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PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS ANEMIA MEGALOBLÁSTICA CONCEITO A anemia megaloblástica é um distúrbio ocasionado por um bloqueio na síntese do DNA, que se caracteriza por um estado em que a divisão celular se torna lenta, em relação ao crescimento citoplasmático. Esta anormalidade nada mais é do que uma assincronia da maturação do núcleo em relação ao citoplasma – as células se preparam para uma divisão que não ocorre e, como resultado, acabam se tornando maiores. As células mais afetadas são aquelas que possuem renovação mais rápida, como as precursoras da Medula Óssea (MO) e as células da mucosa do trato gastrointestinal. Anemia megaloblástica é o mesmo que anemia macrocítica? Não, anemia macrocítica é qualquer anemia com hemácias de tamanho e volume aumentado, ou seja, com VCM (Volume Corpuscular Médio) alto. Anemia megaloblástica é apenas uma das causas de anemia macrocítica! Dividimos as anemias macrocíticas em dois grupos: (1) anemia megaloblástica; (2) anemias macrocíticas não megaloblásticas (ex.: anemias hemolíticas com reticulocitose acentuada, síndromes mielodisplásicas, anemia do alcoolismo, do hipotireoidismo, etc.). O termo "megaloblastose" não se refere a uma alteração no tamanho das hemácias circulantes, mas sim a uma anormalidade morfológica nos núcleos dos progenitores eritroides no interior da medula óssea. Os eritroblastos que desenvolvem essa alteração nuclear são reconhecidos como megaloblastos. Os megaloblastos são reconhecidos como células defeituosas pelos macrófagos da medula óssea, sendo destruídos no interior da própria medula, um fenômeno que chamamos de eritropoiese ineficaz. Até prova em contrário, uma anemia megaloblástica deve ser atribuída à carência de vitamina B12 (cianocobalamina) e/ou ácido fólico (folato), importantes cofatores para a síntese de DNA. Outras condições que podem causar esse distúrbio são o uso de medicamentos que bloqueiam a síntese de DNA (antagonistas de purinas e pirimidinas – p. ex.: certos quimioterápicos e imunossupressores) ou que interferem no metabolismo do ácido fólico (metotrexato, anticonvulsivantes). QUADRO DE CONCEITOS Por que na anemia megaloblástica temos hemácias aumentadas de tamanho? Na anemia megaloblástica temos uma alteração da síntese do DNA. Com isso, o núcleo da célula amadurece de forma lenta, e a divisão celular se dá mais tardiamente. Entretanto, o citoplasma não sofre alterações e "cresce" à espera da divisão celular, que não vem... O que quer dizer exatamente "megaloblastose"? É uma alteração no núcleo dos precursores eritroides (que só pode ser observada na medula óssea). Quando pensamos em anemia megaloblástica, quais são as principais etiologias? Deficiência de vitamina B12 (cobalamina) e ácido fólico. Qual é a alteração no sangue periférico que mais sugere anemia megaloblástica? Além da macrocitose, existe outra alteração clássica: A hipersegmentação do núcleo dos neutrófilos – como a alteração básica da anemia megaloblástica é nuclear e nem as hemácias nem as plaquetas têm núcleo no sangue periférico, só poderíamos procurá-la nos leucócitos... PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS FISIOLOGIA DO ÁCIDO FÓLICO E VITAMINA B12 ÁCIDO FÓLICO O ácido fólico (folato ou ácido pteroilglutâmico) tem como principal fonte natural os vegetais verdes frescos (fonte mais importante), fígado, aveia e algumas frutas, nas quais ele se encontra sob a forma de poliglutamato (o cozimento prolongado pode destruir até 90% do folato alimentar). A necessidade mínima diária da vitamina gira em torno de 50-200 µg, entretanto, durante períodos de demanda metabólica, como gravidez, lactação ou hemólise, as necessidades podem aumentar para 200- 800 µg/dia. O folato da dieta é absorvido pelo duodeno e jejuno proximal (mesmo local da absorção do ferro) que contêm enzimas em suas microvilosidades, chamadas carboxipeptidases, capazes de converter o poliglutamato em mono ou diglutamato, permitindo assim uma pronta absorção. Logo após ser absorvido, o folato circula no plasma como metiltetra-hidrofolato (MTHF) sob a forma de monoglutamato, ligado a proteínas. Ao penetrar nas células, o grupamento metil é retirado por uma enzima dependente da vitamina B12 (metionina sintase), liberando no citoplasma o tetra-hidrofolato (THF), já na forma de poliglutamato – a forma ativa da vitamina. O maior reservatório corpóreo de folato é o fígado, responsável por metade das reservas. O folato é secretado na bile, para ser reabsorvido no jejuno (ciclo êntero-hepático do folato), além de ser excretado na urina. O balanço negativo de folato geralmente é decorrente de uma dieta inadequada, da má absorção ou da utilização exagerada da vitamina. O estoque de folato dura pouco (como na maioria das vitaminas hidrossolúveis). Na maioria das vezes, os sinais clínicos de deficiência de folato se desenvolvem cerca de 4-5 meses após o início das perdas. A má absorção de folato pode ser consequência de um distúrbio primário da mucosa duodenojejunal (ex.: doença celíaca, espru tropical), ou do uso de determinados fármacos que interferem com o processo de absorção como a sulfassalazina e alguns anticonvulsivantes. A hemodiálise também causa perda excessiva do folato através da membrana do dialisador. Existe uma interdependência do metabolismo do ácido fólico e da cobalamina, uma vez que a vitamina B12 é necessária para a manutenção do folato no meio intracelular (conversão do monoglutamato metiltetra- hidrofolato em poliglutamato tetra-hidrofolato). VITAMINA B12 A cobalamina não é encontrada em plantas, e as únicas fontes dietéticas são os compostos de origem animal, como carnes, ovos e laticínios. Dessa forma, vegetarianos estritos, que não ingerem nenhum tipo de carne ou outros compostos animais (como leite, PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS ovos e queijo), acabarão desenvolvendo deficiência de cobalamina caso não utilizem suplementos multivitamínicos. A necessidade mínima de vitamina B12 (que corresponde às perdas) é de cerca de 2,5 µg/dia (2,5 unidades/dia), e a quantidade corpórea total dessa vitamina é de aproximadamente 2-4 mg, com metade das reservas presentes no fígado. O estoque corporal de cobalamina é bastante duradouro... Seriam precisos: 10-15 anos com dieta pobre em cobalamina para haver sinais clínicos de deficiência, caso a absorção não se encontre prejudicada; e 3-6 anos, caso a absorção da vitamina esteja prejudicada. Como acontece a absorção da vitamina B12? Ligante R: glicoproteína secretado pela saliva e mucosa gástrica. Fator Intrínseco: glicoproteínas produzida pelas células parietais do fundo e corpo gástrico, secretado em paralelo com o ácido clorídrico. A cobalamina da dieta vem sempre ligada às proteínas alimentares, precisando sofrer a ação do ácido gástrico e da pepsina para se desprender. Durante a digestão gástrica, a vitamina B12 é liberada e imediatamente se liga a uma glicoproteína: o ligante R, secretado na saliva e na mucosa gástrica. No duodeno, o complexo vitamina B12-ligante R é dissolvido sob a ação das proteases secretadas pelo pâncreas. Dessa forma, a vitamina B12 é liberada, sendo então captada pelo Fator Intrínseco (FI). O FI é uma glicoproteína produzida pelas células parietais do fundo e corpo gástricos, secretada em paralelo com o ácido clorídrico. O complexo vitamina B12-FI é resistente à degradação proteolítica e prossegue até o íleo distal, onde receptores específicos situados na borda em escova da mucosa ligam o complexo e possibilitam finalmente a absorção da vitamina. Além de evitar a degradação, o FI também funciona como um verdadeiro "guia" para a vitamina B12 alcançar o epitélio ileal. Cerca de 99% da absorção davitamina B12 só se dá ligada ao FI. Uma pequena parcela (1%) é absorvida sem o FI, por difusão passiva por entre as células da mucosa intestinal. No interior da célula da mucosa ileal, a cobalamina (vit. B12) se liga a uma proteína transportadora, a transcobalamina II (TC-II), que a transporta para o plasma. Entretanto, a meia-vida da TC-II é muito curta, e a cobalamina que se desprende do carreador recém- destruído passa a ser carreada pela TC-I (quantitativamente, o maior carreador de vitamina B12 