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Linguística e Ensino de Letras
Disciplina Digital
--
DGT0595
9001
 
O que é Linguística Aplicada?
Prof. Nataniel Gomes
false
Descrição
Origem, definição e campo de trabalho da Linguística Aplicada como área de conhecimento de Letras.
Propósito
Compreender a origem, os pressupostos teóricos e os aspectos metodológicos do campo da Linguística Aplicada para ampliar o conhecimento linguístico na área do ensino-aprendizagem de língua.
Objetivos
Módulo 1
Origem e conceito da Linguística Aplicada
Identificar a origem e o conceito de Linguística Aplicada.
Módulo 2
Campo de trabalho da Linguística Aplicada
Reconhecer o campo de trabalho da Linguística Aplicada.
Introdução
A Linguística Aplicada é uma ciência relativamente jovem, mas ela já tem produzido conteúdos cada vez mais relevante para sua área de atuação, tanto no Brasil quanto em todo o mundo. Isso pode ser percebido pelo grande número de artigos e livros publicados e a crescente quantidade de congressos, seminários e cursos nos últimos anos, colocando a área em destaque.
Ainda há, porém, muita discussão sobre a distinção entre Linguística e Linguística Aplicada, o que não é nada simples de se responder. A partir dos trabalhos dos pesquisadores em Linguística Aplicada, pode-se encontrar um caminho de resposta, descrevendo a sua forma de abordar as questões da linguagem, como uma área de conhecimento explícito, objetivo e sistemático.
Como veremos neste conteúdo, o histórico da Linguística Aplicada mostra o seu relevante percurso, abrangendo diferentes áreas do conhecimento, investigando a cultura, considerando os aspectos sócio-históricos e apontando os problemas com os quais ela tem de lidar, buscando soluções para eles.
Inserindo imagem...
1 - Origem e conceito da Linguística Aplicada
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar a origem e o conceito de Linguística Aplicada.
A área da Linguística
A Linguística como ciência
Antes de a Linguística alcançar o status de ciência, ela estava ligada a outros estudos, como a Lógica, a Retórica, a Filosofia, a Crítica Literária, mas isso mudou quando ela passou a focar exclusivamente nas questões da linguagem, gerando pressupostos teóricos, a partir de descrições e explicações para dar conta de sua análise.
Assim, pode-se afirmar o seguinte:
A linguística busca fazer a descrição e a compreensão de como o ser humano é capaz de se comunicar, por meio de sinais sensoriais.
Em outras palavras, a Linguística é a ciência responsável pelo estudo dos códigos utilizados para a comunicação (do latim, communicare, que significa “tornar comum”) e da capacidade inata da humanidade para adquirir a linguagem, sendo que a sua maior preocupação é com a língua falada.
Podemos, então, afirmar que a Linguística estuda as línguas naturais e se interessa por, pelo menos, seis dimensões (FRANCHI, 1990, p. 80):
	record_voice_over
	Dimensão sintática
	Conjunto estruturado dos recursos linguísticos que expressam as relações, funções e categorias relevantes para a interpretação dos enunciados.
	record_voice_over
	Dimensão semântica
	Modos de representação da realidade, tomados como sistema de referência para essa interpretação.
	record_voice_over
	Dimensão dêitico-referencial
	Mecanismos que relacionam essa interpretação a determinados estados de fato, nas coordenadas espaço-temporal e interpessoal.
	record_voice_over
	Dimensão pragmático-discursiva
	Determinadas situações de uso, inclusive para avaliar os enunciados, do ponto de vista de sua adequação a determinadas ações e propósitos.
	record_voice_over
	Dimensão lógica
	Determinadas situações de uso, inclusive para avaliar os enunciados, do ponto de vista de sua verdade ou falsidade.
Os estudos sobre a linguagem assumiram o formato que encontramos atualmente graças às mudanças no domínio da Linguística, que ocorreram no início do século XX, abandonando o naturalismo que dominava a abordagem comparativista do século anterior, muito voltada para a comparação entre as línguas e a investigação de seus aspectos históricos.
No início do século XX, o linguista suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913) criou os fundamentos para que a Linguística deixasse de ser uma investigação e passasse a ser vista como uma ciência. Isso se deu a partir de um curso ministrado por ele na Universidade de Genebra, sendo publicado como obra póstuma elaborada por seus alunos, intitulada Curso de Linguística Geral.
Por isso, o século XX é considerado por muitos teóricos como o “século da linguagem”. Nele se destacaram filósofos com a preocupação especial nas questões da linguagem, como Wittgenstein, Heidegger, Habermas e outros.
Ferdinand de Saussure.
Tal interesse surgiu em diversas áreas para discutir questões ligadas ao tema. Vejamos a seguir alguns exemplos:
Exemplo
Na Teoria do Conhecimento, a crítica transcendental mudou seu enfoque para a crítica da linguagem, a Lógica buscou entender as linguagens artificiais, e a Antropologia percebeu que a linguagem é exclusiva do ser humano e afeta a sua visão de mundo.
Daí temos a Linguística com o objetivo de pesquisar como a linguagem funciona a partir do estudo de línguas específicas. Para tal, ela considera a língua como seu objeto de estudo de forma empírica, dentro de seus limites, como acontece em outras ciências, por exemplo, a Biologia, a Física, a Geografia.
Logo, sua metodologia foca principalmente a fala de determinada comunidade de usuários de determinada língua.
A proposta metodológica desenvolvida pela Linguística visa descrever e analisar a partir de um corpus, ou seja, um conjunto de dados coletados, que são as frases realizadas pelos falantes no uso diário. Assim, a Linguística tem um caráter científico pautado pelo empirismo e pela objetividade de análise.
Nesse sentido, seriam duas as tarefas principais da Linguística:
Tarefa I
Estudar as línguas particulares como um fim em si mesmo, com o objetivo de descrevê-las adequadamente.
Tarefa II
Estudar as línguas como meio de levantar informações acerca da natureza da linguagem de um modo geral.
Perceba que a Linguística não é uma disciplina homogênea, pois ela tem um conjunto de opções teóricas e orientações na busca por investigar as questões da linguagem que afetam diretamente a sociedade, tanto no ensino quanto nas diversas situações cotidianas de comunicação. Assim, a linha de atuação da Linguística é bastante ampla, como veremos mais adiante.
Surgimento da Linguística Aplicada
Em 1946, Charles Fries e Robert Lado ministraram, na Universidade de Michigan, o primeiro curso de Linguística Aplicada. Naquele momento, o foco era o ensino de línguas e os linguistas buscavam uma proposta diferenciada na forma como ministravam a Linguística, com base na experiência que tinham no ensino do inglês como língua estrangeira.
Em 1948, a revista Language Learning: A Journal of Applied Linguistics usou pela primeira vez o termo Linguística Aplicada.
Aquele era um período próximo do final da Segunda Guerra Mundial e que se caracterizava pelo grande investimento no ensino de línguas, com métodos que combinavam:
	o behaviorismo;
	a linguística contrastiva;
	a tecnologia dos laboratórios de línguas; e
	as capacitações linguísticas com fins militares.
Nesse contexto é que surge um campo fértil para desenvolvimento da Linguística Aplicada (ROCHA; DAHER, 2015).
Para Rajagopalan (2006, p. 152), houve uma guinada nos estudos linguísticos em função dos investimentos ou “novas fontes de financiamento” no ensino de línguas, assim, “a forma como as pesquisas linguísticas foram conduzidas nessa época foi determinada pelas expectativas criadas em torno de suas possíveis aplicações”.
Behaviorismo
A perspectiva behaviorista da linguagem se caracteriza, em linhas gerais, pelo entendimento do processo de aprendizagem da linguagem por meio de uma cadeia ou sequência de estímulo-resposta-reforço.
Linguística contrastiva
Caracteriza-se, em linhas gerais, pelo estudo e descrição de duas ou mais línguas a fim de verificar diferenças e semelhanças entre elas.
A Linguística Aplicada,também referida como LA, surgiu no mundo anglófono. Depois da Segunda Guerra Mundial, por exemplo, os Estados Unidos enxergaram o potencial de expandir a língua inglesa por meio do ensino, devido à necessidade de aprender novas línguas. A presença de soldados norte-americanos baseados em países orientais é um exemplo dessa situação.
Naquele contexto do Pós-Guerra, a Linguística Aplicada não tinha relação nem com a “Linguística”, nem com a “aplicação”. Isso porque a Linguística tinha a preocupação de descrever línguas, algumas isoladas, estudar estruturas e assim por diante.
Quando a Inglaterra percebe que está perdendo seu espaço no mundo, ela decide exportar o ensino de sua língua para se manter erguida, numa tentativa de exportar o idioma e manter o poder. Daí surgem os primeiros conceitos da Linguística Aplicada em sua tentativa de estender o ensino da língua inglesa para o resto do mundo.
Na década de 60, quando os indianos eram tidos como falantes de um inglês que ninguém entendia. Gillian Brown (1990), foneticista, e seu grupo de pesquisa fizeram um esforço tremendo em consertar a fala dos indianos: estiveram em Madras (hoje Tamil Nadu) e ao final do treinamento acharam que tinham conseguido que os indianos falassem igual à rainha da Inglaterra. Um ano depois voltaram para saber o resultado de seus esforços: os falantes já haviam voltado a falar como antes do treinamento. Esse evento foi conhecido como Madras Snowball (Bola de Neve de Madras). Apesar de todo esse apelo a um inglês puro, na década de 70, os indianos já contavam com uma produção literária bastante representativa, demonstrando que o inglês britânico não podia mais restaurar seu império, muito menos o linguístico. Hoje a Índia só perde para os Estados Unidos e Inglaterra em produção em língua inglesa.
