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174 Unidade III Unidade III Uma vez abordados os procedimentos técnicos da avaliação fisioterapêutica neurológica e as fisiopatologias das frequentes lesões encontradas no sistema nervoso central e periférico, agora é possível a você refletir como o fisioterapeuta neurofuncional atuará nessas diferentes condições clínicas. Independentemente da natureza da lesão, vale ressaltar a necessidade do início da fisioterapia motora já nas primeiras fases do processo patológico. Com início tardio da reabilitação motora, os resultados nem sempre são obtidos de forma satisfatória, devido, em grande parte, a deformidades e encurtamentos musculares. Com relação à intervenção fisioterapêutica, vamos delinear, de forma geral, os objetivos de tratamento propostos pelo fisioterapeuta e quais os principais métodos e recursos terapêuticos a serem utilizados. Importante lembrar que os objetivos de tratamento que serão apontados para cada patologia servem como referência, uma vez que, embora seja possível o conhecimento da fisiopatologia dessas patologias, cada paciente é único, bem como suas consequências funcionais. 7 ASPECTOS PRÁTICOS DA FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL (PARTE I) 7.1 Fisioterapia no acidente vascular cerebral A fisioterapia em pacientes com história de acidente vascular cerebral sempre foi um desafio. A variabilidade das consequências funcionais geradas pelo acidente vascular exige do profissional uma atenção constante em seu aprimoramento científico a respeito da fisiopatologia do acidente vascular cerebral, mas principalmente, em sua atualização sobre recursos e novos métodos de tratamento fisioterapêutico. É preciso haver a compreensão de que o paciente é um ser único e que o AVC irá provocar necessidade de intervenção terapêutica específica. Além disso, a complexidade do perfil do paciente necessitará, com frequência, da abordagem de uma equipe multidisciplinar, em que além de fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicólogo, neurologista e assistente social deverão atuar em conjunto para favorecer a qualidade de vida do paciente. Embora haja diferentes recursos e métodos de tratamento fisioterapêutico para pacientes pós-AVC, o melhor será aquele que possibilita a obtenção dos objetivos terapêuticos e funcionais do fisioterapeuta. 175 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Conforme abordado anteriormente, o acidente vascular cerebral corresponde a uma das principais causas de morte no mundo. Além disso, devido aos fatores modificáveis e não modificáveis concentrarem-se, sobretudo, na população idosa, a expectativa de aumento do número de pessoas nessa faixa etária até 2025 impõe maior responsabilidade em relação à fisioterapia para esses pacientes. Para a maioria dos pacientes, as causas das limitações funcionais decorrentes do AVC são de natureza sensório-motora, o que reforça a necessidade da fisioterapia motora, que objetivará melhora de mobilidade, flexibilidade e coordenação motora. Porém, dependendo da gravidade do AVC, o paciente necessitará permanecer em uma unidade de terapia intensiva e, consequentemente, da intervenção da fisioterapia respiratória. 7.1.1 Evolução clínica Vimos que há dois tipos de acidente vascular cerebral, o isquêmico e o hemorrágico. Também vale a pena lembrar que o quadro clínico do paciente é dependente diretamente da artéria comprometida e do seu território de irrigação. De maneira geral, os sintomas frequentes sugestivos de um acidente vascular cerebral são: • cefaleia e convulsões; • perda de força muscular em um dos hemicorpos; • alteração do nível de consciência, principalmente nos quadros hemorrágicos; • comprometimento da fala e de outras funções cognitivas; • ausência de coordenação motora e equilíbrio; • perda ou alteração na marcha. Outra característica clínica importante que fará o médico suspeitar dessa hipótese diagnóstica é a instalação súbita dos sintomas clínicos. Outro fator determinante na evolução e permanência dos sintomas na forma de sequelas é a necessidade de rapidez na abordagem médica, sendo importante a recordação da afirmativa de que “tempo é cérebro”. Dessa forma, os principais comprometimentos do paciente pós-AVC são: • déficits somatossensoriais e perceptuais; • deficiências visuais; 176 Unidade III • carências motores; • alteração do tônus muscular; • distúrbios de linguagem e de deglutição; • disfunção cognitiva e comportamental. O comprometimento motor decorrente do AVC é a hemiplegia ou hemiparesia. Do ponto de vista da evolução clínica, uma vez ocorrido o AVC, o paciente apresentará mudança em seu quadro clínico. O início da intervenção fisioterapêutica deve ser o mais precoce possível, após a estabilização das causas responsáveis pelo AVC. Além disso, a intervenção fisioterapêutica será dependente diretamente da fase de evolução clínica do paciente. Podem ser consideradas, de forma geral, três fases de evolução: • fase aguda ou flácida; • fase de transição; • fase crônica ou espástica. Observe que pelos termos utilizados em cada fase, o ponto determinante para cada momento clínico será o tipo de tônus muscular presente. Vamos então caracterizar cada uma delas e em seguida descrever a respectiva intervenção fisioterapêutica. Fase aguda ou flácida A fase aguda ou flácida é aquela que ocorre imediatamente após o acidente vascular cerebral. Esse período pode durar horas, dias ou no máximo semanas. As manifestações clínicas primárias nessa fase são: • flacidez ou hipotonia muscular; • plegia; • anestesia ou hipoestesia superficial e profunda; • arreflexia tendínea; • ausência dos ajustes posturais e reações de equilíbrio, caracterizando ausência no controle de tronco. Diante desse quadro clínico, é possível constatar que o paciente estará dependente para as transferências e trocas posturais. Muito provavelmente estará restrito ao leito. 177 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Note que os sinais clínicos na fase flácida indicam diminuição ou ausência de resposta neuronal. Acredita-se que em decorrência do processo inflamatório, em especial do edema na área de penumbra, seja uma explicação dos sinais observados. Assim, a duração da fase aguda pode ser um indicativo do prognóstico de recuperação funcional do paciente: quanto mais tempo persistirem esses sinais, pior será o prognóstico de recuperação funcional. Além das manifestações clínicas primárias, o paciente pode desenvolver as secundárias, consideradas como complicações desse período. As manifestações clínicas secundárias da fase flácida são: • complicações vasculares, como trombose venosa profunda; • complicações respiratórias; • complicações relacionadas à articulação do ombro, como subluxação. Entre as complicações vasculares, a ocorrência de trombose venosa profunda é possível, uma vez que o paciente nessa fase costuma ser acamado e a hemiplegia somada à hipotonia muscular favorece a estase sanguínea, sobretudo no membro inferior plégico. Vale lembrar, que esse indivíduo já apresenta alteração de natureza vascular, que resultou no AVC. Além disso, o estado de restrição ao leito favorece o desenvolvimento de complicações do sistema respiratório relacionadas à hipoventilação e até surgimento de atelectasias no pulmão do hemitórax do lado acometido, devido à tendência do posicionamento de inclinação do tronco para o lado plégico. Com relação à articulação do ombro, é comum nessa fase ocorrer a subluxação. Os fatores que contribuem para sua instalação são o posicionamento em “abandono” do membro superior plégico, que além de ausência de movimento voluntário, o paciente apresenta anestesia superficial e profunda que colabora para o mau posicionamento do membro nas diferentes posturas. Você deve se lembrar da cinesiologia, que, nesse caso, refere a ação ativa dos músculos do manguito rotador que reforçam o contato das superfícies articulares da articulação glenoumeral, e a orientação da escápula sobre o gradil costal é dependente de ação ativa muscular. Durante a faseflácida, essa musculatura está plégica e hipotônica, favorecendo o predomínio da ação da força de gravidade, que afasta as superfícies articulares. Além dos fatores clínicos que favorecem a subluxação do ombro, é importante lembrar que o cuidador e o paciente tenderão a tracionar o membro superior plégico para auxiliar nas transferências, reforçando a tendência de subluxação. A complicação relacionada à articulação do ombro no paciente hemiplégico pode ocorrer na fase aguda (devido aos fatores citados) e na fase crônica, em que a espasticidade de alguns músculos como 178 Unidade III os adutores e rotadores mediais causam uma desorientação da cabeça do úmero em relação à cavidade glenoide da escápula. A subluxação do ombro acarretará limitação ao processo de estimulação motora do paciente durante a fisioterapia, principalmente quando houver retorno da sensibilidade dolorosa, dando origem ao ombro doloroso do hemiplégico. Uma vez apontadas as características essenciais clínicas da fase aguda do AVC e suas consequências funcionais, vamos, assim, delinear os principais objetivos do tratamento fisioterapêutico na fase aguda do AVC: • Estimular a normalização do tônus muscular (aumentar), visando à aquisição do seu controle. • Estimular o retorno do movimento voluntário no lado hemiplégico. • Estimular a aquisição de ajustes posturais e reações de equilíbrio, sobretudo com ênfase no controle do tronco. • Estimular o retorno da sensibilidade superficial e profunda no lado hemiplégico. • Estimular a realização independente das trocas posturais e transferências. • Evitar o desenvolvimento de complicações de natureza vascular e respiratória. • Evitar a instalação da subluxação de ombro. • Manter a amplitude de movimento das articulações. Observe que a atuação fisioterapêutica deve englobar as consequências funcionais relacionadas às manifestações clínicas primárias e secundárias. Considerando que a ocorrência do acidente