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Indaial – 2020 Farmacologia i Profª. Iandra Holzmann Prof. Marcus Vinicius Pereira dos Santos Nascimento 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2020 Elaboração: Profª. Iandra Holzmann Prof. Marcus Vinicius Pereira dos Santos Nascimento Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: H762f Holzmann, Iandra Farmacologia I. / Iandra Holzmann; Marcus Vinicius Pereira dos Santos Nascimento. – Indaial: UNIASSELVI, 2020. 220 p.; il. ISBN 978-65-5663-431-9 ISBN Digital 978-65-5663-432-6 1. Farmacologia. - Brasil. I. Nascimento, Marcus Vinicius Pereira dos Santos. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 615.1 apresentação Olá, acadêmico! Preparado para iniciar seus estudos na Farmacolo- gia? Este livro didático está dividido em três unidades, e em cada uma de- las serão abordados temas específicos referentes à farmacologia. A ideia do livro é apresentar a você, caro acadêmico, os principais conceitos aplicados nesta ciência. Estes conceitos serão utilizados no seu cotidiano acadêmico e profissional. Para que você entenda como cada grupo de medicamento atua é necessário que, inicialmente, você compreenda a linguagem empregada nesta ciência. Conceitos outrora desconhecidos por você, caro acadêmico, serão apresentados para que suas discussões envolvendo medicamentos possam ser o mais ricas o possível. A primeira unidade consiste em uma introdução da ciência da farma- cologia. Nesta unidade conceituaremos a farmacologia, além de discutirmos de forma breve a história desta ciência e seu panorama atual. Na sequência, você será apresentado a algumas das principais subdivisões da farmacolo- gia e suas aplicações práticas. Já no tópico final da unidade, discutiremos o desenvolvimento de novos fármacos. Neste tópico você entendera como um fármaco é desenvolvido, desde a prancheta do pesquisador no laboratório de pesquisa, passando pela indústria para produção em larga escala até che- gar no balcão da farmácia. Na segunda unidade iremos focar nos conceitos necessários para que você, caro acadêmico, entenda a linguagem que esta ciência fala. No primeiro tópico você conhecerá os princípios gerais da farmacocinética. Neste tópico você aprenderá algumas vias de administração e suas particularidades, além das fases que envolvem a farmacocinética. No segundo tópico discutiremos os alvos mais comuns para ação de fármacos, focando em receptores, canais iônicos, enzimas e transportadores. Já no terceiro tópico, você será introduzido ao conceito de farmacodinâmica, para que futuramente consiga compreender o mecanismo de ação dos fármacos disponíveis no mercado. A terceira, e última unidade tem como objetivo dar um foco maior para ação de fármacos específicos no organismo. Por este motivo, no Tópico 1 desta unidade serão discutidos conceitos de mecanismo de ação. Além disso, no Tópico 2, o tema central são os fármacos que atuam sobre o sistema nervoso autônomo e periférico. Já no Tópico 3, o foco dos estudos está voltado para fármacos que atuam nos processos alérgicos e inflamatórios. Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi- dades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra- mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida- de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun- to em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Esta será uma jornada de muitos aprendizados relacionados à farmacologia. Sem sombra de dúvidas esta disciplina irá servir como norte para seu desenvolvimento como profissional farmacêutico! Bons estudos! Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen- tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE sumário UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA .................................................................. 1 TÓPICO 1 — FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS .................................. 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 O QUE É FARMACOLOGIA? ........................................................................................................... 4 3 BREVE HISTÓRIA DA FARMACOLOGIA ................................................................................... 5 4 A CIÊNCIA ATUALMENTE .............................................................................................................. 9 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 11 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 12 TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA ................................................................. 13 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 13 2 FARMACOLOGIA BÁSICA ............................................................................................................ 14 3 FARMACOCINÉTICA ...................................................................................................................... 14 4 FARMACODINÂMICA ................................................................................................................... 16 5 FARMACOLOGIA DE SISTEMAS ................................................................................................ 17 6 FARMACOLOGIA EXPERIMENTAL ........................................................................................... 18 7 FARMACOLOGIA CLÍNICA .......................................................................................................... 19 8 ETNOFARMACOLOGIA ................................................................................................................. 20 9 TOXICOLOGIA .................................................................................................................................22 10 FARMACOEPIDEMIOLOGIA ..................................................................................................... 23 11 FARMACOECONOMIA ................................................................................................................ 23 12 FARMACOGENÔMICA ................................................................................................................ 23 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 24 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 26 TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS .............................................. 29 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 29 2 FERRAMENTAS FARMACOLÓGICAS – O CAMINHO PARA UM NOVO FÁRMACO ....... 30 3 ENSAIOS IN SILICO – ALVOS VS COMPOSTOS .................................................................... 31 4 ENSAIOS PRÉ-CLÍNICOS .............................................................................................................. 34 4.1 PRINCÍPIOS GERAIS DOS ENSAIOS BIOLÓGICOS ............................................................. 35 4.2 ENSAIOS IN VITRO – ENZIMAS E CÉLULAS........................................................................ 37 4.2.1 Ensaios enzimáticos ............................................................................................................. 38 4.2.2 Ensaios em cultura de células .......................................................................................... 39 4.3 ENSAIOS IN VIVO - ÉTICA E MODELOS ANIMAIS DE DOENÇA ................................... 43 4.3.1 A Ética no uso de animais para experimentação ........................................................... 43 4.3.2 Modelos animais de doença ............................................................................................... 45 5 ENSAIOS CLÍNICOS ....................................................................................................................... 51 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 54 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 57 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 58 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 60 UNIDADE 2 — CONCEITOS GERAIS DE FARMACOLOGIA ................................................. 63 TÓPICO 1 — PRINCÍPIOS GERAIS DE FARMACOCINÉTICA ............................................... 65 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 65 2 VIAS DE ADMINISTRAÇÃO ........................................................................................................ 67 2.1 VIA ORAL ...................................................................................................................................... 68 2.2 MUCOSA ORAL (SUBLINGUAL E BUCAL) ........................................................................... 69 2.3 VIA RETAL .................................................................................................................................... 69 2.4 APLICAÇÃO EM SUPERFÍCIES EPITELIAIS.......................................................................... 70 2.4.1 Administração cutânea ....................................................................................................... 70 2.4.2 Colírios .................................................................................................................................. 70 2.4.3 Via nasal ................................................................................................................................ 