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ELEMENTOS CONSTITUINTES DA ORALIDADE Você já reparou como varia o modo como cada um fala e escreve? Já percebeu que cada pessoa tem um estilo de elaboração textual? Já observou que algumas palavras ou frases são recorrentes na fala de uma pessoa? Você já se pegou “copiando” o estilo de fala de alguém? Isso é linguagem em prática social! Nesta webaula, você conhecerá alguns elementos constituintes da oralidade: as repetições que fazemos quando falamos, as pausas e os truncamentos que constituem toda manifestação oral, os marcadores conversacionais que sustentam nossa fala e as entonações enfáticas que usamos para produzir os mais variados sentidos. Nosso objetivo é que você compreenda que esses elementos não são meras marcas de oralidade; pelo contrário, são constituintes da oralidade e afetam a produção dos sentidos do texto oral. Alguns textos orais não permitem planejamento antecipado; logo, as falas são elaboradas no momento da interação verbal. Em contrapartida, há textos orais cuja realização é posterior à sua produção escrita, ou seja, são textos formais que requerem uma prévia elaboração para serem transpostos para a oralidade, como é o caso de jornais televisivos e algumas entrevistas agendadas nos diferentes meios. Com base nesta introdução, vamos conhecer a seguir os elementos que constituem a oralidade para você se familiarizar com o funcionamento da linguagem. REPETIÇÕES A repetição é um recurso que utilizamos na fala, resultante de vários fatores, desde um domínio ainda imaturo dos elementos linguísticos até a elaboração so�sticada da linguagem, com o objetivo de chamar a atenção do interlocutor ou marcar a ênfase que queremos dar a determinado item. Se a conversação é uma modalidade discursiva em contínua elaboração, se cada expressão, então, aponta para um conteúdo especí�co, só se pode falar em repetição no sentido estritamente formal. Ela é uma estratégia utilizada na interação para a expansão de novos e crescentes signi�cados; a retomada se dá no plano formal e não no do signi�cado. Repetir g p g p não é dizer o mesmo. — (OLIVEIRA, 1998, p. 41) REPETIÇÃO PARA DAR ÊNFASE E PARA CHAMAR A ATENÇÃO DO INTERLOCUTOR Fonte: elaborada pela autora. Nesse exemplo, a repetição de “primeira aula” enfatiza que a estudante precisava do livro já para o primeiro momento da aula. Já a repetição de “entende”, por sua vez, tem a função de chamar a atenção da estudante para ter certeza de que ela compreendeu o argumento: se Maria sempre falta às aulas, a estudante não deveria ter con�ado que ela lhe emprestaria o livro. Koch (2005) acrescenta que a repetição está presente no discurso conversacional, e os parceiros, durante a construção do texto, criam, preservam e negociam as identidades, e o texto re�ete essa atividade conjunta de produção. Isso permite re�etir sobre as repetições que acontecem na nossa fala e na troca de turnos, quando repetimos o que o outro diz para darmos encadeamento na conversa. REPETIÇÃO POR ENCADEAMENTO Fonte: elaborada pela autora. PAUSAS E TRUNCAMENTOS As pausas marcam uma “parada” na fala, que pode ou não ser preenchida pelo interlocutor ou pelo próprio locutor. As pausas podem ser consideradas “momentos de organização e planejamento interno do turno e dão tempo ao falante de se preparar” (MARCUSCHI, 2007, p. 27). Galembeck e Carvalho (1997) acrescentam que o silêncio deixado pela pausa não preenchida pode resultar em problema, pois o locutor se torna vulnerável, abrindo espaço para que o turno seja preenchido pelo interlocutor; daí a necessidade de se preencher as pausas com marcadores e alongamentos, como ahn, uhn, eh, ah, certo... PAUSA Fonte: elaborada pela autora. Nesse exemplo, as pausas na fala são marcadas pelas reticências. Além disso, vemos o marcador “eh” também indicando pausa na enunciação. O truncamento é a redução de uma palavra sem a perda de seu sentido: professor para “prô” ou “pró�”, por exemplo. Para isso, é preciso que a palavra matriz seja, no mínimo, trissílaba, ou seja, tenha três sílabas. TRUNCAMENTO Fonte: elaborada pela autora. Nesse exemplo, vemos dois exemplos de truncamentos: “mara” (maravilhosa) e “pró�” (professor). MARCADORES