vascular cerebral estará extremamente recente, é muito provável que o paciente esteja hospitalizado ou então o acompanhamento fisioterapêutico será domiciliar. Sendo assim, talvez, além da abordagem terapêutica motora, seja necessária a fisioterapia respiratória. Não será objetivo a descrição da intervenção da fisioterapia respiratória, porém vale mencionar que em decorrência da hemiplegia e da restrição ao leito, exercícios para aumentar a expansibilidade torácica no lado acometido, bem como manobras de higiene brônquica devam ser priorizados. Em relação à conduta fisioterapêutica motora, levando-se em consideração o estado clínico geral do paciente, será baseada na cinesioterapia. Assim, podemos citar algumas dessas condutas fisioterapêuticas: 179 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL • Exercícios de mobilização passiva e ativa-assistida dos membros superior e inferior do lado plégico, que podem ser combinados à estimulação sensorial (tátil, pressão e proprioceptiva). • Estimulação sensorial superficial e profunda que podem ser realizadas com objetos e utensílios de textura diferentes. • Utilização de estímulos proprioceptivos (aproximação articular passiva, descarga de peso sobre as superfícies articulares) e reflexo de estiramento combinados à mobilização passiva para facilitar a resposta muscular voluntária dos músculos plégicos. • Facilitação da realização das trocas posturais, orientando o paciente a recrutar o auxílio do hemicorpo não acometido. • Realização de desequilíbrios nas regiões de tronco superior e inferior para recrutar os ajustes posturais e controle do tronco nas posturas como sedestação, decúbito lateral. Na unidade I foram abordados os principais métodos de tratamento que poderão ser utilizados na intervenção do paciente hemiplégico. Importante ressaltar que a orientação sobre o posicionamento e trocas posturais ao cuidador e paciente será fundamental para a prevenção de úlceras no hemicorpo acometido, mas também para a subluxação de ombro. Outro aspecto que precisa ser reforçado junto ao paciente é a utilização do hemicorpo não acometido para auxiliar nas trocas posturais. Ao recrutar a musculatura do lado não acometido, o paciente estimulará os músculos do lado plégico do ponto de vista motor e sensorial. Com relação ao posicionamento articular no lado plégico, tem de ser neutro nas diferentes posturas, ou seja, devem ser evitadas posições em flexão (favorece o encurtamento dos músculos que desenvolverão espasticidade na fase crônica) ou extensão. Além disso, o ideal é que seja recomendado ao cuidador que seja incentivada a troca de postura a cada duas horas. Além do posicionamento adequado e dos exercícios de alongamento muscular, o fisioterapeuta poderá prescrever as órteses de posicionamento visando à manutenção da amplitude de movimento das articulações distais de membros superior e inferior do lado plégico. Entretanto deverá ser analisada a utilização das órteses nessa fase, uma vez que a espasticidade nesses grupos musculares estará presente durante a fase crônica. Além da cinesioterapia, os recursos da eletroterapia são citados em muitos estudos sobre a reabilitação de pacientes pós-AVC, sobretudo aqueles que oferecem emissão de sinais elétricos para os músculos, para facilitar a contração muscular. Entretanto o fisioterapeuta deverá atentar-se para a presença de distúrbios sensoriais e cognitivos na fase aguda, que poderão limitar a utilização desses recursos. 180 Unidade III O posicionamento adequado combinado aos exercícios de estimulação motora contribui para a prevenção da subluxação de ombro. Mas é comum o uso de tipoia no membro plégico sem prescrição prévia do fisioterapeuta. O uso de tipoia auxilia na prevenção da subluxação de ombro durante a fase aguda do AVC? Se o paciente estiver seguindo as orientações do tratamento, talvez não haja necessidade da aquisição da tipoia, que além da questão clínica, há o fator financeiro. Outro aspecto importante é que há diferentes modelos de tipoia, e nem todos favorecem a prevenção à subluxação. Além de forçar um posicionamento em flexão do membro superior plégico, que contribuirá com o desenvolvimento do encurtamento dos músculos que apresentarão espasticidade na fase crônica, o seu uso restringirá os movimentos ativos do membro parético. Assim, o fisioterapeuta deverá analisar sua necessidade e os diferentes modelos oferecidos no mercado que melhor se ajuste às necessidades clínicas e financeiras do paciente hemiplégico. Figura 40 – Modelo de tipoia para membro superior Disponível em: https://bit.ly/3gLEhKw. Acesso em: 30 ago. 2021. Observação Diante da persistência do paciente ou da família no uso da tipoia como forma de prevenção da subluxação do ombro, qual deve ser a orientação do fisioterapeuta? O fisioterapeuta deverá orientar que o paciente utilize a tipoia diante de situações que favoreçam que o membro plégico fique pendente, como, por exemplo, durante as transferências (do carro para a cadeira de rodas). Outra orientação é que não permaneça com a tipoia por período prolongado, uma vez que ela favorece desenvolvimento de encurtamento muscular e impede que o paciente realize movimentação ativa do membro. 181 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Fase de transição A fase de transição nem sempre é descrita e deve ser compreendida como o momento em que for observada uma mudança no quadro clínico do paciente que estava em fase aguda. Vimos que a característica clínica da fase aguda é a presença de hipotonia muscular e plegia, e que os demais sinais clínicos possuem relação com o processo inflamatório, em especial, do edema da área de penumbra da região lesada no AVC. Com a resolução do processo inflamatório e do edema, os neurônios da área de penumbra começam a apresentar atividade elétrica e, assim, consequentemente o quadro clínico se altera. Dessa forma, passa a ocorrer o retorno da sensibilidade, dos reflexos tendíneos, e o tônus muscular aumenta, ou seja, começa a ocorrer a instalação da espasticidadenos músculos antigravitários no hemicorpo acometido. Dos sinais clínicos, o retorno esperado nessa fase e que possui significado de bom prognóstico de recuperação funcional é a motricidade voluntária. Nem sempre é possível o acompanhamento do fisioterapeuta dessa fase, uma vez que a maioria dos pacientes, infelizmente, inicia a fisioterapia somente quando está na fase crônica. Exemplo de aplicação A fase de transição é um momento importante do processo de reabilitação do paciente pós-AVC, pois o aumento do tônus pode estar associado ao ganho da motricidade voluntária e dos ajustes posturais, possibilitando ganho e independência funcional. Diante dessa situação, quais são os objetivos do tratamento fisioterapêutico? De maneira geral, são os mesmos delineados para a fase aguda, com a diferença de que nesse período, o paciente evolui para o aumento do tônus muscular, e nesse contexto, nosso objetivo é atingir o controle do tônus, que possibilitará a realização de movimentos voluntários coordenados e mais controle do equilíbrio diante das trocas posturais, transferências e atividades de vida diária. Agora, além de estimular o movimento voluntário dos músculos plégicos, exercícios para ganho de força muscular nos músculos espásticos e antagonistas aos espásticos devem ser realizados. Além disso, à medida que o paciente adquire maior controle no tronco, será muito importante o incentivo e o treino para a aquisição de posturas mais altas, como a sedestação e a bipedestação, afora a própria aquisição da marcha. Vale a pena lembrar que não há um período preestabelecido de duração dessa fase, uma vez que essa evolução estará na dependência da gravidade do acidente vascular cerebral. 182 Unidade III Fase crônica (espástica) Na fase crônica do AVC, 90% dos pacientes apresentam espasticidade dos músculos antigravitários no hemicorpo acometido. Esses músculos correspondem, de forma geral, aos flexores do membro superior e extensores no membro inferior, conferindo o padrão postural típico desse período. Ao serem solicitados movimentos voluntários, são frequentes padrões sinérgicos anormais, não sendo possível a realização de movimentos isolados dos membros. Os reflexos tendíneos estão exaltados ou com hiper-reflexia, dependendo do grau da espasticidade. Sinais de liberação piramidal como clônus muscular e sinal de Babinski podem estar presentes. Com relação à motricidade, o paciente poderá evoluir para paresia e padrões alterados de recrutamento muscular que favorecem fraqueza muscular. O grau da espasticidade será dependente da extensão e do local da lesão do AVC. De maneira geral, quanto maior o grau da espasticidade, menor será o retorno da motricidade voluntária e dos ajustes posturais e de equilíbrio. Outro efeito direto da espasticidade é o encurtamento muscular e até a evolução para a instalação de deformidades. A função sensorial poderá retornar total ou parcialmente, dependendo se a área de lesão do AVC estiver envolvida no controle dessa função. Diferentemente do que vimos na fase aguda, nesse período não é frequente a evolução para complicações de natureza respiratória e até vascular, como a trombose venosa profunda. Nesse contexto, a presença da espasticidade, embora dificulte o controle do tônus para movimentos voluntários e equilíbrio, contribui em parte para essa prevenção, em especial, no membro inferior parético. Assim, vamos caracterizar, clinicamente, a fase crônica do AVC: • Presença de hipertonia espástica ou elástica. • Aumento dos reflexos tendíneos (exaltados ou com hiper-reflexia). • Plegia ou paresia. • Diminuição ou retorno da sensibilidade superficial e profunda. • Sinais de liberação piramidal clônus muscular e sinal de Babinski. • Ajustes posturais e reações de equilíbrio deficitários. • Fraqueza muscular dos músculos espásticos e seus antagonistas. 