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Gestão Educacional: Direção, Coordenação e Supervisão Eloiza da Silva Gomes de Oliveira Elma Correa de Lima Márcia Souto Maior Mourão Sá 2010 Todos os direitos reservados. IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482 • Batel 80730-200 • Curitiba • PR www.iesde.com.br © 2010 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais. 048 Oliveira, Eloiza da Silva Gomes de.; Lima, Elma Correa de.; Sá, Márcia Souto Maior Mourão / Gestão Educacional: Direção, Coordenação e Supervisão. / Eloisa da Silva Gomes de Oliveira ; Elma Correa de Lima ; Márcia Souto Maior Mourão Sá — Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2010. 104 p. ISBN: 978-85-387-1273-2 1. Administração da educação. 2. Gestão escolar. I. Título. CDD 370 Sumário Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) ............................................7 Introdução: gestor ou administrador? ......................................................................................................7 Teorias da Administração – evolução histórica e características .............................................................8 Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) ............................................19 Teorias modernas de gestão .....................................................................................................................19 Teorias emergentes de gestão ..................................................................................................................23 A escola como instituição aprendente: a busca da qualidade da educação ..........................31 Mudança institucional ..........................................................................................................35 Autoridade e poder do gestor escolar ...................................................................................45 A diferença entre governo e governamento .............................................................................................47 Poder e resistência ...................................................................................................................................47 A importância da crítica ...........................................................................................................................48 Gestão e autonomia da escola ..............................................................................................53 O Projeto Político-Pedagógico: o exercício de responsabilidade coletiva, criatividade e autonomia da escola ...............................................................55 Gestão escolar e políticas de educação ................................................................................61 A gestão colegiada e seus efeitos na escola .........................................................................69 As várias modalidades de gestão escolar .................................................................................................70 Formação e atuação da equipe técnico-pedagógica da escola .............................................79 Um perfil das atribuições específicas dos componentes da equipe técnico-pedagógica da escola ..........80 As atribuições gerais da equipe técnico-pedagógica da escola ..............................................................83 Equipe técnico-pedagógica da escola: quatro aspectos da missão institucional ......................................84 A coordenação da avaliação institucional da escola como atribuição do gestor ..................89 As competências do gestor escolar ..........................................................................................................89 Gestão escolar e avaliação de sistemas educacionais ..............................................................................90 Gestão escolar e avaliação institucional ..................................................................................................91 Referências ...........................................................................................................................97 Apresentação O livro de Gestão Educacional: Direção, Coordenação e Supervisão faz uma reflexão acerca do papel do gestor e sua atuação na prática pedagógica. Sendo assim, o livro está disposto em dez aulas, sendo que cada uma delas trará uma dimensão diferenciada acerca da gestão escolar, gerando um aprofundamento acerca dos temas. As duas primeiras aulas abordam aspectos das principais teorias da Administração a partir de um resgate histórico, bem como as possibilidades de sua aplicação à gestão escolar. São apresentados os con- ceitos da Administração, destacando as características que podem ser aplicadas nas teorias da gestão. A terceira aula descreve como a escola está avançando para adequar-se às demandas da socie- dade, modificando e adequando suas finalidades segundo os preceitos de qualidade na educação. O enfoque da aula seguinte consiste em discutir a importância da ocorrência de mudanças na estrutura, principalmente na organização escolar e cita, ainda, alguns níveis dessas mudanças que as escolas podem implementar em seu cotidiano. A aula cinco discute aspectos sobre autoridade e poder na concepção de importantes autores, articulando o papel do gestor escolar no que diz respeito a sua capacidade de liderança. A autonomia da escola é apresentada na aula seis, destacando qual o papel do Projeto Político-Pedagógico no exer- cício da responsabilidade coletiva e da autonomia da escola. A gestão escolar e as políticas da educação são temas discutidos na aula sete, que traz aspectos sobre a influência da globalização na educação e como estão dispostos os componentes curriculares nas etapas de ensino. A aula oito apresenta as diversas modalidades da gestão escolar, indicando as características de cada uma e destacando os aspectos positivos de sua aplicação. As duas últimas aulas discutem aspectos sobre a formação e as maneiras de atuação da equipe técnico-pedagógica na escola, trazendo o perfil das atribuições de cada membro da equipe. Finalizan- do com o destaque sobre o desenvolvimento das competências do gestor escolar, indicando que uma de suas atribuições está em elaborar e aplicar a avaliação institucional, produzindo mais qualidade para a educação. Portanto, pode-se perceber a importância da gestão escolar nas escolas. Identifica-se que o pa- pel do gestor é primar pelo trabalho em conjunto com sua equipe técnico-pedagógica na elaboração do projeto pedagógico, no exercício da autonomia e na aplicação da avaliação institucional, enfim, ações que tem por base a evolução gradativa da educação e valorização de seus profissionais. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) Introdução: gestor ou administrador? P ara iniciar a nossa aula, vamos conceituar os termos gestão e administração. Ambos têm origem latina (gerere e administrare). O primeiro termo (gerere) tem o sentido de governar, conduzir, dirigir. O segundo termo (administrare), tem um significado mais restrito – gerir um bem, de- fendendo os interesses daquele que o possui – constituindo-se em uma aplicação do gerir. Para outros autores, como Wittmann e Franco, no entanto “como uma instância inerente à prática educativa, que abrange o conjunto de normas/diretrizes e práticas/atividades que garantem, de um lado, o significado ou o sentido histórico do que se faz e, de outro lado, a unidade do conjunto na diversidade de sua con- cretização. A administração da educação engloba as políticas, o planejamento, a gestão e a avaliação da educação.” (1998, p. 27) Assim, entendida como uma ampla coordenação de esforços para realizar a implementação de po- líticas e planos, a Gestão passa a ser uma parte da administração. Sem pretender aprofundar essa polêmica, quando falamos em Gestão Escolar trata-se, numa visão atual,do conjunto de funções desempenhadas pelos “atores institucionais” da escola (ou seja, toda a comunidade escolar), com diferentes graus de complexidade e responsabilidade, coordenadas pela equipe técnico-pedagógica, encabeçada pelo diretor da escola. Já fica claro, portanto, que desvin- culamos da figura do diretor da escola todas as características de autoridade máxima, unipessoalidade, centralização, linha hierárquica, ênfase e relevo único – e às vezes onipotência – que lhe eram atribuí- das há alguns anos (em especial na década de 70). Na década de 80, com a redemocratização da sociedade brasileira, isso começa a ser questiona- do e a direção colegiada surge nas escolas – falaremos dela em uma próxima aula. O termo “Gestor”, amplamente utilizado na atualidade, amplia as competências exigidas deste profissional, demandando uma visão ampla, dinâmica e articulada, conjugando decisão e avaliação constantes. Seja qual for a concepção utilizada, entendemos que o conhecimento histórico das Teorias da Administração, aplicando-as à realidade escolar, é fundamental para a formação do gestor. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 8 Teorias da Administração – evolução histórica e características A feição do nosso curso pede que, em vez de apresentarmos uma sucessão de teorias, com seus vários autores de destaque, falemos de grandes paradigmas que dominaram o cenário da Administração, em ordem cronológica, discutindo- os brevemente e verificando, na próxima aula, alguns dos seus impactos no cená- rio da escola. Antes, porém, uma pergunta: Você sabe o que é um Paradigma? Kuhn (1992, p. 29) afirmou que paradigmas são “realizações reconhecidas durante algum tempo por uma comunidade científica específica, proporcionando os fundamentos para sua prática posterior”. Não é, portanto, um simples modelo, mas uma explicação da realidade em constante reformulação, buscando fazê-lo de forma cada vez mais clara e completa. É a evolução histórica de paradigmas que faz a Ciência evoluir. Então, vamos conhecer alguns desses paradigmas, expressos nas Teorias da Administração que lhes foram contemporâneas? Optamos por apresentar três grandes blocos históricos, como o fazem Ferreira et al. (2000). Embora eles se refiram à Administração de Empresas, podemos adaptar estes blocos teóricos à Gestão da Escola: Teorias tradicionais de Gestão; Teorias modernas de Gestão; Teorias emergentes de Gestão. Além do mais, a escola é uma organização e, como as demais, tem as carac- terísticas destacadas por Schein (1982): objetivos comuns, cujo atingimento é meta de todos os que transitam na organização; divisão de trabalho, por meio da diferenciação de funções; integração, por meio de um esquema de atribuições que define a esfera de responsabilidade de cada um; coordenação dos esforços e meios disponíveis, no sentido da ajuda mútua e do atingimento dos objetivos comuns. Aqui incide, fundamentalmente, a Gestão. Teorias tradicionais de gestão A origem deste conjunto teórico coincide com as enormes transformações trazidas pela Revolução Industrial. O aparecimento das fábricas fez surgir um primeiro paradigma, que defendia a produção racionalizada, a supervisão estreita Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 9 e contínua, a obediência hierarquicamente estruturada e a divisão de tarefas. Tais teorias tiveram enorme importância histórica e ganharam destaque até a década de 60. Sobre elas nos debruçaremos, nesta primeira aula sobre Teorias da Admi- nistração aplicadas à Gestão Escolar. No início do século XX, dois engenheiros desenvolveram trabalhos revolu- cionários em relação à Administração. Um deles era o americano Frederick Wins- low Taylor, criador da Escola de Administração Científica; o outro era o francês Henri Fayol, criador da Escola Clássica de Administração. Vamos conhecer um pouco da teoria de cada um? Taylor e a Administração Científica Nascido em 1856, na Filadélfia, Estados Unidos, a obra de Taylor é usual- mente dividida em duas partes. A primeira corresponde ao período de trabalho na empresa Midvale Steel, com estudos sobre a racionalização do trabalho dos operários, por meio do “estudo de tempos e movimentos”. Ele analisava deta- lhadamente as tarefas dos operários, decompondo-as nos menores movimentos e processos, aperfeiçoando-as e racionalizando-as. A segunda corresponde à publi- cação da obra clássica Princípios de Administração Científica (1911), em que afir- mava que a racionalização do trabalho operário deveria ser acompanhada de uma reestruturação geral da empresa, de acordo com os princípios por ele propostos. Criticava as empresas em três pontos: a vadiagem sistemática dos trabalha- dores, o desconhecimento pela gerência, das rotinas do trabalho desenvolvido e a falta de uniformidade das técnicas e métodos de trabalho. Assim Taylor falava da Administração Científica: a administração é uma Ciência que não encerra, necessariamente, invenção, nem desco- bertas de fatos novos ou surpreendentes. Consiste, entretanto, em certa combinação de elementos que não fora antes realizada, isto é, conhecimentos coletados, analisados, agru- pados e classificados, para efeito de leis e normas que constituem uma Ciência, seguida de completa mudança na atitude mental dos trabalhadores e da direção, quer reciprocamente, quer nas respectivas atribuições e responsabilidades... (1962, p. 126). Fica claro que, neste enfoque, a improvisação dá origem ao planejamento e o empirismo, à Ciência. O objetivo desta forma de administração seria contemplar a identidade de interesses entre patrão e empregado (o máximo de prosperidade), conjugando o baixo custo da produção, desejado pelo empregador, aos altos salá- rios, anseio dos empregados. Taylor separou as atividades de planejamento e supervisão (Administração) das atividades de execução (operários), propondo uma “Organização Racional do Trabalho” (ORT), cujos princípios eram: seleção científica do trabalhador: é necessário colocar o homem para de- sempenhar a tarefa mais adequada ao seu perfil de aptidões e interesses; estabelecimento de um tempo: padrão para a execução de cada tarefa, isto é obtido por meio da minuciosa análise do trabalho (desenho de car- gos e tarefas) e do estudo de tempo, movimentos e da fadiga humana; Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 10 plano de incentivos salariais: a remuneração do trabalhador deve ser com- patível com a sua produção, estabelecendo-se prêmios por produção; divisão do trabalho: cada tarefa deve ser dividida no maior número pos- sível de subtarefas, pois assim o trabalhador se especializará ao máximo, aumentando a eficiência da sua produção; supervisão funcional: também especializada – por áreas – a supervisão significa controle rígido do trabalho dos funcionários; padronização das tarefas com ênfase na eficiência: existe uma única ma- neira de executar uma tarefa (the best way) e ela deve ser descoberta e imposta aos trabalhadores; estabelecimento de boas condições físicas de trabalho: isto influi direta- mente na produtividade e na eficiência, em virtude do bem-estar físico e da diminuição da fadiga do trabalhador. Fica claro perceber que esta abordagem, embora revolucionária, sofreu inú- meras críticas. Procuramos sintetizá-las no quadro abaixo. Utilização da visão do Homo economicus: – visão estreita do homem como movido apenas por interesses econômicos, preguiçoso, limita- do e mesquinho, que precisa ser controlado por meio da racionaliza- ção de tarefas e do tempo, e vigiado pela supervisão. Enfoque mecanicista do homem: a organização de trabalho é vista como uma máquina, que deve funcionar de maneira ótima, o homem constitui-se, assim, apenas em uma engrenagem desta máquina, sen- do desvirtuado da sua condição humana. Exploração dos trabalhadores: a Administração Científica contribui para legitimar a exploração dos trabalhadores, enfatizando decisiva- menteos interesses dos patrões. Superespecialização do trabalhador: a fragmentação da tarefa reduz a demanda de qualificação do trabalhador, tornando o trabalho monóto- no e repetitivo e alienando cada vez mais o homem ao seu trabalho. Abordagem fechada: desconhece o ambiente da empresa (tanto inter- no quanto externo) e as influências que ele tem sobre todo o processo de produção. A Administração Científica de Taylor teve muitos seguidores, destacando- se Gilbreth, Gantt e Henry Ford, lançador do primeiro carro popular americano produzido em escala industrial (o Ford T, em 1908). Fayol e a Teoria Clássica da Administração Enquanto, nos Estados Unidos, Taylor desenvolvia os estudos da Adminis- tração Científica, centrada nas tarefas, o engenheiro francês Henri Fayol defendia princípios bastante semelhantes, mas com uma ênfase maior na estrutura. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 11 Segundo Chiavenato (1998, p. 87), a preocupação com a estrutura da organização como um todo constitui, sem dúvida, uma substancial ampliação do objeto de estudo da Teoria Geral da Administração (com relação à abordagem Taylorista das tarefas). Fayol, um engenheiro francês, partiu de uma aborda- gem sintética, global e universal da empresa, inaugurando uma abordagem anatômica e estrutural, que rapidamente suplantou a abordagem analítica e concreta de Taylor. Fayol postulou quatorze princípios gerais da Administração. Vejam como se assemelham, em muitos aspectos, às idéias enunciadas por Taylor. Divisão do trabalho: a especialização das tarefas e das pessoas conduz a uma maior eficiência e ao aumento da produtividade. Autoridade e responsabilidade: o direito de dar ordens e ser obedecido (autoridade) pertence aos supervisores, enquanto a obrigação de obede- cer compete aos trabalhadores de escalões hierarquicamente inferiores. Existe uma reciprocidade, pois quanto maior é a autoridade, maior a res- ponsabilidade. Disciplina: existe a necessidade da existência de normas de conduta e de trabalho, válidas para todos os trabalhadores, que devem ser obedecidas, para que a empresa não mergulhe no caos. Unidade de comando: é necessário que o trabalhador receba ordens de uma autoridade única, evitando a existência de contra-ordens. Unidade de direção: deve haver a aplicação de um plano único para cada grupo de atividades com os mesmos objetivos. Prevalência dos interesses gerais: deve haver a subordinação dos interes- ses individuais aos interesses coletivos. Remuneração de pessoal: deve ser justa, para garantir a satisfação dos empregados e da organização. Centralização: deve haver a concentração da autoridade nas funções mais elevadas da organização. Cadeia escalar ou hierarquia: a linha de autoridade deve estabelecer-se do nível mais alto ao mais baixo da estrutura hierárquica. Ordem: mantida em toda a organização, deve ser material e humana “um lugar para cada coisa ou pessoa e cada coisa ou pessoa em seu lugar”. Eqüidade: na empresa deve prevalecer a justiça, pois esta traz a lealdade dos empregados; Estabilidade e duração do pessoal: quanto mais tempo as pessoas forem mantidas em seus cargos, melhor, pois a rotação (turn over) possui efeito negativo. Iniciativa: deve-se estabelecer um plano e cumpri-lo, assegurando o seu sucesso. Espírito de equipe (sprit de corps): a comunicação entre as equipes deve ser facilitada, garantindo um clima organizacional de harmonia e união. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 12 Coube a Fayol enunciar as funções da gerência administrativa, como ele mes- mo chamou. Elas possuem bastante atualidade embora, como já dissemos, a década de 80 tenha trazido profundas mudanças no que concerne às funções do gestor. São cinco essas funções, a saber: planejar ou prever – estabelecer os objetivos e as formas de consecução dos mesmos, visualizando o futuro e traçando os programas de ação; organizar – coordenar todos os recursos da organização, em função dos objetivos definidos; comandar – fazer com que as pessoas executem as tarefas que lhes são atribuídas, respeitando a hierarquia existente; coordenar – articulação de atitudes e esforços de toda a organização, tendo em vista os objetivos traçados; controlar – estabelecer padrões e medidas de desempenho que permitam verificar que tudo ocorra de acordo com as regras estabelecidas e com as ordens dadas. Henri Fayol também teve seguidores, como Elton Mayo, Argirys e Likert. Da mesma forma que a Administração Científica, a Teoria Clássica recebeu críticas bastante pertinentes: obsessão pelo comando – a visão da organização pela ótica gerencial levou à centralização no comando, na autoridade e na responsabilidade; empresa como sistema fechado – trata-se da mesma crítica atribuída a Taylor, por desconhecer o contexto interno e externo à organização, o que inviabilizaria qualquer planejamento; manipulação dos trabalhadores – é outra crítica comum à Administração Científica e à Teoria Clássica, a tendenciosidade favorável aos patrões. Elton Mayo e a Escola de Relações Humanas Os estudos de Kurt Lewin sobre o comportamento dos grupos sociais e as experiências realizadas por Elton Mayo e sua equipe na fábrica da Western Elec- tric Company (Hawthorne, Chicago) marcaram, na década de 1930, o início da preocupação com o fator humano na administração. Ao tentar determinar a relação existente entre a intensidade da iluminação e a eficiência dos operários (produtividade), Elton Mayo desmentiu alguns pres- supostos da Administração Científica e estudou as relações entre a organização informal dos operários e a organização formal da fábrica. As conclusões do ex- perimento definiram os princípios da chamada “Escola de Relações Humanas” da Administração. São eles: nível de produção como resultante da integração social – o nível de com- petência e eficiência do trabalhador é estabelecido pela capacidade so- cial do trabalhador e não pela sua capacidade de executar movimentos eficientes dentro de um tempo previamente estabelecido. O homem não Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 13 age individualmente, mas integrado socialmente ao grupo de trabalho, e isto amplia a sua disposição para o mesmo. A Teoria Clássica não perce- beu que não são os trabalhadores que definem sua capacidade máxima de produção, mas os grupos com os quais eles estabelecem interação. Des- vios de comportamento do indivíduo provocam retaliações simbólicas, por parte do grupo do qual faz parte; recompensas e sanções sociais – as pessoas são avaliadas pelos grupos de que participam, de acordo com normas que o próprio grupo cria para si. São consideradas boas companheiras e colegas, se o seu comporta- mento se ajusta a essas normas e padrões de comportamento e são avalia- das como más, se o seu comportamento transgride tais normas e padrões. Embora essas recompensas sejam simbólicas e não-materiais, influen- ciam fortemente a motivação e a felicidade do trabalhador. Grupos informais – a empresa passou a ser concebida como uma organi- zação social composta por grupos sociais informais, cuja estrutura nem sempre coincide com a organização formal da empresa. Esses grupos informais constituem a organização humana da empresa, muitas vezes em contraposição à organização formal estabelecida pela direção. Os grupos informais definem as suas regras de comportamento, as formas de recompensas ou sanções sociais, seus objetivos, sua escala de valores sociais, crenças e expectativas, que cada participante vai assimilando e integrando às suas atitudes e comportamentos. Relações humanas – para explicar e justificar o comportamento das pes- soas na organização, a Teoria das Relações Humanas estudou as intera- ções sociais surgidas dentro da mesma, em face do grande número de grupos e de interações necessariamente resultantes; a compreensão da natureza dessas relações humanas permite ao administrador obter melho-res resultados de seus subordinados. A importância do conteúdo do trabalho – a maior especialização (e frag- mentação) do trabalho não é a forma mais eficiente de divisão desse trabalho, pois não cria, necessariamente, a organização mais eficiente. O conteúdo e a natureza do trabalho têm enorme influência sobre o moral do trabalhador. Ênfase nos aspectos emocionais – os teóricos das Relações Humanas atri- buem grande atenção aos aspectos emocionais do comportamento humano. Participação nas decisões – embora dependa da situação envolvida e da posição na estrutura hierárquica, a participação de todos os trabalhadores no processo decisório da organização estimula a produtividade e a inicia- tiva dos mesmos. Alguns teóricos importantes das Relações Humanas são Sheldon, Marrow, Tead e Follett. Sistematizando as principais críticas sofridas por este enfoque temos: Negação do conflito entre o trabalhador e a empresa – a teoria superfi- Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 14 cializa o tratamento do problema negando a existência de conflitos que surgem da diferença das metas e objetivos da empresa e do trabalhador. Ausência de critérios inovadores de gestão – falta a esta teoria a indica- ção de estratégias para o alcance de melhores resultados para a empresa e para o trabalhador. Excesso de ênfase nos grupos informais – este enfoque trata como ilimi- tada a influência dos grupos, supervalorizando-as. Concepção utópica do trabalhador – apresenta uma visão idealizada do trabalhador (plenamente satisfeito e integrado ao ambiente de trabalho). Restrição das variáveis e da amostra – esta teoria trabalhou com poucas variáveis e com uma pequena amostra de organizações, o que torna os seus resultados discutíveis. Estabelecimento de procedimentos de “espionagem“ – a abertura de um espaço para a participação dos trabalhadores foi utilizada, com freqüên- cia, como uma forma de saber das idéias e insatisfações dos trabalhado- res, para uso da administração. As Teorias X e Y de McGregor Chegamos, nesta viagem cronológica, à década de 30. Douglas McGregor, insatisfeito com a inadequação do modelo de relações humanas à realidade em- presarial e influenciado pela Teoria Comportamental – ou Behaviorismo – focou seus estudos na relação entre o sucesso de uma organização e a capacidade que ela tem para prever e controlar o comportamento. Ele construiu duas teorias constrastantes: a Teoria X, em que a autoridade determina a direção e o controle, e que ele considera inadequada, e a Teoria Y, em que é a integração que legitima a autoridade e busca-se a integração entre os objetivos pessoais e os organizacionais. O quadro abaixo, adaptado de Ferreira et al (2000, p.44), estabelece uma comparação entre os dois modelos propostos por McGregor: Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 15 Teoria X Concepção tradicional de direção e controle Teoria Y Integração entre objetivos pessoais e organizacionais As pessoas são preguiçosas e indolentes, têm aversão natural ao trabalho. As pessoas são esforçadas e gostam de ter o que fazer. As pessoas evitam o trabalho. O trabalho é uma atividade tão natural quanto brincar ou descansar. As pessoas evitam a responsabilidade a fim de se sentirem mais seguras. As pessoas procuram e aceitam responsabilidades e desafios. As pessoas precisam ser controladas e dirigidas, coagidas, para que trabalhem. As pessoas podem ser automotivadas e autodirigidas, em relação aos objetivos que pretendem. As pessoas são ingênuas e sem iniciativa. As pessoas são criativas e competentes. A participação dos trabalhadores é um instrumento de manipulação dos mesmos. A participação dos trabalhadores é uma forma de valorização das suas potencialidades. O ser humano é carente e se esforça para satisfazer uma hierarquia de necessidades. O compromisso com um objetivo depende das recompensas associadas à sua consecução. O líder assume um estilo autocrático. O líder assume um estilo participativo. A Teoria Y desenvolve um estilo de administração muito aberto e dinâmico, extremamente democrático, por meio do qual administrar é um processo de criar oportunidades, liberar potenciais, remover obstáculos, encorajar o crescimento individual e proporcionar orientação quanto a objetivos. Segundo McGregor, a teoria Y é geralmente aplicada nas empresas com um estilo de direção baseado em uma série de medidas inovadoras e humanistas, dentre as quais salienta as seguintes: Descentralização das decisões e delegação de responsabilidades. Ampliação das funções inerentes a cada cargo, para atribuir maior signi- ficado ao trabalho. Participação nas decisões mais altas e administração consultiva. Auto-avaliação do desempenho do trabalhador. Teoria Sistêmica Não poderíamos encerrar esta nossa aula, sobre as Teorias Tradicionais da Gestão, sem falar da Teoria Sistêmica. A Teoria Sistêmica, que teve destaque na década de 60, parte do estabele- cimento de um paralelo entre os organismos vivos e as organizações. Trata-se de uma teoria interdisciplinar, elaborada inicialmente pelo biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy, buscando transcender os problemas exclusivos de cada ciência e proporcionar princípios e modelos gerais para todas as ciências envolvidas, de modo que as descobertas efetuadas em cada ciência pudessem ser utilizadas pelas demais. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 16 Os sistemas podem ser fechados ou abertos. Sistemas fechados: são os sistemas que não apresentam intercâmbio com o meio ambiente que os circunda, pois são herméticos a qualquer influ- ência ambiental. Sistemas abertos: são os sistemas que apresentam relações de intercâm- bio com o ambiente, através de entradas e saídas. As organizações são sistemas do segundo tipo e compostas por cinco parâ- metros: a) Entrada, insumo ou impulso (input) – é o conjunto de insumos que o sistema extrai do ambiente fornecendo o material ou energia para a ope- ração do sistema. b) Saída, produto ou resultado (output) – são os produtos, serviços ou informações que o sistema retorna ao ambiente, como resultado do pro- cessamento. c) Processamento – competências, procedimentos e tecnologia emprega- dos pela organização para a transformação do input; d) Retroação, retroalimentação ou retroinformação (feedback) – retor- no das informações para alimentar o sistema. e) Ambiente – é o meio que envolve externamente o sistema. O sistema aberto recebe entradas do ambiente, processa-as e efetua saídas nova- mente ao ambiente, de tal forma que existe entre ambos – sistema e am- biente – uma constante interação. A Teoria de Sistemas baseia-se no conceito do “homem funcional”, que de- sempenha um papel dentro das organizações, relacionando-se com os demais in- divíduos como um sistema aberto. A perspectiva sistêmica trouxe uma nova maneira de ver as coisas, não so- mente em termos de abrangência, mas principalmente quanto ao enfoque do todo e das partes, do dentro e do fora, do total e da especialização, da integração inter- na e da adaptação externa, da eficiência e da eficácia. Esta visão gestáltica e global das coisas privilegia a totalidade e as suas partes componentes, sem desprezar o que chamamos de emergente sistêmico (as propriedades do todo que não apare- cem em nenhuma de suas partes). Viram, meus alunos, quantas teorias ligadas ao nosso primeiro paradigma? Antes de concluirmos a nossa aula, porém, vamos responder a uma pergun- ta que os alunos sempre fazem, quando tratamos de Teorias da Administração: O que é burocracia? Na linguagem corrente, burocracia é sinônimo de emperramento, de lenti- dão no processo administrativo. Na sua origem, no entanto, o significado era com- pletamente diferente. A burocracia constitui uma forma de associação humana que se baseia na racionalidade, ou seja, na adequação dos meios aos fins, para se alcançar com a máxima eficiência os objetivos de umaorganização. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 17 Historicamente, a “ideologia da burocracia” nasceu de um novo conjunto de normas de comportamento e produção, que Max Weber denominou de “ética protes- tante”: trabalho duro, ascetismo, poupança e objetividade (sem vaidade). Essas idéias surgiram junto com o capitalismo, principalmente na Holanda e na Inglaterra. Os princípios da burocracia incluem a visão do “homem funcional” (flexí- vel ao desempenho de vários papéis simultâneos na organização); racionalização, com economia de esforços; divisão do trabalho e hierarquia; promoção e seleção por competência técnica; separação entre propriedade e administração; e indese- jabilidade das organizações informais, porque imprevistas e pouco racionais. O modelo burocrático de organização, quando aplicado de forma correta, mostrou- se bastante adequado, pois facilita a supervisão do trabalhador, previamente in- formado sobre a tarefa e sobre a expectativa em relação ao seu desempenho. Segundo Ferreira et al (2000, p.37): Provavelmente nada revoltaria mais os defensores da verdadeira burocracia, do que prever que seus pressupostos seriam tão amplamente deturpados. Afinal, a defesa do desempe- nho das tarefas da forma mais poupadora possível de esforços não é muito compatível com a visão que se faz hoje de uma organização burocratizada. Afinal, os princípios da burocracia defendem o cumprimento dos objetivos organizacionais de forma não apenas eficaz, mas eficiente. Terminamos aqui a primeira parte da nossa aula. Daremos continuidade com a abordagem dos outros dois paradigmas de que falamos no início: as Teorias Modernas e as Teorias Emergentes de Gestão. Estabeleceremos também algumas aplicações das teorias estudadas, à ges- tão escolar. 1. Vocês viram as Teorias X e Y das organizações, elaboradas por McGregor. Imagine duas escolas, X e Y, cada uma baseada em uma dessas teorias. Escreva as característi- cas que você atribuiu a cada escola. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 1) 18 Agora fale um pouco do trabalho do gestor de cada uma destas escolas, focalizando as princi- pais dificuldades encontradas pelos dois. 2. A charge a seguir ilustra criticamente os aspectos negativos que o termo burocracia ganhou, ao longo da história. IE SD E B ra si l S .A . Qual é a sua opinião sobre isto? Existe uma “escola burocrática”? Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) N a aula anterior, conversamos sobre três teorias pertencentes ao primeiro paradigma: as Teo-rias Tradicionais de Gestão. Estão lembrados? Apresentamos a vocês a Administração Cien-tífica, de Frederick Winslow Taylor, a Teoria Clássica da Administração, de Henri Fayol, a Escola de Relações Humanas, de Elton Mayo, as Teorias X e Y de McGregor e a Teoria Sistêmica. Conversamos, ainda, sobre a burocracia, e sobre o fato do seu sentido inicial ter sido muito modifica- do ao longo do tempo. Nesta aula vamos abordar os outros dois paradigmas: as Teorias Modernas e as Teorias Emergentes de Gestão. São mais recentes, datando da década de 50, e bastante presentes na administração atual. Teorias modernas de gestão Este corpo teórico ganhou tal complexidade, que não estamos tratando mais de modelos de organização – com a sua conseqüente forma de gestão – mas de conhecimentos consistentes e muito abrangentes, envolvendo aspectos técnicos, humanos e estratégicos das organizações. Muitos tomam por marco inicial desta fase a publicação da obra A Prática da Administração de Empresas, de Peter Drucker, em 1954. Ela inaugura um novo aporte teórico: a Administração por Objetivos. Administração por objetivos (APO) A APO tem sete princípios fundamentais: Mudanças ambientais – provocam intensa necessidade de mudanças não só na organiza- ção, mas também no comportamento dos gestores. Definição e multiplicidade dos objetivos – talvez o mais importante princípio, determina que os objetivos da organização devem ser ampliados, claramente identificados e conhecidos por todos os envolvidos no processo. Devem ter, além do mais, definidas claramente as suas formas de medida e avaliação. Criação de oportunidades – considera a gestão como uma tarefa criativa, e não apenas adaptada ao que já existe e está definido. Desenvolvimento pessoal – enfatiza a ampliação e o aprimoramento dos recursos humanos da empresa. Descentralização administrativa – promove o aperfeiçoamento da organização, mas deve partir de uma rigorosa avaliação diagnóstica. Autocontrole – “um dos maiores benefícios da administração por objetivos foi o fato de ela Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 20 ter permitido substituir a administração através da dominação pela admi- nistração através do autocontrole.” (DRUCKER, 1981, p. 123-124). Autoridade e liderança – a gerência não é o único grupo de liderança, pois ela deve ser descentralizada. Embora bastante rica, a Administração por Objetivos foi muito criticada pela falta de embasamento experimental e por desconsiderar que existe um confli- to fundamental entre os objetivos do trabalhador e da organização. Administração contingencial Surgiu como um aprofundamento dos estudos sobre a Teoria Sistêmica, que vimos na aula anterior. A palavra contingência significa algo incerto ou eventual, que pode suceder ou não. A abordagem contingencial enfatiza que não é possível atingir a eficácia organizacional seguindo um único e exclusivo modelo organi- zacional, ou seja, não existe uma forma única para alcançar os objetivos altamente variados das organizações, inseridas em um ambiente também altamente variado. Recentes estudos sobre as organizações complexas levaram a uma nova perspectiva teórica: a estrutura de uma organização e seu funcionamento são de- pendentes da interface com o ambiente externo. A mais notável contribuição da abordagem contingencial consiste em ve- rificar as variáveis que produzem maior impacto sobre a organização, como o ambiente e a tecnologia, para então predizer as diferenças produzidas na estrutura e no funcionamento das organizações. Esta abordagem marca uma nova etapa no estudo da administração das organizações, assumindo uma abordagem eclética, comparando as demais teorias administrativas existentes à luz dessas variáveis e aplicando seus diversos princípios em cada situação específica da organização. Algumas dessas variáveis são: a) relativas ao ambiente geral (o macroambiente, ou seja, o ambiente gené- rico e comum a todas as organizações): condições tecnológicas; condições econômicas; condições políticas; condições legais; condições demográficas; condições ecológicas; condições culturais. b) relativas ao ambiente da tarefa (o ambiente mais próximo e imediato de cada organização): fornecedores de entradas; clientes ou usuários; Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 21 concorrentes; entidades reguladoras. Talvez o seu maior mérito seja tratar-se de uma abordagem eclética e inte- grativa, absorvendo conceitos das diversas teorias administrativas, ampliando ho- rizontes e mostrando que nada é absoluto. Alguns a criticam por não ter atingido um desenvolvimento que a diferencie verdadeiramente da Teoria Sistêmica. Administração estratégica Quem de nós nunca ouviu falar em planejamento estratégico? Ele surgiu na década de 60, e tomou de assalto o cenário da administração na década de 80. É um processo de planejamento de longo alcance, formalizado, próprio para a defi- nição e a consecução dos objetivos organizacionais. A Administração Estratégica é um processo contínuo e interativo, voltado para a manutenção da organização como um todo, integrado apropriadamente ao seu ambiente. Envolve a realização de uma análise do ambiente, o estabelecimen- to de diretrizes organizacionais, a formulação de estratégias organizacionais, a implementação das mesmas e a aplicação do controle estratégico.Nunca é demais lembrar que os planejamentos estratégico, administrativo