no plasma) e TC-III. BIOQUÍMICA DO ÁCIDO FÓLICO E DA VITAMINA B12 ÁCIDO FÓLICO O folato tem como função primordial transferir "fragmentos de um carbono" (metileno) para aceptores, que darão origem a bases nitrogenadas (purinas e pirimidinas), constituintes do DNA. O folato "doador" é o tetra-hidrofolato – THF (na forma de poliglutamato) – não é difícil imaginar que, sem a metilação adequada do DNA, os precursores hematopoiéticos começam a ter dificuldades na maturação do núcleo. É exatamente o que ocorre na deficiência de ácido fólico! Ao doar grupamentos metileno, o THF é convertido em di-hidrofolato – DHF. Para regenerar novamente o THF, a partir do DHF, é necessária a ação de uma importante enzima celular, denominada di-hidrofolato redutase. VITAMINA B12 A cobalamina (vit. B12) é cofator de duas importantes reações... A primeira reação é extremamente ligada ao metabolismo do folato... O metiltetra-hidrofolato (MTHF) é a forma circulante do folato que precisa ser convertida na forma celular, o tetra-hidrofolato (THF), ou "folato ativo". Isso é feito pela enzima metionina sintase, utilizando a cobalamina (vitamina B12) como cofator. Perceba, portanto, que a deficiência de B12 impede a formação de THF a partir do MTHF, logo, reduz a forma ativa, intracelular, do folato. Em outras palavras: a deficiência de B12 provoca um "estado de deficiência celular de folato"... É através deste mecanismo que a deficiência de B12 prejudica a síntese de DNA, e isso explica porque a reposição de altas doses de ácido fólico pode resolver parcialmente a anemia megaloblástica por carência de B12! Todavia, conforme veremos adiante, mesmo que altas doses de ácido fólico amenizem parcialmente as alterações hematológicas da carência de B12, as alterações neurológicas persistem se a reposição de B12 não for realizada, pois tais alterações dependem de uma reação bioquímica diferente, que não tem qualquer relação com o metabolismo do folato... PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS Na reação da metionina sintase, o grupamento metil do MTHF é transferido para a homocisteína (um aminoácido), formando a metionina. Por isso, tanto na deficiência de folato, como na deficiência de cobalamina, esta reação fica prejudicada, aumentando os níveis celulares e plasmáticos de homocisteína. A hiper-homocisteinemia é lesiva ao endotélio, podendo aumentar o risco de aterosclerose. A segunda reação não é ligada ao folato. É a conversão do metilmalonil-CoA em succinil-CoA. Na deficiência de B12 (mas não na de ácido fólico), os níveis séricos e urinários de ácido metilmalônico aumentam significativamente e isso pode ser utilizado para fins diagnósticos. O quadro neurológico, próprio da carência de B12, deve-se provavelmente a dois mecanismos: (1) os níveis aumentados de metilmalonil-CoA promoverão a síntese de ácidos graxos não fisiológicos, que irão se incorporar aos lipídios neuronais; (2) a metionina, quando não formada adequadamente, promove uma diminuição da produção de fosfolipídios contendo colina, que são elementos fundamentais na formação da bainha de mielina. ORIGEM DAS DEFICIÊNCIAS VITAMÍNICAS: . DEFICIÊNCIA DE VITAMINA B12 Ingesta inadequada (raro) Má absorção 1. Prejuízo da liberação da vitamina do alimento: Acloridria; Gastrectomia parcial. 2. Produção inadequada de fator intrínseco: Anemia perniciosa; Gastrectomia total; Ausência congênita do fator intrínseco. 3. Desordens do íleo terminal Ressecção intestinal; Ileíte regional (doença de Crohn); Outras ileopatias; Má absorção seletiva de cobalamina (doença de Imerslund). 4. Competição pela cobalamina: Síndrome de alça cega – hiperproliferação bacteriana; Diphyllobothrium latum ("verme do peixe"). Colchicina, ácido paraminossalicílico, neomicina. Outras causas 1. Deficiência de transcobalamina II 2. Exposição ao óxido nitroso. 3. Defeitos enzimáticos. DEFICIÊNCIA DE FOLATO Ingesta inadequada (alcoólatras, anorexia nervosa) Aumento das necessidades 1. Gravidez. 2. Hemólise. 3. Malignidade. 4. Doenças exfoliativas crônicas da pele. 5. Hemodiálise. Má absorção 1. Espru tropical. 2. Doença celíaca. 