183 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL • Padrões sinérgicos anormais dos membros no hemicorpo acometido. • Encurtamentos musculares e deformidades articulares. Diante desse quadro clínico geral, os principais objetivos de tratamento fisioterapêutico são: • normalizar o tônus muscular (diminuir); • estimular a aquisição de motricidade voluntária; • ganhar força muscular nos músculos paréticos e antagonistas aos espásticos; • estimular os ajustes posturais e reações de equilíbrio, em especial no controle de tronco; • melhorar o equilíbrio nas posturas altas e em especial durante a marcha; • minimizar os encurtamentos musculares e prevenir as deformidades articulares; • incentivar a independência para a realização de atividades de vida diária. Para a obtenção dos objetivos de tratamento nessa fase, o fisioterapeuta, além da cinesioterapia clássica, poderá utilizar outros recursos, como eletroterapia, termoterapia e hidroterapia, em adição a outros métodos como terapia do espelho, realidade virtual e até equoterapia. Com relação à cinesioterapia, em especial para o controle do tônus, na fase crônica deverão ser utilizadas condutas que visam a sua redução. Para esse objetivo, uma das principais condutas inclui exercícios de alongamento muscular, que deverão constar da rotina do paciente neurológico que possuir espasticidade. O alongamento muscular deve ser realizado lentamente, para que ocorra a acomodação do fuso muscular. Vale lembrar que na espasticidade, o controle suprassegmentar sobre o fuso muscular está comprometido devido à lesão no sistema nervoso central, sendo a ativação do fuso responsável pela contração reflexa do músculo espástico. Fisiologicamente, é o alongamento rápido do músculo que determina a ativação do fuso muscular, o que então nos ajuda a compreender que, para o tratamento da espasticidade, os exercícios de alongamento deverão ser realizados de forma lenta. Além do alongamento muscular, a redução da espasticidade poderá ser obtida através de exercícios de fortalecimento para os músculos antagonistas aos espásticos. Esses exercícios, afora favorecer o ganho de força muscular, propiciam o relaxamento do músculo espástico, pelo efeito fisiológico da inibição recíproca. 184 Unidade III Outra forma de obtenção dos objetivos terapêuticos através da cinesioterapia, é a utilização das posturas neuroevolutivas e trocas posturais. Ao solicitar que o paciente adote e se mantenha em posturas como decúbito lateral, quadrupedia, sedestação, ajoelhado, bipedestação e até durante a realização da marcha, é possível melhorar o grau de alongamento, de força e ativação dos ajustes posturais nos grupos musculares do lado hemiplégico. Os métodos de tratamento fisioterapêutico na área da neurologia abordados anteriormente neste livro-texto poderão ser utilizados para a obtenção das metas funcionais propostas pelo fisioterapeuta. Na eletroterapia, a eletroestimulação funcional (FES) é o recurso indicado para o recrutamento da contração muscular, e em combinação com as estratégias de aprendizado motor, favorece a motricidade voluntária, sendo utilizada com resultados positivos nesse período, inclusive para o tratamento da subluxação de ombro, como também em combinação com a cinesioterapia. A crioterapia, que é a utilização do gelo para fins terapêuticos, é a modalidade na termoterapia indicada para a redução da espasticidade. Isso porque o frio possui a capacidade fisiológica de diminuir a velocidade de condução nervosa ao longo do neurônio motor inferior, e, assim, os estímulos que provocam a contração exagerada no músculo espástico estarão mais lentos, auxiliando dessa forma a diminuição da espasticidade. Porém os estudos mostram que essa redução é temporária e local, ou seja, o músculo espástico a ser relaxado será aquele que sofrer o resfriamento, por exemplo, através de uma bolsa térmica. Entretanto é importante ressaltar que não são todos os pacientes que apresentarão o efeito de relaxamento após a aplicação de gelo. O que precisamos lembrar é que, antes do efeito de resfriamento do nervo responsável pela inervação do músculo espástico,a pele também poderá absorver esse efeito, sendo ela rica em termorreceptores para o frio. E então, ao invés de relaxamento muscular, poderá ocorrer aumento da contração em resposta à sensibilidade ao frio. Assim, antes de pensar em utilizar o gelo como recurso para a redução temporária da espasticidade, o terapeuta deverá verificar: o paciente apresenta integridade da sensibilidade superficial da pele para o frio? Isso porque devemos lembrar que assim como o calor, o frio pode causar queimaduras. E posteriormente, precisará verificar a resposta de relaxamento da espasticidade a esse recurso. Se considerarmos o efeito também temporário da espasticidade produzido pelo alongamento muscular, hoje há estudos que combinam os dois recursos para a obtenção desse relaxamento, denominando assim o crioalongamento, que associado às estratégias para o aprendizado motor são importantes ferramentas que o fisioterapeuta poderá utilizar contra a espasticidade do paciente pós-AVC. Com relação à hidroterapia, através de seus métodos específicos de tratamento, ela contribuirá de forma positiva para a intervenção fisioterapêutica na fase crônica, favorecendo o alongamento muscular, a redução temporária da espasticidade, o ganho de força muscular e a melhora no equilíbrio do paciente. Porém o paciente precisará ter suas funções hemodinâmicas, como pressão arterial, frequências cardíaca e respiratória estáveis para a realização dos exercícios no meio aquático aquecido. Importante reforçar que a diminuição temporária da espasticidade no meio terapêutico aquático se deve à redução da ação da força de gravidade nesse meio, e não ao fato de a água ser aquecida. O aquecimento da água favorecerá os exercícios de alongamento muscular. 185 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL A equoterapia, cujo recurso terapêutico utilizado é o cavalo, pode ser outra forma de abordagem terapêutica para o paciente pós-AVC em fase crônica. A utilização do cavalo como recurso terapêutico é baseado, em especial, nas oscilações do centro de gravidade geradas na marcha do cavalo, que se assemelham às observadas na marcha humana. Assim, uma ênfase desse método de tratamento é o controle do tronco do paciente. Mas qual é o melhor método ou recurso terapêutico para o paciente pós-AVC em fase crônica? O fisioterapeuta para responder essa questão deverá levar em consideração além das necessidades clínicas do paciente, fatores que contribuirão para a adoção do melhor método, como, por exemplo, condições financeiras do paciente e de sua família, grau de envolvimento dos familiares no processo terapêutico e principalmente a motivação do paciente em relação à própria fisioterapia. Além dos métodos clássicos de tratamento fisioterapêutico para o paciente neurológico que teve um AVC, atualmente a fisioterapia tem adotado, baseado em estudos clínicos, novas abordagens que têm contribuído para a reabilitação motora funcional do paciente, como, por exemplo, as terapias do espelho e a de restrição indutiva (TCI). Observação Na terapia do espelho, o paciente é incentivado a realizar movimentos com o membro superior não acometido diante de um espelho, como forma de estímulo para o membro superior plégico/parético. Já na terapia de restrição e indução do movimento há a restrição do movimento do membro superior não acometido com o uso de uma tipoia. O paciente é então submetido a um programa intensivo de exercícios no membro superior parético e através da repetição de padrões de movimento nesse membro, espera-se ativar mecanismos celulares da plasticidade neural nas áreas cerebrais vizinhas à área cerebral lesada. 7.2 Fisioterapia no traumatismo cranioencefálico Os efeitos da instalação do trauma nas áreas encefálicas favorecem o desenvolvimento de um quadro clínico extremamente variável e complexo, em que a função motora frequentemente está comprometida. Conforme discutido na unidade II, geralmente os indivíduos mais propensos a sofrerem um TCE são jovens e as repercussões pessoais e sociais dessa situação clínica serão múltiplas. O TCE corresponde atualmente a uma das principais causas de morbidade e mortalidade com impacto na qualidade de vida do paciente, bem como de todos que se relacionam do ponto de vista pessoal e social. 186 Unidade III Esse impacto é decorrente dos efeitos provocados pela ocorrência do traumatismo cranioencefálico (TCE) que podem ser temporários ou definitivos (BRASIL, 2015). Assim, essa condição deve ser considerada uma doença da sociedade moderna, embora seja mais frequente em jovens masculinos, pode ocorrer em qualquer idade e gênero. É importante a adoção de medidas governamentais para sua prevenção (BRASIL, 2015). Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2015), o programa de reabilitação do paciente pós-TCE envolve três momentos: • Reabilitação na fase aguda, ou hospitalar: corresponde ao atendimento imediato após a ocorrência do trauma cranioencefálico, com objetivos de manter a sobrevida do paciente e evitar o desenvolvimento de complicações clínicas. • Reabilitação subaguda: ainda no período de internação, podem ser iniciadas as abordagens terapêuticas específicas para os comprometimentos motor, cognitivo, sensorial e comportamental. • Reabilitação ambulatorial: com o paciente sem risco de morte, em fase crônica, em um centro de reabilitação, a equipe multidisciplinar objetivará a reintegração social do indivíduo e sua qualidade de vida. A fisioterapia é um dos principais componentes que integrará o programa de reabilitação dos indivíduos com história de traumatismo cranioencefálico. O contato do paciente com a fisioterapia pode acontecer em dois momentos distintos da evolução clínica: uma fase aguda, hospitalar, em que provavelmente o paciente estará internado na unidade de terapia intensiva, e provavelmente com risco de morte. E em uma fase posterior em que não haverá mais risco de morte, o quadro neurológico solicitará a intervenção de profissionais especializados na reabilitação. Essa fase pode ocorrer em um centro de reabilitação ou no domicílio do paciente, dependendo de suas condições clínicas. Chamaremos essa fase de reabilitação ambulatorial. 