71 2.4.4 Inalação ................................................................................................................................. 71 2.5 INJETÁVEL .................................................................................................................................... 72 2.5.1 Subcutânea ............................................................................................................................ 72 2.5.2 Intramuscular ....................................................................................................................... 72 2.5.3 Intravenosa ........................................................................................................................... 73 2.5.4 Intratecal ............................................................................................................................... 73 3 ABSORÇÃO ........................................................................................................................................ 74 3.1 MECANISMOS DE ABSORÇÃO................................................................................................ 74 3.1.1 Difusão .................................................................................................................................. 75 3.1.2 Transporte ativo ................................................................................................................... 75 3.1.3 Endocitose ............................................................................................................................. 75 3.2 FATORES QUE INFLUENCIAM NA ABSORÇÃO ................................................................. 76 3.2.1 Potencial Hidrogeniônico (pH) .......................................................................................... 76 3.2.2 Fluxo sanguíneo, superfície e tempo de contato ............................................................ 77 3.2.3 Expressão de glicoproteína P ............................................................................................. 78 3.3 BIODISPONIBILIDADE E BIOEQUIVALÊNCIA .................................................................... 78 4 DISTRIBUIÇÃO ................................................................................................................................ 79 5 BIOTRASNFORMAÇÃO (METABOLISMO) ............................................................................. 81 5.1 REAÇÕES DE FASE I ................................................................................................................... 82 5.2 REAÇÕES DE FASE II .................................................................................................................. 84 6 EXCREÇÃO E ELIMINAÇÃO ......................................................................................................... 84 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 88 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 89 TÓPICO 2 — ALVOS PARA AÇÃO DE FÁRMACOS .................................................................. 91 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 91 2 PRINCIPAIS ALVOS FARMACOLÓGICOS ............................................................................... 91 2.1 RECEPTORES ................................................................................................................................ 92 2.1.1 Receptores ionotrópicos ......................................................................................................92 2.1.2 Receptores metabotrópicos ................................................................................................ 93 2.1.3 Receptores ligados a quinases............................................................................................ 95 2.1.4 Receptores nucleares (NR) ................................................................................................. 96 2.2 CANAIS IÔNICOS ....................................................................................................................... 97 2.3 ENZIMAS ..................................................................................................................................... 99 2.4 TRANSPORTADORES ............................................................................................................... 100 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 102 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 103 TÓPICO 3 — PRINCÍPIOS GERAIS DE FARMACODINÂMICA .......................................... 105 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 105 2 RELAÇÕES DOSE-RESPOSTA .................................................................................................... 107 2.1 DOSE-RESPOSTA GRADUADA .............................................................................................. 107 2.2 DOSE-RESPOSTA QUANTAL .................................................................................................. 108 3 INTERAÇÕES FÁRMACO E ALVO ............................................................................................ 109 3.1 AGONISTAS ................................................................................................................................ 109 3.1.1 Agonistas totais .................................................................................................................. 109 3.1.2 Agonistas parciais .............................................................................................................. 109 3.1.3 Agonistas inversos ............................................................................................................. 110 3.2 ANTAGONISTAS ....................................................................................................................... 111 3.2.1 Antagonistas de receptores .............................................................................................. 111 3.2.2 Antagonistas sem receptores ............................................................................................ 114 4 CONCEITOS EM TERAPIA .......................................................................................................... 114 4.1 JANELA TERAPÊUTICA .......................................................................................................... 115 4.2 ÍNDICE TERAPÊUTICO ............................................................................................................ 116 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 118 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 123 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 124 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 126 UNIDADE 3 — FÁRMACOS QUE ATUAM SOBRE O SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO E PERIFÉRICO ............................................................................ 129 TÓPICO 1 — FARMACOLOGIA DO SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO .......................... 131 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 131 2 NEURÔNIOS DO SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO ........................................................ 132 3 SISTEMA NERVOSO SIMPÁTICO ............................................................................................ 133 4 SISTEMA NERVOSO PARASSIMPÁTICO............................................................................... 134 5 SISTEMA NERVOSO SOMÁTICO ............................................................................................. 137 6 COMUNICAÇÃO NEURONAL ................................................................................................... 138 6.1 NEUROTRANSMISSÃO COLINÉRGICA .............................................................................. 139 6.1.1 Agonistas colinérgicos de ação direta ............................................................................. 140 6.1.2 Agonistas colinérgicos de ação indireta: anticolinesterásicos (reversíveis) .............. 141 6.1.3 Agonistas colinérgicos de ação indireta: anticolinesterásicos (irreversíveis) ........... 141 6.1.4 Antagonistas colinérgicos ................................................................................................. 143 6.2 NEUROTRANSMISSÃO ADRENÉRGICA............................................................................. 147 6.2.1 Receptores adrenérgicos (adrenoceptores) .................................................................... 148 6.2.2 Antagonistas ou bloqueadores α-adrenérgicos ............................................................. 151 6.2.3 Bloqueadores β-adrenérgicos ........................................................................................... 153 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 156 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 157 TÓPICO 2 — FARMACOLOGIA DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL ............................... 161 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 161 2 ANSIOLÍTICOS E HIPNÓTICOS ................................................................................................ 162 2.1 BENZODIAZEPÍNICOS (BDZ) ................................................................................................ 163 2.1.2 Mecanismo de ação dos BDZs ......................................................................................... 