e operacional devem ser integrados, e que o gestor deve ter papel ativo em todos eles. O planejamento estratégico de uma organização envolve nove etapas: definição dos objetivos; identificação dos objetivos e das estratégias atuais; análise do ambiente; análise dos recursos disponíveis; identificação das oportunidades e das ameaças à organização; definição do grau de mudança necessário; escolha da estratégia a ser utilizada; implantação da estratégia; mensuração e controle dos resultados obtidos. As críticas mais freqüentes a essa teoria referem-se à dificuldade da pre- visão de estratégias a mais longo prazo, em um ambiente que normalmente se apresenta turbulento e em constante mudança, e às dificuldades no processo de estabelecimento de uma cultura organizacional e de competências para a realiza- ção do planejamento estratégico. Administração participativa A participação dos trabalhadores nas decisões da empresa vem sendo um ponto extremamente discutido nas últimas duas décadas. Este modelo de adminis- Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 22 tração consolidou-se como um catalisador da produtividade e do avanço tecnoló- gico de alguns países orientais. Uma boa definição deste tipo de administração é dada por Maximiano (1995, p. 19-20): A administração participativa é uma filosofia ou política de administração de pessoas, que valoriza sua capacidade de tomar decisões e resolver problemas. A administração parti- cipativa aprimora a satisfação e a motivação no trabalho. A administração participativa contribui para o melhor desempenho e a competitividade das organizações. A administração participativa tem como objetivos, segundo Mendonça (1987): ampliar a responsabilidade social das empresas; equilibrar os interesses dos vários setores envolvidos; desenvolver uma cultura organizacional democrática; reduzir a alienação; utilizar totalmente o potencial humano; diminuir os conflitos, estimulando a cooperação; aumentar a satisfação das pessoas; obter maior competitividade da organização. A participação pode ser de dois tipos: a) Participação direta – dirigida à pessoa, considerada individualmente, em um estilo de gerência participativa. b) Participação indireta – neste caso, a participação se dá por meio de re- presentantes escolhidos pelos trabalhadores dos diversos setores da em- presa. Pode assumir várias modalidades: comitês, negociações coletivas, co-gestão, até a autogestão, forma plena de exercício coletivo do poder. Sobre a Administração Participativa incidem críticas relativas à acomodação provocada nos trabalhadores, à possibilidade de manipulação por parte dos patrões e à dificuldade da criação de uma cultura propícia para a sua implementação. Administração japonesa Fortemente alicerçada na participação direta dos trabalhadores, esse mode- lo tomou conta do cenário da administração na década de 70. A preocupação com a qualidade fez com que os programas e iniciativas que visavam a busca da “quali- dade total” virassem moda, muitas vezes sem o cuidado da adaptação necessária, pois haviam sido gerados em um contexto cultural bastante diferente do nosso. Além da administração participativa e da preocupação com a qualidade to- tal, em relação a qual é referência a obra de Ishikawa (1981), são características da Administração Japonesa: a ênfase no planejamento estratégico; a visão sistêmica; Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 23 a supremacia do coletivo sobre os objetivos individuai; a busca intensiva da produtividade; a flexibilidade dos planos e estratégias; o incentivo ao aprimoramento dos recursos humanos e ao trabalho em grupo; a sofisticação tecnológica; a busca da padronização no trabalho; o uso constante de mecanismos de manutenção, limpeza e arrumação do ambiente de trabalho; o estabelecimento de uma cultura organizacional de confiança e respon- sabilidade. As críticas incidem, no caso da Administração Japonesa, sobre alguns pon- tos bem-definidos: a dificuldade da adaptação às culturas ocidentais; a dependência da cooperação quase irrestrita das pessoas, o que normal- mente não se obtém na empresa; o risco de cair na lentidão e na burocratização dos processos decisórios; a dificuldade do desenvolvimento de processos administrativos eficientes, para apoiar a produção; o estabelecimento de uma visão “romântica” da administração; e os resultados recessivos que vêm sendo obtidos pelos países orientais que têm utilizado essa forma de administração. Teorias emergentes de gestão Trata-se do paradigma mais recente, correspondente às duas últimas déca- das, e que, em alguns casos, ainda se encontra mais no universo das pesquisas sobre administração do que na prática cotidiana das empresas. Merece destaque a influência, sobre ele, do enorme desenvolvimento tecnológico, vivenciado pela humanidade neste período. Costuma-se tomar como marco referencial deste para- digma a publicação, em 1982, da obra O Ponto de Mutação, de Fritjof Capra, que preconizava o Holismo ou Totalidade na Ciência. Reengenharia A velocidade com que as tecnologias de informação se desenvolveram, pro- vocou a necessidade de adaptações aceleradas da empresa ao ambiente. Para Hammer e Champy (1994, p. 21-22), reengenharia consiste em: ... abandonar procedimentos consagrados e reexaminar o trabalho necessário para criar os produtos e serviços de uma empresa e proporcionar valor aos clientes. (...) é o repensar Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 24 fundamental e a reestruturação radical dos processos empresariais, que visam alcançar drásticas melhorias em indicadores críticos e contemporâneos de desempenho, tais como custos, qualidade, atendimento e velocidade. O próprio termo (reengineering) significa “começar de novo”, mostrando que consiste em uma mudança radical, buscando resultados organizacionais visí- veis e drásticos. Segundo Abreu (1994), a Reengenharia é implementada em quatro fases: Estratégia: elaboração do planejamento estratégico da empresa, consi- derando as condições e os recursos existentes. Ativação: ênfase nos ganhos obtidos com a reengenharia dos processos (em termos de melhoria da qualidade, incremento da produtividade e redução dos custos). Melhoria: é o momento da agregação de valor aos processos e aos ser- viços oferecidos, pela empresa, aos clientes. Redefinição: formação de novas unidades de negócios / serviços, em fun- ção da reengenharia. Entre as mudanças profundas provocadas pela reengenharia, podemos citar como exemplos: os papéis dos trabalhadores ganham maior autonomia; o enfoque de mero treinamento para as tarefas, muda para educação; as estruturas da organi- zação mudam de hierárquicas para niveladas; os gerentes mudam de supervisores para capacitadores; os critérios de promoção mudam de desempenho para habili- dade ou competência. (FERREIRA et al, 1997, p. 213). Tudo acaba, portanto, na construção coletiva de uma “cultura empreende- dora”. É justamente sobre a dificuldade de se chegar a esta cultura, que incidem críticas à Reengenharia. Outras críticas se voltam para a radicalidade das mudan- ças exigidas por ela e para as demissões realizadas. Administração virtual Este modelo revolucionário está ligado à verdadeira “revolução da informa- ção”, ocorrida nos anos 90. A Administração Virtual é realizada por pessoas reais, que dominam a in- formação em tempo real e estabelecem relacionamentos confiáveis. Requer uma preparação mais aprimorada dos trabalhadores e o entendimento de que o contro- le não deixa de existir, apenas muda de configuração (realiza-se on-line). Ferreira et al (1997, p. 205) dizem, sobre a Administração Virtual: “A virtu- alidade deve ser entendida sob pelo menos dois pontos de vista distintos. O cliente percebe como um atendimento instantâneo aos seus desejos. Aempresa parece existir a qualquer hora, em qualquer lugar, potencialmente pronta para atendê-lo.” Essa forma de administrar sofre três críticas principais: o aumento do stress das pessoas, pela rapidez com que as coisas acontecem, a tendência à impessoali- dade das relações e a desvalorização do trabalho humano. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 25 Bem, apresentados os três grandes paradigmas teóricos – Teorias Tradi- cionais, Modernas e Emergentes de Gestão – vamos situar algumas aplicações das mesmas à gestão escolar. Vocês devem estar lembrados que, na aula anterior, afirmamos que a escola também é uma organização. Há, portanto, características que aproximam a gestão escolar da administração das empresas. Não vamos fazer uma correspondência unívoca entre cada uma das doze escolas de Administração que apresentamos e a evolução da gestão na instituição escolar. Podemos, no entanto, traçar algumas analogias entre os três grandes para- digmas – Administração Tradicional, Moderna e Emergente – e os seus impactos nos processos gestionários da escola. Comecemos com uma situação histórica dos paradigmas e das escolas que abordamos, para que vocês se situem. Teorias Tradicionais de Gestão Teorias Modernas de Gestão Teorias Emergentes de Gestão *1911 *1954 *1982 Publicação de Princípios de Administração Científica (Taylor) Publicação de A Prática da Administração de Empresas (Drucker) Publicação de O Ponto de Mutação (Capra) a) Adm. Científica b) Teoria Clássica da Administração c) Escola de Relações Humanas d) Teorias X e Y e) Teoria Sistêmica a) Adm. por Objetivos b) Adm. Contingencial c) Adm. Estratégica d) Adm. Participativa e) Adm. Japonesa a) Reengenharia b) Adm. Virtual Assim como temos um paradigma tradicional nas Teorias da Administra- ção, temos um modelo pedagógico tradicional, que exige um perfil de gestão e ações correspondentes, que a ele se associam. Se observarmos com atenção a conceituação do papel do diretor de escola enunciado por Luck (1998, p. 16-17), veremos claramente a centralização hierár- quica de autoridade e de decisão, características de uma abordagem tradicional. É do diretor da escola a responsabilidade máxima quanto à consecução eficaz da política educacional do sistema e desenvolvimento pleno dos objetivos educacionais, organizan- do, dinamizando e coordenando todos os esforços nesse sentido, e controlando todos os recursos para tal. Devido à sua posição central na escola, o desempenho de seu papel exerce forte influência (tanto positiva como negativa) sobre todos os setores e pessoas da escola. E do seu desempenho e de sua habilidade em influenciar o ambiente que depende, em grande parte, da qualidade do ambiente e clima escolar, do desempenho do seu pessoal e da qualidade do processo ensino-aprendizagem. Tomemos como ilustração os relatos de professores, sobre um fato bastante comum: a ação de controle do diretor da escola, ao exigir os planos de aulas dos professores, para examinar e avaliar. Enquanto em algumas escolas os diretores utilizavam essa prática de forma autoritária e até arbitrária, em outras o diretor tentava orientar e subsidiar os professores, para o aprimoramento das aulas. Estas e outras práticas provocaram muitas críticas como a de Antunes (2003), que indaga em um artigo: “Você trabalha em uma grande ou pequena escola?”