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W BA 01 14 _V 3. 0 GESTÃO DO CONHECIMENTO 2 Veruska Evanir Pereira São Paulo Platos Soluções Educacionais S.A 2022 GESTÃO DO CONHECIMENTO 1ª edição 3 2022 Platos Soluções Educacionais S.A Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César CEP: 01418-002— São Paulo — SP Homepage: https://www.platosedu.com.br/ Head de Platos Soluções Educacionais S.A Silvia Rodrigues Cima Bizatto Conselho Acadêmico Alessandra Cristina Fahl Camila Braga de Oliveira Higa Camila Turchetti Bacan Gabiatti Giani Vendramel de Oliveira Gislaine Denisale Ferreira Henrique Salustiano Silva Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Nirse Ruscheinsky Breternitz Revisor Thiago Oliveira da Silva Editorial Beatriz Meloni Montefusco Carolina Yaly Márcia Regina Silva Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)_____________________________________________________________________________ Pereira, Veruska Evanir Gestão do conhecimento / Veruska Evanir Pereira. – São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022. 32 p. ISBN 978-65-5356-118-2 1.Competências estratégicas. 2. Implantação e práticas de gestão do conhecimento. 3. Aprendizagem organizacional. I. Título. CDD 658.04 _____________________________________________________________________________ Evelyn Moraes – CRB 010289/O P436g © 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Platos Soluções Educacionais S.A. 4 SUMÁRIO Apresentação da disciplina __________________________________ 05 Introdução à gestão do conhecimento, cenários e complexidades _______________________________________________ 07 Gestão do Conhecimento e competências estratégicas ______ 18 Aprendizagem Organizacional e Perspectivas do BSC ________ 30 Implantação e práticas de gestão do conhecimento __________ 43 GESTÃO DO CONHECIMENTO 5 Apresentação da disciplina Seja bem-vindo à disciplina Gestão do conhecimento. Iniciamos a jornada apresentando o pensamento e a evolução do conhecimento a partir de cenários e complexidades acerca da gestão do conhecimento e sua relação com a inovação organizacional. Nesse contexto, serão apresentadas a gestão do conhecimento e as competências estratégicas, com a conceituação e a caracterização das competências essenciais organizacionais. Veremos ainda os componentes capazes de promover a transformação do conhecimento organizacional. Em seguida, estudaremos a aprendizagem organizacional com o objetivo de compreender a sua complexidade de aplicação no ambiente corporativo, destacando os principais conceitos e dimensões. Não menos importante, será apresentada a ferramenta Balanced Scorecard e suas perspectivas, dando destaque à perspectiva aprendizagem e crescimento, que se correlaciona aos conceitos de gestão do conhecimento e aprendizagem organizacional. Ademais, serão apresentadas a implantação e as práticas de gestão do conhecimento, que serão abordadas a partir da apresentação da metodologia de identificação da escala de conhecimento e do grau de maturidade de gestão do conhecimento nas organizações, bem como veremos a descrição de algumas práticas de gestão do conhecimento. Por fim, apresentaremos uma sugestão de esquematização de implementação de gestão do conhecimento, descrevendo suas fases e características, bem como um guia prático. Assim, conheceremos os temas principais da gestão do conhecimento e fundamentaremos a 6 importância dessa prática para a sustentabilidade e a competitividade organizacionais, destacando a relevância do conhecimento como um dos seus principais ativos. Bons estudos! 7 Introdução à gestão do conhecimento, cenários e complexidades Autoria: Veruska Evanir Pereira Leitura crítica: Thiago Oliveira da Silva Objetivos • Apresentar o pensamento e a evolução do conhecimento. • Argumentar sobre cenários e complexidades da gestão do conhecimento. • Introduzir a relação entre conhecimento e inovação organizacional. 8 1. Pensamento e evolução do conhecimento Vamos começar com uma provocação: o que foi que você consumiu hoje? Comprou alguma coisa, um alimento, equipamento? Pode ser que você diga que não, que hoje não comprou nada novo, mas de qualquer forma você consumiu, seja quando tomou banho e usou água, energia elétrica e sabonete, ou quando fez uma refeição e escolheu o tipo de alimento, os pratos e talheres etc. Assim, podemos afirmar que houve consumo, e, sobre esse consumo, baseia-se uma ação muito importante: a escolha, ou seja, você escolheu que tipo de serviço ou produto consumir. Essa analogia traz a questão da escolha do consumidor. Independentemente do que o leva a escolher, a ideia aqui é que atualmente, em todos os cantos do mundo, há sempre mais a se escolher. Cada vez mais produtos e serviços são lançados, reinventados, oferecidos, produzidos e distribuídos com o objetivo de “ganhar o cliente”. Assim, nessa concorrência desmedida e impulsionada principalmente pela globalização e pela tecnologia, as organizações se vêm impelidas a se reinventarem todos os dias e cada vez mais rápido. Acontece que nem sempre foi assim, isto é, ter à disposição produtos e serviços que teoricamente trazem maior conforto e melhoria de vida. Nos primórdios, para sobreviver, o ser humano tinha que usar toda a sua capacidade física e estratégia e conhecimentos para conseguir o alimento, para se proteger e interagir com as forças da natureza, a fim de, instintivamente, satisfazer suas necessidades ou seus desejos. Com a evolução das tecnologias, houve uma diminuição das distâncias entre os homens como seres que vivem em agrupamentos sociais. Antes, o que os diferenciava nos grupos era o conhecimento, uma vez que era necessário encontrar uma forma de organização política e social em que a inteligência pudesse se sobrepor aos instintos. Então, aqueles 9 que dominavam processos, como plantar, construir, manufaturar, negociar, trocar, estocar etc., conseguiam se sobressair dos demais e tinham uma certa “vantagem competitiva”, ou seja, obtinham os recursos necessários para sua sobrevivência em detrimento dos outros seres humanos sem esses conhecimentos e essas habilidades. Contemporaneamente, embora esses conhecimentos básicos de sobrevivência ainda sejam necessários, já não são mais suficientes. As organizações, para manter sua vantagem competitiva ou mesmo a sustentabilidade de seus negócios, tem que lidar com quantidades cada vez maiores de dados e informações, complexidades e sofisticações de inteligência. Dessa forma, Longo et at. (2017) afirmam que a nação ou as organizações que detiverem mais conhecimentos possuirão maiores riquezas e poderão exercer o domínio e o poder sobre os demais. Em outras palavras, obterão as maiores vantagens competitivas. As novidades em tecnologia tratam de livrar os seres humanos cada vez mais das operações braçais ou artesanais para crescentemente trabalharem com suas capacidades intelectuais, a fim de serem mais criativos e produtivos. Portanto, as organizações são mais valoradas pela sua capacidade intelectual e de inovação do que por seus processos primários de produção, como estoques, equipamentos, mobiliários ou instalações (LONGO et al., 2017, p. 38). 1.1 Conhecimento e filosofia Para Aristóteles (384-322 a.C.), todos os homens aspiram ao saber e essa busca os impele a conhecer a verdade, afastando-os de fantasias que os atrasem no processo. Então, o que é a verdade? Freud e Sócrates, um psicanalista e um filósofo, assim como tantos outros estudiosos e filósofos interessados na descoberta da origem do conhecimento,afirmam que é preciso que tenhamos uma certa distância das ilusões 10 dos sentidos para que possamos nos aproximar da essencialidade dos fatos, das evidências. Ainda para Aristóteles, o conhecimento se dá no campo do concreto, discordando de Platão, que acreditava que ele se dava em dois campos diferentes: a experiência e as ideias. Considerando essa concretude, Aristóteles afirma que o conhecimento vai tomando forma e se amplia à medida que o indivíduo organiza as informações adquiridas constantemente em sete graus: sensação, percepção, imaginação, memória, linguagem, raciocínio e intuição, como exemplificado pela Figura 1. Figura 1 – Degraus do Conhecimento segundo Aristóteles Fonte: elaborada pela autora. 11 Ao argumentar que o conhecimento é concreto e organizado em sete graus, Aristóteles contribuiu decisivamente para sua organização, construindo um certo tipo de lógica inexistente até então e provendo método e precisão para as observações da realidade. Muitos filósofos também deixaram suas impressões acerca do conhecimento, como Platão, que afirmava que o conhecimento é a ferramenta de superação da ignorância, ou Nietzsche, que afirmava que a verdade se baseia na percepção de cada indivíduo sobre seus próprios interesses, criando assim correntes filosóficas que diferiam em relação à origem do conhecimento e ao método de como possuí-lo (CAMARGO, 2008). Entre as correntes filosóficas empiristas (conhecimento pela indução) e racionalistas (conhecimento pela dedução), surgiu um meio- termo trazido por Immanuel Kant, filósofo alemão do século XVIII, que afirmava que a origem do conhecimento se inicia com as percepções ou observações, dependendo também da criatividade, da imaginação e do poder de conceitualização do intelecto. Estas são as raízes da contemporaneidade da inovação, ou seja, novas ideias, novos conhecimentos organizados e materializados em produtos e serviços centrados nas necessidades e nos desejos dos seres humanos. 