163 3 ANTIEPILÉPTICOS ........................................................................................................................ 165 3.1 MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIEPILÉPTICOS ............................................................ 167 4 ANTIDEPRESSIVOS ...................................................................................................................... 170 4.1 MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIDEPRESSIVOS ........................................................... 171 4.2 TRATAMENTO DA MANIA E DO DISTÚRBIO BIPOLAR ................................................ 175 5 ANTIPSICÓTICOS ......................................................................................................................... 175 5.1 MECANISMO DE AÇÃO DOS ANTIPSICÓTICOS .............................................................. 177 6 DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS ..................................................................................... 179 6.1 DOENÇA DE PARKINSON ...................................................................................................... 179 6.2 DOENÇA DE ALZHEIMER ...................................................................................................... 181 7 FÁRMACOS OPIOIDES ................................................................................................................183 7.1 MECANISMO DE AÇÃO DOS AGONISTAS OPIOIDES .................................................... 184 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 188 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 190 TÓPICO 3 — FARMACOLOGIA DOS PROCESSOS INFLAMATÓRIOS E ALÉRGICOS ......... 193 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 193 2 ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES ........................................................................ 196 2.1 INIBIDORES SELETIVOS DA COX ......................................................................................... 198 2.2 INIBIDORES NÃO SELETIVOS DA COX .............................................................................. 199 3 ESCOLHA DO ANTI-INFLAMATÓRIO NÃO ESTEROIDE ................................................. 200 4 ANTI-INFLAMATÓRIOS ESTEROIDAIS (GLICOCORTICOIDES) .................................. 201 5 PROCESSOS ALÉRGICOS ............................................................................................................ 204 5.1 ANTAGONISTAS DE RECEPTORES H1 (ANTI-HISTAMÍNICOS H1) ............................ 205 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 208 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 215 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 216 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 218 1 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • compreender a história da farmacologia e como chegamos às atuais ferramentas tecnológicas que possibilitam o desenvolvimento de moléculas inovadoras; • distinguir os campos e subdivisões das ciências farmacológicas como a farmacologia básica, experimental, clínica, entre outras; • conhecer como novos medicamentos são pesquisados, desenhados e, enfim, lançados no mercado; • distinguir estudos conduzidos in silico, in vitro, e in vivo, além de entender limitações e vantagens de cada uma destas abordagens; • entender as etapas envolvidas no desenvolvimento de um novo medicamento, desde a descoberta da molécula inovadora e testes preliminares em culturas celulares até a chegada ao mercado farmacêutico e a contínua farmacovigilância. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS TÓPICO 2 – SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA TÓPICO 3 – DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS 2 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS 1 INTRODUÇÃO Iremos iniciar nossos estudos na farmacologia, tendo como objetivo, neste primeiro momento, familiarizar você, acadêmico, com a história desta ciência complexa e em constante evolução. Embora pareça ser restrita somente a questões médicas, ou diretamente relacionada a profissionais da área de saúde, a farmacologia faz parte do cotidiano de todos. As interações entre moléculas do meio ambiente e nosso organismo ocorrem a todo momento, desde o café da manhã (rico em cafeína, uma molécula estimulante), até a hora de dormir, com um chá de camomila (planta conhecida por seus efeitos calmantes). Weatherall diz que a ciência dos fármacos, no caso, a farmacologia, tornou-se imprescindível quando a primeira pessoa a ficar bêbada vislumbrou o que estava acontecendo com ela mesma (WEATHERALL, 1996). O conhecimento destas interações moleculares é de extrema importância para o farmacêutico, uma vez que a raiz da profissão deriva justamente dos seus conhecimentos científicos a respeito desta relação entre moléculas e o organismo. Neste tópico, você terá contato com uma breve história da farmacologia e como esta ciência vem sendo desenvolvida nos últimos anos, com intuito de gerar moléculas promissoras para as mais variadas condições clínicas, fato que a tornou uma das maiores potências em termos industriais da nossa era. Ainda, neste tópico, discutiremos as subdivisões da farmacologia, por qual motivo elas existem e quais as funções de cada uma das áreas desta ciência. Final- mente, ainda nesta primeira unidade, abordaremos quais as etapas necessá- rias para que um fármaco seja desenvolvido, desde a descoberta de uma nova molécula até a chegada desta na forma de um medicamente nas gôndolas das farmácias comerciais. UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 4 Preparado para ampliar seus conhecimentos a respeito da ciência dos medicamentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim, absorverá melhor as informações. Não esqueça de acessar a trilha interativa da disciplina para acompanhar melhor seus estudos. CHAMADA 2 O QUE É FARMACOLOGIA? Inicialmente, antes de começarmos a discutir sobre a história e ferramen- tas utilizadas na farmacologia temos que entender de que trata essa ciência e alguns termos nela empregados. É comum utilizarmos em nosso dia a dia termos como “remédio”, “medicamento”, “fármaco” e “droga”. Você sabe diferenciar cada um destes termos e no que implicam estas diferenças? Vamos definir primeiramente o que é um remédio. Um remédio é qualquer recurso utilizado para se obter a cura, seja uma abordagem utilizando alguma substância, dieta, terapias ocupacionais, alguma técnica manual, entre outros. Analisando este conceito entendemos como remédio então uma determinada substância química com fórmula definida, ou mesmo uma massagem, para o alívio da dor (Figura 1) (DUTRA et al., 2010). Na sequência, analisamos o termo droga. É comum o uso desse termo legalmente para definir substâncias entorpecentes de uso recreativo e que podem causar dependência química. No entanto, na ciência da farmacologia, chamamos de droga uma substância ou matéria-prima que tenha finalidade medicamentosa ou sanitária (ANVISA, 2020). O próximo termo que temos que conhecer é medicamento. A ANVISA define como medicamento um produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou ela- borado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico (DUTRA et al., 2010). E, finalmente, definimos fármaco. Define-se fármaco como uma determinada substância química de estrutura conhecida, que não seja um nutriente, que, quando administrado a um organismo, produz um certo efeito biológico (ANVISA, 2020). TÓPICO 1 — FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS 5 FIGURA 1 – DEFINIÇÕES DE REMÉDIO, DROGA, MEDICAMENTO E FÁRMACO FONTE: O autor (2020) Agora que definimos estes simples termos podemos discorrer a respeito da ciência da farmacologia, sua história e aplicações. A farmacologia é a ciência que estuda o efeito dos fármacos no funcionamento de sistemas vivos. Grande parte da terapêutica empregada hoje no mundo por médicos é baseada em evidências observadas justamente pelas ciências farmacológicas e suas subdivisões (conforme iremos observar no Tópico 2) (RITTER et al., 2020). 