CONVERSACIONAIS Na oralidade, encontramos os marcadores conversacionais, elementos que constituem as produções orais e organizam o texto. Por que você acha que utilizamos marcadores conversacionais em nossas falas? Santos (2006, p. 28) responde que os marcadores conversacionais “são utilizados pelos interlocutores para dar tempo à organização do pensamento, sustentar o turno, monitorar o ouvinte quanto à recepção, interromper ou �nalizar o turno conversacional etc.”, e isso resulta em marcas do envolvimento dos interlocutores na interação. Existem relações estruturais e linguísticas entre a organização da conversação em turnos (marcados pela troca de falantes) e a ligação interna em unidades constitutivas de turno. Isto sugere que os marcadores do texto conversacional são especí�cos e com funções tanto conversacionais como sintáticas. — (MARCUSCHI, 2007, p. 61) MARCADORES CONVERSACIONAIS Fonte: elaborada pela autora. Nesse exemplo, temos alguns marcadores no início do turno, como “então” e “bom”, inclusive com a ocorrência de dois marcadores de opinião: “eu acredito que” e “parece que”. No meio do turno, ocorre um marcador ideacional ou coesivo: o advérbio “aliás”. Posicionado no �nal do turno, o uso de “né” é indicativo de passagem de turno. ENTONAÇÕES ENFÁTICAS A entonação enfática diz respeito ao “tom” que damos aos nossos textos orais, ao modo como pronunciamos determinadas palavras. Você já percebeu que, dependendo da entonação dada a algumas palavras ou frases, interpretamos que o interlocutor está irritado, ordenando algo ou sendo irônico, por exemplo? A ênfase é a energia da fala. Em uma frase, existem uma ou mais palavras que pedem maior ênfase ao serem enunciadas. Além disso, a ênfase que damos a uma palavra, e não a outra, revela sentidos que estão funcionando naquele dizer. Já a entonação pode ser considerada a música da linguagem. Assim, cada palavra tem a sua variedade melódica, de acordo com o sentido. A escolha dos tons relaciona-se com as noções de modo (tipo de orações declarativas, interrogativas...), com a noção de modalidade (asserção de possibilidade, probabilidade, validade, relevância... do que se está dizendo), com os atos de fala (ordem, pedido, sugestão...) e com as atitudes do falante, seu comportamento protocolar linguístico, como: polidez, indiferença, surpresa, etc. — (CAGLIARI, 2007, p. 180) ENTONAÇÕES ENFÁTICAS Fonte: elaborada pela autora. Perceba que, se você pronunciar essas frases dando ênfase às palavras destacadas, a relevância do sentido muda bastante. Esse exemplo permite re�etir sobre a entonação enfática enquanto elemento constituinte da oralidade e que afeta na produção dos sentidos daquilo que falamos. No primeiro quadro, o destaque recai em quem fez a receita (eu); no segundo quadro, o ênfase é colocada no que foi feito (a “melhor” receita); no terceiro quadro, o destaque está no tempo de conclusão da receita (primeiro). No eixo da oralidade, no componente curricular do ensino fundamental, a BNCC (2017, p. 79) expõe a importância de “Identi�car e analisar efeitos de sentido decorrentes de escolhas de volume, timbre, intensidade, pausas, ritmo, efeitos sonoros, sincronização, expressividade, gestualidade etc. e produzir textos levando em conta efeitos possíveis”. Diante dessa citação, você deve ter percebido a importância de se estudar os constituintes da oralidade, dando- lhes um lugar de destaque nas discussões sobre sentido em sala de aula. SAIBA MAIS! Saiba mais sobre oralidade e os elementos que a constituem a partir do texto da pesquisadora Lucia Teixeira, da Universidade Federal Fluminense. A autora discute a oralidade pela noção de gênero, ressaltando a importância de se colocar a oralidade como objeto de ensino. TEIXEIRA, L. Gêneros orais na escola. Bakhtiniana,v. 7, n. 1, p. 240-252, 2012. Nesta webaula, você conheceu um pouco mais sobre as repetições, as pausas e os truncamentos, entendendo que esses elementos são constituintes da oralidade. Você veri�cou como os marcadores conversacionais afetam a organização textual e a relação entre os interlocutores, assim como percebeu a importância da entonação que damos a algumas palavras ou frases em um texto oral.