(RAJAGOPALAN, 2010, p. 15)
No início, a Linguística Aplicada era vista como uma área que tinha como propósito investigar as práticas de aprendizagem de línguas, portanto, voltada para métodos e técnicas científicas para ensino de línguas estrangeiras.
Desse modo, a LA não nasce como uma aplicação da Linguística, antes, a LA surge a partir de uma abordagem indutiva, ou seja, uma pesquisa vinculada ao estudo da língua a partir de seu uso no mundo real, e não a partir de uma língua idealizada.
O que podemos perceber é que a Linguística Aplicada estava ligada a um movimento imperialista que levava a língua inglesa para os países falantes de outros idiomas, o que nos mostra a Linguística sujeita a interesses sociogeopolíticos (RAJAGOPALAN, 2010).
Conceitos e objetivos da Linguística Aplicada
Na década de 1980, surgiu uma discussão sobre a abrangência da Linguística Aplicada.
A LA iria além do ensino, do uso da linguagem em determinados contextos, chegando à busca da união entre teoria e prática, o que incluía:
	Bilinguismo e multilinguismo
	Comunicação por intermédio de computadores
	Análise de conversação
	Linguística de corpus
	Análise crítica do discurso
	Linguística forense
	Planejamento e políticas linguísticas
	Comunicação multimodal
	Tradução
Isso significa que a preocupação passa a ser com problemas linguísticos do mundo real, apoiada na multidisciplinaridade, seja na vida social, cultural e mesmo política, considerando a complexidade dos sujeitos.
Com o avançar dos anos, surgiram novas formas de pesquisa e o conceito da Linguística Aplicada como aquela que vai resolver os problemas da linguagem foi deixado de lado.
O que surge é a noção de que ela passa a ter um papel interdisciplinar e de produção de novos conhecimentos.
Diz-se que a linguística é aplicada quando suas teorias, métodos de investigação e achados de pesquisa são aproveitados para elucidar e ajudar a resolver questões e problemas práticos relacionados à língua e a seu uso.
(BAGNO, 2017, p. 253)
Vale lembrar que não se trata de utilizar os conhecimentos da Linguística e aplicá-los para criar soluções, isto é, não é uma aplicação da Linguística.
A Linguística Aplicada é um campo que investiga as relações linguísticas a partir de uma perspectiva própria, mas utilizando teorizações de diversos campos para convergir em discussões específicas.
Assim, a Linguística Aplicada tem o objetivo de dialogar com diversas áreas a partir de práticas sociais, pensando novas formas de conhecimento e pesquisa que respondam às demandas da sociedade na qual estamos inseridos.
Com a popularização das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC), passa-se a refletir sobre as diversas semioses que se manifestam nos discursos sociais, em diversas culturas, a partir de diferentes usos linguísticos.
Em especial, são considerados o avanço e a popularização dos usos tecnológicos dos computadores, o desenvolvimento do Wi-Fi, a tecnologia Bluetooth, o 4G e os smartphones e tablets, pensando no ensino de línguas.
O que essas tecnologias provocam são novos letramentos, com os usuários passando a ter acesso tanto a recursos digitais quanto às soluções tradicionais, como papel e caneta, de acordo com a disponibilidade.
Os objetivos da Linguística Aplicada
A Linguística Aplicada se caracteriza por, pelo menos, três aspectos relacionados com seus objetivos:
Objetivo I
Responder a determinada demanda social.
Objetivo II
Valer-se de diferentes áreas do conhecimento.
Objetivo III
Usar como critério de avaliação os seus resultados.
Rocha e Daher (2015) acrescentam a essa lista dos objetivos da Linguística Aplicada mais dois itens:
	enfatizar ensino-aprendizagem de línguas; e
	ancorar as bases teóricas na pesquisa linguística.
Uma das características da Linguística Aplicada é sua busca por tentar resolver problemas ligados ao ensino de línguas, às traduções, à organização de dicionários, além de ações cotidianas que a área pode ajudar a solucionar, mas sempre ligadas ao engajamento às demandas sociais, seja no Direito, na Saúde, na Mídia ou na Administração, entre outras áreas, na tentativa de compreender a sociedade.
Mesmo Saussure e seus seguidores já mostravam preocupação com aspectos práticos nas pesquisas linguísticas.
Interdisciplinaridade e pesquisa na Linguística Aplicada
Além disso, a Linguística Aplicada busca instrumentos em outras ciências, tais como a Didática das Línguas, que une Linguística, Psicologia e Sociologia, numa tentativa de unir teoria e prática no ensino de línguas, por exemplo.
Perceba que a Linguística Aplicada é marcada pela interdisciplinaridade.
Infelizmente, durante muito tempo não se via o especialista em Linguística Aplicada como um produtor de teorias, mas apenas como alguém que reproduzia teorias já existentes.
Outro item que merece destaque é que a Linguística Aplicada é avaliada pelos resultados obtidos, conforme apontado acima. Isso quer dizer que seus resultados são avaliados em função da resposta dada à demanda averiguada.
Segundo Rocha e Daher (2015), essa repercussão sobre as pesquisas em Linguística Aplicada se dá a partir da demanda formulada:
Por alguém que ocupa uma posição hierárquica mais alta na situação investigada.
Pelo pesquisador a partir de objetivos de pesquisa.
Pelo pesquisador a partir atribuídos a um dado coletivo.
Por um círculo que não exerce nenhuma função de destaque na hierarquia institucional em questão.
Rocha e Daher (2015) ainda acrescentam que a Linguística Aplicada e o campo do ensino de línguas eram tratados praticamente como sinônimos nas primeiras décadas da área, já que a sua preocupação era ser “prática”. Mas, de lá para cá, o interesse foi ampliado para outras formas de atuação, além do ensino de línguas, ainda que fortemente calcada na área.
A Linguística Aplicada ainda sofre do complexo de não produzir conceitos novos, mas aplicar teorias da Linguística. A esse respeito, pode-se afirmar o seguinte:
A Linguística Aplicada lida com pesquisas e práticas de problemas da comunicação, aplicando teorias da Linguística ou desenvolvendo propostas novas a partir das suas constatações.
A área da Linguística Aplicada
A Linguística Aplicada mantém a sua identidade na área de estudos da linguagem. Mesmo com todasas mudanças pelas quais passou, ela mantém a sua proximidade com as ideias de Wittgenstein, com os primeiros cursos ministrados sobre o seu conteúdo. Essa área permanece com um eixo comum até hoje, mesmo com todas as ofertas de disciplinas novas cada vez mais especializadas.
A ampliação de seu currículo acabou evitando um aprofundamento de divergências teóricas e querelas na sua epistemologia. O fato é que todas essas mudanças visam à busca de soluções dos problemas encontrados nas suas pesquisas no que se refere às questões de linguagem.
Cursos
Esses cursos começaram na Universidade de Edimburgo, na Escócia, em 1956.
A área da Linguística Aplicada se mostra muito promissora.
Inclusive, têm surgido propostas recentes, como da Linguística Aplicada Crítica, com a Linguística tendo um papel político importante, contribuindo para mudar as relações de poder no mundo.
O especialista em Linguística Aplicada ajudaria o ser humano a tomar consciência sobre o domínio que a língua exerce sobre os outros, questionando a visão do progresso das ciências como algo linear, já que elas devem ser ligadas a diversas outras ideias, dentro de um contexto geopolítico e sócio-histórico.
Antes de finalizarmos esta seção e conhecermos o trabalho da LA no Brasil, há uma questão à qual devemos responder:
Qual a diferença entre a Linguística e a Linguística Aplicada?
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Para Rajagopalan (2006), a diferenciação entre a Linguística e a Linguística Aplicada surge a partir da preocupação com o social.
A Linguística deixa o aspecto social para segundo plano, enquanto a Linguística Aplicada busca responder às demandas que a sociedade clama, quase sempre avaliada a partir de seus resultados, com forte ênfase no ensino e/ou aprendizagem de idiomas.
Pesquisa em Linguística Aplicada
Linguística Aplicada no Brasil
No Brasil, inicialmente, o desenvolvimento da Linguística Aplicada se dá devido à sua origem interdisciplinar e à sua interface entre a Linguística e a Educação. Em seguida, passa por um processo de maior teorização e avança para uma área transdisciplinar a fim de enfatizar uma epistemologia indisciplinar, o que inclui questões diversas como:
Indisciplinar
Refere-se ao conhecimento desenvolvido para além dos limites tradicionais de determinada disciplina, ou seja, aponta para a ideia da Linguística Aplicada se organizando a partir de múltiplos centros, de diversos enfoques, constituindo-se em uma área mestiça na qual ocorrem intersecções e cruzamentos de fronteiras.
	Discurso
	Identidade
	Etnia
	Sexualidade e gênero
	Letramentos
	Entre outras
Desse modo, a LA vai além da aplicação da Linguística para o “mundo real”, como foi vista por muito tempo. A Linguística Aplicada precisou incorporar novas fontes teóricas, a fim de dar conta das necessidades e problemáticas que surgiam, já que:
Nenhuma área do conhecimento pode dar conta da teorização necessária para compreender os processos envolvidos nas ações de ensinar/aprender línguas em sala de aula devido a sua complexidade.
(MOITA LOPES, 2006, p. 16)
Por isso, existe um número considerável de especialistas com o entendimento de que é preciso procurar ajuda em outras áreas do saber das Ciências Humanas e Sociais, além da Linguística, para estudar e buscar possíveis respostas em relação às questões que afligem o mundo e passam pela linguagem (ligadas ou não ao ensino).