3 BREVE HISTÓRIA DA FARMACOLOGIA O uso de plantas medicinais com objetivo de curar diferentes condições patológicas data de aproximadamente 4000 anos a.C. com pinturas rupestres em sítios arqueológicos. Talvez, o mais famoso registro histórico dos princípios da ciência da farmacologia seja o Papiro de Ebers,do Egito, que data aproximadamente de 1500 a.C. (Figura 2). Neste papiro existem cerca de 700 formulações com extratos de diferentes plantas como romã, babosa e coentro, sendo utilizados com as mais variadas finalidades. É importante ressaltar que nesta época a farmacologia ainda era considerada uma forma de ciência oculta, e seu conhecimento era permitido a poucos membros das sociedades antigas. O termo utilizado pelos detentores destes conhecimentos das interações de substâncias químicas e do corpo era Alquimia (HAAS, 1999). UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 6 FIGURA 2 – O PAPIRO DE EBERS, UM DOS MAIS ANTIGOS REGISTROS DO USO DE MEDICAMENTOS FONTE: <https://maestrovirtuale.com/wp-content/uploads/2019/10/Papyrus_Ebers.png>. Acesso em: 11 maio 2020. À medida que os séculos passaram, a ciência continuou evoluindo na utilização de produtos derivados de plantas. Grandes nomes merecem destaque, como o grego Pedânio Dioscórides (77 d.C.), que deixou um vasto material em seu livro “De Materia Medica”, com mais de 900 preparações de uma infinidade de plantas. Claudio Galeno, médico e filosofo romano, escreve em 150 d.C. "De succedanus" ou “drogas paralelas”, sendo este um material contendo uma lista de substâncias químicas que apresentavam ações idênticas, além de novas formulações não indicadas por Dioscórides, alguns anos antes (MANDAL; MANDAL; DAS, 2015). Mesmo com o rico conhecimento desenvolvido nos séculos anteriores, foi com Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, conheci- do como Paracelso, no século XV, que a farmacologia ganha contribuições mais relevantes. Considerado por muitos como pai da Farmacologia, Bioquímica e Toxicologia, é famoso por definir que “o que difere o veneno do remédio é a dose”. Suas observações somadas aos movimentos iluministas, que ocorreriam nos próximos séculos, contribuíram muito para o pensamento científico e conhe- cimento fisiológico, sendo estes pilares fundamentais para o desenvolvimento da farmacologia como a ciência que é atualmente (COCKAYNE, 2002). TÓPICO 1 — FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS 7 A partir do século XIX, a farmacologia começa a tomar formas diferentes, e a utilizar substâncias químicas sintéticas, ou seja, aquelas que são desenvolvidas em laboratório, começam a ser foco de maior interesse dos cientistas da época. Foi nesse século que a farmacologia começou a ser vista como a ciência que estuda o efeito dos fármacos nos sistemas vivos. Podemos citar que nesse século, por exemplo, ocorreu o isolamento da morfina derivada da Papaver somniferum por Friedrich Sertürner, em 1804. Em 1818, Joseph Bienaimé Caventou e Pierre Joseph Pelletierisola isolam a estriquinina derivada da Strychnos nux-vomica (Pesticida, muito usado para matar ratos e responsável por inúmeros envenemantos). Em 1820, a mesma dupla de cientistas isola com sucesso o quinino, sendo este a base até hoje para tratamento de malária e algumas doenças autoimunes. Em 1928, Johann Buchner isola a salicilina da casca do salgueiro, usada no tratamento de dores e febre, e que serviria como base para formulação da aspirina anos mais tarde, em 1897, por Felix Hoffmann. Ainda no final deste século, em 1900, o médico Paul Ehrlich introduzia neste ano o termo “receptor” para designar locais na superfície das células em que substâncias químicas interagem e, desta forma, geram efeitos fisiológicos específicos (Figura 3). Diversos outros estudos notáveis foram desenvolvidos no século XIX e permitiram avanços consideráveis no século seguinte (RITTER et al., 2020). FIGURA 3 – PAUL EHRLICH, CONHECIDO COMO UM DOS PAIS DA FARMACOLOGIA, INTRODUZIU O CONCEITO DE RECEPTORES A ESTA CIÊNCIA FONTE: <https://www.britannica.com/biography/Paul-Ehrlich>. Acesso em: 11 maio 2020. UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 8 Ficou interessado no processo de descoberta de medicamentos conduzidos no século passado? O documentário “A aventura do antibiótico” relata como estas substâncias farmacologicamente ativas foram descobertas e posteriormente desenvolvidas para produção em larga escala. Além disso, o documentário ainda aborda a microbiologia. Link: https://www.youtube.com/watch?v=XtP7WF8XjXU&t=2631s. DICAS No século XX, iniciou-se a era biotecnológica da ciência, com a indústria de biotecnologia Genetic Engineering Technology (EUA), produzindo insulina hu- mana a partir de uma bactéria da espécie Escherichia coli com DNA recombinan- te. Nos anos seguintes, a mesma indústria de biotecnologia produz o hormônio de crescimento (GH), também com DNA recombinante. Atualmente, a indús- tria farmacêutica tem focado grande parte de seus esforços em terapia gênica e na imunoterapia, que é o desenvolvimento de anticorpos monoclonais voltados para uma série de condições patológicas, como doenças autoimunes, neurodege- nerativas e câncer (Figura 4) (BAESHEN et al., 2014; RITTER et al., 2020). FIGURA 4 – A IMUNOTERAPIA É UMA DAS VERTENTES ESTUDADAS DA IMUNOFARMACOLOGIA FONTE: <https://estudio.r7.com/cura-do-cancer-as-terapias-que-renovam-a- esperanca-13112019>. Acesso em: 11 maio 2020. TÓPICO 1 — FARMACOLOGIA: A CIÊNCIA DOS MEDICAMENTOS 9 Se você quer conhecer mais sobre a história da farmacologia, leia o artigo Farmacologia no século XX: a ciência dos medicamentos a partir da análise do livro de Goodman e Gilman. Neste artigo, as autoras analisam a apresentação da farmacologia como ciência a partir do livro “As bases farmacológicas da terapêutica de Louis Goodman e Alfred Gilman”. Link: https://www.scielo.br/pdf/hcsm/v20n2/0104-5970- hcsm-S0104-59702013005000007.pdf. DICAS 4 A CIÊNCIA ATUALMENTE A indústria farmacêutica é hoje uma das maiores potências mundiais, com receitas anuais na casa dos bilhões de dólares. Esta mesma indústria investe todos os anos parte de seus lucros na pesquisa e desenvolvimento de novas moléculas, sejam elas derivadas de produtos naturais ou sintéticas. A sociedade vem adotando hábitos mais saudáveis à medida que os séculos passam, e isso resulta no aumento da expectativa de vida populacional. No entanto, com o aumento da sobrevida da população, novas doenças começam a aparecer, que outrora não eram tão comuns ou simplesmente não eram diagnosticadas corretamente por falta de condições tecnológicas. É o caso de doenças neurodegenerativas, doenças autoimunes e câncer (DE MEIJER et al., 2013). Atualmente, a indústria farmacêutica vê sua receita mais concentrada na produção de medicamentos voltados para combate ao câncer, contando com mais de 14% deste valor. Na sequência temos medicamentos antirreumáticos, antidiabéticos, antivirais e outros. As perspectivas de crescimento de receita para esta indústria são de 864 bilhões de dólares em 2018 para 1.222 bilhões de dólares já em 2024, um crescimento anualizado de aproximadamente 7% (Figura 5). Estes números demonstram um setor industrial sólido, mas que depende inteiramente de desenvolvimento tecnológico e conhecimento científico de seus profissionais nas mais diferentes áreas da farmacologia (BUCHHOLZ, 2020). FIGURA 5 – RECEITA GERADA PARA A INDÚSTRIA POR CLASSE DE MEDICAMENTOS EM 2018 E PROJETADO PARA 2024 (BILHÕES DE DÓLARES) UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 10 FONTE: Adaptado de <https://www.statista.com/chart/18311/sales-revenues-of-drug-classes/>. Acesso em: 11 maio 2020. Os desafios para a farmacologia no panorama atual são a busca por moléculas inovadoras para condições patológicas novas e antigas, porém com efeitos adversos mais brandos ou, se possível, inexistentes, quando comparados a moléculas já disponíveis no mercado. Além disso, facilitar a adesão terapêutica dos pacientes, ou seja, diminuir, a quantidade de comprimidos que um paciente deve tomar de um determinado medicamento, sem que sua eficácia terapêutica seja afetada. Buscam-se também terapias com alvos específicos, como no câncer, onde a quimioterapia (abordagem farmacológica) acaba interagindo não somente com as células do tumor, queseria o desejável, mas também com outras células do corpo, causando danos reversíveis, porém extremamente desconfortáveis para o paciente (perda de cabelos, ressecamento de mucosas, enjoos, entre outros). E, finalmente, cumprir com todos estes desafios e gerar fármacos que sejam acessíveis financeiramente para população de forma geral, empregando técnicas de química verde (sustentáveis) e de baixo custo operacional para indústria (PANKEVICH et al., 2014). Apesar de todos os desafios, as perspectivas são animadoras. As ferramentas tecnológicas têm avançado em progressão geométrica e a cada ano que passa, novos conhecimentos das interações bioquímicas entre substâncias químicas e organismos surgem. Estas ferramentas permitem acelerar experimentos que agregam conhecimento para geração de novos fármacos. Agora, caro acadêmico, você sabe como chegamos até os desafios atuais da farmacologia. Nos próximos tópicos vamos abordar algumas das subdivisões da farmacologia e quais as funções e especificações técnicas de cada uma destas, além de conhecer melhor algumas ferramentas empregadas para pesquisa de novos fármacos, diferentes metodologias (in silico, in vitro e in vivo) e fases do desenvolvimento dos fármacos (pré-clínico e clínico). 11 Neste tópico, você aprendeu que: RESUMO DO TÓPICO 1 • A farmacologia é uma ciência relativamente moderna, embora seja objeto de estudo e fascínio da humanidade deste muito antes do nascimento de Cristo. • O século XIX serviu como berço para descoberta de conceitos e aplicações científicas que são utilizados até hoje na farmacologia. • O estudo de novas moléculas com atividade farmacológica hoje faz uso de ferramentas de biotecnologia visando à otimização de terapias direcionadas e com menos efeitos adversos. • O aumento da expectativa de vida da população de forma geral leva ao aparecimento de novas doenças e, para tal, novas moléculas e abordagens farmacológicas são necessárias. • A indústria farmacêutica é uma das maiores geradoras de receita, e este crescimento nos últimos anos tem se dado pelo mercado de fármacos com ação anticâncer. • A farmacologia é uma ciência em constante evolução, e tem como maiores desafios atualmente a busca por moléculas eficazes que apresentem baixo potencial de apresentar efeitos adversos, além de promover uma melhor adesão terapêutica e tratamento direcionado a alvos específicos. 