7.2.1 Fase aguda (hospitalar) Essa fase é caracterizada pelo período de internação do paciente vítima do TCE. A intervenção fisioterapêutica dependerá da condição clínica do paciente, uma vez que provavelmente ele estará na unidade de terapia intensiva e com instabilidade hemodinâmica. Na unidade II foi discutido que a ocorrência do trauma cranioencefálico, além de acarretar um quadro neurológico com aumento da pressão intracraniana, muitas vezes está combinado a outros traumas, como de tórax e de membros, o que contribuirá para maior instabilidade hemodinâmica do paciente. 187 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Diante disso, os objetivos fisioterapêuticos serão aqueles adotados para um paciente de unidade de terapia intensiva, em que a prioridade será a manutenção e o controle das funções hemodinâmicas junto à equipe médica. Nesse contexto, a função respiratória será uma das prioridades do fisioterapeuta. Além disso, sabemos que uma das principais causas de morte do paciente de terapia intensiva ocorre em decorrência das complicações clínicas e da própria síndrome do imobilismo. Porém a hipertensão intracraniana é uma situação clínica geralmente associada ao TCE, sendo uma das causas de morte dessa condição clínica. A hipertensão intracraniana (HIC) é um efeito compressivo sobre os elementos intracranianos decorrentes do desequilíbrio entre sangue, liquor e parênquima cerebral causado pelo trauma. Sua relação com o óbito se dá principalmente pela obstrução dos vasos cerebrais dificultando a circulação sanguínea cerebral e pela compressão de estruturas anatômicas que controlam nossas funções vitais, como o centro cardiorrespiratório localizado no tronco cerebral. Assim, a atuação fisioterapêutica estará restrita diante da HIC, que resultará em instabilidade clínica, sobretudo nesse período. Oprocedimento para observação e controle da HIC é a colocação cirúrgica do cateter de monitorização para pressão intracraniana (PIC), realizada muitas vezes após a drenagem de hematomas intracranianos, resultado direto do TCE. A figura a seguir mostra as regiões anatômicas que o cateter pode ser posicionado. Pele Osso Dura Subdural Aracnoide Ventrículo lateral Subdural IntraparenquimatosoVentriculostomia Figura 41 – Posicionamento do cateter de monitorização da PIC Fonte: Giugno (2003, p. 291). Desses posicionamentos possíveis, um dos mais frequentes é a colocação do cateter em um dos ventrículos laterais, já que o parâmetro da mensuração da PIC é a pressão liquórica. 188 Unidade III A outra extremidade do cateter é externa e termina em um monitor que é posicionado ao lado do leito do paciente. Assim, os profissionais da UTI poderão visualizar de forma contínua os valores da PIC. Portanto, a integridade do cateter e seu posicionamento intracraniano devem ser mantidos por todos os profissionais da UTI. As condutas da equipe médica, incluindo o fisioterapeuta, para o paciente que está com monitorização da PIC é: • Manter o paciente em decúbito dorsal, com elevação, aproximadamente, de 30° do tronco superior, e a cabeça deve estar na linha média, evitando-se qualquer inclinação ou rotação. Esse posicionamento favorece a drenagem sanguínea venosa. • Evitar mudanças de decúbito e procedimentos que possam favorecer aumento da PIC. Para o tratamento da hipertensão intracraniana (HIC), são adotadas algumas medidas médicas gerais como: • Colocação cirúrgica do cateter de monitorização da PIC. • Administração de medicamentos como sedativos, para evitar qualquer grau de agitação motora que possa favorecer aumento da PIC, diuréticos, para auxiliar na resolução de retenção de líquidos, como o edema cerebral, importante fator casual da HIC. • Posicionamento do paciente em decúbito dorsal, com elevação aproximada de 30º do tronco superior e cabeça alinhada. • Controle da função respiratória do paciente no ventilador mecânico, evitando o acúmulo de secreções, bem como favorecendo a hiperventilação. Em especial, a atuação da fisioterapia contribui para as duas últimas medidas gerais de tratamento da PIC. A contribuição para a manutenção do posicionamento do paciente, mas principalmente para o controle da função respiratória, através dos procedimentos de higiene brônquica, como aspiração e controle dos parâmetros ventilatórios serve para facilitar a hiperventilação. Vale lembrar que a presença de secreção ao longo das vias respiratórias favorece o aumento da PIC, pois estimula o reflexo da tosse. Quanto à hiperventilação, a eliminação de CO 2 auxilia na intervenção ao edema cerebral. Assim, é importante reforçar que as condutas fisioterapêuticas diante da condição clínica da HIC serão restritas e dependentes diretamente de sua evolução. À medida que passa a ser observada estabilidade da HIC, o fisioterapeuta, além da função respiratória, poderá atuar de forma a evitar as complicações da síndrome do imobilismo e até auxiliar, através de exercícios de estimulação sensorial e motora, na reversão do coma. São objetivos da intervenção fisioterapêutica na fase hospitalar do paciente pós-TCE: 189 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL • Prevenir desenvolvimento de úlceras de decúbito. • Impedir desenvolvimento de complicações de natureza respiratória e vascular, como trombose venosa profunda. • Evitar desenvolvimento de encurtamentos musculares e deformidades articulares. • Manter a função respiratória e promover o desmame do paciente em relação à ventilação respiratória. • Auxiliar na reversão do estado de coma. • Potencializar o controle motor e postural. Para a obtenção desses objetivos, algumas condutas podem ser destacadas: • Posicionamento e mudanças de decúbito, de preferência, a cada duas horas. • Exercícios respiratórios associados às manobras de higiene brônquica. • Mobilizações articulares passivas e ativas-assistidas. • Estimulação sensorial que pode ser combinada com os exercícios de mobilização passiva e ativa-assistida dos membros. • Incentivo das trocas posturais, em especial decúbito lateral, sedestação e, se possível, bipedestação e marcha. • Instigação da realização de movimentos voluntários e, se possível, o ganho de força muscular. 7.2.2 Fase crônica (ambulatorial) Nesta fase, o paciente não possui mais risco de morte, seu quadro clínico geral é estável e controlado do ponto de vista sistêmico e hemodinâmico. Ele pode estar em casa ou ser encaminhado para um centro de reabilitação a fim de dar continuidade ao programa de reabilitação. Embora estável do ponto de vista sistêmico, o rebaixamento do nível de consciência pode estar mantido. O quadro clínico nesse período é muito variável devido à ação difusa que as forças responsáveis pelo trauma cranioencefálico provoca sobre as diferentes regiões encefálicas. Assim, podemos encontrar na avaliação: • Comprometimento da função cognitiva (memória, atenção, dificuldade de crítica e julgamento) e comportamental. 190 Unidade III • Comprometimento da função motora (hipotonia, hipertonia espástica, ataxia, plegia/paresia; movimentos involuntários). • Alteração sensorial superficial e profunda. • Comprometimento da função vesical. • Comprometimento da linguagem (afasia, disartria). • Perda da audição e visão. Uma característica comum para a maioria dos pacientes pós-TCE é o comprometimento variável da função cognitiva e comportamental, devido à tendência de acometimento dos lobos frontal e temporal durante a ocorrência do TCE. Lesões nessas regiões estão relacionadas com perda da memória, dificuldades de atenção e aprendizagem; enquanto as comportamentais incluem redução da autoconfiança e motivação, comportamento infantil, além de irritabilidade e agressão. Os déficits envolvidos na função cognitiva e comportamental são responsáveis muitas vezes pelas limitações funcionais e de reintegração social desses pacientes. Para a abordagem terapêutica do paciente que sofreu TCE, há escalas que podem ser aplicadas para verificação do prognóstico clínico do TCE, como é o caso da escala de Glasgow, e para verificação da função cognitiva e comportamental do paciente. A escala Rancho Los Amigos foi descrita inicialmente em 1965 e foi revisada em 2001. Além do nível de consciência, possibilita a avaliação da função cognitiva e comportamental do paciente. Através de sua aplicação, é possível a elaboração de estratégias adequadas de tratamento para a reabilitação. De maneira geral, a escala foi fundamentada inicialmente em oito níveis. Quadro 31 – Níveis cognitivos da escala Rancho Los Amigos Nível Resposta I Sem resposta II Resposta generalizada (dor) III Resposta localizada (de acordo com o estímulo: lenta) IV Confuso-agitado (confusão, desorientação, comportamentos agressivos) V Confuso-inadequado (responde a comandos simples, baixa concentração) VI Confuso e apropriado (30 min. de atenção, confusão apenas em assuntos fora de sua rotina, percepção de apenas déficits físicos) VII Automático e apropriado (realização de todos os cuidados sem auxílio, pouca flexibilidade mental, necessidade de supervisão) VIII Automático e apropriado (realização de todos os cuidados sem auxílio, pouca flexibilidade mental, necessita de supervisão) 191 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Após a revisão em 2001, mais dois níveis foram introduzidos à escala. Quadro 32 – Complementação da escala Rancho Los Amigos Nível Resposta IX Apropriado-propositado (responde eficientemente a situações familiares, porém pouca tolerância à frustração) X Propositado-apropriado (modificado independente) responde adequadamente a tarefas múltiplas, pode precisar de mais tempo ou há interrupções periódicas Diante do nível cognitivo e comportamental, são delineadas fases de reabilitação específicas para cada nível. Quadro 33 – Níveis cognitivos e fases de reabilitação Nível Fase de reabilitação I, II e IIIDespertar (paciente hospitalizado e saindo do coma) IV, V e VI Adequar (estimulação dos aspectos perceptocognitivos e desempenho funcional: membros superiores) VII e VIII Reorganizar (maior noção das limitações físicas e cognitivas, maior colaboração durante as terapias) Importante apontar que a evolução de cada paciente será dependente diretamente do grau de severidade do TCE. Assim, cada paciente possuirá uma evolução que poderá passar por todos os níveis cognitivos da escala, ou permanecerão em um nível, sendo sequela do TCE. Observação Do ponto de vista fisioterapêutico, a disfunção cognitiva e comportamental do paciente requer avaliação, uma vez que poderá intervir durante a fisioterapia de forma negativa. Ao fisioterapeuta caberá identificar e encaminhar o paciente a um profissional especializado na reabilitação cognitiva. Em relação aos déficits das funções motora e sensorial, não há uma abordagem fisioterapêutica específica ao portador de lesão encefálica após um TCE. A elaboração do programa de tratamento dependerá da avaliação inicial e da queixa funcional do paciente. Assim, alguns objetivos de tratamento fisioterapêutico para o paciente pós-TCE em fase crônica podem incluir: • Estimular o controle do tônus muscular. • Estimular as modalidades sensoriais superficial e profunda. • Estimular a aquisição de movimentos voluntários e força muscular. 