Temas e preocupações da pesquisa em LA no Brasil
Em nosso país, a preocupação com os estudos da Linguística Aplicada começou no final da década de 1970 e início dos anos 1980, muito influenciada pela imprensa, que anunciava as dificuldades de leitura na escola, atribuindo a responsabilidade aos docentes. Isso acabou culminando nas pesquisas ligadas à formação de professores.
Logo, a leitura, primeiramente nas línguas estrangeiras e posteriormente em língua portuguesa, passou a ser uma das primeiras preocupações das pesquisas em Linguística Aplicada no Brasil.
Tais pesquisas focadas no problema da leitura foram incorporadas em documentos oficiais, como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), além de constarem na bibliografia de cursos superiores e de concursos. Essas pesquisas continuam sendo objeto de discussão ainda hoje.
A escrita, quando a Linguística Aplicada começou a dar seus primeiros passos, ainda era vista como suporte para o livro, mas atualmente ela se manifesta em meios variados e muito próxima das nossas práticas sociais e cotidianas, em mídias digitais e diversos outros suportes materiais, inclusive combinando com linguagens não verbais.
Assim, a questão da leitura mudou muito nas últimas décadas.
Particularmente, num cenário em que se fala em pós-verdade e fake news, não basta ler, mas investigar se a informação é verdadeira e quem está por trás dela.
Nesse contexto de preocupação da pesquisa em LA com a situação da leitura e da escrita relacionada à formação dos estudantes e dos professores, surgem trabalhos que realizam análises etnográficas, por exemplo, de escolas como local de trabalho, da formação continuada do professor, possibilitando o registro e a análise da leitura de textos com a intenção de servir de motivação para professores e participantes diversos das reuniões. Tudo isso situado em um contexto social e ao mesmo tempo histórico, que ajuda a entender tais práticas no ambiente da periferia de grandes centros urbanos.
Resumindo
Assim, podemos dizer que a Linguística Aplicada foca um leque bastante diversificado de opções no que se refere aos seus objetivos e ao modo de ensino e de pesquisa, buscando respostas e contribuindo para a solução dos problemas ligados ao ensino e à aprendizagem, por exemplo, da língua portuguesa no Brasil.
Podemos notar que, com mais de meio século de existência, a Linguística Aplicada conseguiu resgatar e renovar instrumentos, objetos, temas e conceitos, inclusive modificando as concepções da área, dando voz aos participantes e valorizando conhecimentos, mesmo que socialmente excluídos.
Por isso, é possível que o próximo passo da Linguística Aplicada no Brasil seja a elaboração de currículos e materiais didáticos com a intenção de dar visibilidade a grupos tratados como “invisíveis” socialmente, além da inclusão de pesquisadores no ambiente escolar, valorizando práticas de outros contextos, dirigidas por personagens de outras culturas e de outras identidades, sem abandonar as mudanças pelas quais o mundo passa.
video_library
A Linguística Aplicada
Neste vídeo, serão apresentados a origem, o conceito e os objetivos da Linguística Aplicada.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
1:53 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Contexto de origem da Linguística e Linguística Aplicada
Inserindo imagem...
1:41 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Objetivos da Linguística Aplicada
2:09 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Diferença entre Linguística e Linguística Aplicada
O campo de atuação da Linguística Aplicada
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Analise as afirmativas a seguir, considerando a origem da Linguística Aplicada:
I– O mundo anglófono e o Pós-Guerra fazem parte do contexto no qual surgem os estudos que resultam na Linguística Aplicada.
II– O ensino-aprendizagem de língua estrangeira, particularmente do inglês, e o desenvolvimento de métodos e técnicas para essa prática são objetos de estudo no surgimento da Linguística Aplicada.
III– A Linguística Aplicada surge, originalmente, como uma aplicação da Linguística do começo do século XX, com um viés ou abordagem dedutiva.
Está correto apenas o que se afirma em
A
I.
B
II.
C
III.
D
I e II.
E
II e III.
A afirmativa I está correta porque a presença de militares norte-americanos em várias bases espalhadas pelo mundo no Pós-Guerra e a necessidade de se preservar o prestígio cultural britânico no mundo são aspectos que marcam o contexto anglófono dos estudos de LA. A afirmativa II está correta porque a pesquisa sobretécnica e métodos de ensino-aprendizagem de inglês está relacionada com o surgimento da LA. A afirmativa III está incorreta porque a LA não surge diretamente como aplicação da Linguística da época, mas como uma abordagem indutiva voltada para o estudo das práticas reais de linguagem.
Questão 2
O conceito de Linguística Aplicada deve ser identificado como
A
o estudo descritivo da língua, procurando estabelecer sua estrutura e seu funcionamento.
B
os estudos pedagógicos de filiação behaviorista voltados para o estabelecimento de método de ensino-aprendizagem de inglês para crianças anglófonas.
C
os estudos linguísticos estruturalistas voltados para a descrição e a explicação dos fenômenos gramaticais.
D
o estudo disciplinar e o estabelecimento de área bem delimitada a fim de compreender o fenômeno do bilinguismo.
E
um campo de estudo interdisciplinar com teorias e métodos voltados para a pesquisa de questões reais do uso da língua.
A Linguística Aplicada trabalha com uma abordagem interdisciplinar, com questões e metodologias de pesquisa específicas, tratando de problemas da língua em uso e estratégias para superá-los. Assim, a Linguística Aplicada não é uma mera aplicação da Linguística.
2 - Campo de trabalho da Linguística Aplicada
Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer o campo de trabalho da Linguística Aplicada.
O campo de atuação da LA
Atuação e expansão da Linguística Aplicada
Você já sabe que a Linguística Aplicada (LA) é um campo de estudo transdisciplinar, interdisciplinar e intercultural que identifica, explora e procura soluções para problemas relacionados à linguagem na vida concreta.
Embora seu desenvolvimento tenha uma relação profunda com os estudos sobre o ensino de línguas, em especial, o inglês, o seu campo de interesse foi ampliado para o uso da língua materna, ensino de segunda língua e línguas de contato.
No caso do Brasil, conforme Silva (2010), a LA foi, ao longo de vários anos, uma área de estudos voltados para o ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras e, também, do português como língua materna. Nesse contexto, a LA passava por mudança no foco de pesquisa e apresentava propostas para o ensino.
Assim, a LA variava na seguinte sequência:
	arrow_downward
	Primeiro
	A ênfase nas metodologias de ensino.
	arrow_downward
	Segundo
	O tratamento da pertinência ou não do ensino de determinados aspectos linguísticos.
	adjust
	Terceiro
	O exame da atuação do estudante em sala de aula.
A Linguística Aplicada, no entanto, expandiu suas pesquisas indo além do ensino de línguas, da formação docente e do uso didático. Assim, ela passou a produzir seu saber inter e transdisciplinar para problematização e compreensão da linguagem, respondendo às demandas da sociedade.
Relembrando
A Linguística Aplicada não é simplesmente a aplicação de uma teoria ou proposta linguística a determinada necessidade, afinal, a simples aplicação nem sempre seria capaz de resolver os problemas da linguagem no cotidiano; isto é, a área se preocupa em unir teoria e prática para construção de seu saber.
Por isso, Moita Lopes (1996, p. 123) destaca que “há uma preocupação cada vez maior em linguística aplicada com a investigação de problemas de uso da linguagem em contextos de ação ou em contextos institucionais, ou seja, há um interesse pelo estudo das pessoas no mundo”.
Desse modo, a Linguística Aplicada tem como proposta:
Entender o mundo e buscar trabalhar uma agenda contra posicionamentos hegemônicos, enfatizando a ideologia, o poder, o gênero, a classe e a etnia, construindo teorias que levam em conta os sujeitos, sejam leitores, escritores, falantes ou ouvintes dentro ou fora de determinado contexto histórico de ensino e de aprendizagem, sem desconsiderar a existência de limites éticos para a ciência.
Atualmente, a LA pode ser vista, então, como uma área do conhecimento que se caracteriza por articular diversos domínios do saber, buscando dialogar com diferentes campos do conhecimento voltados para as questões da linguagem. Desse modo, a LA se apresenta como um campo de atuação bastante abrangente, já que a língua perpassa as diferentes esferas da vida e da sociedade humanas.
Tendo em vista que a linguagem permeia todos os setores de nossa vida social, política, educacional e econômica, uma vez que é construída pelo contexto social e desempenha o papel instrumental na construção dos contextos sociais, nos quais vivemos, está implícita a importância da LA no equacionamento de problemas de origem educacional, social, política e até econômica.
(CELANI, 2000, p. 19-20)
A Linguística Aplicada, portanto, apresenta diversas áreas de atuação e interesse no campo pedagógico: o ensino de línguas estrangeiras, o ensino da língua materna, a formação de professores de língua, estudos sobre o bilinguismo nas comunidades indígenas, as línguas de sinais, o processo de alfabetização, as formas de letramento, as relações entre linguagem e mercado de trabalho, entre outras.
Ensino-aprendizagem de língua estrangeira e LA
Considerando a prática do especialista em Linguística Aplicada, pode-se perceber como as questões da linguagem fazem parte do mundo globalizado.
O caráter globalizado e digital de nosso tempo exige cada dia mais que o indivíduo saiba, pelo menos, uma língua estrangeira, ajudando a expandir e a ampliar sua formação cultural, conhecendo, pelo menos, um pouco de outras identidades.
É bastante comum encontrar pessoas que ouvem e cantam músicas estrangeiras e passam a conhecer parte do léxico daquela língua, ainda que de forma inconsciente.
Isso se dá também com a presença da língua inglesa como um tipo de idioma universal.
Alguns exemplos onde isso ocorre são:
	Em diversos aparelhos eletrônicos que apresentam botões em inglês, como power ou on/off para ligar/desligar.
	Em jogos eletrônicos, que finalizam a participação do usuário com um game over.
