cooperação jurídica internacional em matéria de direito do consumidor. O art. 6º do CDC traz os direitos básicos do consumidor, em um rol exemplificativo, assim não há o exaurimento de tais direitos. Art. 6º São direitos básicos do consumidor: I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos; II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; IX - (Vetado); X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) XIII - a informação acerca dos preços dos produtos por unidade de medida, tal como por quilo, por litro, por metro ou por outra unidade, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento. (Incluído pela Lei nº 13.146, de 2015) Atenção! O art. 6º do CDC elenca, em seus incisos, uma lista de direitos básicos do consumidor. A Lei nº 14.181/2021 acrescentou três novos direitos ao rol. Antes de analisarmos as espécies de direitos básicos dos consumidores, importante destacar a cláusula de abertura do microssistema, prevista no art. 7º do CDC, segundo a qual para além dos direitos previstos no CDC, todo direito do consumidor, que esteja expresso em outra espécie normativa vai ser inserido no sistema consumerista. Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Direito à vida, à saúde e à segurança (I) Proteção à vida, saúde e segurança são direitos que nascem atrelados ao princípio maior da dignidade, uma vez que a dignidade da pessoa humana pressupõe um piso vital mínimo. O CDC repete o princípio no art. 4º, caput, para assegurar expressamente a sadia qualidade de vida com saúde do consumidor e sua segurança, no inciso I do art. 6º. Direitos básicos do consumidor Percebe-se então, que, consequentemente, a regra do caput do art. 4º descreve um quadro amplo de asseguramento de condições morais e materiais para o consumidor. Quando se refere à melhoria de qualidade de vida, está apontando não só o conforto material, resultado do direito de aquisição de produtos e serviços, especialmente os essenciais (serviços públicos de transporte, água e eletricidade, gás, os medicamentos e mesmo imóveis etc.), mas também o desfrute de prazeres ligados ao lazer (garantido no texto constitucional — art. 6º, caput) e ao bem-estar moral ou psicológico. Direito à educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos ou serviços. Liberdade de escolha (II) O inciso II do art. 6º prevê o direito do consumidor de receber educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços colocados à sua disposição no mercado. Segundo José Geraldo Brito Filomeno, essa educação deve ser encarada sob dois aspectos: i) a educação formal, que deverá ser dada nas escolas; e, ii) a educação informal, de responsabilidade dos fornecedores, a respeito das características dos produtos ou serviços que são lançados no mercado. Além disso, é direito do consumidor ver assegurada a sua liberdade de escolha e a igualdade nas contratações. Essa igualdade – ainda na visão de José Geraldo Brito Filomeno – obriga o fornecedor a informar o consumidor previamente sobre as condições contratuais, evitando-se que seja surpreendido por alguma cláusula abusiva. A necessidade de proteção da liberdade de escolha do consumidor, parte mais fraca da relação de consumo, leva a impor novos riscos profissionais aos fornecedores, que não poderão ser transferidos aos consumidores por nenhuma manifestação válida da vontade, a redefinir o abuso. Sobre o tema, o STJ veda a venda casada realizada por fornecedores, uma vez que retira do consumidor a liberdade de escolha do produto ou serviço que pretende adquirir: 1. A venda casada ocorre em virtude do condicionamento a uma única escolha, a apenas uma alternativa, já que não é conferido ao consumidor usufruir de outro produto senão aquele alienado pelo fornecedor. 2. Ao compelir o consumidor a comprar dentro do próprio cinema todo e qualquer produto alimentício, o estabelecimento dissimula uma venda casada (art. 39, I, do CDC), limitando a liberdade de escolha do consumidor (art. 6º, II, do CDC), o que revela prática abusiva. Não se deve, entretanto, ver venda casada na oferta conjunta, muito comum no mercado, de vários produtos iguais ou complementares, como forma de marketing capaz de oferecer preços promocionais. Desde que, é óbvio, não se tolha ao consumidor a opção pela compra apenas do produto que livremente escolher. Direito à informação adequada e clara sobre os produtos e serviços (III) O dever de informar é princípio fundamental na Lei n. 8.078, aparecendo inicialmente no inciso III do art. 6º, e, junto ao princípio da transparência estampado no caput do art. 4º, traz uma nova formatação aos produtos e serviços oferecidos no mercado. Com efeito, na sistemática implantada pelo CDC, o fornecedor está obrigado a prestar todas as informações acerca do produto e do