3. Drogas. Fenitoína; Barbitúricos. Prejuízo no metabolismo 1. Inibidores da di-hidrofolato redutase: Metotrexato; Pirimetamina; Pentamidina; Trimetoprima. 2. Álcool. 3. Deficiências enzimáticas (raras). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DEFICIÊNCIA DE VITAMINA B12 Grande parte dos pacientes afetados pela carência de B12 apresenta manifestações hematológicas, na mucosa gastrointestinal e, principalmente, neuropsiquiátricas. Manifestações hematológicas Decorrem de queixas referentes à anemia, como palpitações, fraqueza, cefaleia, irritabilidade, etc. É interessante notarmos que estes pacientes são capazes de tolerar baixíssimos níveis de hemoglobina, pois a anemia megaloblástica é uma anemia de instalação insidiosa... Eventualmente, notamos petéquias e púrpuras devido à presença de trombocitopenia. PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS Manifestações Digestivas Podemos observar diarreia e perda ponderal, ambos decorrentes de má absorção. Os pacientes muitas vezes queixam-se de uma sensação dolorosa na língua, que se mostra avermelhada e com atrofia de papilas (glossite - A queilite angular, semelhante à observada na anemia ferropriva, também pode ser encontrada. Manifestações Neurológicas Estas podem ocorrer com o hemograma absolutamente normal e somente com a vitamina B12 sérica baixa. Entretanto, na maioria dos casos, existe anemia megaloblástica associada. Os achados neurológicos ou, melhor dizendo, neuropsiquiátricos, incluem: (1) parestesia em extremidades (alteração mais precoce) decorrente de uma polineuropatia; (2) diminuição da sensibilidade profunda (proprioceptiva e vibratória); (3) desequilíbrio, marcha atáxica, sinal de Romberg, refletindo a perda da propriocepção inconsciente nos membros inferiores; (4) fraqueza e espasticidade nos membros inferiores, com sinal de Babinski, hiper-reflexia profunda, refletindo uma síndrome piramidal nos membros inferiores; (5) deficit cognitivos, demência e psicoses. O acometimento da sensibilidade profunda (cordão posterior da medula espinhal) associado ao comprometimento dos feixes piramidais dá o nome de "síndrome dos sistemas combinados" ou "mielinose funicular" ao deficit neurológico da carência de B12. Obs.: propriocepção = noção de posição segmentar (pode ser consciente ou inconsciente). A propriocepção consciente é testada pedindo-se para o paciente, de olhos fechados, dizer qual é a posição do hálux (para cima ou para baixo). A propriocepção inconsciente é monitorada pelo teste de Romberg: o paciente coloca os pés juntos, os braços junto ao corpo e fecha os olhos – se ele cair, o teste é positivo, denotando a falta de "informação" da posição segmentar inconsciente para o cerebelo pelas fibras do cordão posterior da medula... ANEMIA PERNICIOSA A anemia perniciosa é uma doença caracterizada pelo desenvolvimento de autoanticorpos que atacam as células do corpo e fundo gástricos (células parietais), reduzindo tanto a produção de ácido e pepsina quanto de fator intrínseco. O resultado é o desenvolvimentode hipocloridria e anemia megaloblástica por má absorção de B12. A anemia perniciosa é a causa mais comum de deficiência de cobalamina descrita na literatura. Afeta indivíduos entre 45-65 anos, sendo rara antes dos 30 anos. É ligeiramente mais comum em mulheres (1,6:1) de origem nórdica, com olhos azuis e que possuem cabelos brancos precocemente. A anemia perniciosa é fator de risco para o adenocarcinoma gástrico. Os anticorpos anticélulas parietais estão presentes em 90% dos pacientes, enquanto os anticorpos antifator intrínseco são encontrados em 60%, inibindo a ligação do FI com a vitamina B12. Alguns apresentam uma outra variedade de anticorpo, que age bloqueando a molécula de fator intrínseco em seu sítio de ligação ileal. A anemia perniciosa está associada a outras afecções autoimunes, como a tireoidite de Hashimoto (hipotireoidismo), o vitiligo, a insuficiência suprarrenal idiopática (doença de Addison), o hipoparatireoidismo e a doença de Graves. Além dos fenômenos imunológicos, a própria hipocloridria resultante dificulta a liberação de vitamina B12 da proteína alimentar para união