	Em vitrines de lojas que anunciam promoções ou liquidações com o termo sale.
Assim, para além de necessidades no mundo profissional, as pessoas vão percebendo cada vez mais a necessidade de aprender ou dominar uma língua estrangeira, preferencialmente aquela que cultural e economicamente prevalece no mundo globalizado.
Essa necessidade se reflete também no contexto educacional formal.
Nesse sentido, há a percepção ou entendimento de que, ao ter acesso a outra língua, o estudante é capaz de desenvolver respeito pela cultura, pelo povo e pelos valores que não apenas os de seu país.
Por isso, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) já defendiam, no final dos anos 1990, o estudo da língua materna ou mesmo estrangeira como dever de todo cidadão, como competência intercultural.
Esse aprendizado de outras línguas, que não apenas a língua materna, vincula-se à necessidade de se estabelecer relações culturais com outros povos, promovendo pluralidade cultural e formação geral.
No caso das línguas estrangeiras, a seguinte afirmação consta nos PCNs:
O uso de uma Língua Estrangeira é uma forma de agir no mundo para transformá-lo. A ausência dessa consciência crítica no processo de ensino e aprendizagem de inglês, no entanto, influi na manutenção do status quo ao invés de cooperar para sua transformação.
(BRASIL, 1998, p. 40)
Logo, a experiência do professor pode ser um instrumento bastante válido na verificação de uma metodologia adequada à sua realidade.
Nesse momento, entra em ação a Linguística Aplicada para analisar o contexto em que se dá esse processo de ensino-aprendizagem e, consequentemente, colaborar no processo do aluno e do professor a fim de alcançar os melhores resultados possíveis.
Para Moita Lopes (1999), no caso do ensino de línguas estrangeiras, até o final do século XX, as pesquisas em Linguística Aplicada no Brasil enfatizavam os seguintes itens:
	Ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras suprimindo a leitura, a produção escrita, a compreensão oral e ensino por intermédio de computadores.
	Leitura.
	Formação do professor de línguas.
	Descrição da língua estrangeira.
	Análise de erros e interlíngua.
	Análise contrastiva entrea língua estrangeira e o português.
	Análise da interação oral no ambiente da sala de aula.
	Avaliação de material didático.
	Produção escrita.
	Planejamento de cursos.
	Compreensão oral.
	Aquisição de L2 (segunda língua).
	Elaboração de material didático.
	Análise do discurso em línguas estrangeiras.
	Construção de identidade no espaço da sala de aula.
	Ensino de língua estrangeira por intermédio de computadores.
	Testagem.
LA e produção de material didático
Produção de material didático em língua estrangeira e LA
Outra área de atuação da Linguística Aplicada tem a ver com a produção de material didático, em especial, livros.
Podemos perceber um avanço na qualidade dos livros didáticos graças à influência da Linguística Aplicada.
Esses livros passaram a focar as quatro habilidades da língua:
	ouvir;
	falar;
	ler; e
	escrever.
Moita Lopes (1999), ao listar os itens da pesquisa em LA na área do ensino de língua estrangeira, menciona a elaboração e a avaliação de material didático. No entanto, em sua lista, não há itens que tratem especificamente do livro didático, pois a referência é ao material utilizado para o ensino de maneira geral.
Desse modo, até o final do século XX, o foco da Linguística Aplicada estava voltado para as questões de ensino-aprendizagem das línguas estrangeiras a partir de uma aplicação da teoria para o uso pelo professor em sala de aula, diferentemente do que tem acontecido hoje.
O início da Linguística Aplicada no país, nos anos 60 e 70, foi marcado por questões relativas ao ensino de línguas estrangeiras, principalmente o inglês. Naquela época, as dissertações de mestrado na área refletiam o pensamento de aplicação de teorias da Linguística para melhorias de técnicas de ensino em sala de aula, [...] uma das ênfases de trabalhos de investigação na área neste início eram as sugestões para produção e avaliação de materiais.
(SILVA, 2010, p. 209)
Vale ressaltar que o livro didático passou a ter maior destaque e uso a partir da década 1960, principalmente para atender às demandas do contexto da escola que se reformulava naquele momento.
Na década de 1980, foi criado o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), para que na década seguinte o Ministério da Educação (MEC) passasse a ter um papel mais direto na discussão sobre o livro didático, incluindo um projeto pedagógico disseminado pelos PCNs.
A Linguística Aplicada atualmente se preocupa também com o “processo de ensino-aprendizagem em sala de aula” (MOITA LOPES, 1999, p. 425).
Pode-se notar que o livro didático tem sido objeto de análise dos especialistas em Linguística Aplicada nos últimos anos, ainda que de forma insuficiente, dada a sua importância para professores e alunos, quase como uma fonte de autoridade para o saber na escola, mesmo com a popularização da tecnologia para o ensino.
Mas já se percebe que é comum os livros didáticos apresentarem propostas para ensinar a língua estrangeira por meio das repetições de sons daquela língua-alvo.
Comentário
Por isso, é importante, ao preparar os livros didáticos, levar em conta a língua estrangeira e a língua materna do falante, considerando uma descrição científica da língua aprendida, muitas vezes comparando com a língua daquele que está estudando.
Vale lembrar que muitos livros didáticos são preparados visando apenas “facilitar” a vida do estudante, o que nem sempre é uma boa saída, podendo atrapalhar em vez de ajudar.
Não se deve desconsiderar que o livro didático pode ser a principal fonte para o estudante acessar a língua que está estudando e a cultura do país em que aquela língua é utilizada.
A urgência para aprender uma língua estrangeira pode estar ligada ao objetivo de se alcançar uma distinção social mais do que no próprio uso do idioma. Por isso, a Linguística Aplicada precisa buscar novas e melhores formas para facilitar o processo de ensino-aprendizagem.
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Na verdade, o livro didático, ano a ano, tem melhorado na forma de abordagem do tema.
No entanto, há críticas ao livro didático, já que muitas vezes ele assume um papel de autoridade do saber para professores e alunos, direcionando o ensino, visto que a maioria das instituições que se propõe a ensinar línguas estrangeiras usa essa ferramenta.
Por outro lado, dada a realidade socioeconômica, o livro didático é bem-vindo na maioria das escolas, especialmente as públicas, uma vez que normalmente os alunos têm dificuldade para aquisição de material e os livros são distribuídos gratuitamente pelo Governo Federal.
Também devemos lembrar que, para aprender uma língua estrangeira, além de se usar os livros didáticos, é possível a utilização de músicas, filmes, aplicativos de idiomas e outros recursos digitais e disponíveis na internet. De forma cada vez mais rápida e eficaz, inclusive remotamente ou a distância, os recursos didáticos vão sendo disponibilizados graças aos avanços da tecnologia e às pesquisas em Linguística Aplicada.
Ensino de língua Portuguesa e LA
Além do ensino de língua estrangeira, a Linguística Aplicada tem focado o ensino da escrita em língua portuguesa e, muitas vezes, tem usado o livro didático com essa intenção, tal como acontece no ensino de língua estrangeira.
Logo, a Linguística Aplicada vem investigando o ensino de língua portuguesa na escola, já que se entende que o ensino implica todos os usos e regularidades da língua.
Para o estudante é importante conhecer a língua materna a fim de poder utilizá-la adequadamente nas mais variadas situações comunicacionais de seu cotidiano.
Por isso, o ensino de língua portuguesa não pode ser descontextualizado tampouco autoritário. Nesse sentido, é fundamental buscar novas estratégias para o ensino sob novas perspectivas, provocando reflexões e ressignificação para quem ensina.
Não é segredo que, apesar das transformações no ensino da língua portuguesa, nota-se uma dificuldade crescente dos alunos que terminam o ensino médio em escrever de acordo com as normas da gramática normativa, além da pouca habilidade para o registro claro e articulado de suas ideias.
Com as mudanças da sociedade, além do desafio do ensino normativo da língua portuguesa, surge a necessidade de entender os contextos situacionais e verbais em que ocorrem as situações de interação verbal, de modo que os alunos possam compreender como determinado item da gramática funciona no uso real da língua.
O trabalho com a língua não fica limitado ao estudo de frases soltas, mas considera o texto, ultrapassando o ensino de regras gramaticais e ampliando a análise do texto, por intermédio de práticas que levam à reflexão.
Há um desafio diante da grande insatisfação dos alunos com o ensino da língua portuguesa. Muitos não percebem, em sua formação, a capacitação para interagir com textos diferentes e o trabalho com diferentes linguagens em contextos distintos.
Esses alunos não percebem que os conhecimentos aprendidos na escola nas aulas de língua portuguesa são suficientes para atender às necessidades do uso do idioma em situações concretas da vida.
Os PCNs já apontavam, na virada do século XX para o XXI, essa situação problemática e criticavam o ensino de português reduzido ao aprendizado das regras gramaticais, quando afirmam que o problema não está na gramática, mas em como ensinar os fatos e as regras da gramática diante do ato comunicativo.
A gramática extrapola em muito o conjunto de frases justapostas deslocadas do texto. O texto é único como enunciado, mas múltiplo enquanto possibilidade aberta de atribuição de significados, devendo, portanto, ser objeto também único de análise/síntese.
(BRASIL, 2000, p. 18-19)
Os PCNs trouxeram uma ruptura com alguns modelos de ensino e de aprendizagem de língua, levando o professor a estudar mais para se atualizar — tirando alguns da zona de conforto em que se encontravam — e contribuindo para que posicionamentos fossem revistos e se buscassem com mais criatividade os objetivos de promover melhores condições para a sociedade como um todo.