serviço, suas características, qualidades, riscos, preços etc., de maneira clara e precisa, não se admitindo falhas ou omissões. Trata-se de um dever exigido mesmo antes do início de qualquer relação. A informação passou a ser componente necessário do produto e do serviço, que não podem ser oferecidos no mercado sem ela. O princípio da transparênciaestá já previsto no caput do art. 4º, e traduz a obrigação de o fornecedor dar ao consumidor a oportunidade de tomar conhecimento do conteúdo do contrato que está sendo apresentado. Assim, da soma dos princípios, compostos de dois deveres — o da transparência e o da informação —, fica estabelecida a obrigação de o fornecedor dar cabal informação sobre seus produtos e serviços oferecidos e colocados no mercado, bem como das cláusulas contratuais por ele estipuladas. Com a entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência (na data de 3 de janeiro de 2016, Lei n. 13.146, de 6-8-2015), o artigo 6º do CDC ganhou um parágrafo único, assim disposto: “Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caput deste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento.” Como é possível ver do final da proposição, a regra depende de regulamentação para ter vigência. Ao que consta, o objetivo da norma é obrigar os fornecedores a oferecerem informações cabais também ao consumidor com deficiência. Direito à proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, bem como contra práticas abusivas (IV) O inciso IV do art. 6º do CDC, protege o consumidor “contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços”. Essa proteção é tratada, especificamente, pelo art. 30, do CDC, quando atribui à oferta o caráter vinculativo. Vale dizer, tudo que se diga a respeito de um determinado produto ou serviço deverá corresponder exatamente à expectativa despertada no público consumidor, sob pena de responsabilidade. A publicidade enganosa é aquela suscetível de induzir o consumidor em erro, em relação à natureza, às características, à qualidade, à quantidade, às propriedades, à origem, ao preço e quaisquer outros dados do produto e serviço (art. 37, § 1º, do CDC). A doutrinadora Cláudia Lima Marques exemplifica a situação na propaganda de liquidação ou rebaixa de preços inexistente em uma rede de lojas. Publicidade abusiva, por sua vez, é aquela discriminatória de qualquer natureza, que incite a violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeite valores ambientais, ou que induza o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (art. 37, § 2º, do CDC). É, destarte, a publicidade antiética, que fere a vulnerabilidade do consumidor, que fere valores sociais básicos, que fere a própria sociedade como um todo. O inciso IV do art. 6º do CDC proíbe, ainda, as práticas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços. As normas que proíbem práticas abusivas são de ordem pública e, portanto, inalteráveis pelas partes. O art. 39 do CDC enumera um rol não taxativo de práticas consideradas abusivas pela lei. Direito à modificação e revisão de cláusulas contratuais (V) Visa assegurar o equilíbrio econômico da relação contratual. O CDC inovou ao prever o dirigismo contratual, autorizando o Estado a intervir na economia interna do contrato, quando se identificar um desequilíbrio econômico e financeiro na relação contratual. Assim, o consumidor terá direito de modificar o contrato sempre que houver prestação desproporcional. É feita uma análise objetiva, ou seja, basta que tenha uma cláusula desproporcional para que o contrato seja modificado, a fim de se alcançar o equilíbrio entre as partes. O CC, influenciado pelo CDC, trouxe regras que também admitem a intervenção do Estado na economia interna do contrato. Modificação das cláusulas contratuais: O consumidor possui o direito de modificar cláusulas contratuais quando se verifica o desequilíbrio desde o início. Observe que o contrato já nasce em desequilíbrio, afeta o sinalagma genético do contrato. O art. 51 do CDC prevê que a cláusula contratual que colocar o consumidor em desvantagem exagerada será nula de pleno direito. O consumidor poderá, portanto, solicitar a modificação da cláusula geradora das prestações desproporcionais (com base no art. 6º, V, do CDC) ou a declaração de sua nulidade (art. 51 do CDC). Importante salientar que ocorre, aqui, o instituto da lesão (vício do NJ), o qual não deve se confundir com a lesão prevista no CC, vejamos as diferenças no quadro abaixo: LESÃO NO CDC LESÃO NO CC Previsão: art. 6º, V Previsão: art. 157 Caracterização: basta a presença de cláusula que estabeleça prestações desproporcionais, em prejuízo do consumidor. Caracterização: além da desproporção das prestações, exige-se a caracterização da necessidade premente ou de inexperiência da parte. Consequência: a regra é a manutenção do contrato, possibilitando-se ao consumidor (parte não beneficiada) solicitar a modificação (art. 6.