12 1 Desde o início da História existem relatos do uso de remédios pela huma- nidade. Naturalmente, com o decorrer dos séculos este uso tornou-se uma ciência e, hoje, continua a passar por grande evolução. A respeito desta ci- ência, defina o que é a farmacologia e qual o objeto de estudo desta ciência. 2 O médico Paul Ehrlich, em 1900, introduziu um conceito inovador na farmacologia que até hoje é utilizado nos estudos modernos. Qual é a palavra que define este conceito? a) ( ) Molécula. b) ( ) Bioquímica molecular. c) ( ) Receptores. d) ( ) Imunoglobulinas. e) ( ) Antibióticos. 3 No século XX se iniciou uma nova era para farmacologia, com buscas por terapias gênicas e drogas com alvos específicos. Qual foi principal característica deste período? a) ( ) O emprego de ferramentas de biotecnologia. b) ( ) O uso de fármacos derivados de plantas medicinais. c) ( ) O uso de produtos naturais. d) ( ) O emprego de moléculas exclusivamente sintéticas. e) ( ) A utilização de terapias baseadas unicamente em abordagens holísticas. 4 A indústria farmacêutica é um setor que não para de crescer, sendo resiliente mesmo em períodos de recessão econômica severa. Cite dois fatores que influenciam este crescimento. 5 Diversos são os desafios relacionados à criação de novas moléculas com potencial ação farmacológica. Cite e explique ao menos um dos desafios do farmacologista moderno na criação de novos fármacos. AUTOATIVIDADE 13 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 1 INTRODUÇÃO Agora, caro acadêmico, você já conhece um pouco mais da história da ciência dos fármacos e quais foram os fatos e grandes nomes que nos trouxeram ao panorama atual. Acredito que, a esta altura, você concorde que a farmacologia é um tanto quanto complexa se levarmos em consideração que ela, por si só, é responsável por estudar e definir o que os fármacos fazem com os sistemas vivos. É justamente por essa enorme complexidade que é comum observarmos uma grande variedade de subdivisões para esta ciência. Reflita: para um fármaco interagir com um sistema vivo devemos levar em consideração, inicialmente, se este fármaco está sendo ingerido, inalado, administrado diretamente na circulação do paciente ou por uma injeção na musculatura. Todos estes fatores implicam diferentes magnitudes de efeitos. Na sequência, devemos levar em consideração se este fármaco está sendo administrado na forma pura, ou com alguma outra substância, que pode também alterar a qualidade dos seus efeitos. A seguir nos perguntamos, por qual motivo este fármaco gera especificamente este efeito? Com quais células do nosso corpo ele pode interagir? Antes mesmo de todas essas perguntas, para este fármaco ser utilizado em seres humanos, fizeram-se necessários estudos em softwares, em cultura de células, em animais, em humanos que participem de ensaios clínicos, para finalmente, ser aprovado e chegar às farmácias e/ou hospitais. Em conjunto com todos estes fatores, estudos da viabilidade econômica para produção desta substância devem ter sido levados em consideração e, futuramente, ao estar já no mercado, será que este fármaco não poderá causar algum efeito tóxico ou ainda ser utilizado como droga de abuso e causar algum grau de dependência? Confuso, não é? Se tentarmos colocar todas as respostas relacionadas ao desenvolvimento de novos fármacos sob responsabilidade de uma única ciência este provavelmente é o resultado. E é justamente por este motivo que obser- vamos tantas divisões na farmacologia. A seguir, discutiremos algumas destas áreas da farmacologia, o que realizam e como atuam na contribuição do conhe- cimento dos fármacos. 14 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 2 FARMACOLOGIA BÁSICA Será comum, caro acadêmico, você ouvir no decorrer de sua vida acadê- mica e posterior carreira profissional, profissionais da área da saúde dividindo diversas ciências em “básicas”, “clínicas” e ainda “aplicadas”. Isso é comum, no- vamente com intuito de organizar os conhecimentos adquiridos. Veja as ciências básicas, por exemplo, têm como objetivo responder a questões independente- mente de suas aplicações. Por exemplo, em farmacologia básica buscam-se compreender integralmente os mecanismos de ação dos fármacos, bem como suas rotas metabólicas e forma de distribuição através dos compartimentos corpóreos. Você julga este conhecimento desnecessário? Acredito que não, certo? Porém, para as ciências aplicadas, como a farmacologia clínica, nem sempre o conhecimento de todos os mecanismos de ação que um fármaco pode ter farão diferença. Veja a dipirona (metamizol), um fármaco utilizado como antipirético e analgésico aqui em nosso país, ainda tem seu mecanismo de ação considerado como pouco conhecido. Seus efeitos clínicos em diminuir a febre e dor de pacientes que fazem uso desta substância são claros, porém, por qual motivo exatamente isto ocorre ainda é um mistério. O mesmo ocorre com uma infinidade de medicamentos dispostos no mercado farmacêutico mundial (RITTER, 2009). Conhecer os mecanismos pelos quais um fármaco gera seus efeitos engrandece a ciência da farmacologia como um todo. É função da farmacologia básica desvendar estes mistérios moleculares. Aos olhos do leigo parece tolice conhecer os meios uma vez que o que importa de fato são os fins na terapêutica, mas entenda, caro acadêmico, que as ciências básicas são aquelas que pavimentam os caminhos para as aplicadas (RITTER, 2009). 3 FARMACOCINÉTICA A farmacocinética é o estudo do movimento dos fármacos dentro dos compartimentos corpóreos, umavez que o corpo em questão foi exposto a estes. Para simplificar o entendimento desta subdivisão dar farmacologia, podemos descrever a farmacocinética como a ciência que estuda o que nosso corpo faz com um determinado fármaco após a exposição. Por exemplo, uma vez que um paciente ingere por via oral um comprimido de paracetamol, para onde este comprimido vai? A princípio, para o estômago, certo? E depois que chegar no estômago, como ele se dissocia da forma de comprimido e chega até o local de ação? Após seu efeito, ele fica para sempre circulando em nosso organismo? O conhecimento detalhado deste tipo de interação é de extrema importância para que doses seguras de medicamentos sejam definidas antes de chegarem a hospitais e farmácias. No estudo da farmacocinética é comum dividirmos as fases de interação do organismo com o fármaco em: exposição, absorção, distribuição, biotransformação e excreção (MEIBOHM; DERENDORF, 2002; RITTER et al., 2020). TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 15 Com o passar dos anos, as bulas de medicamentos foram se tornando cada vez mais fáceis de serem interpretadas por leigos, para que a adesão terapêutica dos pacientes seja mais eficaz e intoxicações relacionadas a medicamentos sejam cada vez mais raras. No entanto, é comum na maioria das bulas constar um campo descrito como “informações técnicas”. Neste campo estão informações a respeito da farmacocinética e farmacodinâmica (próximo item). Veja o exemplo desta bula de dipirona a respeito de suas propriedades farmacocinéticas: Propriedades farmacocinéticas A farmacocinética da Dipirona Monoidratada e de seus metabólitos não está completamente elucidada, mas as seguintes informações podem ser fornecidas: Após administração oral, a Dipirona Monoidratada é completamente hidrolisada em sua porção ativa, 4-Nmetilaminoantipirina (MAA). A biodisponibilidade absoluta da MAA é de aproximadamente 90%, sendo um pouco maior após administração oral quando comparada à administração intravenosa. A farmacocinética da MAA não se altera em qualquer extensão quando a Dipirona Monoidratada é administrada concomitantemente a alimentos. Principalmente a MAA, mas também a 4-aminoantipirina (AA), contribuem para o efeito clínico. Os valores de exposição total de fármaco ao longo do tempo (AUC – Area Under Curve) para AA constituem aproximadamente 25% do valor de AUC para MAA. Os metabólitos 4-Nacetilaminoantipirina (AAA) e 4-N-formilaminoantipirina (FAA) parecem não apresentar efeito clínico. São observadas farmacocinéticas não-lineares para todos os metabólitos. São necessários estudos adicionais antes que se chegue a uma conclusão sobre o significado clínico destes resultados. O acúmulo de metabólitos apresenta pequena relevância clínica em tratamentos de curto prazo. O grau de ligação às proteínas plasmáticas é de 58% para MAA, 48% para AA, 18% para FAA e 14% para AAA. Após administração intravenosa, a meia-vida plasmática é de aproximadamente 14 minutos para a Dipirona Monoidratada. Aproximadamente 96% e 6% da dose radiomarcada administrada por via intravenosa foram excretadas na urina e fezes, respectivamente. Foram identificados 85% dos metabólitos que são excretados na urina, quando da administração oral de dose única, obtendo-se 3% ± 1% para MAA, 6% ± 3% para AA, 26% ± 8% para AAA e 23% ± 4% para FAA. Após administração oral de dose única de 1g de Dipirona Monoidratada, o clearance renal foi de 5mL ± 2 mL/min para MAA, 38mL ± 13mL/min para AA, 61mL ± 8mL/min para AAA, e 49mL ± 5 mL/min para FAA. As meias-vidas plasmáticas correspondentes foram de 2,7 ± 0,5 horas para MAA, 3,7 ± 1,3 horas para AA, 9,5 ± 1,5 horas para AAA, e 11,2 ± 1,5 horas para FAA. FONTE: Adaptado de <https://bit.ly/2LwmyK4>. Acesso em: 6 jun. 2020. 