Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Júlia Figueirêdo – HM VI BASES DA CIRURGIA VASCULAR: SEMIOLOGIA VASCULAR PERIFÉRICA: O exame clínico angiológico se inicia com a observação de alguns importantes aspectos demográficos e epidemiológicos durante a anamnese, a saber: Idade: um mesmo achado pode ter significados distintos de acordo com a faixa etária do paciente, como a diminuição dos pulsos, que em idosos está associada a doença aterosclerótica, ao passo que, em crianças, reflete quadros congênitos; Sexo: determinadas doenças, como fenômenos vasoplásticos (ex.: doença de Raynaud) são mais comuns em mulheres, ao passo que algumas formas de obstrução arterial são típicas em homens; Etnia: a susceptibilidade a distúrbios venosos superficiais é maior em pacientes caucasianos, enquanto negros apresentam maior prevalência de HAS; Hábitos de vida: comportamentos como tabagismo, etilismo, sedentarismo, histórico de fraturas ou cirurgias podem causar disfunções vasculares. Normalmente, o principal sintoma que norteia as queixas arteriais é a dor, sendo necessário avalia-la quanto a duração, irradiação, forma de início, local, intensidade e fatores de melhora ou piora. Outros achados relevantes são a parestesia, edema e alterações na coloração na pele ou em sua temperatura. Durante a inspeção, dividida em etapas estática e dinâmica, são observadas característica como brilho, pigmentação e coloração de pele e mucosas, além de possíveis mudanças circulatórias associadas ao movimento, que indicam comprometimento vascular. A palpação conta inicialmente com o exame da pele, determinando sua textura, elasticidade, umidade e temperatura (sempre comparada), porém seu ponto principal é a aferição dos pulsos, que abrange: Artéria temporal superficial: palpável à frente do tragus, ou na região frontal, acima do pavilhão auditivo; Artéria carótida: examinada entre o esternocleidomastoideo e a traqueia; Artéria axilar: deve ser palpada no ápice da axila, com o ombro do paciente em abdução (forma uma “cova axilar”); Júlia Figueirêdo – HM VI Artéria braquial: pode ser palpada na parte anterior do cotovelo ou no terço distal do braço, no sulco entre o bíceps e o tríceps; Artéria radial: é palpável no terço distal do antebraço, entre os tendões do músculo abdutor longo do polegar (lateral) e do músculo flexor ulnar do carpo (medial); Essa região é utilizada como referência para aferir a frequência cardíaca na maioria dos adultos. Artéria abdominal: sua palpação deve ser bimanual, na linha média do abdome, se estendendo desde a região epigástrica até a área infra-umbilical; Artéria femoral: pode ser palpada ao nível do trígono femoral, no ponto médio entre a sínfise púbica e a espinha ilíaca anterosuperior Artéria poplítea: sua palpação é mais fácil com a flexão do joelho e a colocação das polpas digitais na fossa poplítea; Artéria dorsal do pé: pode ser identificada lateralmente ao tendão do A manobra de Allen pode ser realizada de forma a detectar obstruções nos ramos profundos das artérias radial e ulnar, realizada a partir da aplicação de pressão em ambos e descomprimindo um dos leitos vasculares, observando se a circulação da mão é mantida (repetir para a outra artéria) Júlia Figueirêdo – HM VI extensor longo do hálux (“base do peito do pé”); Artéria tibial posterior: é palpável de forma posterior ao maléolo medial; A técnica correta para avaliação do pulso consiste em aplicar uma leve pressão sobre a região onde está a artéria, utilizando os dedos indicador e médio de uma ou ambas as mãos. Todo esse processo de aferição é importante para o cálculo do índice tornozelo-braquial (ITB), uma importante forma de triagem para anormalidades arteriais. Esse parâmetro é fruto da divisão da maior pressão sistólica nas artérias do tornozelo pela pressão sistólica da artéria braquial. Ressalta-se que valores entre 1.0 a 1,4 são considerados normais, com