1.2 Cenários e complexidade Muito se comenta e se discute sobre a questão da sustentabilidade das organizações, mas ela vem de um sentido mais amplo, de perenidade. O que uma organização precisa ter para se manter saudável no mercado? Por quanto tempo? Com quais recursos? Como anda a concorrência? Quais novos produtos e serviços aparecerão no mercado? Qual a próxima jogada? Essas questões iniciais já nos dão uma ideia do quão complexo é o ambiente corporativo. Nele, os cenários se caracterizam por situações 12 diversas, muitas vezes totalmente subjetivas e imprevisíveis, que se relacionam em contrapartida com aspectos materiais e objetivos. Para Longo et al. (2017), os sistemas complexos podem ser definidos a partir de sua baixa precisão e pelo alto nível de incerteza e criatividade. Devemos nos perguntar “o que o futuro nos reserva?”. Nesse sentido, quanto menos respostas para essa questão, mais complexo o contexto se tornará. Não haveria problema nenhum em se viver em um ambiente complexo se a rebote não viesse a questão da ansiedade tanto nos indivíduos quanto nas organizações. Acontece que essa ansiedade na maioria das vezes não traz a resposta mais adequada às questões propostas, ou mesmo não possibilita que as questões corretas sejam trazidas. Imagine que você está em uma nova organização, ou em um novo relacionamento, em que pouco se conhece da outra pessoa. Como agir de forma segura e tranquila? Agora imagine que você está em uma reunião de trabalho em que todas as pessoas estão remotas, ou seja, cada uma em seu computador, mas conectadas on-line em uma plataforma virtual. A tarefa do dia é fazer um trabalho colaborativo, devendo devem dar sua contribuição a partir do uso de uma ferramenta nova e desconhecida. Acontece que você só tem 5 minutos para fazer a tarefa, mas não conhece essa nova ferramenta. Como você se sentiria? Muito provavelmente se sentiria ansioso, para não dizer desesperado. Então, a liderança tenta explicar o quão fácil é interagir nessa ferramenta, mas você não consegue nem escutar direito o que está sendo dito... e a confusão está feita! Talvez você consiga contribuir de uma certa forma, mas sua criatividade não estaria sendo plenamente utilizada, uma vez que você já teve um fator de estresse acontecendo. Com isso, sua organização perdeu 13 uma chance incrível de construir um conhecimento a partir das potencialidades de todos os indivíduos naquela reunião de trabalho. Dessa forma, quanto mais você conhecer e tiver informações sobre ambientes e relações, mais se sentirá seguro e confortável para agir e reagir. Portanto, é possível afirmar que o conhecimento aplicado pode reduzir a ansiedade e a incerteza, tanto para os indivíduos quanto para as organizações. Considerando que as organizações vivem em ambientes complexos, em que a velocidade dos movimentos corporativos é um fator imprescindível para a sobrevivência, as decisões devem ser tomadas de forma ágil e flexível, além de ter a inovação constantemente presente. Porém, para isso acontecer, é indispensável fazer o uso eficiente, eficaz e efetivo da informação e do seu conhecimento. Voltando ao exemplo da reunião on-line com a ferramenta nova, você fez o que pode, usou suas experiências e conhecimentos prévios e “se virou”. Para Longo et al. (2017), algumas questões devem ser pensadas e respondidas para que haja um tratamento estruturado sobre a gestão do conhecimento: • Onde está o conhecimento necessário para o desenvolvimento das tarefas? E para a inovação? • De que tipo de conhecimento estamos falando? Científico? Tácito? Filosófico? Empírico? Teológico? • Desses conhecimentos, quais irão efetivamente agregar o valor de que as organizações precisam? 14 • Será que as organizações têm compreensão e ciência do quanto elas sabem ou necessitam saber (conhecimentos correntes e conhecimentos necessários)? • Tendo ciência do conhecimento essencial e de que ele existe, o quão acessível este está quando necessário? A partir dessa investigação, a gestão do conhecimento surge para fazer a gestão do capital intelectual, que é composto também pela experiência e pelo conhecimento de cada indivíduo da organização com o objetivo de fazer diferenciais competitivos emergirem para a empresa. Em um contexto mais amplo, o capital intelectual é composto pelo conjunto do que chamamos de capital interno, capital externo e capital humano e se caracteriza pela intangibilidade, como resumido no Quadro 1. Quadro 1 – Capital Intelectual Capital Interno Capital Externo Capital Humano Estrutura interna das organizações: processos, sistemas, cultura. Conjunto das relações com as partes interessadas (stakeholders), clientes, marcas, imagem e reputação. São as pessoas, com seus talentos e suas competências; é o conjunto dessas habilidades. Fonte: adaptado de Chiaventato (1994). Para Longo et al. (2017), é por meio do capital humano que se iniciam os processos de inovação nas organizações que dependem dos conhecimentos que ainda serão desenvolvidos pelas demandas futuras. 1.3 Gestão do conhecimento e inovação Se os processos de inovação são fundamentais para a sustentabilidade das organizações e as inovações estão no capital humano, que tipo de conhecimento dever se então construído ou desenvolvido para que as organizações sobrevivam nesse ambiente complexo? Devemos lembrar que a complexidade do conhecimento se dá pelos seus 15 desdobramentos, ou seja, por suas características de imprevisibilidade e novidades, em que cada pessoa traz suas peculiares formas de enxergar as situações e possíveis resoluções de problemas ou inovações, o que pode tornar os ambientes organizacionais caóticos (LONGO et al., 2017). Porém, apesar de caóticos, esses ambientes são fontes importantes para a inovação, uma vez que consideram o conhecimento de cada um. Basta apenas que esses conhecimentos estejam organizados e liderados por processos criativos. A inovação nas organizaçõesdepende do entendimento de ambientes complexos e da disponibilização de conhecimentos emergentes da movimentação dos mercados e que ainda deverão ser desenvolvidos para dar cabo às demandas futuras com criatividade. Acontece que processos criativos não acontecem do nada. Dessa forma, as organizações precisam disponibilizar ambientes propícios e que ofereçam as condições necessárias para que o conhecimento e o aprendizado individual e organizacional aconteçam. Portanto, a criação do conhecimento em uma organização deve ser patrocinada pelas lideranças e ter a capacidade de desenvolver e implementar novos métodos de trabalho, processos e melhorias, além de disseminá-los e causar o engajamento em todos os níveis organizacionais. Isso vai exigir dos líderes da era do conhecimento e inovação habilidades de observação mais atentas, abertas e generosas dos cenários, além de uma escuta ativa e empática com disponibilidade e apetite para experimentar protótipos que deverão ser construídos coletivamente em cocriação, a fim de ser possível a implementação de soluções práticas e ágeis. Pode-se afirmar que o aprendizado organizacional é o motor que sustenta a vantagem competitiva, ou seja, deve-se aprender de forma mais ágil e eficiente que o concorrente, e isso se dá a partir das pessoas (LONGO et al., 2017). Devemos sempre lembrar que pessoas são únicas, 16 que são indivíduos capazes de transformar os ambientes a partir de suas experiências, trajetórias, formas de agir, de pensar, de ver os cenários e de posicionar, sendo seus conhecimentos capazes de influenciar toda uma organização e sociedade em geral. A gestão do conhecimento se refere, portanto, ao esforço e à ação corporativa no sentido de promover o estímulo e o desenvolvimento do conhecimento, capturando, organizando e disseminando esses conhecimentos com base em suas estratégias de sustentabilidade empresarial. Com isso, gera-se valor para o acionista e as partes interessadas e se contribui para o desenvolvimento da sociedade em geral. Para Longo et al. (2017), o conhecimento organizacional é um fenômeno necessariamente coletivo, ou seja, oriundo das pessoas que lá estão compondo a força de trabalho daquela organização e permeado tanto pela perspectiva pedagógica quanto pela perspectiva do pragmatismo da geração de valor econômico, por meio da transformação de conhecimento em novos serviços e produtos que possam diferenciar determinada organização no mercado. Essa diferenciação é a inovação, conquistada a partir do desenvolvimento de ideais corporativas, ou do conhecimento criado, organizado e disseminado corporativamente. Pensando em inovação como algo que ainda não existe, ou seja, está no futuro, Longo et al. (2017) nos trazem o conceito de que a aprendizagem não está mais apenas baseada na compreensão de fatos passados (aprendizagem como memória), mas sim nas possibilidades de criação que o futuro pode oferecer. Portanto, é possível concluir que a gestão do conhecimento é um fator importante para a criação de um ambiente de inovação. 