16 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA Ficou confuso com as informações desta bula? Abordaremos o assunto farmacocinética de forma específica na Unidade 2 deste livro. ESTUDOS FU TUROS 4 FARMACODINÂMICA A farmacodinâmica, como o próprio nome já deixa claro, é o estudo da dinâmica dos fármacos no organismo. Simplificando a terminologia, podemos entender esta ciência como a subdivisão da farmacologia que estuda especificamente o que o fármaco faz com o organismo. Encontra-se no escopo desta ciência então desvendar o mecanismo de ação dos fármacos e compreender de que forma estes mecanismos acabam gerando os efeitos clínicos desejados. É através deste conhecimento também que a interação entre diferentes fármacos num mesmo organismo acaba sendo elucidada, lembre-se de que é comum pacientes, principalmente idosos, fazerem uso de mais de três ou quatro medicamentos por dia para doenças crônicas (MEIBOHM; DERENDORF, 2002; RITTER et al., 2020). Veja o exemplo a seguir das informações sobre as propriedades farmacodinâmicas da dipirona: Propriedades farmacodinâmicas A Dipirona Monoidratada é um derivado pirazolônico não narcótico com efeitos analgésico, antipirético e espasmolítico. A Dipirona Monoidratada é uma pró-droga cuja metabolização gera a formação de vários metabólitos entre os quais há 2 com propriedades analgésicas: 4-metil-aminoantipirina (4- MAA) e o 4-amino-antipirina (4-AA). Como a inibição da ciclo-oxigenase (COX- 1, COX-2 ou ambas) não é suficiente para explicar este efeito antinociceptivo, outros mecanismos alternativos foram propostos, tais como a inibição de síntese de prostaglandinas preferencialmente no sistema nervoso central, dessensibilização dos nociceptores periféricos envolvendo atividade via óxido nítrico-GMPc no nociceptor, uma possível variante de COX-1 do sistema nervoso central seria o alvo específico e, mais recentemente, a proposta de que a Dipirona Monoidratada inibiria uma outra isoforma da ciclo-oxigenase, a COX-3. Os efeitos analgésico e antipirético podem ser esperados em 30 a 60 minutos após a administração e geralmente duram cerca de 4 horas. FONTE: Adaptado de <https://consultaremedios.com.br/dipirona-monoidratada/bula>. Acesso em: 6 jun. 2020. https://consultaremedios.com.br/dipirona-monoidratada/bula TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 17 Ficou confuso com as informações desta bula? Abordaremos o assunto farmacodinâmica de forma específica na Unidade 2 deste livro didático. ESTUDOS FU TUROS 5 FARMACOLOGIA DE SISTEMAS A farmacologia de sistemas não necessariamente é uma subdivisão da farmacologia, mas é comum dividirmos os estudos dos fármacos em relação aos sistemas em que estes geram seus efeitos terapêuticos. Por exemplo, na Unidade 3 deste livro didático, iremos discutir o “Estudo da ação de fármacos no organismo” e, um dos tópicos refere-se a “Fármacos que atuam sobre o sistema nervoso autônomo e periférico”. Estamos nos referindo, neste caso, à farmacologia que estuda especificamente a interação de fármacos com o sistema nervoso central, e podemos designar este tópico também como neurofarmacologia (estudo de fármacos com ação sobre o sistema nervoso central) (RITTER et al., 2020). Outras áreas comuns da farmacologia referente especificamente a sistemas são, por exemplo (Figura 6): • Imunofarmacologia: estudo de fármacos que, de alguma forma, interagem com o sistema imunológico através de processos inflamatórios sejam estes processos de caráter infeccioso, alérgico ou degenerativo. • Farmacologia cardiovascular: estudo de fármacos que atuam diretamente ou indiretamente sobre o sistema cardiovascular. Compreende este estudo principalmente a classe de anti-hipertensivos como: diuréticos, antagonistas adrenérgicos, vasodilatadores e inibidores do sistema renina-angiotensina- aldosterona. • Farmacologia respiratória: estudo de fármacos que atuam diretamente ou indiretamente sobre o sistema respiratório. Compreendem estes estudos classes de medicamentos como descongestionantes nasais, antitussígenos, expectorantes e mucolíticos, broncodilatadores, entre outros. • Farmacologia gastrointestinal: estudo de fármacos que atuam diretamente ou indiretamente sobreo sistema gastrointestinal. Compreendem estes estudos classes de medicamentos como inibidores da bomba de prótons, antiácidos, protetores da mucosa gástrica, antieméticos, purgativos, antiespasmódicos, entre outros. 18 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA FIGURA 6 – ALGUMAS DAS ESPECIFICAÇÕES DA FARMACOLOGIA DE SISTEMAS FONTE: O autor (2020) 6 FARMACOLOGIA EXPERIMENTAL A farmacologia experimental é uma subdivisão da farmacologia voltada para experimentação de novos fármacos, com intuito de elucidar seus mecanismos farmacocinéticos e farmacodinâmicos. Para tal, o farmacologista lança mão de diversas ferramentas tecnológicas e conhecimentos multidisciplinares. Veremos mais à frente em nosso livro didático que, antes de se tornar um medicamento de fato, um fármaco deve ser testado sob diversas condições, para que gere seus efeitos terapêuticos dentro de dosagens seguras em que o benefício de suas aplicações sobreponha os riscos (SALOMONE, 2010). Para esta análise, conhecimentos de diversas áreas são aplicados pelo farmacologista, principalmente fisiologia, bioquímica e estatística (sim, matemática faz parte do cotidiano do farmacologista). Além disso, toda essa análise experimental dos fármacos é sistematicamente dividida em fase pré- clínica, que compõe estudos em softwares, células e animais, e fase clínica (fases I, II, III e IV), em que os testes são conduzidos em humanos (Figura 7). Um estudo TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 19 experimental de um determinado fármaco, desde sua primeira análise de relação estrutura atividade in silico, até sua chegada na forma de um medicamento nas gôndolas de uma farmácia, costuma demorar não menos que dez anos. Diante deste fato, fica evidente a complexidade desta subdivisão da farmacologia (SALOMONE, 2010). FIGURA 7 – AS FASES DE ESTUDO DE UM NOVO FÁRMACO PARA QUE SE TORNEM UM MEDICAMENTO: FASE PRÉ-CLÍNICA E FASE CLÍNICA FONTE: O autor (2020) 7 FARMACOLOGIA CLÍNICA A farmacologia clínica é a subdivisão onde o foco de atenção é o uso racional de medicamentos e otimização da terapia farmacológica para o paciente. Aqui, nesta subdivisão, busca-se analisar o efeito final do fármaco, já na forma de medicamento, sempre levando em consideração informações técnicas de farmacocinética e farmacodinâmica. O resultado da otimização da farmacoterapia é refletido em saúde para o paciente, além da diminuição do risco de intoxicações e efeitos indesejados causados por interações farmacológicas (RITTER, 2009). Perceba, caro acadêmico, que o uso racional de medicamentos, embora pareça algo simples e de fácil solução é, na realidade, um dos maiores problemas no que diz respeito ao uso de medicamentos no mundo. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais da metade de todos medicamentos são prescritos, dispensados ou vendidos de forma inadequada e que metade dos pacientes, quando em contato com estes medicamentos, não os utiliza da forma correta. Não é por acaso que o próprio Conselho Federal de Farmácia (CFF) fomente tanto o uso racional de medicamentos, visando à educação quanto aos cuidados com medicamentos e a saúde geral da população (BRASIL, 2015). 20 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA O dia 5 de maio, de todos os anos, é o Dia Nacional pelo Uso Racional de Medicamentos. A data foi criada para conscientizar as pessoas quanto os riscos que a automedicação pode acarretar a saúde. O objetivo da data é reforçar o papel do uso indiscriminado de medicamentos e a automedicação, sendo estas as principais responsáveis pelos altos índices de intoxicação por medicamentos. FONTE: <http://bit.ly/3oC951W>. Acesso em: 18 maio 2020. IMPORTANT E 8 ETNOFARMACOLOGIA Você já deve ter ouvido de algum conhecido, provavelmente mais velho, que chá de quebra pedra (Phyllanthus acutifolius) é bom para pedra nos rins. Ou que chá de pata de vaca (Bauhinia forficata) é bom para “o diabetes”. Ou ainda que, gargarejo com chá de malva (Malva sylvestris) é bom para amigdalite. Estes são conhecimentos populares que, muitas vezes embora apresentem de fato os efeitos relatados, não possuem pesquisas que comprovem cientificamente os relatos (PATWARDHAN, 2005). TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 21 O campo da etnofarmacologia é responsável por estudar o conhecimento popular de determinado grupo étnico ou social acerca de drogas vegetais, produtos naturais e demais remédios usados pela população. Como descrito no início do livro didático, o uso de plantas medicinais data de milhares de anos antes de Cristo, e no decorrer destes muitos anos, a humanidade aprendeu na prática o uso de certas substâncias, sem necessariamente o emprego da sistemática utilizada pela ciência moderna. A etnofarmacologia busca unir estes dois mundos: a tradição e a ciência, comprovando (ou não) a eficácia de terapias empregadas popularmente, ou ainda, isolando moléculas inovadoras de produtos naturais que podem servir como protótipos para futuros novos fármacos (PATWARDHAN, 2005). A etnofarmacologia é, em nosso país, uma grande fonte de publicações científicas abordando a medicina tradicional de comunidades