192 Unidade III • Estimular o controle de tronco, bem como os ajustes posturais e reações de equilíbrio. • Incentivar as aquisições e manutenção de equilíbrio nas diferentes posturas, como sedestação, bipedestação e marcha. • Melhorar a coordenação motora, em especial para a realização das atividades diárias. Com relação às condutas terapêuticas, estas podem ser baseadas nos métodos de tratamento abordados na unidade I, incluindo a facilitação proprioceptiva (conceito Kabat), o conceito neuroevolutivo (conceito Bobath), o método Rood, entre outros. A utilização de recursos ortopédicos como as órteses pode ser indicada para auxiliar na prevenção dos encurtamentos musculares e deformidades articulares. Além da disfunção cognitiva, o comprometimento da função motora na forma de alteração de tônus muscular mais comum é a espasticidade. Assim, para o tratamento da espasticidade poderão ser utilizados os recursos da cinesioterapia convencional e eletroterapia. A hidroterapia também auxilia na reabilitação motora do paciente pós-TCE, sendo importante verificar a presença de critérios necessários para sua prescrição, como controle das funções hemodinâmicas e autonômicas do indivíduo. Para finalizar, importante ressaltar que a reintegração social do paciente dependerá do retorno de sua habilidade para a realização independente de suas atividades funcionais, mas também de seu controle cognitivo e comportamental. 7.3 Fisioterapia no trauma raquimedular (TRM) Um dos conceitos de reabilitação afirma que reabilitar é tornar alguém novamente habilitado de algo que foi perdido, com auxílio de uma equipe multidisciplinar composta de profissionais das áreas de humanas, biológicas e exatas (SILVA et al., 2012). Nesse contexto, a lesão medular ocasiona múltiplos efeitos na vida do indivíduo devido às alterações em sua dinâmica corporal com transformações abruptas sobre ele e seus familiares (SILVA et al., 2012). Nas transformações relacionadas à dinâmica corporal, inclui-se a necessidade de adaptação em relação a controle vesical e intestinal, integridade da pele, mobilidade articular, sexualidade, aspectos nutricionais, afetivos e profissionais (SILVA et al., 2012). Nos últimos anos, as pesquisas sobre lesão medular têm possibilitado novas perspectivas à reabilitação da lesão medular, a fim de ofertar melhora na qualidade de vida aos portadores. 193 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Entre essas pesquisas, vale apontar aquelas relacionadas com células-tronco para estimular o processo de regeneração da medula, mas também o desenvolvimento de exoesqueletos, cuja função é possibilitar movimentos da pessoa sem prognóstico de recuperação motora (SILVA et al., 2012). Figura 42 – Representação de exoesqueleto humano Disponível em: https://bit.ly/3t2eB14. Acesso em: 30 ago. 2021. A intervenção fisioterapêutica dependerá diretamente do quadro clínico, assim como da fase de evolução da lesão que estiver o paciente, além disso, procurará prevenir as complicações clínicas. Vimos na unidade II que a lesão medular pode ser resultado de diferentes causas, sendo as traumáticas as mais frequentes. Sendo assim, focaremos a evolução clínica do trauma raquimedular. 7.3.1 Evolução clínica do trauma raquimedular O quadro clínico na lesão medular dependerá dos fatores: nível de lesão, grau de lesão medular nos planos transversal e longitudinal, além do tempo de instalação da lesão. Imediatamente ao trauma raquimedular, a evolução clínica é caracterizada pela apresentação das fases: aguda (choque medular), transição e crônica. Fase de choque medular Período que se instala imediatamente após a lesão medular e pode durar entre 4 e 6 semanas. Segundo Neves e Jesus (2007), os sinais clínicos presentes nessa fase são: 194 Unidade III • anestesia superficial e profunda abaixo do nível de lesão; • paralisia flácida abaixo do nível de lesão (atonia muscular); • arreflexia tendínea e cutânea; • vasodilatação paralítica e anidrose (ausência de sudorese); • arreflexia vesical e atonia intestinal; • alterações sexuais (ausência de ereção e ejaculação masculina e de ereção clitoriana, lubrificação vaginal e amenorreia de um a 3 meses). O ideal é que o início da fisioterapia seja nessa fase, em que provavelmente o paciente estará ainda hospitalizado. Porém os procedimentos cirúrgicos adotados para o trauma na coluna vertebral poderão restringir a intervenção fisioterapêutica nesse momento. De maneira geral, os objetivos de fisioterapia na fase de choque medular são (HOSPITAL DE CLÍNICAS…, 2019): • Minimizar os efeitos deletérios do repouso prolongado no leito, tendo cuidado com as mobilizações precoces no período pré-cirúrgico. • Melhorar ou manter a função respiratória. • Atenuar os riscos de trombose venosa profunda. • Prevenir complicações clínicas como hipotensão postural, disreflexia autonômica, úlceras de pressão. • Melhorar ou manter a amplitude de movimento. • Melhorar ou manter a função motora relacionada ao nível de lesão. • Impedir encurtamentos musculares e deformidades articulares. • Aumentar força e resistência muscular dos grupos não afetados pela lesão medular. Do ponto de vista respiratório, de modo geral, técnicas terapêuticas específicas que incluem vibrocompressão torácica, exercícios expiratórios e até procedimento de aspiração de vias aéreas podem ser necessárias, dependendo do nível neurológico do paciente nessa fase. Além disso, exercícios respiratórios visando a reexpansão pulmonar como os exercícios respiratórios diafragmáticos, sustentação máxima da inspiração e aqueles que combinam exercícios ativos de membros superiores (HOSPITAL DE CLÍNICAS…, 2019). 195 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Para a fisioterapia motora, exercícios de mobilizações passivas sobre os segmentos plégicos ajudam a prevenir complicações que podem comprometer a vida, como a trombose venosa profunda, úlceras de pressão, além de contribuir para a manutenção da amplitude de movimento. Ao realizar as mobilizações passivas e mudanças de decúbito, o fisioterapeuta deve aplicar exercícios de aproximação articular, tapping e descarga de peso sobre as articulações como forma de estimulação sensorial exteroceptiva e proprioceptiva. Nos grupos musculares localizados acima do nível de lesão, exercícios ativos e resistidos devem ser recrutados, visando o ganho de força e resistência muscular. As trocas posturais e posicionamento adequado no leito devem ser realizados a cada duas horas e inicialmente executados pela equipe de enfermagem e fisioterapeuta, que deverão virar em “bloco” o paciente para evitar movimentosde rotação do tronco durante essa fase. Diante da liberação médica, o paciente deve ser incentivado a realizar exercícios para o controle de tronco, treino de sedestação na beira do leito e em cadeira. Fase de transição: retorno da atividade medular reflexa Essa fase é caracterizada pelo retorno da atividade reflexa osteotendínea e cutânea quando a lesão for do neurônio motor superior, composta de hipertonia espástica, anestesia e reflexos patológicos como Babinski e clônus muscular. No caso de lesão do neurônio motor inferior será observada paralisia flácida, arreflexia tendínea e anestesia. Há retorno da atividade autonômica, a bexiga neurogênica pode ser do tipo espástica (lesão neurônio motor superior) e flácida (lesão neurônio motor inferior). Fase crônica da lesão medular Nesse período, o quadro clínico do paciente está estabilizado, sendo possível a definição do tipo e nível de lesão. No caso das lesões incompletas, haverá evolução para uma das síndromes medulares. Do ponto de vista funcional, há necessidade de adaptação do paciente a sua nova condição de tetraplegia ou paraplegia (NEVES; JESUS, 2007). A determinação do nível neurológico pela ASIA irá influenciar o programa de reabilitação e seu prognóstico funcional. De maneira geral, os objetivos do tratamento fisioterapêutico para a fase crônica incluem (HOSPITAL DE CLÍNICAS…, 2019): • Estimular controle de tronco. • Manter amplitude de movimento e flexibilidade muscular. 196 Unidade III • Aumentar força e resistência muscular dos grupos musculares não plégicos. • Evitar úlceras de pressão e complicações respiratórias, bem como aquelas relacionadas à espasticidade. • Incentivar as trocas posturais e transferências, visando à independência funcional. • Encorajar treino de manuseio e dispositivos auxiliares para locomoção, incluindo cadeira de rodas. Para essa fase, os recursos fisioterapêuticos são variados e incluem a cinesioterapia, a hidroterapia, a eletroterapia (como a eletroestimulação funcional, para pacientes com preservação da sensibilidade), entre outros. Cada recurso deverá ser adaptado às necessidades clínicas e psicológicas do paciente. Lembrete Um dos recursos utilizados atualmente para pacientes com lesão medular incompleta é o treino de marcha em esteira, que pode ser combinado com a utilização de eletroestimulação funcional. 