Isso tudo provoca uma reflexão sobre a função do professor e sua práticaem sala de aula, podendo gerar novas tentativas para melhorar seu desempenho ou mesmo a reafirmação de uma forma anterior de trabalhar.
O professor tem um papel essencial na formação na área da linguagem dos estudantes e precisa ter a devida noção das práticas necessárias para o êxito no ensino.
Integração entre fala e escrita
Ensino de português integrado
Com a finalidade do ensino da língua portuguesa, a escola tem como objetivo incentivar o estudante no desenvolvimento linguístico, embora seja comum a instituição dividir o ensino em “caixinhas”, como:
Leitura e compreensão
Literatura
Gramática
Produção de texto
A forma fragmentada impede uma reflexão mais profunda sobre as questões da linguagem.
Quase sempre, o estudante começa decifrando a língua, para depois partir para a análise por meio de atividades separadas.
A Linguística Aplicada tem demonstrado que o ensino da língua portuguesa deve valorizar a fala, porque é a modalidade da língua que se aprende primeiramente e que está mudando constantemente, ou seja, a língua passa por inúmeras transformações, mas a escola não consegue acompanhar, porque se fundamenta essencialmente na língua que se manifesta na escrita. Considerando as características da língua falada, ela precisa também ser trabalhada no contexto de sala de aula.
Outra questão posta é que não pode haver desarticulação entre leitura e produção de textos, já que eles formam um todo. No máximo, sugere-se que sejam feitas separações com o objetivo de facilitar o estudo, mas mantendo a sua relação com outros elementos.
Por isso, afirmamos que gramática, texto e produção jamais devem ser separados.
Outro problema facilmente detectado pelos professores em sala de aula é a dificuldade que os alunos apresentam para escrever e reproduzir a língua oral na produção textual.
Geralmente, os alunos escrevem do modo que falam antes de desenvolver maturidade na competência escritora.
Daí a necessidade de se trabalhar a oralidade e as diferenças e semelhanças entre a fala e a escrita.
Tais como as diferenças léxicas para a constituição de textos, a sintaxe tem características diferentes para as duas modalidades da língua, entre outras.
O professor ainda precisa enfatizar que na interação entre a fala e a escrita há algumas diferenças:
Fala
A interação ocorre face a face.
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Escrita
Os interlocutores não estão presentes no mesmo espaço e tempo.
Em geral, isso implica um não planejamento prévio na fala, diferentemente da escrita. Assim, a fala não pode ser revisitada, enquanto a escrita pode ser revista ou reelaborada. De certo modo, a fala mostra o processo criativo, enquanto a escrita, seu resultado.
O trabalho integrado de ensino do português deve articular as atividades com texto e, também, com elementos da gramática.
A Linguística Aplicada esclarece que os estudos da linguagem devem ser feitos de modo a ampliar a capacidade de comunicação do estudante.
Dica
Uma das sugestões é trabalhar a partir da produção e recepção dos textos, já que eles servem para mostrar a língua de forma mais ampla em seu funcionamento real.
Assim, é importante trabalhar com textos para desenvolver a competência comunicativa dos alunos, visto que ela se faz por intermédio dos textos, e um dos aspectos mais importantes do ensino de línguas é capacitar o estudante a produzir e compreender os enunciados de modo adequado a cada contexto de interação.
É importante ressaltar, porém, que em algumas categorias da gramática existem elementos que não podem ser vinculados aos textos, por isso, apesar da importância do trabalho com textos, ele não é capaz de dar conta de todas as necessidades do professor e do aluno.
Integração entre escrita e leitura
Não podemos esquecer que vivemos em uma sociedade letrada e que o domínio de diferentes manifestações linguísticas é um fator primordial para que o indivíduo consiga se inserir socialmente. Infelizmente, diversas avaliações do ensino em nosso país alertam para a qualidade baixa de leitura, ou seja, temos problemas no domínio da língua escrita e nas práticas de leitura.
O PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) coloca o Brasil entre os últimos países nos seus critérios avaliativos, bem abaixo de países que se enquadram na mesma categoria.
Relembrando
É essencial lembrar que esse processo de associar um sinal gráfico a um som da língua, em uma abordagem mais tradicional da leitura, é um processo que está no nível do automático. O aprendizado desse processo geralmente ocorre no ensino fundamental, embora esse período não seja suficiente para tornar o aluno um leitor de nível satisfatório de compreensão da leitura.
O PISA, ao considerar os 5 níveis de complexidade da leitura, mostra que mais da metade de nossos alunos ficaram no primeiro nível (uma parte ficou abaixo).
O processo de compreensão é resultado do conhecimento adquirido e da interpretação de outros níveis ligados ao ato de leitura.
Os cinco níveis são:
Fonológico
Sons da língua.
Ortográfico
Representação escrita do sistema linguístico.
Morfossintático
Combinação de morfemas em estruturas maiores, como a palavra, a frase ou o texto.
Semântico
O sistema de significados.
Pragmático
O conhecimento ligado ao contexto extralinguístico.
Uma proposta comumente usada é da integração, quando há um intercâmbio entre as diversas habilidades do leitor e do texto. Assim, o leitor usa seu repertório de conhecimento para dar sentido a determinado texto.
No entanto, se o aluno tiver pouca bagagem de leitura, um repertório pobre, isso dificulta a escrita, limitando o seu vocabulário.
Aprendemos, porém, continuamente, em qualquer ambiente, com todas as pessoas, mesmo sem notarmos, em uma bate-papo informal ou ouvindo músicas, lendo um cartaz ou andando pelo centro da cidade olhando vitrines, isto é, o nosso cérebro processa todas essas informações que chegam a ele por meio de nossos sentidos, produzindo algum tipo de conhecimento.
Assim, o processo de aprendizagem da escrita tem uma grande importância para a leitura. Quando o indivíduo lê, ele incorpora certas estruturas gramaticais, a complexidade da sintaxe, o vocabulário, a adequação textual e até mesmo a pontuação devida para aquela situação.
Por intermédio da leitura, o usuário da língua adquire a estrutura básica linguística, que muitas vezes não foi ensinada na escola, ou seja, a leitura é uma ferramenta muito importante no processo de aprendizagem de uma língua, sendo um instrumento que todo processo precisa enfatizar.
O professor que tem acesso às propostas da Linguística Aplicada passa a ter condições de escolher a melhor forma de trabalhar com seus alunos e de estruturar atividades que efetivamente ajudem no domínio da língua, de modo a ter uma maior competência no ato da comunicação.
O fato é que quanto mais se estudam as propostas de determinada área, maiores são as oportunidades de trabalhar de maneira mais adequada com a língua, por isso é fundamental que o professor tenha uma boa base de formação em Linguística, o que irá ajudá-lo tanto no ensino do idioma materno quanto no ensino de língua estrangeira.
Dica
Além da formação inicial na licenciatura, por exemplo, é preciso buscar cursos de aperfeiçoamento para que se possa prosseguir nas pesquisas sobre Linguística Aplicada.
Atualmente, há muito material disponível, seja em forma de artigos, vídeos ou livros, inclusive trazendo excelentes propostas metodológicas bem práticas para o uso em sala de aula. São trabalhos que versam sobre ensino-aprendizagem, seja de língua materna ou estrangeira, enfocando:
A produção de textos orais e escritos
A leitura de textos e o ensino do léxico e do vocabulário
O ensino de gramática
Todo esse material serve para que o professor possa desempenhar bem o exercício do magistério.
No campo da formação docente, a expectativa é que a Linguística Aplicada continue a contribuir para o entendimento de que a linguagem tem um aspecto socialmente construído, por isso, o professor precisa ser conscientizado politicamente acerca dos problemas da linguagem e do vínculo da língua com o contextosocial do falante.
Além disso, o profissional da educação pode perceber que a interação na sala de aula durante o processo de ensino pode apresentar informações que ajudam o docente a compreender melhor a sua prática pedagógica e a experiência de seus alunos, buscando um processo de melhoria em suas práticas de ensino.
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O campo de atuação da Linguística Aplicada
Neste vídeo, serão apresentados as pesquisas em Linguística Aplicada, seu campo de atuação e sua contribuição para questões diversas relacionadas com a língua.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
1:24 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Principais áreas de atuação da LA
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2:05 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Linguística Aplicada e a superação do ensino tradicional de português
1:58 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Linguística Aplicada e a relação entre fala e escrita
O campo de atuação da Linguística Aplicada
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Uma das áreas de atuação da Linguística Aplicada é o ensino da língua materna, já que para o estudante é fundamental conhecê-la e utilizá-la de maneira adequada. A partir da contribuição dos estudos da Linguística Aplicada, assinale a alternativa que indica a maneira adequada de estimular o ensino da língua materna.
A
Promover o engajamento dos alunos na luta por uma escola em que o português genuíno seja ensinado, de modo a resgatar a importância da norma culta.
B
Contextualizar o ensino da língua a partir de seu uso real e promover a reflexão sobre a língua por parte dos alunos.
C
Explicitar as desigualdades existentes no falar, promovendo a unificação e a homogeneização da fala em qualquer região do país.
D
Focar o ensino a partir do texto, deixando de lado os elementos e as categorias gramaticais nas aulas de português.
E
Centrar o trabalho no livro didático, já que ele incorpora todas as inovações produzidas pelas pesquisas em Linguística Aplicada e alcança todos os alunos matriculados nas escolas.
Conforme os estudos da LA, o ensino de língua materna precisa ser contextualizado e levar em conta a realidade do aluno, buscando novas metodologias de ensino, sem abrir mão da reflexão dos alunos. Desse modo, o ensino de língua materna deve integrar a escrita, a leitura, a fala, o texto, os elementos e as categorias gramaticais, aproximando o aprendizado da língua do mundo real e das necessidades de comunicação e interação apresentadas pela vida em sociedade.