com o ligante R, etapa anterior à sua captação pelo fator intrínseco. QUADRO DE CONCEITOS Qual é a sua importância? É a causa mais comum de deficiência de vitamina B12. Qual grupo tem maior chance de desenvolvê-la? Mulheres brancas de meia-idade. Qual é o seu mecanismo patogênico? É uma condição autoimune – destruição e atrofia da mucosa do estômago, levando à redução da produção de FI. Quais são os principais autoanticorpos? Anticélula parietal: 90% dos casos. Anti-FI: 60% dos casos. Existe associação a alguma doença neoplásica? Sim, com o câncer gástrico. Existe associação a outras doenças autoimunes? Sim, com a doença de Graves, Hashimoto, vitiligo, insuficiência adrenal idiopática e hipoparatireoidismo. PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS DEFICIÊNCIA DE ÁCIDO FÓLICO Os pacientes com deficiência de folato geralmente estão mais desnutridos do que aqueles deficientes em cobalamina. As manifestações clínicas são semelhantes às da anemia por deficiência de vitamina B12, exceto por dois fatores importantes: (1) os achados do aparelho digestivo são mais exuberantes; e (2) não ocorrem manifestações neurológicas. A deficiência de folato (e a deficiência de cobalamina também) pode cursar com hiperpigmentação difusa da pele, ou somente das pregas cutâneas. QUADRO DE CONCEITOS Existem outras causas de macrocitose que não a anemia megaloblástica? Sim. As principais são: mielodisplasias, anemia aplásica (eventualmente), anemia sideroblástica (forma secundária), anemia da hepatopatia, alcoolismo, hipotireoidismo, anemia hemolítica grave e toxicidade de algumas medicações. Quando, então, devemos pensar em anemia megaloblástica? Em toda anemia macrocítica, principalmente aquelas que cursam com o VCM muito aumentado (VCM > 120 fl é virtualmente patognomônico de megaloblastose). Qual é o achado no sangue periférico considerado quase patognomônico de anemia megaloblástica? Em toda anemia associada a manifestações do TGI ou SNC. Neutrófilos plurissegmentados. Quais são os outros achados laboratoriais? Leucopenia, trombocitopenia, elevação da LDH e bilirrubina indireta. O ácido metilmalônico está elevado na... ...deficiência de cobalamina. A homocisteína está elevada na... ...deficiência de cobalamina e folato LABORATÓRIO Dividiremos os achados laboratoriais da anemia megaloblástica como referentes ao hemograma e sangue periférico, à medula óssea e à bioquímica e imunologia. HEMOGRAMA Anemia Macrocítica (VCM > 100-110) / Neutrófilos ↑ segmentados; Plaquetas e Leucócitos (Pancitopenia leve) ↑ LDH e bilirrubina indireta (lembra hemólise) Mas é carência de B12 ou Folato? ↑ Homocisteína: os dois causam aumento. ↑ Ácido Metilmalônico: Somente Vitamina B12. SANGUE PERIFÉRICO A alteração mais característica de anemia megaloblástica no esfregaço de sangue periférico é a chamada hipersegmentação do núcleo dos neutrófilos que pode ser definida pelos seguintes critérios: (1) achado de apenas um neutrófilo contendo seis ou mais lobos; e (2) presença de pelo menos 5% de neutrófilos com cinco lobos. O achado desses neutrófilos plurissegmentados é quase patognomônico de anemia megaloblástica. Outras alterações incluem: anisocitose poiquilocitose macro-ovalócitos: são eritrócitos grandes e ovais, completamente hemoglobinizados. Os macrócitos das outras anemias não possuem essa característica... MEDULA ÓSSEA (MIELOGRAMA) A medula geralmente é hipercelular, com uma diminuição da relação mieloide/eritroide. Podemos identificar ferro corável em teores expressivos. TRATAMENTO DEFICIÊNCIA DE COBALAMINA (Vit. B12) De preferência Parenteral (IM) 1000 mcg IM, 1x/dia por 7 dias, depois 1x/semana por 4 semanas, depois 1 dose mensal para o resto da vida. Na grande maioria dos pacientes com deficiência de cobalamina o problema está na má absorção dessa vitamina. Assim, a via de administração tradicional é a parenteral. A vitamina B12 é prescrita sob a forma de cianocobalamina ou hidroxicobalamina. PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS DEFICIÊNCIA DE FOLATO A deficiência de folato é tratada com terapia de reposição, na dose usual de 1-5 mg/dia por via oral. Se