º, V) ou a decretação da nulidade da cláusula contratual (art. 51). Consequência: a regra é a invalidade do negócio jurídico. Excepcionalmente, o contrato pode ser salvo, a depender da vontade da parte favorecida (art. 157, § 2.º, do CC). Análise objetiva. Análise subjetiva. Revisão das cláusulas contratuais: O contrato inicia-se equilibrado, mas por situações supervenientes torna-se desequilibrado, causando um prejuízo ao consumidor. Nestes casos, admite-se a revisão do contrato. Aqui, afeta-se o sinalagma funcional do contrato. Destaca-se que não se exige imprevisibilidade, basta que seja um fato superveniente, tendo em vista que o CDC adotou a TEORIA DA BASE OBJETIVA DO NEGÓCIO JURÍDICO. STJ - O preceito insculpido no inciso V do art. 6º do CDC dispensa a prova do caráter imprevisível do fato superveniente, bastando a demonstração objetiva da excessiva onerosidade advinda para o consumidor. A desvalorização da moeda nacional frente à moeda estrangeira que serviu de parâmetro ao reajuste contratual, por ocasião da crise cambial de janeiro de 1999, apresentou graus expressivo de oscilação, a ponto de caracterizar a onerosidade excessiva que impede o devedor de solver as obrigações pactuadas (STJ, REsp 361.694/RS). O CC adotou a TEORIA DA IMPREVISÃO, segundo a qual além de o fato ser superveniente, deverá ser imprevisível. Vejamos o quadro abaixo, a fim de uma melhor compreensão acerca do tema. TEORIA DA BASE OBJETIVA DO NEGÓCIO JURÍDICO (ART. 6º, V, CDC) TEORIA DA IMPREVISÃO (ART. 478 DO CC) Dispensa a análise da previsibilidade do fato superveniente. Exige a imprevisibilidade do fato superveniente. Basta a onerosidade excessiva para o consumidor. Além da onerosidade excessiva para o devedor, exige “extrema vantagem” para o credor. Consequência: a regra é a revisão do contrato. Excepcionalmente, acarretará a resolução nos casos em que não for possível salvá-lo. Consequência: a regra é a resolução do contrato. Excepcionalmente, poder revisto, a depender da vontade do credor. Direito à prevenção e reparação de danos individuais, coletivos e difusos. Acesso aos órgãos judiciários e administrativos (VI e VII) Os incisos VI e VII do art. 6º do CDC, preveem a “a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”, bem como “o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados”. O Código preocupou-se, como se vê, em proteger o consumidor preventivamente, nas atitudes que as próprias empresas fornecedoras de produtos e serviços devem ter para que não venham a ocorrer danos ao consumidor ou a terceiros. É o que ocorre, por exemplo, quando as empresas chamam os consumidores para trocarem peças defeituosas nos bens alienados, procedimento denominado recall. Protege, também, o consumidor de forma repressiva,ao determinar a reparação integral (patrimonial e moral) dos danos individuais, coletivos e difusos provocados ao consumidor. A reparação dos danos provocados ao consumidor deve ser integral, não se admitindo qualquer tarifamento: Com o advento do Código de Defesa do Consumidor, a indenização pelo extravio de mercadoria não está sob o regime tarifado, subordinando-se ao princípio da ampla reparação, configurada a relação de consumo. A proteção legal engloba não apenas os danos individuais, mas, também, os coletivos e difusos, donde a relevância das ações coletivas previstas no Código (art. 81). Coletivos são os direitos indetermináveis em relação aos titulares, ligados entre si por circunstâncias de fato; individuais homogêneos, por sua vez, são aqueles decorrentes de origem comum (art. 81, parágrafo único, I e II). As ações coletivas podem ser ajuizadas pelo Ministério Público ou por associações legalmente constituídas para a defesa dos direitos coletivos ou individuais homogêneos. Pacífica é a jurisprudência do STJ no sentido de que o Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses coletivos, tais como a coibição de aumento abusivo de mensalidade escolar. Além disso, as entidades sindicais e as associações têm legitimidade ativa ad causam na defesa, em juízo, dos direitos coletivos ou individuais homogêneos de toda a categoria que representa ou de apenas parte dela. A fim de viabilizar a ampla proteção do consumidor, nas esferas administrativa e judicial, é assegurado o seu acesso aos órgãos judiciários e administrativos (tais como os Procons). Essa facilitação engloba a isenção de taxas e custas, atendimento preferencial etc. Direito à facilitação da defesa dos direitos do consumidor. Inversão do ônus da prova (VIII) O CDC, no inciso VIII do art. 6º do CDC, prevê a facilitação da defesa dos direitos do consumidor, especialmente