17 Referências CAMARGO, Gustavo Arantes. Sobre o conceito de verdade em Nietzsche. Revista Trágica: Estudos sobre Nietzsche, [s.l.], v. 1, n. 2, p. 93-112, 2008. CHIAVENATO, Idalberto. Gerenciando Pessoas: o passo decisivo para a administração participativa. São Paulo: Markron Books, 1994. LONGO, Rose Mary Juliano et al. Gestão do Conhecimento: a mudança de paradigmas empresariais no século XXI. São Paulo: Senac, 2017. 18 Gestão do Conhecimento e competências estratégicas Autoria: Veruska Evanir Pereira Leitura crítica: Thiago Oliveira da Silva Objetivos • Apresentar o modelo de empresa baseada em recursos como diferencial competitivo. • Conceituar competências essenciais e elencar suas características. • Introduzir os componentes capazes de promover a transformação e a transferência do conhecimento organizacional. 19 1. Conhecimento como recurso estratégico Qual é a melhor estratégia para que a empresa se mantenha firme e saudável ao longo dos tempos? Este é um desafio e tanto. O estudo da administração das organizações já trouxe muitos pressupostos acerca da forma como as organizações devem agir para se manterem competitivas, mas, de modo geral, contemporaneamente, temos dois aspectos imprescindíveis a serem estudados, o de mercado e o de ambiente. Ou seja, as organizações devem olhar para fora e estudar o mercado e, ao mesmo tempo, olhar para dentro de si próprias, analisando seus recursos internos, pois são estes que determinarão seu desempenho. Essa abordagem é conhecida como visão da empresa baseada em recursos (WERNERFEL, 1984; PETERAF, 1993; PRAHALAD; HAMEL, 1990 apud FLEURY; OLIVEIRA JR., 2011). Como recursos, podemos ter a marca, equipamentos, pessoal qualificado, conhecimento tecnológico desenvolvido na empresa, contratos, capital etc. Nesse contexto, o “pulo do gato” é como administrar esses recursos de forma a criar uma vantagem competitiva. Quando se trata de vantagem competitiva, o conhecimento é o recurso interno considerado o ativo mais relevante estrategicamente de uma organização, partindo da premissa de que as organizações são comunidades sociais e têm a necessidade fundamental de gerenciar seus conhecimentos de uma forma mais eficiente e eficaz do que seus concorrentes. Portanto, a gestão do conhecimento se torna uma ação estratégica das organizações (FLEURY; OLIVEIRA JR., 2011), e, assim, em uma trajetória evolutiva, além da visão da empresa baseada em recursos, temos a baseada em conhecimento. Corroborando a ideia de que conhecimento é um recurso estratégico, Fleury e Oliveira Jr. (2011) citam que alguns recursos intangíveis, 20 resultado de conhecimentos organizacionais acumulados, podem trazer sólidas vantagens competitivas, como: • Melhor integração entre as atividades da organização, trazendo assim uma possibilidade maior de reação diante das demandas do mercado. • Maior engajamento ou comprometimento da força de trabalho, proporcionando uma melhor experiência do cliente. • Alto nível de inovação e qualidade, atraindo clientes. Assim, a partir do momento que consideramos que os conhecimentos organizacionais afetam a capacidade da empresa de reagir ao mercado, na qualidade de seus produtos e serviços e na satisfação ao cliente, ou seja, no bojo de sua existência, é possível afirmar que a gestão do conhecimento deve ser considerada um ativo estratégico. 1.1 Competências essenciais Considerando o mercado cada vez mais veloz em suas modificações para atender a um cliente também cada vez mais exigente, é fundamental que as organizações identifiquem quais competências essenciais devem ser desenvolvidas e mantidas na organização a fim de se manterem competitivas. Nesse contexto, as competências essenciais são o conjunto de habilidades e tecnologias que a empresa possui para proporcionar ao consumidor de seus produtos e serviços experiências únicas, colocando a organização em uma posição de diferenciação no mercado (HAMEL; PRAHALAD, 1994, p. 81). Segundo Rumelt (1994), como características de competência essencial temos: 21 Abrangência corporativa: as competências essenciais não são de propriedade de um indivíduo isoladamente na organização, tampouco de um setor ou departamento em específico, ou seja, elas pertencem à organização como um todo. A pergunta é: somos bons em quê? Qual de nossas características é reconhecida pelo mercado e nos diferencia como uma organização de qualidade e inovadora? Estabilidade no tempo: embora as competências essenciais sejam reconhecidas nos produtos e forneçam uma sustentação a eles, são mais estáveis e evoluem mais lentamente do que estes. Aprendizagem ao fazer: competências são adquiridas no trabalho do dia a dia, o qual é considerado em todos os níveis: operacional, tático ou estratégico. É fazendo que se constrói a competência, e, assim, quanto mais a organização souber fazer, maior distinção terá no mercado.Lócus competitivo: a competição mais profunda se dá no nível de competências organizacionais, superando a ideia de que a competência se dá apenas em produtos e serviços momentâneos do mercado. É importante destacar que as competências essenciais não são estáticas e devem ser desenvolvidas de acordo com o nível de inovação de que o mercado e os clientes necessitam. Então, o que está funcionando muito bem hoje pode não funcionar amanhã, e, nesse sentido, a organização que mantiver as raízes em competências que foram sucesso uma época pode sucumbir se não procurar evoluir de forma contínua, em suas ações gerenciais e comportamentais. Dessa forma, é relevante salientar que, mesmo que as competências essenciais atuais estejam funcionando, é imprescindível que a organização prospecte e invista no desenvolvimento de novas competências baseadas em oportunidades e ameaças. A palavra-chave é inovação, sempre. 22 1.2 Transformação e transferência do conhecimento – Componentes do conhecimento organizacional A visão organizacional baseada no conhecimento, que é um aprofundamento da visão da empresa baseada em recursos (GRANT, 1996), trata o conhecimento como o recurso estratégico mais importante, consistindo em como a informação é reunida, agrupada e disponibilizada para sua aplicação e em como é feita a coordenação dessas ações na empresa. Assim, um dos principais fatores determinantes no êxito de uma organização é o nível de eficiência e eficácia no processo de transformação do conhecimento que ainda está no plano de ideias para o conhecimento aplicado, em relação às outras organizações. Concerne, então, às organizações agir como o ente organizador do conhecimento que já existe, aplicá-lo e, como em uma espiral, criar novos conhecimentos (KOGUT; ZANDER, 2003). Nesse sentido, cada organização deve identificar como se dá o conhecimento individual e como este pode ser transformado em conhecimento coletivo/corporativo, a fim de serem possíveis sua transformação e sua transferência. Também é essencial descobrir as formas possíveis de disseminação do conhecimento organizacional (como as organizações aprendem e o que já sabem) (FLEURY; OLIVEIRA JR., 2011), bem como suas aplicações para que sua utilização agregue valor e trague o êxito empresarial. Existe uma distinção primária em relação aos conhecimentos, que podem ser “tácitos” e “explícitos”. O conhecimento explícito é aquele que pode ser disseminado em uma linguagem formal, de forma organizada, enquanto o conhecimento tácito é aquele que carrega consigo uma característica mais pessoal e subjetiva, o que, teoricamente, torna-o mais difícil de ser formalizado e transmitido (FLEURY; OLIVEIRA JR., 2011). Dessa forma, pode-se definir que é explícito aquilo que é claro e não gera dúvidas, e tácito aquilo que é subjetivo e depende da experiência 23 de cada um. Por exemplo, o conhecimento adquirido por meio da leitura de um manual é explícito, mas o conhecimento que está na mente do colaborador e indica o comportamento de trabalho dele, não podendo ser expresso em palavras, imagens etc., é considerado tácito. Imagine a situação em que dois vendedores que seguem o mesmo procedimento de vendas têm resultados diferentes, um vendendo muito mais do que o outro. Qual é a receita de sucesso do vendedor que vende mais? O que ele sabe que o outro vendedor não sabe? Apesar do conhecimento explícito que eles têm proveniente do procedimento, provavelmente há um conhecimento tácito que os diferencia. Nesse sentido, o desafio das organizações reside em como lidar com os conhecimentos tácitos, como transferi-los de forma corporativa para que possam ser praticados por todos. Portanto, partindo de um ambiente em que já existe um conhecimento explícito institucionalizado, as organizações procuram codificar e disseminar o “estoque de conhecimento” de indivíduos, de pequenos grupos ou de áreas funcionais específicas para toda a organização. No entanto, é necessário tomar cuidado com a disseminação do conhecimento, pois, nos esforços de reforçar sua replicação com sua codificação e simplificação, pode-se introduzir uma maior facilidade de imitação deste pelos concorrentes, ou seja, outras organizações podem se apoderar do mesmo conhecimento e ganhar o mercado. Podemos dar como exemplo uma empresa que desenvolve tecnologia de celulares e trabalhou em um novo produto por meses ou anos e outra organização se apodera desse trabalho e lança um novo celular rapidamente. Portanto, é necessário que os conhecimentos organizacionais estratégicos sejam muito bem tratados, a fim de evitar que essa facilidade de imitação seja utilizada pelos concorrentes e diminua a vantagem competitiva da organização. 