Questão 2
Analise as afirmativas a seguir, considerando o campo de atuação da Linguística Aplicada.
I– Desde seu começo até a atualidade, o campo de atuação da Linguística Aplicada se define em torno do ensino de língua estrangeira.
II– O ensino-aprendizagem de língua materna, com questões relacionadas aos desafios da alfabetização e do letramento e à formação de professores, é um dos campos de atuação da LA.
III– Na LA, tem surgido o interesse pela pesquisa voltada ao uso da linguagem no contexto da vida em sociedade, por exemplo, do mundo do trabalho.
Está correto apenas o que se afirma em
A
I.
B
II.
C
III.
D
I e II.
E
II e III.
Linguística Aplicada ao Ensino
Prof. Nataniel Gomes
Descrição
Descrição linguística, diversidade linguística e linguística aplicada ao ensino de língua.
Propósito
Compreender as contribuições e implicações da Linguística Aplicada no ensino de língua a fim de desenvolver as competências para a atuação como professor de língua portuguesa na educação básica.
Objetivos
Módulo 1
Descrição Linguística e Ensino
Identificar a relação entre descrição linguística e ensino.
Módulo 2
O Professor e a Diversidade Linguística
Identificar as implicações da diversidade linguística em sala de aula.
Módulo 3
Linguística Aplicada ao Ensino de Leitura e Escrita
Identificar as contribuições da Linguística Aplicada para o ensino de leitura e escrita.
Introdução
A Linguística Aplicada, como uma subárea da Linguística, tem feito diferença nos estudos da língua em situações reais de uso, incluindo aspectos relacionados com identidade, valores e crenças, entre outros. Desde seu surgimento, a Linguística Aplicada também traz seus aportes teóricos para o tema do ensino de língua.
A contribuição da Linguística Aplicada ao ensino-aprendizagem de língua pode ser reconhecida em diferentes elaborações teóricas, propostas metodológicas e até mesmo por meio de críticas a procedimentos tradicionais e equivocados de se abordar a língua.
Assim, é muito importante conhecer as contribuições da Linguística Aplicada para as questões relacionadas com o ensino de língua, seja a língua materna (L1) ou uma língua estrangeira (L2).
Tudo isso, afinal, pode ajudar a escola a se transformar em um espaço mais motivador, inclusivo e democrático de aprendizagem da língua, tornando a sala de aula uma experiência voltada para a cidadania exercida por meio da linguagem.
1 - Descrição Linguística e Ensino
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar a relação entre descrição linguística e ensino.
Teoria e prática nos estudos linguísticos
Linguística e a Relação Teoria-Prática
Para começar nossa discussão sobre a relação entre descrição linguística e ensino, é preciso, primeiramente, chamar sua atenção para a falsa dicotomia entre a linguística e a prática cotidiana.
Muitos estudantes acabam tendo a impressão de que as elaborações teóricas da linguística se opõem à prática, às situações reais e às necessidades do uso da língua. Por isso, é preciso reconhecer que os estudos linguísticos partem da prática e voltam para a prática.
O professor e linguista indiano Kanavillil Rajagopalan é bastante enfático ao comentar essa situação de separação entre os estudos linguísticos e a prática ou uso da língua.
Eu acho que a maior desgraça que poderia ter acontecido com a nossa disciplina, e qualquer outra, é a divisão de bolo entre teoria e prática. Foi um desastre, é um desastre! Eu me recuso a aceitar essa distinção simplesmente! Um teórico que não pensa na prática é um teórico inútil.
(RAJAGOPALAN, 2003, p. 180)
A linguística pode ter inúmeros desdobramentos para a educação, indo da qualificação profissional até o ensino propriamente dito, servindo como recurso importante para se trabalhar a interação, a comunicação e a expressão em diversas áreas.
Cada área da linguística tem uma abordagem bastante específica para o fenômeno da linguagem. Todas elas têm dado a sua contribuição para investigação da linguagem, cada uma a seu modo.
É preciso estarmos cientes de que o professor, ao fazer a opção por uma certa corrente teórica, o que inclui uma metodologia específica, uma abordagem particular e um objeto a ser descortinado, acaba assumindo uma determinada perspectiva teórico-metodológica que pode ser misturar também a crenças e valores que o professor carrega consigo.
Se alguém adota uma perspectiva da língua a partir do linguista suíço Ferdinand de Saussure, de viés estruturalista, assumirá uma abordagem que prevê que a língua é um sistema.
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Já quem tem uma análise da língua a partir do linguista norte-americano Noam Chomsky, teórico da visão gerativista, entenderá que a gramática é inata e marcada por princípios e parâmetros.
Outra abordagem poderia ser feita a partir do linguista russo Roman Jakobson, teórico formalista, que via a língua como um sistema que tem propósito comunicativo e estruturado a partir dos Seis elementos da comunicação, com os respectivos enfoques nas funções emotiva, conativa, metalinguística, poética, fática e referencial da linguagem.
Seis elementos da comunicação
Emissor, receptor, código, mensagem, canal e contexto.
Ao adotarmos uma abordagem do linguista norte-americano William Labov, da sociolinguística variacionista, assumiremos que a língua é marcada por fatores sociais, como classe social, escolaridade, sexo, idade, que revelam a diversidade linguística exercida pelos falantes dentro da comunidade.
O linguista William Labov.
Vamos considerar um poucomais a última abordagem que mencionamos, o enfoque sociolinguístico com ênfase na variação linguística.
A abordagem da sociolinguística
A perspectiva da sociolinguística ainda é muito recorrente nas salas de aula e relaciona as variantes linguísticas com elementos sociais que rodeiam os falantes.
Esse tipo de abordagem no ensino de língua materna ajudou a diminuir o preconceito em relação ao uso de variantes linguísticas, afinal, todas as manifestações apresentam uma motivação e uma justificativa a partir do contexto social em que o falante está inserido.
Desse modo, a própria norma culta passa a ser vista como mais uma variante entre tantas outras, que, por razões sociais, políticas e culturais, passou a ter mais prestígio e uma marca de status, servindo como instrumento de ascensão social.
Ao descrever a língua a partir de um olhar sociolinguístico, o docente pode valorizar, incorporar e ainda usar em sala de aula outras variantes, não apenas a norma culta, de modo a expressar marcas linguísticas que são eficientes na comunicação e que revelam o uso cotidiano de outros grupos sociais, sendo formas genuínas de manifestação da língua materna adequadas ao seu uso.
Logo, deve-se apresentar também outras variantes, como a variante de prestígio, na escrita e na fala, que precisa ser trabalhada no ambiente escolar, dado o seu papel político e ideológico de ascensão social. Afinal, para muitos alunos, o aprendizado da língua culta só é possível no contexto da educação formal, já que esses alunos vêm de famílias e contextos sociais em que há baixo nível de escolaridade e quase nenhum domínio da língua culta.
A abordagem da pragmática
Um outro olhar, entre tantos, que pode ser utilizado para a linguística de sala de aula, é o da pragmática, que trata de elementos externos para a produção e para a recepção da linguagem a partir da interação entre os falantes.
Atenção!
Para a abordagem pragmática, os elementos extralinguísticos, como a forma de falar, a intenção, as informações implícitas e os atos de fala, são destacados para se atingir o sentido.
Do ponto de vista do ensino, a perspectiva pragmática contribui para:
A descrição sobre os modos de produção de sentido por meio da língua e sua organização.
A averiguação acerca do comportamento linguístico, de acordo com a cultura de cada grupo.
A promoção do caráter interacional da linguagem, seja falada seja escrita, pois existe a necessidade de um interlocutor.
Estudos linguísticos e prática docente
Implicações dos estudos linguísticos na prática docente
Propostas ou abordagens do tipo que acabamos de comentar brevemente tiraram o professor do papel de dono exclusivo do saber, sem desmerecer o seu papel, mas enfatizando os elementos envolvidos no processo interativo.
Hoje, entende-se que o docente tem um papel de mediador nas relações linguísticas e que o saber é construído de forma conjunta, assim como todas as relações humanas.
Desse modo, surge uma prática pedagógica mais democrática no ensino-aprendizagem de língua, bem mais próxima dos discentes, que pertencem a diferentes grupos sociais. Essa prática pedagógica, inspirada em abordagens teóricas mais próximas das situações reais de uso da língua em seus contextos, se afasta de um modelo que entende a língua de forma homogênea e bastante idealizada a partir do viés normativo.
O professor e linguista brasileiro Luiz Fiorin nos lembra de que um dos desafios da ciência é ser prática, o que se aplicaria certamente à linguística (FIORIN, 2003).
Fiorin trata dessa questão no contexto da universidade em termos da dicotomia entre criação e divulgação, dois processos que ele afirma não poderem ser separados.
O compromisso com a educação está na ordem da divulgação. Um fato evidente é que o avanço da linguística pode ajudar na educação. Divulgar um avanço da ciência é tão importante como fazer avançar a ciência, porque, na verdade, a ampliação da linguagem humana, a consciência da linguagem humana, a compreensão dos seus mecanismos dá ao homem a possibilidade de ascender à construção cultural que ele fez ao longo da história; é por meio da linguagem que eu tenho acesso a tudo aquilo que torna o homem especialmente humano. A linguística não pode em momento nenhum se alhear dessa preocupação de que ela tem que, digamos, socializar as descobertas, para que cada vez mais os homens ascendam a esses benefícios, ampliem a sua capacidade de linguagem, ampliem seus horizontes linguísticos com conhecimento de outras normas, de outros registros, de outras variantes... no sentido de que eles possam se tornar mais plenamente humanos. Esse é o papel da linguagem.