mediante a inversão do ônus da prova no processo civil. Essa inversão, todavia, é admitida, a critério do juiz quando “for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Nessa linha, deve-se reconhecer como abusiva a cláusula que inverta o ônus da prova em prejuízo do consumidor (CDC, art. 51, VI). A inversão que a lei admite é tão somente em prol do consumidor. Essa distribuição dinâmica do ônus da prova quebra a tradicional regra de processo, na qual ao autor cabe a prova dos fatos constitutivos de seu direito, enquanto ao réu, a do fato impeditivo ou extintivo do direito do autor. Ela é admissível, contudo, de forma extraordinária, e deve ser compatibilizada com os princípios informativos do próprio Código de Defesa do Consumidor. Essa facilitação da defesa justifica-se em razão do reconhecimento de que o consumidor é a parte fraca no mercado de consumo. Mas somente é admitida quando o juiz venha a constatar a verossimilhança da alegação do consumidor, ou sua hipossuficiência, “segundo as regras ordinárias de experiência”. Sem basear-se na verossimilhança das alegações do consumidor ou na sua hipossuficiência, a faculdade judicial não pode ser manejada em favor do consumidor, sob pena de configurar-se ato abusivo, com quebra do devido processo legal. A verossimilhança é juízo de probabilidade extraída de material probatório de feitio indiciário, do qual se consegue formar a opinião de ser provavelmente verdadeira a versão do consumidor. Quanto à hipossuficiência, trata-se de impotência do consumidor, seja de origem econômica, seja de outra natureza, para apurar e demonstrar a causa do dano cuja responsabilidade é imputada ao fornecedor. Pressupõe uma situação em que concretamente se estabeleça uma dificuldade muito grande para o consumidor de desincumbir-se de seu natural onus probandi, estando o fornecedor em melhores condições para dilucidar o evento danoso. É de se ressaltar, outrossim, que a hipossuficiência não nasce simplesmente da palavra do consumidor, pois depende dos indícios que sejam trazidos ao processo. Segundo a orientação do STJ, fica a critério do juiz, analisando os pressupostos no caso concreto, determinar a inversão do ônus da prova: “A inversão do ônus da prova fica a critério do juiz, segundo apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor e de sua hipossuficiência” (STJ, 4ª T., AgInt no REsp. 1.409.028/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 22.11.2016, DJe 01.12.2016. No mesmo sentido: STJ, 3ª T., AgInt no AREsp. 907.749/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 20.09.2016, DJe 29.09.2016). O mecanismo da inversão do ônus da prova se insere na Política Nacional das Relações de Consumo, com o objetivo de tutelar o consumidor, e deve ser aplicado até quando seja necessário para superar a vulnerabilidade do consumidor e estabelecer seu equilíbrio processual em face do fornecedor. Não pode, evidentemente, ser um meio de impor um novo desequilíbrio na relação entre as partes, a tal ponto de atribuir ao fornecedor um encargo absurdo e insuscetível de desempenho. Por fim, ressalte-se que não pode resultar da inversão o ônus para o fornecedor de provar o fato constitutivo do direito pretendido pelo consumidor. O que se impõe ao fornecedor é a prova dos fatos que, segundo sua defesa, excluiriam a responsabilidade que o demandante lhe imputa. Fatos esses que normalmente não se teriam de ser provados, se não existisse nem mesmo o começo de prova das alegações do demandante. Se a inicial nada demonstra que, pela verossimilhança ou pela experiência da vida, se pode ter como indícios da veracidade dos fatos constitutivos do direito, nenhum sentido teria a inversão de que cogita o CDC. O consumidor sucumbirá pela completa ausência de suporte fático-jurídico capaz de sustentar sua pretensão. Direito à prestação adequada e eficaz do serviço público (X) O último Direito Básico do consumidor previsto no art. 6º da Lei n. 8.078/90 está no inciso X, que prevê “a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”. Esse direito é decorrência do princípio maior da eficiência previsto na Constituição Federal. O legislador constitucional acresceu ao elemento obrigatório da adequação do serviço público o da eficiência. Isso significa que não basta haver adequação, nem estar à disposição das pessoas. O serviço tem de ser realmente eficiente; tem de cumprir sua finalidade na realidade concreta. O significado de eficiência remete ao resultado: é eficiente aquilo que funciona. A eficiência é um plus necessário da adequação. O indivíduo recebe serviço público eficiente quando a necessidade para a qual este foi criado é suprida concretamente. É isso o que o princípio constitucional pretende. E é isso o que dispõe a Lei n. 8.078.
Compartilhar