7.3.2 Complicações clínicas Além dos efeitos diretos ocasionados pelo trauma raquimedular, o portador da lesão medular estará sujeito a complicações clínicas que podem se desenvolver a partir da fase de choque ou fase crônica. Comprometimento respiratório Lesões torácicas e cervicais altas da medula espinal podem comprometer a função respiratória devido à paralisia dos músculos envolvidos diretamente no controle da respiração: diafragma, intercostais e acessórios da cervical e abdominais. A insuficiência respiratória é mais comum no período de choque medular. Com a paralisia dos músculos inspiratórios, o paciente evoluirá para hipercapnia, sendo necessárias condutas imediatas para seu controle (NEVES; JESUS, 2007). Além disso, a hipoventilação favorecerá o desenvolvimento de atelectasia e a probabilidade de infecções respiratórias. As complicações respiratórias podem ser prevenidas com a fisioterapia respiratória, que dará ênfase para a mobilização de secreções, prevenção a atelectasias e fortalecimento da musculatura respiratória (NEVES; JESUS, 2007). 197 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Comprometimento vascular A trombose venosa profunda (TVP) é uma complicação vascular frequente, sobretudo no período do choque medular. Ocorre a ausência de tônus vascular e da resposta reflexa de vasoconstrição ou vasodilatação, o que favorece uma estase, principalmente nos membros inferiores. O deslocamento de trombo poderá causar uma embolia pulmonar, quadro que pode levar ao óbito de forma súbita. Segundo Neves e Jesus (2007), a incidência da TVP e da embolia pulmonar é maior no lesado medular devido aos seguintes fatores: • Redução da velocidade do fluxo sanguíneo venoso devido a paralisia muscular, ausência do controle vasomotor e repouso prolongada no leito. • Menor pressão negativa intratorácica devido à ausência de ação da musculatura intercostal e abdominal em pacientes tetraplégicos, o que favorece a redução do retorno venoso para as cavidades cardíacas direitas. • Alterações nos fatores de coagulação, como liberação da tromboquinase. É necessário muito cuidado na avaliação de uma provável TVP, uma vez que os principais sintomas costumam estar camuflados na lesão medular, como ausência de sensibilidade dolorosa e tônus muscular. A hipotensão ortostática também é outra complicação vascular comum em pacientes com nível alto de lesão, principalmente na fase de choque medular. Ela se manifesta pelos sinais clínicos de zumbido, vertigem, taquicardia, cefaleia, fraqueza, escurecimento da visão ou perda súbita da consciência (NEVES; JESUS, 2007). A hipotensão ortostática é resultado do comprometimento do controle autônomo sobre o tônus vascular periférico e da circulação visceral abdominal. A fisioterapia precisa estar atenta a sua presença, principalmente durante as solicitações das trocas posturais, que ao ocorrer poderá provocar desmaios e até quedas. Daí a importância do incentivo à adoção de posturas mais altas, como o próprio ortostatismo ao paciente, após liberação médica. Do ponto de vista muscular, há redução da síntese de proteínas nas fibras musculares, que combinado ao desuso, favorecerá a atrofia muscular. Essas alterações estão presentes nos músculos respiratórios e dos membros, o que poderá dificultar o processo de extubação, prolongando a necessidade de ventilação mecânica (SIBINELLI et al., 2012). 198 Unidade III Com relação à manutenção prolongada do decúbito dorsal, ocorrerá mudança do fluido intravascular, das extremidades para a caixa torácica, além do posicionamento das vísceras abdominais dificultar a excursão diafragmática. Assim, a ausência do ortostatismo, pela redução do efeito de descarga de peso sobre os ossos dos membros inferiores, favorece a dificuldade de fixação de cálcio, possibilitando a osteopenia e a ocorrência de fraturas. Portanto o ortostatismo como recurso terapêutico tem sido adotado cada vez mais cedo, inclusive nas unidades de terapia intensiva, incorporando o denominado programa de mobilização precoce. Pode ser adotado de forma passiva, com a utilização da prancha ortostática ou ativa para estimulação motora, favorecendo também a melhora da função cardiopulmonar e do estado de alerta (SIBINELLI et al., 2012). A utilização da prancha ortostática tem sido realizada em pacientes críticos, dos quais os com lesão medular estão inclusos. São considerados benefícios obtidos com a sua utilização (SIBINELLI et al., 2012): • melhora no controle autonômico do sistema cardiovascular; • evolução da oxigenação e da ventilação; • progresso do estado de alerta; • incitação do sistema vestibular, da propriocepção, do tato e da pressão sobre as superfícies plantares; • estimulação da descarga de peso sobre os ossos dos membros inferiores. Observação Tanto para os pacientes críticos e com lesão na medula espinal, o fisioterapeuta deve manter a sua monitorização hemodinâmica constante durante sua inclinação na prancha ortostática. Principalmente no que se refere aos sinais de pressão arterial, frequência cardíaca, saturação de oxigenação, bem como aqueles que possam indicar fadiga ou desconforto respiratório durante o processo de verticalização. 199 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Figura 43 – Prancha ortostática Disponível em: https://bit.ly/3AyhTuW. Acesso em: 30 ago. 2021. A disreflexia autonômica é outra complicação em pacientes com lesão medular completa, principalmente, naqueles com lesão acima de T5-T6, sendo caracterizada por instalação súbita e clinicamente por vasodilatação cutânea nas regiões de pescoço e cabeça (rubor, congestão nasal), bradicardia, hipertensão,cefaleia intensa, hipersudorese e piloereção, sendo essas respostas ativadas diante de estímulos aferentes exteroceptivos (NEVES; JESUS, 2007), como, por exemplo: • Distensão vesical: litíase urinária, obstrução e pinçamento da sonda vesical, infecção urinária, cateterismo intermitente. • Distensão intestinal ou impactação fecal, flatulência, estimulação retal durante rotinas intestinais (enemas e supositórios). • Após estimulação da pele: úlceras de decúbito, unhas encravadas, mudanças na temperatura cutânea, manutenção prolongada de decúbito e trocas posturais. • Aqueles provocados pelo ato sexual e estresse psicológico. A disreflexia é resultado da desconexão entre os neurônios pré-ganglionares simpáticos e o bulbo, a qual irá gerar uma resposta vagal acima do nível da lesão, vasoconstrição abaixo dela, bem como a elevação da pressão sanguínea, responsáveis pelas manifestações clínicas. Vale lembrar que é uma emergência médica, uma vez que essas respostas podem causar descompensação cardíaca e até um AVC (NEVES; JESUS, 2007). 200 Unidade III Lembrete Atualmente, com os avanços tecnológicos presentes nas unidades de terapia intensiva, as intervenções precoces voltadas para a reabilitação do paciente são cada vez mais possíveis. É o caso da mobilização precoce, que corresponde a um conjunto de condutas terapêuticas realizadas na UTI com objetivos de manutenção ou aumento da força muscular e condição física do paciente. Além de exercícios específicos, é incentivada a adoção de posturas como sedestação e bipedestação, que podem ser obtidas através da utilização de uma prancha ortostática. Alteração na regulação térmica O controle da temperatura corpórea é resultado de mecanismos complexos envolvendo o sistema nervoso, endócrino e vascular, sendo que a função das glândulas sudoríparas depende de estímulos aferentes e eferentes provenientes do sistema nervoso central e periférico, incluindo a medula espinal e suas raízes e a inervação pré e pós-ganglionar (NEVES; JESUS, 2007). Na fase de choque medular, há anidrose abaixo do nível da lesão e, posteriormente, os últimos segmentos medulares preservados tendem a compensar, agindo sobre alguns dermátomos localizados abaixo da lesão, havendo o retorno da sudorese (NEVES; JESUS, 2007). Assim, os portadores de lesão medular apresentam intolerância às temperaturas extremas, com dificuldade de reação de calafrios e vasoconstrição diante de oscilações térmicas. Dessa forma, o controle da temperatura ambiente é uma variável importante, que poderá influenciar no rendimento do paciente durante a fisioterapia. Alteração no tecido cutâneo O desenvolvimento de úlceras de pressão é uma das principais complicações na vida do paciente com lesão medular, e os fatores envolvidos nessa propensão são múltiplos e incluem redução da mobilidade e da sensibilidade, incontinência urinária e/ou fecal, alterações na elasticidade da pele e da circulação (NEVES; JESUS, 2007). Neves e Jesus (2007) relatam que as úlceras de pressão são decorrentes de isquemia tecidual local e por alteração do reflexo de dor nos pacientes com lesão medular. Inicialmente, há maior preferência pelas regiões onde saliências ósseas são mais proeminentes, como maléolo lateral, calcâneo, sacro, trocânter maior, ângulo inferior da escápula, porém qualquer região do corpo pode ser sede de desenvolvimento dessas lesões. 