(FIORIN, 2003, p. 74-75)
De acordo com Fiorin (2003), ao pensarmos sobre a relação da linguística com a escola, podemos verificar como a compreensão do fenômeno da linguagem pode ser importante para todos, inclusive os estudantes, desmistificando conceitos tão estratificados na sociedade, como a homogeneidade da linguagem e suas transformações.
Os estudos linguísticos têm dado importante contribuição ao desfazerem o mito da homogeneidade da língua. Compreender “o fenômeno linguístico como um fenômeno intrinsecamente heterogêneo e dinâmico” vai contra a concepção tradicional da linguagem como algo homogêneo e estático, ao mesmo tempo em que contribui para construir uma educação democrática, já que a linguagem passa a ser concebida como alteridade, algo heterogêneo, assim como os demais aspectos da realidade humana (FIORIN, 2003, p. 74).
Se não há homogeneidade na linguagem, cabe à linguística e ao professor de língua atuar em favor da educação para a democracia, da educação para a cidadania. Nesse sentido, a democracia não é entendida como o governo da maioria, mas como “um sistema político em que existe um respeito à diferença, um respeito à diversidade” (FIORIN, 2003, p. 75).
Quando a linguística evidencia a heterogeneidade da língua, a sua diversidade e pluralidade, está contribuindo para uma educação democrática, uma educação para a tolerância (FIORIN, 2003).
A dicotomia certo/errado em língua
É comum muitos professores de língua portuguesa valorizarem questões como certo e errado no uso da língua, mas os linguistas passam a relativizar os critérios que são empregados com mais frequência.
O desafio dos profissionais da língua portuguesa é ensinar o modo culto, prestigiado, de falar e escrever em nossa língua, mas sem reduzir o ensino apenas a isso, o que seria um empobrecimento enorme do ato de lecionar, porque a norma culta não vem de um valor intrínseco da língua. Ou seja, não existem formas que sejam intrinsecamente erradas ou certas, com exceção da ortografia, que passa por uma legislação bastante específica.
O conceito de certo e errado passa por uma série de necessidades e convenções assumidas pela sociedade, resultando em normas de comportamento, de estilo musical e até do uso da língua. Quando uma dessas variedades é escolhida, as outras manifestações são condenadas.
Por exemplo, uma frase como “Os carioca ama praia e carnaval”, geralmente, não é utilizada pelos usuários que pertencem à elite socioeconômica, pois isso geraria algum desconforto. Esse incômodo, entretanto, desaparece ao falar em uma língua cuja concordância verbal é inexistente ou está limitada ao uso do artigo, como no caso do inglês: “Cariocas love the beach and football”.
Assim, a norma culta é uma variedade que foi escolhida como padrão, enquanto as outras são rejeitadas no ensino tradicional.
O senso comum gerou a noção de que o papel do professor de língua materna é ser um juiz togado que bate o martelo para definir o que é certo ou errado na língua. Mas de uma perspectiva linguística, apenas depois que o profissional das letras passar a conhecer com profundidade a língua, suas variações e modalidades, ele poderá ter ideias mais claras sobre o ensino de língua e repensar suas práticas.
Assim, o ensino de língua deveria se voltar para a sua origem, como os gramáticos faziam na Grécia e em Roma, cuja preocupação era com a eficiência do uso da língua, e não com a prescrição, ou seja, aintenção era que o falante estivesse preparado para exercer seus direitos por meio da língua.
Quando a gramática passou a ter um fim em si mesma, o ensino passou a sofrer com isso, perdendo a reflexão sobre seu uso. Devemos nos lembrar de que trazemos a gramática internalizada em nossa mente, logo o desafio é refletir sobre ela, explicitando-a, em vez de apresentar exercícios que se encaixem naquilo que foi decorado e posteriormente cobrado em avaliações escolares.
A descrição linguística e suas contribuições
As aplicações da descrição linguística
A língua pode ser estudada a partir de diferentes perspectivas, seja descritiva, social, cognitiva ou outra perspectiva, e como um sistema fechado.
Geralmente, quando se fala sobre o estudo descritivo da língua, ele pode ser dividido no nível fonético-fonológico, morfológico e sintático, constituindo a gramática.
Vamos tratar do nível fonético-fonológico, que é o primeiro nível, para demonstrarmos um pouco a contribuição da descrição linguística.
Exemplo
O nível fonético-fonológico pode ser usado para análises da língua portuguesa, como nos sons [t] e [tς].
Encontramos [t] como som inicial na palavra “tatu”.
Temos [tς] como som inicial da palavra “tia”, no dialeto do Rio de Janeiro.
Em português, o [tς] não distingue palavras. A mesma palavra é pronunciada como [‘tia] em algumas regiões do Brasil e como [‘tςia] em outras, mas não geram significados diferentes, ou seja, a representação mental de [t] e [tς] é a mesma.
Do ponto de vista do som, percebemos a diferença entre eles, mas é uma diferença que não muda o significado.
Algo contrário acontece entre [p] e [b], tanto que “pato” e “bato” são palavras diferentes pela simples mudança de um som.
Assim, na língua portuguesa, os sons [t] e [tς] são duas realizações possíveis do mesmo fonema. Já em algumas línguas, como o italiano, esses dois sons aparecem como dois fonemas diferentes.
Se no Rio de Janeiro se pronuncia [tςia], em outros lugares do Brasil se pronuncia [tia]. Essa é uma diferença diatópica, em outras palavras, uma diferença geográfica. O [tς], utilizado no dialeto carioca, é um alofone de /t/.
Assim, a Linguística Aplicada pode informar e formar profissionais capazes de detectar problemas e buscar soluções práticas que serão investigadas na tentativa de solucioná-los, gerando novas hipóteses e novas investigações, contribuindo com novos conhecimentos para o ensino.
A partir disso, pode-se gerar uma consciência de que o docente tem valor real e potencial para fazer um trabalho diferenciado no ensino.
Como afirma Castilho:
Temos de lembrar que nosso ofício maior não é ensinar a crase, é formar o cidadão de um estado democrático. Na democracia, exige-se do cidadão senso crítico, capacidade de julgar entre alternativas e escolher a que lhe pareça melhor. Dele se exige ampla exposição à variedade de possibilidades, à variedade de entendimentos e também à variedade linguística. Se lhe prescrevermos sem mais debates o que é considerado certo e condenarmos o que os manuais afirmam ser errado, estaremos matando na fonte a formação do cidadão. Isso é mais grave no caso dos alunos de classes subalternas hoje a maioria. Estaremos destruindo seu apego à variedade linguística aprendida em família, um dos fundamentos de sua identidade psicossocial. Chegar à escola e só ouvir que você e sua família falam errado é receber uma sentença de exclusão.
(CASTILHO, 2002, p. 12)
Na visão de Castilho (2002), a tarefa do professor é levar o aluno a discernir qual é a variedade linguística adequada a cada contexto de comunicação e interação. Essa tarefa é coerente com a perspectiva de uma escola e sociedade democráticas, em que os contrários convivem.
Assim, não seria democrático a escola e o professor estarem limitados ou reduzidos “a um único recorte de língua, mesmo que seja aquele prestigiado pela sociedade, condenando o resto” (CASTILHO, 2002, p. 12).
Podemos entender, então, que o objetivo do ensino da língua materna é preparar os cidadãos para o exercício dos seus direitos e deveres, capacitando-os para a integração ao mercado de trabalho com possibilidade de ascensão.
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Descrição Linguística e Ensino de Língua
Assista agora a um vídeo em que são comentadas as abordagens da Linguística em relação à língua e ao ensino de língua, destacando a importância de descrição linguística na formação e prática do professor de língua portuguesa.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
2:52 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Heterogeneidade da língua e o respeito à diferença no ensino
2:28 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
A dicotomia certo X errado no ensino de língua
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Na relação entre o trabalho de descrição linguística e o ensino de língua, é possível identificar como contribuição da Linguística Aplicada
A
a promoção de abordagens teóricas que reconheçam e promovam a homogeneidade da língua.
B
a dissociação entre os estudos teóricos e as práticas relacionadas com o uso da língua.
C
o reconhecimento da heterogeneidade da língua e a superação da dicotomia entre teoria e prática.
D
o reconhecimento da dicotomia entre teoria e prática, e o entendimento da língua como fenômeno estático.
E
a separação entre a pesquisa linguística e a divulgação dos resultados dessa pesquisa no contexto escolar.
Os estudos linguísticos, particularmente aqueles do campo da Linguística Aplicada, podem ajudar os professores de língua a reconhecerem o fenômeno linguístico como algo heterogêneo e dinâmico. Tal reconhecimento tem implicações no ensino de língua, pois evita posturas meramente prescritivas e dogmáticas em relação à língua. Assim, a pesquisa e os aportes teóricos se aproximam da prática, contribuindo para mudanças no ensino-aprendizado de língua.
Questão 2
O fato de a palavra “tia” ser pronunciada como [‘tia] em determinadas regiões geográficas e como [‘tςia] em outros lugares aponta para uma variação no nível fonético-fonológico que não implica mudança de significado da palavra. Ao se dar conta de tal descrição linguística, o professor de língua portuguesa deve concluir que
A
a língua apresenta variações que demandam um ensino centrado na norma culta.
B
a língua apresenta variações que demandam um ensino centrado nas variedades populares.
C
a língua se reduz a variações nos falares, mas sem implicações no aprendizado escolar.
D
a língua é heterogênea e, por isso, a tarefa principal do professor é definir o que é certo.
E
a variação linguística aponta para a necessidade de adequação das variedades a cada contexto de comunicação.
Na abordagem fonético-fonológica da língua, uma possibilidade é perceber as variantes linguísticas em termos de pronúncia, o que destaca a necessidade de o professor ajudar o aluno a compreender esses fenômenos a partir da descrição linguística e perceber quando e onde cada variante é adequada.