o limite girando em torno de 0,9-0,99. Caso o ITB seja < 0,9, há indícios de obstrução, ao passo que um índice >1,4 é sugestivo de calcificação. Aspectos importantes na avaliação do ITB A avaliação do sistema venoso é feita com o paciente de pé, de forma a tornar as veias superficiais mais visíveis em resposta ao menor retorno venoso. Cabe ao examinador investigar: Trajeto venoso: importante avaliar a presença de veias dilatadas, especialmente nos membros inferiores; Alterações de cor na pele: o trajeto de veias varicosas pode estar pigmentado em função da deposição de hemossiderina, ao passo que, em pacientes com insuficiência venosa crônica, a cianose é um achado comum; Edema: deve ser verificado pelo sinal do cacifo para determinação de sua intensidade e elasticidade; Palpação de edema com cacifo positivo Alterações tróficas: quadros de hipertensão venosa podem levar à descamação da pele adjacente, acompanhada por prurido e, em casos mais graves, pelo surgimento de úlceras venosas, cujo fundo é liso e coberto por exsudato. Um pulso saudável deve ter um período de ascensão seguido por um “decréscimo” suave em sua intensidade, simétrico quando comparado à artéria contralateral Júlia Figueirêdo – HM VI Evolução da doença venosa crônica, destacando-se o surgimento de ulcerações em sua fase grave No exame do sistema linfático, são inspecionados tanto os membros inferiores quanto os superiores, avaliando a presença de assimetrias no volume destes. Destaca-se que essas alterações podem ser segmentares, iniciadas nas extremidades e progredindo em direção cefálica.. OBSTRUÇÃO ARTERIAL AGUDA: A obstrução arterial aguda é uma emergência vascular bastante comum, causada pela interrupção súbita do fluxo atrial, que leva a várias alterações, tanto locais quanto sistêmicas. Esse quadro apresenta elevada morbimortalidade, tornando essencial o seu diagnóstico precoce. O quadro obstrutivo leva ao comprometimento da microcirculação, o que favorece o desenvolvimento de isquemias e processos inflamatórios no endotélio, com intensidade proporcional ao tempo de oclusão. As principais causas para esse processo são a trombose (doença da parede do vaso) e a embolia (impactação extrínseca). Em eventos trombogênicos, o desenvolvimento de circulação colateral aumenta as chances de viabilidade do tecido. Comportamento de trombos e êmbolos A gravidade da obstrução é definida pela localização do segmento obstruído, de forma que acometimentos proximais sejam mais severos, uma vez que há maior volume de tecido em isquemia. Na embolia, as áreas mais afetadas são as bifurcações das artérias femoral, ilíaca, aorta e poplítea. Comparativo entre as características de maior relevância na oclusão arterial mediada por êmbolos e trombos O quadro clínico típico conta com a presença de seis sinais e sintomas clássicos, que podem ser memorizados como “os 6 P”: Pain (dor): normalmente se inicia de forma distal em relação à oclusão, com intensidade variável, que tende a diminuir com a progressão da isquemia; Os principais fatores de risco para a oclusão arterial aguda são a doença arterial obstrutiva periférica, causadora de trombose, e alterações cardíacas, que levam à formação de êmbolos Júlia Figueirêdo – HM VI Pulseless (ausência de pulso): a avaliação comparada dos pulsos pode ajudar a determinar, de forma genérica, o local da obstrução. Em quadros causados por embolia, o pulso é cheio acima da oclusão, e mais fraco abaixo desta; Casos com origem trombogênica tendem a apresentar redução generalizada dos pulsos, inclusive no membro contralateral, indicando presença de uma doença crônica. Palidez: se o tempo de enchimento capilar é > 2 segundos, já há indícios de comprometimento dos tecidos; Em casos de oclusão por êmbolos, além de pálida, a pele pode apresentar bolhas, ao passo que na obstrução trombogênica, pode haver hiperemia compensatória. Palidez causada por oclusão arterial