24 Uma classificação do conhecimento organizacional contribui para a organização e o entendimento dessa questão, indicando as extensões e os limites desses conhecimentos, a fim de facilitar a transferência ou o controle destes em função do objetivo estratégico da empresa. Dentro dessa classificação, alguns fatores são fundamentais para determinar a importância estratégica do conhecimento nas empresas, segundo Fleury e Oliveira Jr. (2011): 1. Criação de valor: significa a possibilidade de o conhecimento específico constituir uma fonte de lucros para a empresa. 2. Transferibilidade: entendida como a probabilidade de uso do conhecimento na empresa, internamente ou em cooperação com parceiros. 3. Inimitabilidade: relacionada ao risco de competidores reproduzirem aquele tipo de conhecimento e, assim, erodir a vantagem da empresa. Ainda segundo Fleury e Oliveira Jr. (2011), existem três pontos principais sobre a natureza do conhecimento que são importantes para as ações estratégicas: 1. Definir qual conhecimento realmente vale a pena ser desenvolvido pela empresa. 2. Como as empresas podem compartilhar o conhecimento e quando isso é possível até que sustente sua vantagem competitiva. 3. As formas pelas quais o conhecimento que é considerado como vantagem competitiva para a organização pode ser protegido. Quando a vantagem competitiva de uma organização está baseada em conhecimento explícito, a estratégia de expansão dos negócios deve ser fundamentada dentro e fora da empresa por meio de acordos de licenciamento, estabelecimento de patentes, contratos e acordos de compromissos. Assim, o conhecimento explícito pode ser utilizado largamente com esses acordos ou essas parcerias relacionadas às competências tecnológicas 25 ou organizacionais, deixando a empresa protegida de uma concorrência ao garantir a propriedade desses conhecimentos. Para Fleury e Oliveira Jr. (2011), compreender os elementos que constituem o conhecimento (classificações e naturezas) é a base para entender uma sistematização deste na organização e sua possível transformação e transferência. 1.3 Criação e integração do conhecimento O surgimento do conhecimento nas organizações acontece a partir de diversos graus de interação social, e a identificação deste em seus aspectos relevantes, bem como a sua integração pela organização, torna-se imprescindível. Uma organização de conceitos sobre a criação do conhecimento e sua gestão foi estudada e proposta por Nonaka e Takeuchi (1995, p. 62- 70), que sugerem um modelo de conversão do conhecimento, bem usual no meio corporativo. Para exemplificar, a Figura 1 mostra uma proposta de matriz de conversão do conhecimento, ilustrando as quatro formas de conversão: socialização, combinação, internalização e externalização. 26 Figura 1 – Matriz de conversão do conhecimento Fonte: elaborada pela autora. O modelo proposto na Figura 1, também conhecido como SECI, apresenta o resultado da interação entre os conhecimentos tácitos e explícitos. Assim, como apresentado, é possível dizer que existem quatro modos diferentes de conversão do conhecimento: 1. Socialização: de conhecimento tácito para tácito. 2. Combinação: conhecimento explícito em explícito. 3. Internalização:do conhecimento explícito para o tácito. 4. Externalização: conhecimento tácito em explícito. 27 Para uma melhor compreensão desse caminho de conversão entre os conhecimentos, cada modo de transformação será conceitualizado a seguir. Na socialização, temos a conversão de conhecimento tácito para conhecimento tácito. Aqui estamos tratando da interação entre os indivíduos e o compartilhamento de suas experiências, principalmente por meio da observação, da imitação e principalmente de suas práticas. Exemplos dessa prática são modelos mentais e habilidades técnicas, sendo uma forma de conversão de conhecimento fundamentada na experiência compartilhada e na troca de conhecimentos tácitos entre os indivíduos. A combinação é uma forma de conversão do conhecimento explícito em conhecimento explícito, ou seja, a partir de conhecimentos explícitos já existentes e da interação entre eles, a fim de produzir novos conhecimentos. Exemplos dessa conversão podem ser considerados em troca de e-mails, reuniões, documentos etc., em que a reconfiguração da informação existente produz novo conhecimento. Na internalização, temos a conversão de conhecimento explícito em conhecimento tácito e dizemos que temos o aprendizado do indivíduo na prática. Como exemplo, temos o indivíduo que se apropriou de um manual ou procedimento e colocou em prática esse conhecimento explícito e, assim, agregou valor ao seu trabalho e elevação de seu conhecimento tácito. Porém, para ser considerado internalizado, esse conhecimento explícito deve ser experimentado mais de uma vez. Dessa forma, além de elevar seu conhecimento tácito, é fundamental que aconteça a experiência de transmissão desse novo conhecimento, proporcionando a transformação em um modelo mental tácito. Por fim, a externalização é um processo contrário da internalização, sendo o conhecimento tácito convertido em conhecimento explícito, o que pode ocorrer por meio do diálogo e da reflexão em grupo em que 28 essa conversão de conhecimento pode ser provocada. Temos muitos exemplos desse tipo em oficinas de inovação, nas quais a cocriação é provocada a partir de discussões entre indivíduos e grupos em que a ideação é estimulada. A partir da gestão articulada e cíclica desses quatro modelos de conversão de conhecimento, temos a chamada espiral de criação do conhecimento, na qual o conhecimento começa no nível individual, move-se para o nível grupal e então para o nível de empresa. Nesse contexto, à medida que a espiral sobe na empresa, todos os conhecimentos tendem a ser enriquecidos e estendidos por meio das interações entre indivíduos e suas organizações. Figura 2 – Espiral do conhecimento Fonte: porcorex/iStock.com. 29 Neste Tema, estudamos sobre os principais tipos de conhecimentos organizacionais, o explícito e o tácito, e suas possíveis interações para a criação e o desenvolvimento de novos conhecimentos. Referências FLEURY, M. T. L.; OLIVEIRA JR., M. M. (org.). Gestão estratégica do conhecimento – Integrando aprendizagem, conhecimento e competências. São Paulo: Atlas, 2011. GRANT, R. M. Toward a knowledge-based theory of the firm. Strategic Management Journal, [s.l.], v. 17 (S2), p. 109-122, dez. 1996. HAMEL, G.; PRAHALAD, C. K. Competing for the future. Boston: Harvard Business School Press, 1994. KOGUT, B.; ZANDER, U. Knowledge of the firm and the evolutionary theory of the multinational corporation. Journal of International Business Studies, [s.l.], v. 34, n. 6, p. 516-529, fev. 2003. NONAKA, I.; TAKEUCHI, H. The knowledge creating company. New York: Oxford University Press, 1995. PETERAF, M. A. The cornerstones of competitive advantage: a resource-based view. Strategic Management Journal, [s.l.], v.14, p. 179-191, 1993. PRAHALAD, C. K.; HAMEL, G. The core competence of the corporation. Harvard Business Review, [s.l.], p. 79-91, maio/jun. 1990. RUMELT, R. Forward. In: HAMEL, G.; HEENE, A. (ed.). Competence-based competition. New York: John Wiley, 1994. WERNERFELT, B. A resource based view of the firm. Strategic Management Journal, [s.l.], v. 5, p. 171-180, 1984. 30 Aprendizagem Organizacional e Perspectivas do BSC Autoria: Veruska Evanir Pereira Leitura crítica: Thiago Oliveira da Silva Objetivos • Introduzir o tema aprendizagem organizacional e compreender a sua complexidade na aplicação do ambiente corporativo. • Destacar os principais conceitos e dimensões da aprendizagem organizacional. • Apresentar a ferramenta de gestão do Balanced Scorecard, em especial a perspectiva aprendizagem e crescimento, e correlacioná-la com os conceitos de gestão do conhecimento e aprendizagem organizacional. 