. O autor apresenta o seguinte ponto, para diferenciar grandes e pequenas escolas: Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 26 Pequena escola Grande escola A nt un es (2 00 3, p . 1 70 ) O poder decisório centraliza-se nas mãos de uma pessoa ou de um grupo restrito que o exerce de maneira autoritária O que é bom para o “mantenedor”, para o “dono” ou para o seu primeiro executor deverá ser bom para todos. Existe um poder decisório, mas este fundamenta-se na opinião coletiva e consensual, aceitando-se a diversidade e administrando-a conforme o sentido de justiça que é dinamicamente construído e recontruído. A escola foi influenciada, em um momento posterior, pela Escola de Rela- ções Humanas de Fayol e pela Teoria Y de McGregor, surgindo uma gestão preo- cupada com a integração social, com aspectos ligados à criatividade e motivação e com os grupos informais existentes na escola, enfatizando aspectos emocionais em detrimento de outros, puramente objetivos. Neste modelo temos, por exemplo, uma cultura de confraternizações e dinâmicas integradoras dos grupos, envol- vendo técnicas de sensibilização. O diretor busca apoio na ação do Orientador Educacional, valorizando o que era chamado, na época, “aulas de SOE” (Serviço de Orientação Educacional). A década de 70 e o tecnicismo, que dominou o cenário educacional brasilei- ro, marcaram a influência da Teoria Sistêmica sobre a gestão escolar. Utilizava-se fartamente planilhas sofisticadas para a elaboração dos planejamentos, e nestas abundavam a citação dos inputs, outputs (comportamentos de saída) e do feedback obtido por meio da avaliação. Infelizmente, isto não tornou a gestão escolar mais dinâmica, eficaz e de- mocrática. Ao contrário, o diretor tornou-se mais impessoal e friamente técnico, às vezes, perdido em uma infinidade de fluxogramas e papéis que pouco aprimo- raram a qualidade da educação no Brasil. Uma outra vertente do tecnicismo, no entanto, apontou para uma mudança paradigmática na gestão escolar. Trata-se da ênfase nos objetivos, na sua formu- lação e hierarquia. Estas questões taxonômicas perpassaram a escola e a sua ges- tão, embora de uma maneira não tão significativa. Merece destaque, no entanto, pelos indícios de descentralização administrativa e de autoridade que permitiu prenunciar. Já em plena vivência do Paradigma Moderno de Gestão, os meados da dé- cada de 70 demarcaram uma forte ênfase na ação gestora sobre o planejamento. Ela está presente na Administração Estratégica, que acentuou alguns aspectos da Administração por Objetivos, agora falando de estratégias institucionais. Oliveira (2002) fala de três níveis de planejamento na organização: o ope- racional, o tático e o estratégico. Destes, é o terceiro que abrange a organização como um todo e, embora esteja apoiado nos outros dois níveis – responsáveis pela operacionalização/execução – fica afeito aos escalões mais elevados da empresa. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 27 Assim define o planejamento estratégico: ...é o processo administrativo que proporciona sustentação metodológica para se estabele- cer a melhor direção a ser seguida pela empresa, visando ao otimizado grau de interação com o ambiente e atuando de forma inovadora e diferenciada. (...) diz respeito tanto à formulação de objetivos, quanto à seleção dos cursos de ação a serem seguidos para sua consecução, levando em conta as condições externas e internas à empresa e sua evolução esperada. Também considera as premissas básicas que a empresa , como um todo, deve res- peitar para que o processo estratégico tenha coerência e sustentação decisória. (p. 47-48). Quanto à Administração Participativa, teve um forte impacto no cenário educacional brasileiro e nas características da gestão escolar. O movimento de re- tomada democrática no país fortaleceu os processos de delegação e participação, assim como o saudável hábito de discutir e decidir democraticamente, há tantos anos impedido. Com isto, a gestão precisou adaptar-se a ações como colegiar e delegar, praticamente incompatíveis com os modelos componentes do Paradigma Tradicional de Gestão. Entre as características destacadas por Guiomar Namo de Mello (1993) para as “escolas que dão certo“, temos o compartilhamento de decisões entre os agen- tes internos da escola e a comunidade. Silva (2001), após constatar que “as teorias, com o passar do tempo, vão ceden- do lugar a novas teorias sempre que a realidade histórica exige...” (p. 161), afirma: Dentro desta tendência de mudança nos padrões gerenciais,situa-se o esforço generaliza- do de adoção de técnicas oriundas do chamado “modelo japonês”, no Brasil, com ênfase nos programas de gerência da qualidade total. (...) A tentativa de implantar formas de gerenciamento mais flexíveis no Brasil e, por decorrência, a adoção de técnicas que fa- voreçam a participação na gestão tem sido feita pelos chamados programas de qualidade total. (p. 162). Isso nos permite ver, portanto, um entrelaçamento entre as duas últimas modalidades emergentes de gestão – a Administração Participativa e a Japonesa. Esta última trouxe os já conhecidos Programas de Controle da Qualidade, com ênfase na Qualidade Total. Esse gestor voltado para qualidade, coordenando a realização dos rituais do CQT (Controle de Qualidade Total) nascidos do sistema japonês de produção da Toyota Motor Co, não é encontrado na Educação. Temos, na verdade, a apropria- ção, muitas vezes oportunista, de alguns conceitos da Administração Japonesa e dos resultados da avaliação da qualidade (chancela ISO). Isso acontece principal- mente por parte de instituições particulares de ensino, desejosas de atrair alunos. Finalizando, falemos dos modelos de gestão ligados ao Paradigma Emer- gente de Gestão. Já dissemos que, por serem extremamente recentes, ainda não temos impactos significativos destes modelos sobre a gestão escolar. Começamos a ouvir falar, por exemplo, em uma “reengenharia do Projeto Pedagógico”, expres- são que se refere a mudanças aceleradas e profundas neste projeto, permitindo à escola uma adaptação ativa e rápida ao ambiente que a cerca. Outros termos como “mapeamento da instituição escolar”, “mudança da cul- tura organizacional”, “racionalização organizacional” e “reengenharia psicossocial” Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 28 também vêm associar a moderna administração das empresas à gestão escolar. A verdadeira revolução causada pelo desenvolvimento da Tecnologia de In- formação e Comunicação (TIC) é outro fator que afeta fortemente tudo que foi historicamente estabelecido quanto à gestão da escola, mesmo que não tenhamos, ainda, a “administração virtual”. Não falamos apenas da informatização dos pro- cessos, mas ao fluxo de inovação e informação que invadiu as nossas escolas. Concluindo, podemos afirmar que a gestão escolar evoluiu historicamente ao longo destes últimos cem anos – como tentamos mostrar nestas duas primeiras aulas – assumindo variadas formas, algumas mais semelhantes e outras totalmen- te opostas. Esperamos que vocês consigam agora detectar, na gestão das escolas que conheceram até hoje, traços e características dos paradigmas de que falamos, as- sumindo posicionamento crítico em relação a elas. Agora, que a nossa aula terminou, é hora de enriquecer o que aprendemos. Acesse, na internet, a página <http://novaescola.abril.uol.com.br>. Você vai encontrar, no índice de temas, o link Gestão Escolar. Acesse o texto de Heloísa Luck intitulado: A evolução da mudança educacional, a partir da mudança paradigmática. A autora fala sobre as mudanças de paradigma na gestão escolar, destacando cinco aspectos de evolução: Antes Depois Ótica fragmentada. Ótica globalizadora. Limitação da responsabilidade. Responsabilidade expandida. Ação episódica. Processo contínuo. Hierarquização e burocratização. Coordenação. Ação individual. Ação coletiva. Observando estes cinco aspectos, procure fazer uma análise do paradigma em que se encontra a sua escola, ou alguma escola que você conhece. Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 29 Teorias da Administração aplicadas à gestão escolar (parte 2) 30 A escola como instituição aprendente: a busca da qualidade da educação B em, caros alunos, primeiramente darei atenção ao complemento do tema principal desta aula – a busca da qualidade na educação – para então, referi-la à escola e especialmente situá-la no contexto de uma Instituição Aprendente. Meu ponto de partida é a constatação de que a maioria da população não se sente atendida pelo ensino que lhe é fornecido pelas instituições de ensino, ainda que os princípios educacionais pontua- dos na Lei n.