indígenas, do serrado e quilombolas. A Journal of Ethnopharmacology é uma das revistas científicas internacionais que se propõe a publicar estudos nesta área. FONTE: <https://www.journals.elsevier.com/journal-of-ethnopharmacology>. Acesso em: 18 maio 2020. NOTA 22 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 9 TOXICOLOGIA Assim como a farmacologia é a ciência que estuda a relação dos fármacos com organismos vivos, a toxicologia estuda a relação de agentes tóxicos e venenos sobre estes mesmos organismos. As duas ciências são parentes próximas, e até pouco tempo atrás eram uma só, sendo a toxicologia considerada um braço da farmacologia até hoje. A necessidade da separação dos estudos veio com o aumento da população a agentes tóxicos no decorrer dos anos, processo acelerado pela Revolução Industrial e todos os processos de intoxicação ocupacional causado por estes. Além disso, a população mundial tem cada vez mais exposição a novos medicamentos e drogas de abuso, e agora que você, caro acadêmico, já sabe que um dos maiores problemas no que tange aos medicamentos é justamente seu uso de forma irracional, entenda que a toxicologia é responsável pelo estudo dos efeitos tóxicos destes. Paracelso já definia que “a diferença entre o remédio e o veneno reside na dose”, e hoje, uma das maiores causas por internações hospitalares relacionadas a intoxicações advém intoxicações causadas por medicamentos (GUNDERT-REMY et al., 2015). A toxicologia ainda pode ser dividida em várias subáreas, como a toxicologia clínica, experimental, ocupacional, forense, entre outras. A esta última subárea, a toxicologia forense, reside grande interesse dos acadêmicos. É nesta ciência em que se empregam conhecimentos multidisciplinares, como química analítica e farmacologia, para ajudar investigações médicas ou criminais acerca de mortes relacionadas ao abuso de drogas e envenenamentos (intencionais ou acidentais) (GUNDERT-REMY et al., 2015). Uma das áreas onde o farmacêutico irá atuar exercendo a farmacologia e toxicologia no seu cotidiano é com análises forenses. Atuando como Perito Criminal o farmacêutico trabalha principalmente em laboratórios que empregam rotinas analíticas processando vestígios que servem como provas para resolução de crimes. Para atuar como perito criminal é necessário a realização de concurso, podendo este ser de âmbito estadual ou federal. Ficou curioso? Acesse o link para saber mais sobre a profissão: https:// bioquimicabrasil.com/2019/02/17/analises-forenses/. NOTA TÓPICO 2 — SUBDIVISÕES DA FARMACOLOGIA 23 10 FARMACOEPIDEMIOLOGIA Embora raramente ensinada a profissionais da área de saúde, a farmacoepidemiologia é uma das subdivisões da farmacologia de grande importância. Podemos definir esta ciência, de forma simplificada, como a aplicação de métodos epidemiológicos para análisedos efeitos de medicamentos, incluindo vacinas e tratamento com biofármacos. Assim, esta ciência tem fortes laços científicos com a farmacologia clínica, sendo a principal diferença entre as duas o fato de que a farmacoepidemiologia não trata diretamente de um indivíduo, e sim de grandes populações, para gerar dados que guiem, muitas vezes, políticas de saúde pública (EVANS, 2012). 11 FARMACOECONOMIA Os estudos referentes à viabilidade econômica da produção, dispensação e implementação de medicamentos no mercado é responsabilidade da farmacoeco- nomia. Como já abordado em nosso livro didático, a indústria farmacêutica é uma das que mais geram receita anual e possui ainda perspectivas de só crescer nos próximos anos. Isso se dá, ao menos em parte, pelo envelhecimento populacional e consequente aparecimento de novas doenças. De forma geral, é correto afirmar então que medicamentos consomem grande parcela de recursos de um país, cau- sando um impacto considerável nas despesas totais de saúde. No caso do Brasil, especificamente, um dos desafios é manter o sistema único de saúde (SUS) em funcionamento, atendendo a toda a população no território nacional (que possui dimensões continentais), com recursos limitados. Assim, diferentes estudos farma- coeconômicos devem ser empregados, como: a minimização de custos, a análise do custo-utilidade, custo-benefício e custo-efetividade (PACKEISER; RESTA, 2014). 12 FARMACOGENÔMICA Com a evolução nos conhecimentos a respeito da genética que vem ocorrendo de forma exponencial com as ferramentas disponibilizadas pela biologia molecular, a farmacogenômica visa unir esta ciência a farmacologia, buscando responder de que forma os genes influenciam nas respostas individuais a determinados fármacos. Diferentes pessoas podem responder ao mesmo fármaco de heterogênea, e a farmacogenômica busca as respostas para esta diferença na informação genética de cada um. Diversas evidências embasam esta ciência e, até o momento, o polimorfismo genético de receptores ou das enzimas que metabolizam os fármacos parecem ser o maiores responsáveis por estas respostas heterógenas (ANEESH, 2009; RITTER et al., 2020). Em um mundo ideal, quem sabe em um futuro longínquo, as terapias farmacológicas poderiam ser direcionadas para cada indivíduo com base no seu genótipo. Problemas relacionados ao aparecimento de efeitos adversos seriam praticamente extintos. 24 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A farmacologia pode ser dividida em diversas subáreas para que cumpra com seus objetivos de estudo de fármacos a partir de diferentes perspectivas. Nestas subáreas podemos incluir: ○ Farmacologia básica: busca-se compreender integralmente os mecanismos de ação dos fármacos, bem como suas rotas metabólicas e forma de distribuição através dos compartimentos corpóreos, independente de aplicações clínicas para a substância em questão. ○ Farmacocinética: estuda “aquilo que nosso corpo faz com o fármaco”, ou seja, quais serão os fenômenos biológicos que nosso corpo irá realizar para absorver, distribuir, biotransformar e elimina o fármaco, uma vez que a substância não é um nutriente. ○ Farmacodinâmica: estuda “aquilo que o fármaco faz com o nosso corpo”, desta forma, refere-se aos efeitos propriamente ditos que o fármaco irá causar num determinado sistema biológico, mecanismo de ação e interações com elementos moleculares. ○ Farmacologia de sistemas: umas das formas de separar o estudo da farmacologia através do estudo de sistemas que compõe o organismo. Por exemplo: farmacologia do sistema nervoso central estuda justamente fármacos que agem de alguma forma sobre este sistema; ○ Farmacologia experimental: tem como objetivo a experimentação, através de diferentes ferramentas, de novos fármacos ou a aplicação de fármacos para doenças específicas em outras condições patológicas; ○ Farmacologia clínica: analisa o padrão de resposta farmacológica do paciente, visando otimizar a terapêutica e promover o uso racional de medicamentos, evitando eventos adversos a medicamentos; ○ Etnofarmacologia: o objetivo da etnofarmacologia é estudar o conhecimento popular de determinado grupo étnico ou social acerca de drogas vegetais, produtos naturais e demais remédios usados pela população; 25 ○ Toxicologia: a toxicologia estuda a relação de agentes tóxicos e venenos sobre sistemas biológicos vivos; ○ Farmacoepidemiologia: a junção entre a epidemiologia e a farmacologia clínica, nesta subárea o alvo de estudo são grandes populações, para gerar dados que guiem, muitas vezes, políticas de saúde pública; ○ Farmacoeconomia: estudos referentes a viabilidade econômica da produção, dispensação e implementação de medicamentos no mercado; ○ Farmacogenômica: busca nas informações genéticas dos indivíduos as respostas para diferenças e particularidades nas reações a farmacoterapia. 26 1 A farmacologia pode ser dividida em diferentes subdivisões. Estas subdivisões ajudam a organizar o conhecimento adquirido por esta ciência otimizando a atuação dos profissionais que empregam esta ciência no seu cotidiano. Dentre estas subdivisões, podemos destacar a farmacocinética. A respeito da farmacocinética, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) É a subdivisão da farmacologia que estuda a interação dos medicamentos com sítios ativo, ou seja, explana seus mecanismos de ação. b) ( ) Tem como foco principal compreender fenômenos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção. c) ( ) Estuda as melhores formas de tornar um fármaco economicamente viável para sua produção industrial. d) ( ) Emprega métodos analíticos de pesquisa para determinar os melhores excipientes a serem utilizados na fase pré-analítica do fármaco. e) ( ) Através de seus estudos chega à conclusão da eficácia terapêutica de remédios tradicionalmente utilizados por população. 2 Uma das subdivisões da farmacologia que recentemente tem tido destaque é a farmacoeconomia. Com a crescente expectativa de vida da população novas doenças têm surgido, e problemas com uso contínuo de medicamentos para doenças crônicas se tornam cada vez mais problemáticos para o sistema de saúde, seja ele público ou privado. A respeito da farmacoeconomia, defina quais são suas atribuições. 