aguda em membro inferior direito Parestesia: os nervos periféricos são facilmente afetados pela isquemia, principalmente na região anterior da pele, o que pode gerar déficits sensoriais nos pés; Paralisia: também reflete acometimento neurológico, inicialmente cursando com fraqueza parcial, que pode evoluir para total perda de movimento, frequentemente súbita em caso de embolia; Poiquilotermia: descreve a redução de temperatura no membro acometido, quando comparado àquele contralateral. A confirmação da suspeita de oclusão arterial aguda se dá por meio do cálculo do índice tornozelo-braquial, geralmente com valores < 0,9. Como exames complementares, destacam-se: Arteriografia: é o método padrão-ouro para a detecção desse quadro, porém é invasivo, sendo necessária a infusão de contraste para análise do fluxo arterial; Arteriografia com focos oclusivos (setas) USG vascular com Doppler colorido: permite identificar e classificar a oclusão, diferenciando-os de possíveis estenoses; Angiotomografia e angiorresonância: há boa acurácia diagnóstica, com especificidade e sensibilidade superiores a 90%; Angiorresonância realizada na região da artéria femoral comum DOENÇA ARTERIAL OBSTRUTIVA PERIFÉRICA: A Doença Arterial Obstrutiva Periférica é resultado de quadros ateroscleróticos Júlia Figueirêdo – HM VI sistêmicos, e, graças à oclusão de vasos, eleva o risco de morbimortalidade cardiovascular. A oclusão vascular promove restrição do suprimento sanguíneo e isquemia tecidual, gerando dor em situações de estresse metabólico Alguns aspectos estão associados a uma maior incidência de DAOP, como: Hipertensão; Diabetes; Tabagismo; Hipercolesterolemia; Idade avançada. O principal sintoma associado a esse quadro é a claudicação intermitente, que tem como característica a dor ou desconforto em membros inferiores associada à caminhada, desaparecendo com o repouso. A origem dessa manifestação é a redução do fluxo sanguíneo para os tecidos. Localização da dor na claudicação intermitente de acordo com os vasos afetados De acordo com evolução e a intensidade das manifestações clínicas de cada paciente, é possível estratificar diversos estágios para a DAOP. As classificações mais usadas são a de Fontaine e a de Rutherford. Equivalência entre estágios das diferentes classificações clínicas da DAOP No que se refere aos aspectos anatômicos, a doença arterial oclusiva periférica pode ter sua gravidade estabelecida pela complexidade e extensão das lesões arteriais. O método mais utilizado para esse objetivo é a classificação TASC II, que pode ser empregada como critério para condutas terapêuticas diversas. Tal sistema divide-se em segmentos aortoilíaco e femoropoplíteo. A avaliação de um paciente com suspeita de DAOP deve ser iniciada por um exame físico detalhado, tendo como ponto de partida a investigação da claudicação intermitente. A partir dessa etapa, as avaliações podem diferir, a saber: Pacientes sintomáticos: deve ser realizada ausculta das artérias femorais e a palpação dos pulsos das extremidades inferiores, bem como do abdome. A coloração, bem como a temperatura e a integridade da pele dos pés devem ser avaliadas; Júlia Figueirêdo – HM VI Pacientes assintomáticos: realizam apenas a ausculta e a palpação do abdome e dos membros inferiores. Os exames utilizados para confirmar o diagnóstico são os mesmos citados para a oclusão arterial aguda no tópico anterior. VARIZES: As varizes são veias superficiais dilatadas e tortuosas nos membros inferiores, que apresentam comprometimento variável ao retorno venoso. Tomando como base o diâmetro desses vasos, é possível classifica-los como veias varicosas, > 3 mm e bastante protuberantes na pele (principalmente nas safenas internas e externas), veias reticulares, que tem entre 1 e 3 mm, e telangiectasias (“vasinhos”) de menos de 1 mm. O quadro clínico cursa com cansaço e sensação de peso nas pernas, edema, dor em