31 1. Aprendizagem organizacional Para tratarmos da aprendizagem organizacional, vamos iniciar com um pouco de informação sobre a aprendizagem de uma forma geral. Nesse sentido, considerando que as organizações aprendem por meio das pessoas que as integram, é necessário que contextualizemos como anda o nível de aprendizagem e, em especial, a população brasileira. Segundo pesquisas elaboradas sob a égide do “Panorama Educacional Brasileiro” do Centro de políticas públicas do Insper, baseadas nos dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD), o nível de escolaridade da população brasileira vem crescendo nas últimas décadas, por exemplo, em 2015, um brasileiro adulto tinha em média 10,2 anos de estudo contra 5,1 anos em 1992, e o número de matrículas em curso superior saltou de 1,5 para 6,6 milhões nesse mesmo período (INSPER, 2017). Porém, em comparação com dados internacionais, ainda há uma grande defasagem. É visível que estamos evoluindo, embora ainda tenhamos um grande caminho a seguir na qualidade educacional. E como esse contexto se aplica às organizações? O nível educacional dos indivíduos reflete na capacidade de criação e aplicação do conhecimento nas empresas. A sustentabilidade e a capacidade competitiva das organizações estão baseadas no conhecimento tanto individual quanto organizacional, e o processo de aprendizagem é o caminho fundamental a ser estudado para que a estratégia competitiva seja desenvolvida e implementada. Tanto as correntes de aprendizagem organizacional quanto as organizações de aprendizagem estudam esse processo, mas com perspectivas distintas. Enquanto um grupo mantém o foco em entender o que é aprendizagem organizacional e como ela se dá, o outro está focado em estudar como as organizações podem fazer a gestão do processo de conhecimento. 32 As organizações de aprendizagem buscam a normalização (desenvolver modelos normativos) e metodologias para gerar mudanças e sugerem intervenções baseadas em mensuração, preconizando que a ação deve basear a criação do conhecimento. Assim, a organização que aprende é aquela caracterizada pelo desenvolvimento de competências e habilidades para criar, adquirir e transferir os conhecimentos, a fim de gerar mudanças comportamentais e consequentemente novos conhecimentos. Por sua vez, a corrente da aprendizagem organizacional aborda a aprendizagem como um processo que emerge das relações sociais no ambiente natural do trabalho (TAKAHASHI, 2007). As pesquisas estão mais voltadas aos resultados das mudanças ambientais, ou a como as pessoas significam suas experiências no trabalho e como as informações são interpretadas e as respostas elaboradas. Para Takahashi (2015), todo o processo de aprendizagem organizacional envolve algum processo de mudança, maior ou menor, uma vez que aprender envolve a desorganização ou a tentativa de organização de algo que está em desordem. Na verdade, há algo a ser feito, melhorado ou criado para resolver uma situação que deve ser modificada. E, nesse caminho, há o aprendizado. Uma outra preocupação em relação à aprendizagem no contexto organizacional é a importância de sua institucionalização, visando à retenção do conhecimento e evitando perdê-lo. O conhecimento produzido e não internalizado não produzirá mudanças significativas ousustentáveis, e, portanto, sistemas de aprendizagem devem ser implementados para garantir essa institucionalização. Procedimentos, manuais, instruções de trabalho, rotinas e regras são exemplos de conhecimentos institucionalizados e podem ser considerados como mecanismos estáveis da organização e retidos pela memória organizacional. 33 2. Conceitos e dimensões da aprendizagem organizacional Entre os pontos divergentes nos estudos sobre aprendizagem organizacional, estão a heterogeneidade das referências utilizadas nos trabalhos, pois estes são oriundos de várias áreas, como educação, psicologia, administração, antropologia e outras. Portanto, cada área se detém em seus pontos de interesse e propicia muitas vezes um olhar muito particular para cada situação, não sendo possível a aplicação de todas as características para um contexto global. Entre as convergências, Fiol e Lyles (1985) trazem os conceitos de alinhamento ambiental, distinção entre níveis de aprendizagem e fatores contextuais: Alinhamento ambiental: é reconhecido como um ponto fundamental para a sobrevivência, a inovação e a competitividade corporativa. As organizações devem ter potencial para aprender, desaprender e reaprender com base na análise do histórico de comportamento, ou seja, basear-se e aprender com os comportamentos passados. Distinção entre níveis de aprendizagem: parte da premissa de que a aprendizagem organizacional é diferente da aprendizagem individual, não sendo esta simplesmente a soma das aprendizagens individuais. Fatores contextuais: o consenso entre os estudiosos aponta quatro fatores contextuais que influenciam no processo e na probabilidade de acontecer a aprendizagem – cultura, estratégia, estrutura e ambiente, os quais possibilitam e fortalecem o processo de aprendizagem, bem como são criados por esse processo, em uma interação constante. Cultura: a cultura organizacional é baseada em crenças, valores e estratégias propostas pela organização. Assim, mudanças profundas originárias de processos de aprendizagem sempre envolvem a cultura 34 organizacional, uma vez que promovem uma reestruturação de normas e regras. Estratégia: a postura estratégica da organização influencia nos processos de aprendizagem, facilitando ou criando obstáculos. Afeta a capacidade de aprendizado e muitas vezes estabelece limites à organização do que pode ser absorvido e utilizado como conhecimento. É importante salientar que as escolhas estratégicas dos gestores dependem do que estes aprenderam por meio de suas próprias experiências de gestão. Então, a postura estratégica pode criar espaço para o aprendizado ou restringir mudanças. Estrutura: os diferentes tipos de estruturas organizacionais afetam os processos de aprendizagem em termos de comunicação e fluxo do conhecimento organizacional. As estruturas mais hierarquizadas tendem a inibir mudanças, enquanto estruturas mais sistêmicas, orgânicas e horizontalizadas tendem a facilitar o processo de gestão do conhecimento. Ambiente: se o ambiente for muito estável, pode instigar pouca aprendizagem, mas, se for muito dinâmico, pode dificultar o controle, o monitoramento e os resultados das mudanças vigentes. Podemos perceber que há muitos conceitos que podem definir a aprendizagem organizacional, dependendo do foco ou da perspectiva utilizada. Assim, cada organização deve fazer uma boa leitura dos fatores contextuais e tomar suas decisões com base em estratégias. Na Figura 1, é elencada uma lista de conceitos de aprendizagem organizacional de acordo com as diferentes perspectivas. 35 Figura 1 – Conhecimento organizacional – Perspectivas e conceitos Fonte: adaptada de Takahashi (2015). 36 É possível afirmar então que a aprendizagem organizacional é um processo que gera mudanças no ambiente corporativo e pode alterar padrões de comportamento e envolver interações e construções sociais e compartilhamentos coletivos (TAKAHASHI, 2015). Trata-se de um processo complexo que envolve comportamento, caracterizado pela possibilidade e pelo potencial de mudança resultante da aprendizagem; cognição, visto que ressalta uma alteração nos modelos mentais no processamento das informações a partir de novos conhecimentos; e cultura, considerando os aspectos sociais que envolvem o relacionamento humano e sua interação no processo de aprendizagem organizacional. A relação da cultura com a aprendizagem traz à luz a questão cultural de cada organização como fator fundamental na sistematização dos produtos de aprendizagem e afeta a forma como o conhecimento é criado e organizado em suas rotinas. A partir dessa premissa, é verdadeiro afirmar que a cultura determina o que e como a organização aprende, facilitando ou dificultando a utilização, a absorção e a institucionalização de novos conhecimentos. Porém, existem armadilhas na gestão de uma organização que podem fazer com que o aprendizado não ocorra. Uma delas é quando a organização tem projetos ou produtos de muito sucesso e a crença no sucesso passado pode levar os gestores a não perceberem mudanças no ambiente, impelindo-os a uma certa inércia para tentar manter o padrão de comportamento do que um dia deu certo. Longos períodos de sucesso tendem à estabilidade e à falta de movimento, fazendo com que o sistema não seja capaz de aprender e inovar, o que pode gerar estagnação e a falta de inovação. Por outro lado, organizações inovadoras tendem a funcionar como efetivos sistemas de aprendizagem, pois utilizam de forma maximizada sua capacidade de gerar conhecimento e transformá-lo em produtos e serviços de sucesso (TAKAHASHI, 2007). 