201 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Essa predisposição reforça a importância do fisioterapeuta em orientar o cuidador quanto à necessidade de troca de decúbito e inspeções constantes na pele do paciente para a prevenção das úlceras. A própria espasticidade, em especial dos músculos de membros inferiores, pode ser causa das úlceras, uma vez que devido ao posicionamento do membro espástico, imposto pela espasticidade, favorece o contato de saliências ósseas, como maléolo lateral e calcâneo no leito. A ossificação ou calcificação heterotópica é uma complicação clínica vinculada não somente aos pacientes com lesão medular, mas também àqueles restritos por período prolongado no leito. Ela pode ser definida como sendo a deposição de cálcio em regiões periarticulares (cápsula, ligamentos) de articulações proximais como quadril, ombro, joelho e cotovelo. Há diferentes hipóteses relacionadas a sua origem, mas as mais prováveis associam a alterações do metabolismo do cálcio à própria síndrome do imobilismo. A ossificação heterotópica trará restrições de mobilidade articular, com importante implicação na fisioterapia desses pacientes. Figura 44 – Radiografia de ossificação heterotópica do quadril (grau II), região periarticular Fonte: Grynwald et al. (2012, p. 32). Outra consequência grave associada ao imobilismo, mas principalmente à redução do ortostatismo, é a perda de massa óssea nos membros inferiores, o qual favorecerá a osteopenia. A fisioterapia deve se atentar, sobretudo, aos pacientes crônicos, ao tentar mobilizar ou posicioná-los no ortostatismo devido ao elevado risco de fraturas. Alteração na percepção sensorial A presença de dor crônica é um achado clínico frequente. Costuma ser diária, constante e na forma de choque. Os pacientes relatam sua piora diante de atividade física, estresse, mudança climática, podendo 202 Unidade III ser moderada e incapacitante. Esse quadro é acompanhado pelo constante desconforto induzido pelas estimulações somatossensoriais como hiperestesia e alodínea, e geralmente ocorre nos primeiros meses após a lesão (NEVES; JESUS, 2007). Alteração em controle vesical e intestinal O comprometimento no controle vesical e/ou intestinal favorece a ocorrência de infecções urinárias recorrentes, que se não tratadas, podem evoluir para o comprometimento renal e seu agravamento até para o óbito. O centro da micção localiza-se no nível S2-S4, sendo assim esperado esse comprometimento nos pacientes com lesão medular. Dependendo do nível de lesão, pode ser uma bexiga neurogênica reflexa (lesão do neurônio motor superior) ou flácida (lesão do neurônio motor inferior) (ver quadro 34). Os tipos de bexiga neurogênica favorecem a infecção urinária, além do desenvolvimento de cálculos renais e estenose uretral, devido à redução da atividade voluntária ou reflexa ao nível vesical. Outros fatores que estão relacionados à recorrência de infecção urinária nos portadores de lesão medular são a presença de cateteres, estase vesical, imobilização, dissinergismo vesicoesfincteriano e complicações urológicas frequentes, como refluxo vesicoureteral, litíase e divertículos vesicais (NEVES; JESUS, 2007). Pelas implicações graves que a infecção urinária pode trazer, o fisioterapeuta durante o programa de reabilitação deverá sempre observar sinais que possam sugerir a sua presença, como, por exemplo, odor forte verificado durante os exercícios de membros inferiores; questionar ao cuidador como se encontra a coloração da urina do paciente, alertando para a importância de sua prevenção. Quadro 34 – Principais tipos de bexiga neurogênica Bexiga neurogênica Lesão Características clínicas Reflexa (espástica) Neurônio motor superior (acima de S4-S5) Ausência de controle na micção voluntária; função vesical reflexa Autônoma (flácida) Neurônio motor inferior (cone medular ou cauda equina) Esvaziamento dependente da inervação intramural da bexiga, tendência de retenção da bexiga Com relação ao controle do intestino, este é dependente do nível medular (S2-S4), também frequentemente se encontra comprometido na lesão medular, havendo como consequência propensão à obstipação intestinal (NEVES; JESUS, 2007). Lesões no nível de S2 a S4 impedem a evacuação automática. Após o choque medular, haverá retorno da atividade reflexa nas lesões acima do centro da defecação, porém se manterá ausente nas lesões abaixo desse segmento. 203 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Tanto para o controle vesical como intestinal, é fundamental a regularização, uma vez que influenciará diretamente na adequação ao convívio social dopaciente. Além desse aspecto, a distensão intestinal pode ser um estímulo para ativação de automatismos, espasticidade e disfunção autonômica. Alterações motoras A disfunção motora é uma das principais causas da dependência funcional do paciente com lesão medular. A ausência total ou parcial do movimento voluntário exigirá adaptações nas atividades de vida diária, como nas trocas posturais, para vestuário, alimentação e locomoção. Associada à perda dos movimentos voluntários, a espasticidade é a alteração de tônus mais comum, diante da lesão do neurônio motor superior. Além das limitações nas atividades de vida diária, a espasticidade contribui para outras complicações, como úlceras de pressão e deformidades. Outro aspecto importante que influenciará as limitações funcionais do lesado medular é o nível da lesão, que determinará o grau de controle de tronco mantido após a fase de choque medular. Os encurtamentos musculares e deformidades articulares são consequências crônicas da lesão medular, sendo resultados da somação dos fatores: ausência dos movimentos voluntários, sensibilidade e espasticidade. Alterações na função sexual A função sexual é frequentemente comprometida após lesão da medula espinal. E esse comprometimento pode acarretar sérias consequências psicológicas, uma vez que a maioria é jovem. No homem com lesão medular, a disfunção sexual pode ser caracterizada por dificuldades de ereção e ejaculação, e nas mulheres afeta a lubrificação vaginal (NEVES; JESUS, 2007). Durante o choque medular, é observada ausência de ereção peniana e ejaculação, enquanto nas mulheres há amenorreia por períodos de três a seis meses. A ereção do tipo psicogênica, cuja área responsável está localizada entre T11 e L2, pode estar comprometida em lesões acima desse nível. Já a ereção do tipo reflexa (níveis S2-S3-S4) pode ser preservada em lesões acima de T11 (NEVES; JESUS, 2007). Com relação à fertilidade, nos homens poderá estar alterada, mesmo havendo produção de espermatozoides, devido ao comprometimento da ejaculação. Já nas mulheres, permanece intacta, sendo possível a gestação a termo e inclusive o parto normal (NEVES; JESUS, 2007). 204 Unidade III Alterações psicológicas Todas as repercussões descritas são responsáveis por provocarem sérias mudanças psíquicas, com necessidade de tempo para a adaptação psicológica, que inclui a alteração da imagem corporal do paciente. O fisioterapeuta deve estar atento a essas mudanças, uma vez que com frequência evoluem para depressão, apatia, agressividade, revolta, ingestão de álcool e até ideias suicidas. Embora não seja competência do fisioterapeuta a abordagem terapêutica da função psicológica, esses aspectos emocionais irão influenciar diretamente no programa de reabilitação. Diante desses aspectos emocionais e interferências durante as sessões de fisioterapia, será necessário alertar o cuidador e a família sobre a importância da procura pelo profissional especializado para o suporte ao paciente em seu processo de adaptação psicológica e emocional. O programa de reabilitação para os indivíduos com história de lesão medular é um processo complexo e longo, que inclui a participação de diferentes profissionais, mas também seu sucesso dependerá do envolvimento do paciente e de seus familiares. Atualmente, a maioria dos programas de reabilitação para lesados medulares objetiva inicialmente a adaptação do indivíduo a sua nova condição física, bem como sua inclusão social diante da nova condição. Para isso, os centros de reabilitação costumam incentivar o envolvimento do paciente, uma vez atingidas as metas iniciais da reabilitação à prática de modalidades esportivas adaptadas a pessoas com necessidades físicas especiais. A prática do esporte adaptado possibilitará, além dos benefícios físicos, o convívio do paciente com outras pessoas com histórias e dificuldades diárias semelhantes, o qual auxiliará no processo real de inclusão social. Saiba mais No filme Como eu era antes de você, um jovem rico empresário possui uma vida de sucesso no trabalho, em viagens e nos esportes, mas subitamente sofre um acidente automobilístico que o deixa tetraplégico. A nova situação ocasiona uma mudança radical do ponto de vista físico e emocional, em que passa a ser depressivo, cínico e apático. A atriz Emilia Clarke representa o papel da cuidadora contratada pela família, passa a conviver diariamente com as dificuldades físicas impostas pela lesão medular, e também com seu comportamento emocional. Vale a pena assistir como forma de observação e aprendizado das dificuldades que o cuidador, a família e o fisioterapeuta poderão encontrar diante do paciente com lesão medular. COMO EU era antes de você. Direção: Thea Sharrock. Reino Unido, EUA: Metro-Goldwyn-Mayer/New Line Cinema, 2016. 110 min. 205 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL Figura 45 – Filme Como eu era antes de você Disponível em: https://bit.ly/38nRjcs. Acesso em: 30 ago. 2021. 8 ASPECTOS PRÁTICOS DA FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL (PARTE II) 8.1 Fisioterapia nas doenças dos gânglios da base Conforme abordado anteriormente, os gânglios da base correspondem a um grupo de núcleos localizados entre o mesencéfalo e o diencéfalo. Estão envolvidos com a função motora, cognitiva e comportamental, e sua lesão resultará nas síndromes denominadas hiper ou hipocinéticas. A doença de Parkinson (DP) é progressiva e neurodegenerativa, e devido a sua complexidade, ocasiona uma sobrecarga importante sobre os pacientes, familiares e sociedade. Embora ocorra em ambos os sexos, a incidência aproximada é 1,5 vez maior em homens do que em mulheres. A maioria das pessoas com a DP recebeu o diagnóstico quando tinha mais de 60 anos de idade (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). O impacto econômico da doença é grande, sendo que as estimativas de custo variam de acordo com o país e os maiores componentes dos custos correspondem à internação hospitalar e em lar de idosos. Além disso, há os custos indiretos devido à perda de produtividade, além de sobrecarga para o cuidador (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). 