queimação ou pontada, pernas inquietas e prurido. Nota-se melhora ou regressão dos sintomas durante o repouso ou elevação dos membros, e intensificação destes ao final do dia. Classificação CEAP para avaliação clínica de varizes O diagnóstico das varizes pode ser realizado apenas com a inspeção clínica dos membros inferiores, complementada, se necessário, com um exame físico especial (manter o paciente em pé por 10 minutos para observar o ingurgitamento vascular). O Doppler venoso pode ser empregado para estabelecer os pontos de refluxo e insuficiência venosa no sistema superficial. O tratamento cirúrgico dessas alterações depende do tipo de varicosidade observado. Para telangiectasias e veias reticulares, a escleroterapia (injeção de um agente irritante ao endotélio) apresenta bons resultados. As veias varicosas, por sua vez, devem ser manejadas com a remoção dos segmentos dilatados e a interrupção dos pontos de refluxo, realizando safenectomias e, se necessário, a ligadura dos vasos insuficientes. Representação da escleroterapia A detecção de pele fria OU ao menos um sopro arterial OU anormalidades palpáveis no pulso podem indicar DAOP. O teste do tempo de enchimento capilar apresenta baixa acurácia diagnóstica Júlia Figueirêdo – HM VI PÉ DIABÉTICO: O pé-diabético é definido pela presença de infecções, úlceras ou pela lesão de tecidos profundos, associadas a graus variados de comprometimento neurológico e vascular em pacientes com diabetes melitus. Tais alterações são responsável por causar mudanças anatômicas e funcionais aos pés, criando pontos de pressão e ressecamento cutâneo, retardando a capacidade de cicatrização local. Assim, percebe-se que é possível classificar as apresentações desse quadro em neuropático, marcado por formigamento e perda de (lesões indolores), vascular (isquêmico), cursando com claudicação intermitente, ou misto. Principais diferenças entre a manifestação neuropática e isquêmica do pé diabético Os principais fatores de risco associados ao surgimento de ulcerações e à necessidade de amputação são: História prévia de complicações; Neuropatia periférica; Deformidade dos pés; Distúrbios vasculares periféricos; Nefropatia diabética; Controle glicêmico insatisfatório; Tabagismo. Essas lesões podem ser agudas (causadas pela abrasão da pele) ou crônicas (produto da pressão constante em determinadas áreas), bem como ser divididas em arteriais e venosas. Quando presentes, as úlceras devem ser avaliadas quanto a seu tamanho (área, profundidade e diâmetro), localização, alterações teciduais (ex.: granulação), observação de exsudato ou infecções, além das características das bordas e da região adjacente. Classificação de Wagner para o pé diabético LINFEDEMA: O linfedema corresponde ao inchaço de um membro, seja como resultado de causas primárias (hipoplasia linfática) ou secundárias (obstruções ou rompimentos). Os sinais e sintomas mais comuns são edemas fibrosos e não compressivos, de cor acastanhada, frequentemente unilateral, seja segmentar (áreas isoladas) ou não. Tal edema pode ser classificado em três estágios baseados em sua reversibilidade e capacidade de compressão, ditando a progressão do quadro. Júlia Figueirêdo – HM VI Linfedema unilateral com comparação ao membro saudável O diagnóstico é confirmadoa partir do exame físico, e o tratamento pode contar com massagens locais, curativos com aplicação de pressão, atividade física e, se necessário, cirurgia. Tais medidas por vezes não são curativas, mas podem auxiliar a reduzir a progressão da lesão. As principais complicações nesses pacientes são celulite, linfangite e, menos frequentemente, linfangiossarcoma. A linfangite é causada pela penetração bacteriana, principalmente estreptocócica (erisipela), por portas de entrada diversas. A área afetada torna-se vermelha e quente em decorrência da inflamação. Linfangite causada por estreptococos (erisipela)
Compartilhar