37 Por fim, para essa relação cultura/aprendizagem, Argyris e Schon (1978) apresentam três conceitos acerca da aprendizagem: ciclo simples, ciclo duplo e deuteroaprendizagem. Aprendizagem de circuito simples: caracteriza-se pelas mudanças incrementais, ou por um processo de melhoria contínua com inovações pequenas ou grandes a partir de algo que já existe. Aprendizagem de ciclo duplo: considera a mudança em modelos mentais que proporcionam uma modificação ou renovação à cultura organizacional. Essa mudança depende da capacidade da empresa de aprender e geralmente é impelida pela necessidade de reação a crises ou a problemas graves, quando é preciso desconstruir ou desaprender para dar espaço a uma nova construção ou aprendizado. É o verdadeiro desaprender para aprender! Deuteroaprendizagem: diz respeito ao domínio da própria capacidade de aprender e acontece geralmente quando a organização entende a necessidade do aprendizado e sabe como deve aprender. 3. Balanced Scorecard – Perspectiva, aprendizagem e crescimento Uma das grandes dificuldades das organizações é medir o seu desempenho e, por consequência, conseguir responder a questões estratégicas básicas, como “a empresa vai bem ou mal?”. A resposta depende de muitas variáveis, indo desde a definição do que a empresa é e para onde ela quer ir até quanto de recurso financeiro ela tem para pagamento de funcionários, fornecedores etc. A empresa vai bem ou vai mal? Como responder a essa questão com propriedade, considerando que uma organização complexa possui muitas atividades, processos de trabalho e, acima de tudo, questões 38 estratégicas? Medir o desempenho organizacional é sempre um desafio, pois é necessário observar quais são os objetivos (os estratégicos, sobremaneira) e os recursos disponíveis para atender ao propósito. Para enfrentar esse desafio, indicadores devem ser desenvolvidos e submetidos a métricas que indiquem o sucesso ou insucesso. Mais do que isso, este é um item necessário para que medidas corretivas ou de melhorias sejam implementadas. A metodologia do Balanced Scorecard, ou BSC, surgiu em pela primeira vez em 1992 no trabalho Balanced Scorecard: medidas que impulsionam o desempenho, dos professores Robert Kaplan e David Norton da Universidade de Harvard, os quais ganharam reconhecimento tanto no meio acadêmicoquanto no meio empresarial. Hoje é muito utilizada mundialmente nas organizações nos mais diversos contextos, visto que é uma ferramenta de gestão estratégica que permite medir o progresso de uma organização em relação a suas metas de longo prazo. Mais do que isso, é uma metodologia que permite definir objetivos e medir resultados, distanciando-se da ideia dos indicadores financeiros tradicionais, de mercado ou de faturamento. O Balanced Scorecard parte de quatro perspectivas: 1. Perspectiva Financeira; 2. Perspectiva do Cliente; 3. Perspectiva dos Processos Internos; e 4. Perspectiva do Aprendizado e Crescimento (KAPLAN; NORTON, 1997). Perspectiva financeira: baseia-se em indicadores financeiros que têm como objetivo principal a leitura de curto, médio e longo prazos. Para isso, esses indicadores devem estar conectados com um plano de ação relacionado a estratégias e processos internos, a processos dos clientes, a colaboradores da organização e a seus sistemas. Perspectiva do cliente: visa entender como as partes interessadas vêm a empresa, especialmente os clientes. Para isso, pensa em características 39 do produto ou serviço, como qualidade, funcionalidade, precificação e relacionamento com o cliente. Perspectiva dos processos internos: visa medir a excelência dos processos internos, em termos de operação, pós-venda e inovação. Os indicadores de produtividade, custo, desenvolvimento de produtos e serviços, por exemplo, são os mais utilizados dessa perspectiva. Perspectiva do aprendizado e crescimento: é a perspectiva que mais se relaciona com a gestão do conhecimento. Para Ottoboni e Pagni (2004), ela vai além de apenas medir a satisfação interna dos funcionários e caminha para a construção de uma infraestrutura que possibilite a geração de crescimento e melhorias contínuas, conquistando ativos intangíveis, que são a base de um desempenho inovador. Está ligada a pessoas e deve medir o desenvolvimento dos funcionários (treinamentos formais ou informais, por exemplo), a tecnologia de informação e o alinhamento de procedimento e rotinas organizacionais. Na Figura 2, temos a ilustração das quatro perspectivas da metodologia do Balanced Scorecard. Figura 2 – Perspectivas do Balanced Scorecard Fonte: Visual Generation/iStock.com. 40 Embora o BSC apresente quatro perspectivas que têm sua interrelação e devem ser utilizadas de forma equilibrada para que cada uma seja usada em complementaridade às demais, a perspectiva de aprendizado e crescimento é aquela que pode apresentar a realização dos objetivos determinados nas outras três perspectivas, possibilitando a melhoria organizacional. Segundo Ottoboni e Pagni (2004), ao potencializar a utilização do capital intelectual nas perspectivas financeiras de cliente e processos internos, a gestão do conhecimento atua na perspectiva de aprendizado e crescimento do capital intelectual por meio da presença de um ambiente seguro para a promoção do desenvolvimento e a aplicação das competências essenciais e necessárias para a organização. Além desse ambiente seguro, essa perspectiva, enquanto geradora de capital intelectual, relaciona-se com a aquisição e o desenvolvimento de conhecimentos e com a construção e a difusão dos dados e das informações das organizações. A gestão do conhecimento possibilita a mudança do ambiente de trabalho para que este seja propício ao estímulo da criatividade, da geração de ideias e da cocriação (criação em grupos), fazendo com que a organização cresça de forma unida, em conjunto. Uma visão interessante sobre a importância do conhecimento nas organizações é trazida por Cesarino e Passos (2001), que ressaltam que o alinhamento do conjunto formado por metas, ações, habilidades, recursos, incentivos e reconhecimento é fundamental para a implementação da estratégia organizacional e que a inexistência de um desses fatores pode de fato criar obstáculos para a implementação dessas estratégias, resultando, por exemplo, em medo, insegurança, frustração etc. (Quadro 1). A falta de conhecimento proporcionará o caos. 41 Quadro 1 – Barreiras na implementação da estratégia Itens para a implementação da estratégia Resultado Metas Ações Habilidades Recursos Incentivos Conhecimento Implementação da estratégia com sucesso Metas ? Habilidades Recursos Incentivos Conhecimento Início comprometido Metas Ações ? Recursos Incentivos Conhecimento Medo/Insegurança Metas Ações Habilidades ? Incentivos Conhecimento Frustração Metas Ações Habilidades Recursos ? Conhecimento Pequena transformação Metas Ações Habilidades Recursos Incentivos ? Caos Fonte: adaptado de Ottoboni e Pagni (2004). Apesar de a perspectiva do aprendizado e crescimento do BSC ser a menos desenvolvida e utilizada corporativamente, é considerada uma alavanca que impulsiona as demais perspectivas, reverberando até no nível estratégico da organização. Portanto, se a perspectiva do aprendizado e crescimento do BSC e a gestão do conhecimento fossem trabalhadas em conjunto, as organizações obteriam maiores vantagens competitivas em relação àquelas que não o fizerem. Referências ARGYRIS, C.; SCHON, D. Organizational learning: A theory of action perspective. Reading, MA: Addison-Wesley, 1978. CESARINO, M. A. S. V.; PASSOS, M. C. M. O conhecimento orientado para a estratégia. Itajubá: UNIFEI, 2001. FIOL, C. M.; LYLES, M. A. Organziational Learning. The Academy of Management Review, [s.l.], v. 10, n. 4, 1985. INSPER. Centro de Políticas Públicas do Insper. Panorama Educacional Brasileiro. 2017 Disponível em: https://www.insper.edu.br/wp-content/ uploads/2018/09/20170407_panorama-educacional-brasileiro2016.pdf. Acesso em: 18 mar. 2022. KAPLAN, R. S.; NORTON, D. P. A estratégia em ação: Balanced Scorecard. 22. ed. 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Tese (Doutorado em Administração) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007. 43 Implantação e práticas de gestão do conhecimento Autoria: Veruska Evanir Pereira Leitura crítica: Thiago Oliveira da Silva Objetivos • Apresentar a metodologia de identificação da escala de conhecimento e grau de maturidade de gestão de conhecimento nas organizações. • Sugerir a esquematização de implementação de gestão do conhecimento, descrevendo suas fases e características, bem como apresentar um guia prático. • Descrever resumidamente algumas práticas de gestão do conhecimento nas organizações. 44 1. Escala de conhecimento e grau de maturidade da gestão do conhecimento Sabe-se que a gestão do conhecimento é um guarda-chuva que abriga uma série de conceitos, modelos, técnicas e ferramentas, que juntos podem dar sinais de como identificar e o que fazer com o conhecimento nas organizações. É muito comum nos perguntarmos “O que fazer agora?” e “Como eu poderia começar ou continuar um projeto de gestão do conhecimento?”