o problema estiver na absorção, doses de até 15 mg/dia podem ser utilizadas, sendo rara a necessidade do folato parenteral. A duração da terapia depende do grau de deficiência. A dieta deve ser corrigida, para que não haja recidiva do quadro carencial após o fim do tratamento. Os pacientes com necessidades continuamente aumentadas (anemia hemolítica ou má absorção) devem continuar recebendo ácido fólico oral indefinidamente, juntamente com uma dieta rica em folato. RESPOSTA AO TRATAMENTO Qual é o acompanhamento laboratorial da resposta à reposição de vitamina B12 ou de folato? Assim como na anemia ferropriva, em indivíduos que respondem à reposição observamos um pico reticulocitário dentro de 5-7 dias. O pico varia de 10- 50% (sendo maior quanto mais grave for a anemia...), comparado a um discreto pico de 5-10% no tratamento da anemia ferropriva. A anemia começa a melhorar após dez dias da reposição e regride completamente após 1-2 meses. Os níveis elevados de ácido metilmalônico (na carência de B12) e de homocisteína (na carência de ambos) começam a reduzir em 48h e retornam ao normal dentro de 5-10 dias do início da terapia. Caso o aumento dos reticulócitos não ocorra, ou se ele for pouco expressivo, devemos pesquisar outras causas capazes de contribuir para a anemia, como infecções, deficiência simultânea de folato ou hipotireoidismo. O quadro neurológico possui uma resposta mais lenta, melhorando após 4-6 meses. Como já dito, podem ocorrer sequelas neurológicas irreversíveis se o tratamento for tardio! COMPLICAÇÕES DO TRATAMENTO A hipocalemia é um achado laboratorial que sobrevém durante a reposição, devido ao consumo de potássio pelas células hematológicas em multiplicação exagerada. Devemos ficar atentos, repondo e acompanhando o potássio sérico na primeira semana de tratamento, especialmente nas primeiras 48h, em que a queda pode chegar a 2 mEq/L. QUADRO DE CONCEITOS Como devemos acompanhar a resposta à terapia de reposição com vitamina B12? Através da contagem de reticulócitos. Ela começa a subir por volta do quarto ou quinto dia após o início da terapia e atinge um pico no sétimo dia. Qual é a posologia de vitamina B12 a ser administrada? 1.000 μg IM por dia por sete dias, em seguida, semanal, durante quatro semanas, e depois, mensal, indefinidamente (na maioria dos pacientes). Quais são as principais complicações da reposição de vitamina B12? Hipocalemia; Congestãovolêmica. Qual é a razão da diminuição do potássio? As células novas que estão se formando em resposta à vitamina B12 captam potássio para o seu citoplasma – afinal, ele é o principal eletrólito do meio intracelular. Qual é o perigo da administração de folato em pacientes com anemia megaloblástica? Se o diagnóstico estiver errado ou incompleto, e o paciente apresentar deficiência de cobalamina, as anormalidades hematológicas podem ser corrigidas enquanto as manifestações neurológicas não melhoram e podem progredir. Dessa forma, a reposição de ácido fólico pode "mascarar" uma deficiência de vitamina B12. PROFILAXIA Existem três situações para as quais é recomendada, de rotina, a reposição profilática de vitamina B12: 1. Em todos os vegetarianos é recomendada a reposição de cobalamina em baixas doses (5- 10 μg/dia); 2. 2. RN e lactentes filhos de mães deficientes em cobalamina; 3. Pacientes com disabsorção crônica de vitamina B12 (gastrectomizados, com anemia perniciosa, acloridria ou insuficiência pancreática). Aqui, para compensar a disabsorção, as doses são maiores, cerca de 2.000 μg/dia. A reposição profilática de ácido fólico está indicada em todas as gestantes e em mulheres em idade PEDRO SANTOS – ANEMIAS E PERDAS SANGUÍNEAS reprodutiva que façam uso de anticonvulsivantes, na dose de 400 μg/dia. Portadores de hemólise crônica e doenças mieloproliferativas devem receber 1 mg/dia de ácido fólico. O ácido folínico deve ser usado de rotina em pacientes que usam metotrexato, pirimetamina ou trimetoprima, pois este composto não é metabolizado na via da di-hidrofolato redutase, enzima inibida por essas drogas. A dose é de 1 mg/dia.
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