3 Relatos do uso de remédios e substâncias com atividade biológica são datadas de antes mesmo de Cristo. Além disso, é comum que diferentes comunidades espalhadas pelo globo façam uso de produtos naturais com finalidades terapêuticas. Qual é o ramo da farmacologia que estuda este uso tradicional de remédios e tenta comprovar se são de fato eficazes ou não? a) ( ) Farmcogenômica. b) ( ) Farmacologia experimental. c) ( ) Farmacologia de sistemas. d) ( ) Etnofarmacologia. e) ( ) Farmacologia básica. AUTOATIVIDADE 27 4 Uma das áreas de maior aplicação da farmacologia dentro de hospitais hoje é a farmacologia clínica. É comum que seja empregada para observar e relatar prováveis eventos adversos aos medicamentos e exige uma especialização do profissional que for exercer esta subdivisão da farmacologia. Quais são as atribuições da farmacologia clínica? 5 Espera-se que o uso de medicamentos no futuro seja específico para cada pessoa baseada no seu genótipo. Isto ajudaria muito a reduzir problemas relacionados à adesão terapêutica, além de otimizar a ação destes medicamentos. Qual é a subdivisão da farmacologia responsável por este tipo de desenvolvimento? a) ( ) Farmcogenômica. b) ( ) Farmacologia experimental. c) ( ) Farmacologia de sistemas. d) ( ) Etnofarmacologia. e) ( ) Farmacologia básica. 28 29 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, caro acadêmico, iremos abordar quais são os caminhos para que um novo fármaco seja desenvolvido. No primeiro tópico, deste livro didático, conversamos brevemente a respeito de grandes nomes da farmacologia, suas descobertas e contribuições para que a farmacologia chegasseaté aqui. Nos dias de hoje, a forma com que ensaios farmacológicos são conduzidos mudaram drasticamente. Imagine, por exemplo, que ensaios conduzidos por Paul Ehrlich, no século XIX, eram vagarosos, e conseguiam elucidar respostas a respeito de suas “balas mágicas”, uma a uma, frente a sistemas biológicos. Estes estudos levavam literalmente uma vida para apresentar respostas sobre uma ou duas moléculas. Não existem dúvidas de que a contribuição de todos os farmacologistas clássicos nos possibilitaram chegar até este momento na história da ciência, mas até mesmo as mentes mais brilhantes da época ficariam estarrecidos com a capacidade de pesquisa que a farmacologia ganhou. Adventos tecnológicos permitem que uma série de novas moléculas sejam testadas em questão de horas. Sistemas biológicos serão testados somente após softwares contendo algoritmos refinados apresentarem altas probabilidades de o fármaco em questão ser viável, ou seja, não apresentar toxicidade em concentrações acima daquelas necessárias para que o efeito terapêutico ocorra. A farmacologia, com o advento da indústria farmacêutica, tornou-se uma ciência passível de ser quantificada e, assim, a descoberta de novos fármacos passa por diversas fases, como em uma linha de produção, para que sejam lançados para o mercado. Neste tópico, nós discutiremos ensaios biológicos aplicados à ciência que estuda os fármacos, inicialmente discutindo modelos em softwares (in silico), na sequência modelos aplicados em células ou enzimas (in vitro) e modelos em animais (in vivo). Abordaremos, na sequência, os desafios científicos que existem nestes modelos para que seus resultados possam ser extrapolados para ensaios em humanos. Finalmente, neste tópico, discutiremos a respeito das fases que existem para que um fármaco seja testado em humanos e chegue até o mercado. 30 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA 2 FERRAMENTAS FARMACOLÓGICAS – O CAMINHO PARA UM NOVO FÁRMACO Para que um novo fármaco se torne de fato um medicamento, diversas etapas serão conduzidas pela indústria farmacêutica. Todas estas etapas visam a uma molécula que apresente efeito biológico promissor, com baixo potencial de toxicidade, mas também viabilidade econômica para produção em larga escala. Nada adianta para a indústria descobrir uma molécula inovadora para uma doença se o processo de produção industrial desta molécula não for viável, ou seja, gere um mínimo de receita. Além disso, estima-se que de cerca de 100 moléculas em potencial para se tornarem futuros medicamentos, somente um chegue à fase final de ensaios clínicos, e estes estudos, entre ensaios laboratoriais e processos burocráticos junto a agências reguladoras não costumam demorar menos que 10 anos (PANKEVICH et al., 2014; RITTER et al., 2020). Então, caro acadêmico, raciocine conosco, se de cada 100 moléculas apenas uma é aprovada, o que acontece com as outras 99? E todo o investimento que foi feito em estrutura laboratorial e mão de obra qualificada para pesquisa? Infelizmente, quando uma molécula não apresenta resultados promissores em algum estudo ela vai para biblioteca do laboratório que a descobriu e fica lá, até que seja utilizada novamente para alguma outra pesquisa comparativa, ou análise da relação de sua estrutura química com atividade. Na maioria das vezes estas moléculas servirão somente como base comparativa para outros estudos, e não irão tornar-se medicamentos. FIGURA 8 – ESTÁGIOS NO DESENVOLVIMENTO DE UM NOVO FÁRMACO E SUA RELAÇÃO COM TEMPO E QUANTIDADE DE MOLÉCULAS QUE SE TORNAM MEDICAMENTOS FONTE: Adaptado de RITTER et al. (2020, p. 751). É por este motivo que a indústria, na busca por novas moléculas, cos- tuma dividir suas pesquisas em diferentes etapas. Os estudos atualmente ini- ciam-se com uso de softwares simulando a interação de moléculas com alvos conhecidos. Na sequência, as moléculas com resultados promissores são testa- das em ensaios biológicos e aí, depois de todos os estudos, podem ser testadas em humanos. Vamos começar discutindo os ensaios in silico, ou seja, aqueles conduzidos em softwares. TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DE NOVOS FÁRMACOS 31 3 ENSAIOS IN SILICO – ALVOS VS COMPOSTOS Com os conhecimentos adquiridos pelas ciências, como a bioquímica, genética e a fisiologia, entende-se hoje a relação que existe entre a expressão de determinadas proteínas e funções biológicas, ou processos patológicos nos organismos. Além disso, já se encontram disponíveis no mercado uma série de medicamentos com diferentes efeitos biológicos e conhecimento profundo a respeito de suas interações moleculares (farmacocinética e farmacodinâmica). Com estas informações disponíveis em bancos de dados, tornou-se imprescindível no desenvolvimento de um novo fármaco a definição de qual será o seu alvo. Por exemplo, sabe-se que uma das vias biológicas que controlam os processos inflamatórios deriva da atividade das enzimas ciclooxigenases (COX) e suas isoformas (COX-1, COX-2 e COX-3). Com estudos no decorrer das últimas décadas a relação de inibição destas enzimas com anti-inflamatórios já disponíveis no mercado ficou clara. Nestes estudos, percebeu-se que alguns medicamentos inibiam todas as isoformas, o que acarretava o aparecimento de alguns efeitos adversos, principalmente problemas gástricos. Sabendo que, a isoforma COX-2 seria a com maior relação em processos inflamatórios, farmacologistas iniciaram pesquisas para desenvolver moléculas que fossem inibidoras seletivas desta isoforma, ou seja, inibiriam somente a COX-2, sem afetar a atividade biológica da COX-1. Desta forma foram desenhadas e lançadas as moléculas classificadas como Coxibes (Celecoxibe, Etoricoxibe, Parecoxibe, entre outros), que apresentam diferentes graus de seletividade para COX-2. Esta série de moléculas passou a apresentar outros eventos adversos a medicamentos após sua comercialização, veremos este assunto de forma mais específica no tópico sobre moléculas anti- inflamatórias (KUMMER; COELHO, 2002). Com a definição de um alvo específico para um novo fármaco, ferramen- tas de bioinformática são cada vez mais aplicadas para acessar a probabilidade desta molécula apresentar um bom efeito em sistemas biológico. Desta forma, uma série de moléculas que apresentam baixa probabilidade de gerar um efeito já são descartadas antes mesmo de serem testadas em sistemas biológicos (in vitro e in vivo). Como um programa de computador consegue identificar estas relações apenas com o desenho da molécula em questão? Os dados obtidos de experimentos com moléculas inovadoras e estruturas de receptores, ou outras proteínas alvo, são arquivados em diferentes bancos de dados on-line. Este é um esforço conjunto da comunidade científica para que novas moléculas possam ser geradas com maior facilidade e velocidade, evitando inclusive o uso desnecessário de testes in vivo (em animais). No quadro a seguir, encontram-se alguns bancos de dados disponíveis on-line para desenho de novas moléculas (Quadro 1). 32 UNIDADE 1 — INTRODUÇÃO À FARMACOLOGIA QUADRO 1 – BASES DE DADOS QUÍMICAS PARA DESENHO DE NOVAS MOLÉCULAS IN SILICO Nome URL ACD http://www.mdli.com/ CHemDB http://cdb.ics.uci.edu/ DrugBank http://www.drugbank.ca/ PubChem http://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/ LIGAND http://www.genome.jp/ligand/ WOMBAT http://www.sunsetmolecular.com/ ZINC http://zinc.docking.org/ FONTE: Adaptado de Bernardo e Tong (2012) Achou interessante a ferramenta in silico para desenvolvimento de novos fármacos? Que tal desenhar a molécula da figura ao lado (ácido acetilsalicílico) utilizando o site PubChem? Lá, além de definir o nome da molécula, todas as informações físico- químicas, farmacológicas e toxicológicas listadas para a estrutura em questão estão compiladas. E, caso a molécula seja inédita, o site ainda elenca moléculas similares que podem apresentar atividades semelhantes. Link: http://pubchem.ncbi.nlm.nih.gov/. INTERESSA NTE Os algoritmos executados por estes softwares são
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