. Assim, a proposta aqui será trazer um guia metodológico e prático para a implementação de gestão do conhecimento a partir de alguns autores contemporâneos. Porém, antes disso, é importante que saibamos como estamos com esse tema na organização, ou seja, em qual degrau na escala de conhecimento e em qual grau de maturidadede gestão do conhecimento a organização está. Para North (2010), empresas orientadas para o conhecimento atingem todos os degraus da escala do conhecimento, tendo como objetivo gerar saberes a partir de informações e converter conhecimentos em vantagens competitivas sustentáveis, mensuráveis e com êxitos comerciais. Essa escala de conhecimento de North (2010) pressupõe 8 degraus, a saber: signos, dados, informações, conhecimento, saber fazer, atuar, competência e capacidade competitiva. A seguir trazemos a relação entre esses degraus. Signo (1) do latim signum, é aquilo que tem significado para alguém, que representa alguma coisa e, quando organizado, segue alguma ordem, tornando-se dados (2). A partir da sintaxe dos dados, ou seja, de sua organização e contextualização, temos a informação (3), que é a base do conhecimento. Quando conectadas e relacionadas de alguma forma, as informações passam a ter uma significação que, quando revelada em ações (experiências, perspectivas), torna-se conhecimento (4). 45 Em seguida, faz-se necessária a materialização desse conhecimento, entendida como saber fazer (5), ou seja, a aplicação desse conhecimento. Ainda para North (2010), o saber fazer é um conjunto de conhecimentos, capacidades e habilidades presente nas pessoas e utilizado para a resolução de problemas. Se já sabemos fazer, então é hora de atuar (6), mover-se em consequência de uma motivação para agir. A partir da ação, as competências (7) são reveladas, tantos as individuais quanto as organizacionais, concretizando o uso das inteligências ou dos saberes para o alcance dos objetivos de uma organização. Quando existe a junção das tecnologias e das habilidades baseadas nos conhecimentos tácitos e explícitos, podemos definir as competências-chave de uma organização, ou seja, a atuação correta (como fazer certo) para gerar valor para os clientes. Essas competências-chave de uma empresa são aquelas que vão diferenciá-la competitivamente, fazendo com que possa ser considerada única, a melhor, e, consequentemente, a com maior capacidade competitiva (8). O próximo passo, então, é ser capaz de identificar o grau de maturidade de gestão do conhecimento da organização a partir da escala de conhecimento, que propõe quatro graus de maturidade (NORTH, 2010): • Soluções em tecnologia de informação (TI): é a execução da gestão do conhecimento por meio de soluções de tecnologia da informação. • Soluções individuais específicas de cada área problemática: caracteriza-se pela introdução da gestão do conhecimento em algumas áreas específicas da organização. • Organizações do conhecimento profissional: organizações que possuem infraestrutura de comunicação e informação em que há o estímulo aos funcionários na criação e no compartilhamento do conhecimento. Ademais, apresentam uma integração entre os 46 processos de gestão do conhecimento e os negócios e projetos, além de apoiar a troca de conhecimento, proporcionado por comunidades de prática e de centros de competência, e medir o aproveitamento. São consideradas organizações profissionais do conhecimento. • Gestão empresarial orientada ao conhecimento: são organizações orientadas ao conhecimento cuja cultura organizacional é voltada para a aprendizagem corporativa, tanto interna quanto externa, circundando esse conhecimento as partes interessadas (clientes, fornecedores, sociedade, mercados, tecnologias etc.). O diagnóstico do nível de maturidade e da escala do conhecimento permite que a organização evolua em direção à próxima etapa, que é a implementação da gestão do conhecimento. 2. Implementação da gestão do conhecimento, fases e características – Guia prático A gestão do conhecimento é construída levando em consideração as características e a cultura de cada organização. Para Ozaki e Avona (2016), a confusão conceitual e a falta de consenso sobre a aplicação de uma metodologia clara são fatores limitantes que podem prejudicar a implementação da gestão do conhecimento nas organizações. Porém, estudos apontam alguns caminhos a trilhar que tendem a ter sucesso, como o guia metodológico proposto por Gutierrez (2006), que é composto por três fases: análise, projeto e implementação. Análise: o autor trata da fase de análise apontando dois processos fundamentais, a auditoria e o mapeamento do conhecimento. É na auditoria do conhecimento que os conhecimentos necessários para a obtenção dos resultados organizacionais planejados devem ser identificados. A questão seria: quais conhecimentos essa organização 47 precisa para que os objetivos planejados sejam alcançados? O que precisamos saber para fazer? Uma boa estratégia é identificar as pessoas com posições-chave na organização e entrevistá-las. Ao reunir os conhecimentos das pessoas e as fontes documentais, tem-se o mapeamento do conhecimento e de seu fluxo, o que possibilita identificar as diferenças ou as lacunas entre a auditoria e o mapeamento. Nesse momento, a organização é capaz de descobrir quais conhecimentos poderiam ser descartados e consequentemente não receber mais recursos, bem como decidir quais ações devem ser tomadas para a implantação da gestão do conhecimento. Projeto: nesta fase acontece a transformação do conhecimento tácito para o conhecimento explícito, sendo possível o planejamento do processo de gestão ao selecionar quais serão os processos importantes para a criação de conhecimento na organização. Também é fundamental o planejamento da estrutura da comunidade do conhecimento, ou seja, alocar as pessoas que se dedicarão ao projeto a partir da determinação de suas dedicações em tempo parcial ou integral. Implementação: nesta fase final, os projetos serão implantados, podendo ser tanto por meio de projetos-piloto e posterior passagem para o programa quanto diretamente para o programa de gestão do conhecimento. Ozaki e Avona (2016) trazem uma metodologia a partir dos estudos de North (2010) denominada de Guia Prático do Programa dos 12 Pontos para a implementação da gestão do conhecimento, como segue no Quadro 1. 48 Quadro 1 – Guia Prático – 12 pontos Pontos Descrição Questões norteadoras 1. Sensibilização para a GC e o diagnóstico de problemas Consiste em conscientizar os funcionários sobre o tema Gestão do Conhecimento e então desenvolver um diagnóstico de possíveis problemas. Onde não estão atendidas as nossas necessidades? Em quais postos poderíamos melhorar o fluxo de conhecimento para reduzir os erros? Ponto de vista pessoal: em que aspecto você gostaria de ser melhor? 2. Vinculação da GC à estratégia empresarial Considera a estratégia da organização e como verificar quais são os conhecimentos necessários pela análise SWOT (forças, oportunidades, fraquezas e ameaças) e o balanço do conhecimento. Quais são as competências que queremos construir nos próximos anos? Quais são as competências que devemos estruturar para os próximos anos? O que devemos aprender com as empresas concorrentes de sucesso? 3. Configuração do ambiente Por meio da avaliação da cultura organizacional, é necessário criar condições para provocar a geração e o compartilhamento de conhecimentos. Qual é a cultura organizacional presente? 4. Desenvolvimento da aquisição do conhecimento a partir de fontes externas As partes interessadas externas, como clientes, fornecedores e concorrentes, podem prover conhecimentos. Alguns recursos como benchmarking, redes de relacionamentos e fóruns de clientes podem funcionar muito bem. Quais são as fontes e os conhecimentos que eles têm? 5. Desenvolvimento das competências dos trabalhadores Para o desenvolvimento de competências e a gestão de talento, é necessária a utilização de uma metodologia, que pode ser baseada em uma matriz de competências, como uma tabela, uma lista ou um quadro, que proporcione condições para a avaliação das competências e a identificação das pessoas mais adequadas para exercer determinadafunção. Temos uma matriz de competências? Temos as competências mapeadas? Os trabalhadores estão alocados de acordo com as competências necessárias? 49 6. Transferência geracional (entre gerações) dos conhecimentos dos trabalhadores É muito importante preservar o conhecimento ou know-how das organizações em casos de saída das pessoas por conta de aposentadoria e quando da integração de novos funcionários, sendo importante ter um modelo de apadrinhamento, por exemplo, no sentido de que colegas orientem outros colegas. Quem está entrando e quem está saindo da organização? Quais as competências que foram ou deverão ser desenvolvidas e aplicadas por esses trabalhadores. A matriz de competências pode auxiliar nesse acompanhamento. 7. Fomento da inovação e da criatividade Implementar programas de gestão de ideias que podem ser fomentados a partir de sistemas de sugestões eficazes e simples ou mesmo processos de melhoria contínua. Temos programas de gestão de ideias? 