º 9394/96 em seu título II, artigos 2.º e 3.º enfatizem, dentre outros: a igualdade de condi- ções para o acesso e a permanência na escola, a gestão democrática do ensino e a garantia do padrão de qualidade. A Lei assinala ainda, como fins da educação: o pleno desenvolvimento do educando; o seu preparo para o exercício da cidadania e a sua qualificação para o trabalho. Sustentando o fato da ineficiência dos aspectos relacionados à política e à organização do sis- tema educacional, e agregando-se a ele os dados de qualidade de vida da população, a moldura do cotidiano brasileiro, então, passa a contornar o seguinte cenário: o desvio de verbas públicas, o prejuízo e a redução dos percentuais destinados à educação, à saúde e aos bens básicos da população; atribuir-se ao descaso com a educação a dificuldade de inserção do país na economia global; a falta de investimento em pesquisa e no desenvolvimento de novas tecnologias; a concentração de renda: o PIB per capita dos 20% (US$18.563) mais ricos, trinta e duas vezes maior, do que o dos 20% mais pobres (US$578), de acordo com o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento 2000); um dos piores índices de desigualdade de renda atribuído ao Brasil, com 20% da população mais pobre ficando com 2,5% da renda, enquanto os 20% da população mais rica detendo 63,4% (PNUD, 2000); o desprezo das autoridades pelo meio ambiente e o uso inadequado dos recursos naturais; o poder estar ainda centralizado “nas mãos” de políticos populistas e de doutrinas oportunistas; a força do corporativismo de determinados segmentos sociais sobrepujar “a qualquer custo” os demais, em benefício próprio; os índices de desemprego, jamais alcançados, disseminado pelas diversas classes sociais. A este respeito, ocorre-nos a frase do sociólogo e professor José Pastore, da Faculdade de Economia e Administração (FEA) e Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da USP (FIPE), especialista em relações do trabalho e desenvolvimento institucional: O desemprego no Brasil está sendo menos motivado pelo avanço tecnológico e mais pelo atraso educacional. O desafio é também da escola, não apenas da empresa. Para competir e ter sucesso, ou educamos mais e melhor, ou convencemos nossos concorrentes a deseducar os filhos e os profissionais deles! A escola como instituição aprendente: a busca da qualidade da educação 32 o crescimento percentual pouco significativo – de 0,2% em dois anos – no índice de vida dos brasileiros; a instituição definitiva da economia informal; a invasão crescente dos centros urbanos pela população de rua; o aumento da insegurança e da violência; a queda vertiginosa da renda dos brasileiros pelo sexto ano consecutivo, como publicou O Globo de 11 out. 2003. No entanto, segundo o cientista político Sérgio Abranches, o país tem ainda bons motivos para encarar o novo século com otimismo. A criatividade e a capa- cidade de trabalho da população brasileira estão entre as principais razões que colocam o Brasil na trilha de uma grande potência e o deixam confortável diante dos países para os quais perdeu posição, pois fecharam o século com desempenho melhor que o brasileiro. O Brasil é hoje a 15.ª nação mais rica do mundo. Viram? Nós vivemos mesmo em um país de contrastes... Por outro lado, há de ressalvar-se também, a nova postura assumida pelo Brasil em diversos projetos internacionais sobre o papel estratégico da produção das informações, culminando em 1998, quando o país passou a utilizar os in- dicadores educacionais. Tais indicadores, com tratamento sério e relevante, são fundamentais hoje para a avaliação da eficiência e da eqüidade do nosso sistema educacional. Estes são responsáveis, ainda, pela transparência das ações realiza- das na divulgação dos seus resultados e na contribuição inestimável à formulaçãode políticas educacionais mais adequadas e eficazes. Em recente participação na 32.ª Conferência Geral da Organização das Na- ções Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) realizada em Paris, o Exmo. Sr. Ministro da Educação, Cristovam Buarque, sugeriu a criação de um fundo para financiar e apoiar o Programa Educação para Todos, oriundo do valor a ser pago pelos países pobres para saldar a dívida externa. O dinheiro do fundo, conforme a proposta do Ministro, seria aplicado no financiamento de três ações: na alfabetização dos jovens e adultos, na implantação e expansão do Programa Bolsa-Escola na América Latina e na África e na continuidade dos es- tudos de indicadores educacionais como, por exemplo, as taxas de alfabetização, o desempenho escolar dos alunos, a formação e dedicação dos professores. Podemos assim, a partir dos indicadores já instituídos, correlacionar alguns traços marcantes da Educação Nacional à qualidade da educação. São eles: Alfabetização e taxas de analfabetismo – Segundo o relatório do Pro- grama das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o Brasil ocupa o 79º lugar entre cento e setenta e quatro países analisados, quanto ao IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Este índice mede a qualidade de vida dos países, a partir de indicadores de educação. Apesar do índice de educação ter crescido baseado na pequena redução do analfabetismo (16,7% para 16%) e no aumento da taxa de matrícula combinada (72% para 80%), vinte e seis milhões de brasileiros não têm acesso às condi- ções mínimas de educação, saúde e serviços básicos. A escola como instituição aprendente: a busca da qualidade da educação 33 Universalização do Ensino – Após a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), mesmo em regiões menos favorecidas o problema atual do Ensino Fundamental não se situa somente no acesso à escola. Os fatores extra e intra-escolares tornaram-se preponderantes, sobre estes e outros, na dificuldade de permanência do aluno na escola. Acentuada distorção série/idade – A repetência e a evasão escolares são os principais responsáveis pela “gordura” do número de matrícu- las. Há, ainda, um número significativo de alunos em idade cronológica superior à correspondente esperada a cada série. Portanto, a alternativa mais evidente é o investimento, cada vez maior, no projeto pedagógico das escolas, na avaliação interna de sua metodologia e de seus procedi- mentos educativos, na reorganização do espaço escolar, na capacitação de seus professores, em busca da aceleração da aprendizagem. Este pro- grama tem chances de sucesso, se desenvolvido com a seriedade e o rigor que o assunto exige. O Programa de Aceleração da Aprendizagem foi criado e desenvolvido a partir dos resultados do Censo Escolar. Taxas de promoção e repetência – Observa-se que as duas taxas vêm melhorando, o que retrata a melhoria do fluxo escolar. Desse modo, te- mos como conseqüência a melhoria da auto-estima do aluno e a diminui- ção dos custos escolares per capita. Carga horária de aulas reduzida – A meta a ser alcançada pela LDB, no que diz respeito ao número de horas/aula, ainda está longe de ser atin- gida. No entanto precisamos, primeiramente, assegurar o cumprimento da jornada escolar de, pelo menos, quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula e a carga mínima anual de 800 horas. Após esta conquista, o regime de escolas de tempo integral, conforme preconiza a lei, deverá ser a próxima meta a ser alcançada. Democratização de acesso ao Ensino Médio – A matrícula neste nível de ensino dobrou, conforme os resultados do último Censo Escolar. Ha- verá, assim, demanda por novas vagas neste segmento que agora, menos elitista, concentrará a sua procura na Rede Pública Estadual. Logo, os cursos pós-médios deverão não só expandir-se para atender a evolução do processo de escolaridade destes estudantes, como também deverão repensar os seus currículos, com práticas educativas capazes de intru- mentalizar e atender a demanda desses jovens, ávidos pela inserção no mercado de trabalho. Melhoria do perfil do Magistério – Muitos professores, mais preci- samente 820 mil, deverão complementar a sua formação, caso queiram permanecer no magistério, conforme exigência da LDB, incorporada ao Plano Nacional de Educação. Diante deste quadro, torna-se indispensá- vel a valorização e o reconhecimento deste profissional, com a criação de políticas públicas que contemplem a formação de professores e a sua formação continuada em serviço. A escola como instituição aprendente: a busca da qualidade da educação 34 Avaliações externas – A intenção destas avaliações é que os seus re- sultados apontem para a importância dos processos internos da escola quanto à construção de um projeto pedagógico singular, que atenda às expectativas da comunidade escolar. Há, neste novo governo, perspecti- vas diferentes no encaminhamento destas avaliações. Sistemas de Ensino Superior – À medida que o Ensino Básico tem recebido maior atenção e tem demonstrado indicadores de melhoria em sua eficiência e qualidade, espera-se a comprovação destes dados com um maior número de concluintes no Ensino Médio. Sendo assim, a mé- dio prazo há a possibilidade de reflexos positivos no Sistema de Ensino Superior que, por sua vez, deverá organizar-se para recepcionar, com qualidade, uma quantidade maior de novos alunos. Dessa forma, a retratação do cenário de qualidade de vida dos brasileiros, que passa pela qualidade da educação, impressa pelo conjunto de políticas edu- cacionais e posturas educativas, desafia, mais uma vez, a sociedade – e especial- mente os educadores – à urgente necessidade da busca da qualidade da educação, levando-os a repensarem a Escola sob a ótica de um novo modelo de referência, ou seja, à luz de um novo paradigma. Mudança institucional H oje o nosso assunto é mudança institucional, termo muito utilizado atualmente nos estudos sobre gestão. Quando vocês ouvem falar em mudança, o que lhes vem à cabeça? Apenas uma troca