206 Unidade III Na DP, a necessidade de apoio se torna evidente, sendo este de natureza multidisciplinar. Nesse sentido há os grupos de ajuda mútua, organizações formais, geralmente integradas por pessoas com o mesmo diagnóstico e interesses ou que partilham problemas semelhantes (GONÇALVES; ALVAREZ; ARRUDA, 2007). Com a progressão da DP, o portador passa a necessitar do auxílio de cuidadores informais (família, amigos ou parentes) ou formais (auxiliar ou técnico de enfermagem). As associações nacionais de Parkinson fornecem informações gerais, meios de comunicação e apoio para cuidadores. Com esses objetivos podemos citar a Associação Brasil Parkinson. Figura 46 – Logo da Associação Brasil Parkinson (ABP) Disponível em: https://bit.ly/3kHHziP. Acesso em: 30 ago. 2021. As adaptações e ergonomia domiciliar também serão necessárias com o avançar das limitações funcionais. 8.1.1 Caracterização clínica e principais escalas Segundo Barbosa e Sallem (2005), além das manifestações motoras clássicas, são observadas deficiências não motoras que podem se apresentar de forma precoce, como disfunção olfativa, distúrbio comportamental do sono REM, constipação/obstipação e depressão. Ademais, pode ocorrer acometimento cognitivo, especialmente na memória e na função executiva. Incluem deficiências relacionadas com a função executiva: • Controle interno da atenção (versus atenção guiada por pistas externas): essencial para tarefas não rotineiras. • Alternância: mudar a atenção de um estímulo para outro. • Planejamento: identificar e organizar os passos para atingir um objetivo. • Resolução de conflito: inibir respostas predominantes. • Concentração. 207 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL • Retenção e uso de informação. • Desempenho em dupla tarefa. • Tomada de decisão: considerar vantagens e desvantagens das diferentes opções. • Interações sociais: entender intenções,desejos e humor alheios. Todos esses aspectos da função executiva irão influenciar as atividades de vida diária, a marcha e a própria adesão do paciente ao tratamento fisioterapêutico e medicamentoso (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). As deficiências não motoras tardias mais encontradas nos pacientes são a demência, a incontinência urinária e a disfunção sexual. A instalação dos sintomas motores pode gerar limitações nas atividades de vida diária, sendo as dificuldades funcionais apontadas pelos portadores da doença a lentificação nos movimentos e da fala, tremor, rigidez, dor, instabilidade psíquica, deglutição, aumento da salivação, fala e flutuação de resposta aos medicamentos. Limitações durante as transferências, destreza, comunicação, marcha e inatividades são progressivamente observadas (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). Sintomas posturais e axiais (como os observadas durante a marcha) progridem mais rápido do que as outras manifestações motoras, e assim possuem significado de indicador de progressão da doença. Há diferentes escalas relacionadas aos aspectos clínicos e funcionais da doença que podem ser utilizadas por médicos e fisioterapeutas. Uma das mais utilizadas é a escala de Hoehn e Yahr (HY), que classifica o estadiamento da doença, possibilitando uma caracterização demográfica de grupos de pacientes, além de incluir os distúrbios não motores. Quadro 35 – Descrição da escala de estadiamento de Hoehn e Yahr e estágios da DP HY Descrição Estágio 1 Envolvimento unilateral, mínima ou nenhuma incapacidade funcional Inicial 2 Envolvimento bilateral ou axial, nenhuma alteração de equilíbrio Inicial 3 Bilateral; limitação leve a moderada de atividades; reflexos posturais prejudicados; fisicamente independente Moderado 4 Limitação grave de atividades, ainda capaz de caminhar ou ficar em pé sem assistência Moderado 5 Restrito à cama ou à cadeira de rodas, salvo se tiver ajuda Avançado Há uma grande variação individual entre os pacientes em relação às manifestações clínicas. Em geral, as mulheres atingem HY3 mais precocemente, assim como os distúrbios motores, as flutuações motoras, discinesias e freezing. Os indivíduos mais jovens com a doença tendem a evoluir com maiores complicações motoras. 208 Unidade III Outra escala para monitorar a progressão da doença é a Unified Parkinson’s Disease Rating Scale (UPDRS), em português: escala unificada de avaliação da doença de Parkinson, ou a nova MDS-UPDRS, revisada pela International Parkinson and Movement Disorder Society (MDS). A UPDRS permite uma pontuação para o grau de severidade da doença, incluindo as funções motora, mental, atividades de vida diária e complicações. Devido à prevalência e às repercussões na qualidade de vida dos portadores, o programa de reabilitação para os pacientes com a DP é complexo. Inclui uma gama de profissionais da saúde composta, além do clínico geral, de neurologista, enfermeiro, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, nutricionista e psicólogo. Todas as abordagens terapêuticas oferecidas devem ser integradas às condições clínicas e sociais do paciente, principalmente devido ao caráter degenerativo e progressivo da doença. 8.1.2 Intervenção fisioterapêutica A fisioterapia, de maneira geral, procura maximizar a qualidade do movimento, a independência funcional e a forma física geral, e minimizar complicações secundárias. Embora os objetivos específicos do tratamento fisioterapêutico dependerão de cada paciente e do estágio da doença, é possível delinear objetivos gerais que incluam capacidade física, transferências, atividades manuais, equilíbrio e marcha e função respiratória. O quadro a seguir descreve, de maneira geral, a abordagem fisioterapêutica para os pacientes com DP, de acordo com seu respectivo estadiamento clínico, segundo a escala de Hoehn e Yahr. Quadro 36 – Abordagem fisioterapêutica na DP de acordo com a HY HY Abordagem fisioterapêutica 1 Dar apoio ao autocuidado Prevenir a inatividade Melhorar a capacidade física Reduzir a dor e o medo de cair Retardar o início de limitações de atividades 2-4 Manter ou melhorar transferências, equilíbrio, atividades manuais e marcha 5 Manter função respiratória e sinais vitais Prevenir úlceras de pressão e contraturas Dar apoio a cuidadores Adaptado de: Capato, Domingos e Almeida (2015, p. 28-29). A capacidade física engloba a capacidade dos sistemas neuromuscular e cardiorrespiratório e se expressa por tolerância ao exercício, mobilidade articular, tônus muscular. Para a realização de atividades de vida diária, são necessárias força e resistência muscular, coordenação e amplitude de movimento. O 209 FISIOTERAPIA NEUROFUNCIONAL paciente com DP, principalmente devido a bradicinesia e rigidez muscular, tende a evoluir com redução global de sua capacidade física. O medo de cair também é um fator que colabora para a inatividade, assim como os distúrbios motores colaboram para o aumento do risco de quedas, entre eles a instabilidade postural é determinante para a ocorrência de quedas, presente nos quadros mais avançados da doença. Esses fatores citados, além do freezing na marcha, podem ser considerados específicos da doença, porém podemos apontar outros considerados secundários, que também podem colaborar com o medo de cair, como, por exemplo, os efeitos colaterais da medicação, ingestão diária de álcool e incontinência urinária (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). Atividades de dupla ou múltiplas tarefas podem contribuir para a ocorrência de quedas devido à redução da velocidade psicomotora e à flexibilidade atencional (CAPATO; DOMINGOS; ALMEIDA, 2015). Em idosos saudáveis submetidos a atividades que incluam dupla tarefa, como a marcha, tarefa cognitiva, é observada a redução do desempenho cognitivo para otimização da tarefa motora, efeito denominado “postura em primeiro lugar”. No caso dos parkinsonianos, os erros são verificados em ambas as tarefas, em que inclusive o fenômeno freezing passa a ser mais frequente, uma vez que há a redução do automatismo da marcha. Capato, Domingos e Almeida (2015) relatam que mesmo a atenção necessária para ouvir o fisioterapeuta durante o exercício é uma atividade de dupla tarefa, podendo ativar o freezing ou o desequilíbrio durante a realização do exercício solicitado. O freezing ou congelamento presente durante a marcha é dito pelo paciente como se os “pés estivessem colados no chão”, é caracterizado como um andar com passos pequenos e arrastados ou com hesitação. Sua ocorrência é um indicativo de progressão da doença, sendo responsável também pela redução das atividades de vida diária. A duração do freezing pode variar entre 10 segundos a alguns minutos, nos estágios mais avançados da doença e durante o período off da medicação. Além da marcha, outras atividades podem predispor o surgimento do freezing, como passar por caminhos estreitos (porta), durante dupla tarefa (andar e falar), alcançar algo em um espaço aberto ou quando caminha em um lugar escuro. É muito importante o fisioterapeuta observar as situações que predispõem o freezing, uma vez que seu surgimento favorece a queda. Assim, o profissional poderá orientar o seu controle. A DP não é uma doença fatal, porém todas as repercussões clínicas somadas ao perfil do paciente, que na maioria é idoso, predispõem a evolução para complicações respiratórias, podendo ser uma das principais causas de óbito. Além das complicações respiratórias, morbidades podem ocorrer, como, por exemplo, dor, osteoporose, doenças cardíacas e diabetes. 210 Unidade III As principais causas que favorecem as alterações respiratórias são: • piora da deglutição (disfagia); • obstrução das vias áreas e restrição da parede torácica; • fraqueza da musculatura respiratória e ineficiência da tosse; • distúrbios respiratórios do sono; • associação da bradicinesia e rigidez muscular que contribui para a inatividade. A fisioterapia respiratória para os pacientes com DP deve ser focada
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