8. Gestão de projeto orientada ao conhecimento É a aplicação do debriefing como técnica de sistematização para o processo de aprendizagem interno e externo dos projetos e das atividades já realizados, proporcionando a reutilização do que já foi aprendido, das discussões e da documentação dos projetos. Quais são as percepções e as lições aprendidas com os projetos implantados? 9. Integração da GC nos processos de negócios É fundamental que as informações e os conhecimentos necessários à otimização dos processos de negócios estejam atualizados e sempre à disposição por meio de lições aprendidas e benchmarking. Como poderíamos tornar transparentes e disponíveis os conhecimentos para cada etapa de nossos processos? 10. Fomento da troca pessoal de conhecimentos Muitas práticas podem proporcionar a troca de conhecimento, como promover encontros regulares, criar oportunidades informais de troca, oferecer apresentações ou mercados de conhecimentos, bem como criar comunidades de prática, projetos e programas cooperativos, café da manhã de trabalho, entre outros. Como podemos trocar nossas experiências? 50 11. Estruturação, documentação e transparência da informação Muitas atitudes corporativas colaboram para essa estruturação, como analisar os sistemas de gestão de documentação e da intranet, a constituição de procedimentos, manuais ou instruções de trabalho para tratamento da documentação; fazer a regulação de responsabilidades pelos conteúdos; estimular o uso e a regulação responsável da informação por parte dos colaboradores; entre outras. Qual estrutura de tecnologia da informação e comunicação está disponível? 12. Integração dos valores e princípios Incentivar a aplicação coerente dos valores da organização por meio da integração dos valores e princípios de uma efetiva gestão orientada ao conhecimento. A gestão está orientada ao conhecimento? As ações estão coerentes com os valores da organização? Fonte: adaptado de North (2010, p. 164-167). A organização que reconhece a importância da gestão do conhecimento e institucionalmente implementa um programa deve então ser capaz de reconhecer, analisar e gerir suas práticas. 3. Práticas de gestão do conhecimento Autores como Cunha, Vasconcelos e Afonso (2006) e Davenport e Prusak (1998, p. 46) afirmam que todas as organizações têm práticas de conhecimento e a gestão deste se baseia nos recursos que já existem, como um portal na internet, uma biblioteca física ou digital, um sistema de banco de dados, programas de capacitação etc. No entanto, muitas vezes, por não identificar quais seriam essas práticas, não se cria consciência a respeito delas. Nesse contexto, podemos inserir uma questão: temos ou não temos práticas e gestão do conhecimento na organização em que estamos ou estivemos no passado? Como identificar essas práticas? 51 Brown e Duguid (2001) trazem elementos para identificar essas questões. Eles afirmam que mesmo as pessoas que trabalham com atividades rotineiras aplicam uma certa improvisação ou criatividade para atender às demandas do dia a dia, visto que estas mudam rapidamente e podem trazer uma certa desordem. Essa improvisação tem como objetivo compensar a diferença entre o que foi projetado e as condições reais. Assim, essas pequenas práticas que poderiam ser consideradas irrelevantes são aplicadas por toda a organização e, se unidas, trazem um grande volume de conhecimento. Portanto, segundo os autores, é possível vislumbrar uma pista de algumas dificuldades para identificar as melhores práticas de uma empresa por duas razões principais: o que está no manual pode ser (e geralmente é) diferente do que precisa ser praticado na vida real para resolver os problemas; e existe uma lacuna entre o que as pessoas de fato fazem e entregam e a ideia que estas têm sobre aquilo que foi entregue. Nesse sentido, como desafio principal é necessário “fechar ou diminuir” essas lacunas, ou seja, trazer o conhecimento o mais próximo possível da experiência ou vivência, sendo, para isso, recomendadas algumas práticas, como a narração de histórias, a experimentação e a improvisação. Para Brown e Duguid (2001), a narração de histórias sobre as coisas que acontecem (ações de sucesso ou insucesso, problemas e soluções) é uma forma poderosa de saber e entender o que aconteceu e, acima de tudo, a razão pela qual aconteceu e pode acontecer. Essa prática pode ocorrer em ambientes informais (como no cafezinho) ou formais (palestras). As histórias são ótimas oportunidades para narrar situações em sequência (aconteceu isso e depois aquilo) e explicar causas (aconteceu em consequência disso). A partir da conscientização da situação, é importante que tenhamos a oportunidade de desenvolver uma visão comum entre os participantes 52 da história compartilhada. Isso ajuda no pensamento crítico para o enfrentamento das situações-problema e a criação de soluções. Acontece que nem tudo é resolvido pela narração de histórias, e, assim, a experimentação das soluções e a improvisação, em que há um alto grau de autonomia nas ações implementadas sem muita reflexão anterior, são essenciais para que as coisas aconteçam. Entretanto, encontrar a medida correta entre a quantidade de ideias e criações e a capacidade e oportunidade de suas execuções é um desafio. Nesse sentido, o segredo é o equilíbrio segundo Graham e Pizzo (1998, p. 15), que afirmam “que a essência da gerência eficaz do conhecimento reside na capacidade de equilibrar atividades criativas que cultivam as matérias-primas da mente com a execução disciplinada necessária para transformar boas ideias em mercadorias de valor”. Desse modo, está posto o desafio da institucionalização das ideias, as quais podem ser inseridas de cima para baixo, criando uma certa rigidez e reprimenda da criatividade, ou com fluidez das ideias, o que pode trazer um certo caos. Portanto, é importante a organização ter em suas ações estratégicas a formação de gerentes que consigam lidar com a “tênue” linha que existe entre a rigidez e o caos, a fim de trazer o equilíbrio entre a fluidez e a institucionalização (GRAHAM; PIZZO, 1998). Ao mesmo tempo que as organizações precisam das ideias/criações, também precisam que estas sejam materializadas e valoradas no mercado. Depois de tudo que vimos, fica mais fácil entender o motivo de estudiosos, pesquisadores e praticantes afirmarem que todas as organizações, sendo elas privadas ou públicas, de todos os tamanhos e setores, podem e devem implantar a gestão do conhecimento. 53 Referências BROWN, John Seely; DUGUID, Paul. Equilibrismo – Como capturar o conhecimento sem matá-lo. In: HAVARD BUSINESS REVIEW. Aprendizagem organizacional. Rio de Janeiro: Campus, 2001. CUNHA, Carmen; VASCONCELOS, Maria Tereza Celeste Reis; AFONSO, Tarcisio. Análise das Práticas de Gestão do Conhecimento de Empresas do Setor Farmacêutico no Brasil. In: SIMPÓSIO DE GESTÃODA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, 24., 2006, Gramado. Anais [...]. Gramado: ANPAD, 2006. DAVENPORT, Thomas; PRUSAK, Laurence. Conhecimento empresarial: como as organizações gerenciam seu capital humano. 14. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1998. GRAHAM, Ann; PIZZO, Vincent. Uma questão de equilíbrio: estudos de casos na gestão estratégica do conhecimento. In: KLEIN, David. A gestão estratégica do capital intelectual: recursos para a economia baseada no conhecimento. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1998. p.15- 39. GUTIÉRREZ, Mário Pérez-Montoro. O conhecimento e sua gestão em organizações. In: TARAPANOFF, Kira (org.). Inteligência, informação e conhecimento em corporações. Brasília: IBICT/UNESCO, 2006. HIBA, Juan Carlos. Programa de capacitação: ação para a gestão eficaz dos conhecimentos em empresas. In: NORTH, Klaus. Gestão do conhecimento: um guia prático rumo à empresa inteligente. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2013. NORTH, Klaus. Gestão do conhecimento: um guia prático rumo à empresa inteligente. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2010. OZAKI, Yaeko; AVONA, Marcia Eloisa. Gestão do conhecimento. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2016. 54 Sumário Apresentação da disciplina Introdução à gestão do conhecimento, cenários e complexidades Objetivos 1. Pensamento e evolução do conhecimento Referências Gestão do Conhecimento e competências estratégicas Objetivos 1. Conhecimento como recurso estratégico Referências Aprendizagem Organizacional e Perspectivas do BSC Objetivos 1. Aprendizagem organizacional 2. Conceitos e dimensões da aprendizagem organizacional 3. Balanced Scorecard - Perspectiva, aprendizagem e crescimento Referências Implantação e práticas de gestão do conhecimento Objetivos 1. Escala de conhecimento e grau de maturidade da gestão do conhecimento 2. Implementação da gestão do conhecimento, fases e características - Guia prático 3. Práticas de gestão do conhecimento Referências
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