de coisas dos seus lugares originais, como quando mudamos os móveis de lugar por que não podemos, naquele momento, trocá-los por novos? Uma alteração maior de ambiente, como quan- do mudamos para uma nova casa, e precisamos decidir quais as coisas que colocaremos no caminhão, as que daremos a alguém, ou aquelas que jogaremos fora? As famosas “resoluções de ano novo”, famosas por habitualmente não serem realizadas? Ou uma alteração profunda de vida, de atitudes, de ambientes, de metodologias, que realmente transforma aquilo que existia anteriormente? Aliás, esta é a diferença fundamental entre transformação e reforma: a primeira refere-se à mu- dança profunda, de que falamos no parágrafo anterior, enquanto a reforma implica apenas mudanças superficiais, que não alteram a estrutura, o âmago dos processos. Este é o nosso objetivo principal da aula de hoje: discutir a importância da ocorrência de mudanças (transformações) na organização escolar, mostrando a importância da ação do gestor neste processo. Schein (1982, p 3-4), conhecido autor da área da Psicologia nas organizações, afirma que exis- tem seis coisas que cada gestor deve saber: ... (1) o que, em essência, está tentando realizar; (2) como organizar o trabalho para atingir os objetivos esco- lhidos; (3) como recrutar, treinar, distribuir o trabalho e gerir os recursos humanos (funcionários e dirigentes disponíveis para o trabalho); (4) como criar condições de trabalho e sistemas de recompensas e punições capa- zes de fazer com que os funcionários e os dirigentes mantenham elevada eficiência e um moral suficiente para se manterem eficientes por longos períodos de tempo; (5) como operar mudanças na organização em resposta a pressões que têm origem nas modificações tecnológicas e sociais ocorridas tanto no ambiente externo como dentro da própria organização; (6) como manejar a competição e outras forças que derivam de outrasorganiza- ções, de unidades situadas dentro da organização, como os sindicatos de entidades reguladoras e, por fim, das suas próprias “dores de crescimento”. Quero pedir a atenção especial de vocês para dois aspectos citados por Schein: a quinta “com- petência” do gestor, focada na realização de mudanças institucionais, e o fato citado no último item, de que não ocorrem mudanças sem algum “sofrimento”, ansiedade ou desconforto. Vale a pena lembrar, quanto à questão da ansiedade frente às mudanças, que ficamos tensos mesmo diante de expectativas positivas (uma festa ou diante de uma ascensão profissional, por exem- plo) e que o termo que o autor utilizou – “dores de crescimento” – é muito usado para falar da adoles- cência, período de grandes e férteis desenvolvimentos e transições para o futuro e o estado adulto. Para Boog (1994) as organizações, da mesma maneira que os seres vivos, apresentam duas tendências opostas: a conservação, que as leva a manter a sua cultura e tudo que dela faz parte, e a diferenciação, que pressupõe mudança e expansão. Estas duas tendências manifestam-se ao longo de toda a vida da organização e em todos os aspectos que dela fazem parte. O autor associa às mudanças o fenômeno da crise, que provoca o movimento e a desestabiliza- ção necessários à mudança. É importante compreender o termo crise, no entanto, fora do seu contexto de significado negativo. O que leva à “morte” da organização não é a crise, mas sim a crise que, não resolvida, se instala e torna-se crônica, minando os alicerces da instituição. Mudança institucional 36 Podemos falar, então, de uma crise normativa, necessária para criar uma tensão suficientemente forte para deflagrar o processo de mudança, mas impul- sionadora do alcance de estratos mais elevados de desenvolvimento e de “norma- lidade”. Boog (op. cit.) realiza uma abordagem bastante aprofundada do processo de mudança institucional e apresenta o esquema que reproduzimos a seguir, e que comentaremos com mais detalhes. Vemos, nesse esquema, que existem quatro níveis de mudança institucional, que passamos a comentar em relação à instituição escolar: Nível dos recursos – Inclui tudo que tem uma existência física, material (o prédio, as instalações, equipamentos, recursos humanos e financeiros, por exemplo). Conseqüentemente, tudo que pertence a este nível é pal- pável, mensurável. (B O O G , 1 99 4, p . 5 2) Mudança institucional 37 Nível dos processos – Trata-se dos fluxos vitais da organização, reali- zados por meio das metodologias escolhidas e práticas desenvolvidas na escola. Embora não tenha uma existência material, como o nível anterior, os processos são lógicos, calculáveis, previsíveis. Nível das relações – É constituído pelo chamado “clima” ou “ambiente” da instituição. Envolve interação entre pessoas, as suas expectativas, mo- tivações, emoções, simpatias e antipatias. Neste nível estão os processos de comunicação, liderança, prestígio, poder. É, portanto, bastante mais complexo que os dois anteriores. Nível da identidade – Não estamos falando, aqui, das identidades indi- viduais das pessoas que transitam na organização, mas de uma “identi- dade institucional”, composta pela cultura, valores e missão da mesma. Em cada um destes níveis, a mudança se processa de uma forma, em um ritmo e com intensidade de resistência diferentes. As mudanças quantitativas, que se situ- am muitas vezes como reformas, já comentadas anteriormente, são razoavelmente mais fáceis de serem implementadas. À medida que subimos de estrato na figura apresentada, no entanto, o processo de mudança vai ficando mais complexo. Cada uma delas requer, do gestor, habilidades ou competências diferentes. Observem o quadro abaixo: Nível Efeitos principais Competências exigidas do Gestor Recursos Manutenção e/ou ampliação rotineira dos já existentes, depende com freqüência de orçamentos externos à escola e sofre influência intensa do ambiente externo à escola. Técnicas Processos Melhoria constante (inovação), requer uma atualização contínua de informações, por parte da escola. Técnicas organizativas Relações Desenvolvimento progressivo, o ideal é que o nível de interação entre os atores institucionais seja aprimorado. Pessoais (sensibilidade, ponderação, equilíbrio emocional) e sociais Identidade Transformação, pois as mudanças neste nível sempre modificam profundamente a instituição e os três níveis anteriores. Técnicas, organizativas, pessoais (as anteriores e mais sabedoria, intuição), sociais, conceituais, holísticas etc. Afirma Boog (1994): A empresa que não logra sucesso nos seus processos de qualidade total ou de reen- genharia não o faz porque só tem conceitos e ferramentas no nível dos recursos e dos processos. Não é que esses instrumentos estejam errados ou que lhes falte algo. É que não consideram na sua essência as qualidades dos níveis da identidade e das relações. Os processos de mudança eficazes têm como característica a atuação com ênfase simultânea e equilibrada no limiar da ciência e da arte. Mudança institucional 38 A partir disso, pode-se afirmar que a forma como é feita a gestão das mu- danças indica três modelos diferentes de escola: A escola eficiente – dá atenção especial aos níveis dos recursos e dos proces- sos, desenvolvendo mudanças no sentido da manutenção e da melhoria. A escola eficaz – cuida dos recursos e dos processos, mas também está vol- tada para as relações, desenvolvendo as pessoas e a própria instituição. A escola excelente – chega a trabalhar com o nível da identidade institu- cional, desencadeando o verdadeiro processo de transformação. Como as Teorias da Administração, o conceito de mudança institucional também evoluiu com o tempo. Até a década de 70, falar em mudança organizacional, significava falar em projeto ou desenho organizacional. A idéia de mudança estava centrada no concei- to de alteração de organogramas, na criação, modificação ou extinção de cargos e funções. Nos anos 80, porém, esta abordagem vai ganhar uma nova forma. Isso decorreu, em grande parte, do fato de que, após operar vários tipos de mudanças em suas empresas, muitos administradores perceberam que ainda era necessário mudar os valores e as crenças dos grupos, para que os resultados surgissem. Segundo Herzog (Apud Wood, 1992), qualquer mudança no contexto or- ganizacional engloba alterações fundamentais no comportamento humano, nos padrões de trabalho e nos valores vigentes, em resposta às modificações ocorridas – ou antecipando alterações estratégicas, de recursos ou de tecnologia. Este autor afirma, ainda, que o segredo para enfrentar com sucesso o pro- cesso de mudança é o gerenciamento das pessoas (nível das relações), mantendo elevado o nível de motivação e evitando frustrações e desapontamentos. Para ele, grande desafio não é a mudança tecnológica, mas mudar as pessoas e a cultura organizacional, renovando os valores e “oxigenando as atitudes”. O’toole (Apud Wood, 1992) considera que há cinco fatores fundamentais para uma mudança cultural. São eles: a mudança deve ser construída sobre as forças e os valores já existentes na organização; deve haver participação intensa de todos os escalões hierárquicos; a mudança deve ocorrer de forma holística, relacionando-se com a estru- tura, com as estratégias organizacionais, com os sistemas de recompensa e de controle; a alta gerência deve dar todo o apoio ao processo de mudança, e ele deve tornar-se contínuo; deve ser planejada a longo prazo e executada em etapas. A cada nível de mudança está associada uma crise que a deflagra. Assim, a mudança no nível dos recursos é determinada por uma “crise de liquidez”, que mostra à organização que os meios físicos de que dispõe estão defasados ou insu- ficientes. Mudanças nos processos são antecedidas por uma “crise de resultados”, no nível das relações, por uma “crise estratégica” e no nível da identidade da or- ganização, pela “crise espiritual”.
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