2 - O Professor e a Diversidade Linguística
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar as implicações da diversidade linguística em sala de aula.
Diversidade linguística
A Diversidade no fenômeno social da linguagem
Nosso país possui uma enorme diversidade linguística. Tal diversidade reflete a pluralidade cultural de nosso território, que se manifesta em costumes, tradições, crenças e outros aspectos. No entanto, as variações da língua, apesar do enriquecimento cultural, linguístico e de repertório, ainda são alvo de preconceito.
Vale destacar que, além da língua portuguesa, convivem em nosso país quase 200 línguas indígenas – no período do descobrimento eram mais de 1.200 – sem contar comunidades de falantes do alemão, do italiano, do japonês, do espanhol, entre outras.
Saiba mais
No mundo, são mais de 6.000 línguas faladas, sem contar os dialetos e algumas divisões altamente questionáveis, e as línguas impostas que levaram à extinção de inúmeras outras.
Em nosso caso, a diversidade linguística está relacionada à existência eà convivência de diversas línguas diferentes, além dos dialetos do próprio português espalhados por toda a nação. O conceito da diversidade implica a defesa de que haja respeito por todas as línguas e variantes, promovendo a preservação das línguas que estão em extinção.
A proposta de estudar a diversidade linguística busca promover o ensino e o respeito às diferenças de cada língua, de cada falar, de cada região.
Ao nos referirmos à língua, precisamos ter em mente que a sua função é a comunicação e a interação entre os indivíduos. É por intermédio do uso da língua que podemos questionar, entender, argumentar e transmitir informações.
As diferenças existentes nas línguas têm origem, em parte, no contato com outros idiomas, nas mudanças ocorridas com o passar do tempo.
Em relação aos regionalismos ou falares regionais, notamos que cada estado da federação possui características próprias, que o distingue dos outros, o que também se manifesta no aspecto linguístico, no jeito de falar, o chamado sotaque, por exemplo, e nas palavras típicas daquela localidade.
As variações linguísticas também ocorrem graças a fatores ligados à faixa etária dos falantes, à classe social, à profissão, entre outros.
A lição mais importante que qualquer ciência apresenta, incluindo a linguística, é que não existe um fenômeno bom ou ruim, mas que todas as manifestações são igualmente legítimas.
O que temos, em termos linguísticos, é uma variação determinada por fatores vários, que, normalmente, não afetam a comunicação da língua. É impossível que um território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, com um alto índice populacional de mais de 200 milhões de habitantes, pudesse manter a língua como um todo uniforme, sem variações.
Se, por um lado, há em nosso território uma unidade linguística, que é a língua portuguesa, ela passa por diversidade de falares, o que não dificulta que um falante do Norte do país interaja com um falante do Sudeste, mesmo com variações na fonética, na estrutura sintática ou no léxico, sem comprometer a unidade do português.
Por isso, se aplica a máxima "unidade na diversidade e diversidade na unidade" como questão central sobre a língua portuguesa.
Como a língua é uma entidade social, ela está em constante modificação, assim como qualquer sociedade. Por isso, estigmatizar ou rejeitar qualquer modo de falar é um grande equívoco, porque, no final das contas, é rejeitar aquela comunidade da qual o falante faz parte.
Afinal, não existe variante intrinsecamente superior a outra, mas um prestígio de algumas formas graças ao impacto econômico, por exemplo, que lhe dão maior destaque. Um exemplo é a norma culta, que está ligada ao poder que aquela camada tem sobre a sociedade.
A escola frente à diversidade linguística
Diversidade linguística e o desafio da escola
A escola precisa estar atenta a essas questões porque o contexto escolar reúne diversas realidades culturais, sociais e econômicas no mesmo espaço. Ao se abrir espaço para o preconceito linguístico, contribui-se para uma queda na qualidade educacional de nossos alunos. Fazer comentários jocosos ou desprezar certos modos de falar é danoso para a educação.
As variações linguísticas são divisões que surgem naturalmente nas línguas, que são distintas da norma padrão, porque têm a ver com as convenções da sociedade, com o momento histórico, o contexto ou a região em que o falante está inserido, sendo um tema amplamente estudado pela linguística.
Uma língua só vai deixar de mudar quando morrer. Conforme diz o gramático e professor Evanildo Bechara, “uma língua que só apresenta um só estilo já não é uma língua viva” (BECHARA, 2009, p. 25).
Nesse sentido, fica claro que muitas palavras utilizadas hoje na região em que você vive, provavelmente, não existiam no passado, assim como formas de falar que os jovens utilizam diferem bastante da de seus pais e avós. Tudo isso contribui para a pluralidade linguística de nosso idioma.
Assim surgem diferentes variantes da língua que apresentam características próprias. Podemos dividir as variações linguísticas em quatro grupos:
Diastráticas
Têm origem nas diferenças entre os diversos grupos e classes sociais.
Diatópicas
Têm origem nas diferentes regiões geográficas.
Diacrônicas
São características de certas épocas históricas e variam conforme o tempo.
Diafásicas
São características de certos contextos comunicativos, em situações de maior ou menor formalidade.
Infelizmente, as variações linguísticas quase sempre são vistas como formas utilizadas pelas pessoas que não têm um bom nível de escolaridade, ou seja, é uma forma de ver a questão bastante preconceituosa e errada, porque tal manifestação linguística é extremamente rica e demonstra a complexidade e beleza da relação entre língua e sociedade.
Assim, o ensino da língua materna precisa levar em conta as variações linguísticas e a heterogeneidade da língua. Com isso, o professor será capaz de desmitificar a noção amplamente desenvolvida de que são erros.
Um trabalho assim é capaz de investigar sobre as variações, diminuir o preconceito linguístico, a partir da observação de elementos que interferem na fala. Com isso, a sociedade e a escola podem interagir para um melhor desenvolvimento das aulas de língua materna.
O estudo da língua materna não pode ficar restrito apenas à escrita, mas precisa analisar a forma falada, já que é por meio da espontaneidade da manifestação oral que se observam elementos que não ficam restritos à norma culta e apresentam características regionais. Entender tudo isso pode contribuir para um melhor desempenho como professor de língua portuguesa.
A origem histórica da norma padrão
A concepção de língua que a maioria das pessoas traz vem da Grécia antiga, no século III AEC, em que a disciplina gramatical era voltada para a elite, ou seja, voltada para os que eram considerados intelectuais naquele momento histórico.
AEC
Antes da Era Comum
Essa elite era formada por aqueles que recebiam a cidadania a partir de certos requisitos, excluindo-se os escravos e as mulheres, formando um grupo muito pequeno que teria condições de se alçar à aristocracia.
Nesse sentido, o modelo utilizado por essa parcela da população passou a ser considerado padrão e deveria ser seguido por toda a população.
Conforme nos lembra o linguista brasileiro Marcos Bagno, a noção de erro em relação à língua nasce, no mundo ocidental, juntamente com “as primeiras descrições sistemáticas de uma língua específica, a língua grega” (BAGNO, 2007, p. 62).
No Brasil, a realidade não foi muito diferente. A norma utilizada pelo português padrão foi inspirada em um modelo único e de prescrição da língua, a partir de um olhar estético, baseado em escritores renomados.
Esse modelo acabou sendo considerado o correto, devendo ser utilizado na oralidade e na escrita por todos, já que seria esteticamente melhor, segundo seus defensores, desconsiderando que toda manifestação linguística ou dialetos têm a sua importância em seu contexto.
A inclinação a essa abordagem de superioridade de uma variedade do uso linguístico prejudica o aluno no acesso a outras manifestações, em um país que apresenta diversos dialetos, além dos usos familiares.
Ao considerar apenas o modelo padrão, falado por uma parcela muito pequena da população, a língua perde o seu sentido de instrumento de comunicação entre os seres humanos.
Diversidade linguística e atuação docente
O Papel do Professor diante da Diversidade Linguística
No início do século XX, Ferdinand de Saussure (1996), considerado o pai da Linguística, já dizia que a linguagem possui dois aspectos:
Um lado individual
Um lado social
Para Saussure (1996), seria impossível conceber um aspecto sem o outro. Assim, a todo momento, a linguagem implica, simultaneamente, dois aspectos:
Um sistema estabelecido
A cada instante, a linguagem se constitui como uma instituição atual.
Uma evolução
A cada instante, a linguagem é um produto do passado.
A concepção de Saussure já apresentava a língua possuindo uma manifestação coletiva e uma individual, com a língua emconstante transformação.
Diante dessa constatação, entendemos, portanto, que o professor precisa estar atualizado com relação às mudanças pelas quais a língua vem passando, aprimorando o seu conhecimento, interagindo com a realidade.
A abordagem linguística precisa levar em conta a atividade social, as questões cotidianas, explorando a diversidade existente, enfatizando o uso e rejeitando um modelo que trata o padrão como certo e o coloquial como errado.
Se, por um lado, o modelo padrão segue o que está preconizado nas gramáticas escolares, outros modelos são mais informais. Isso pode interferir na escrita.
O professor com boa formação na área de Linguística ou Linguística Aplicada pode intervir nesse momento, mostrando que tais modelos fazem parte do uso cotidiano da língua na nossa sociedade e servem para muitas formas e usos, demonstrando que cada uma delas tem o seu momento e lugar de uso, tornando o falante um poliglota em seu próprio idioma, transitando de acordo com a necessidade (BECHARA, 2006).
De modo algum queremos afirmar que devemos abandonar o ensino da gramática normativa. O que não podemos é restringir o ensino da língua portuguesa apenas à prescrição gramatical. Conforme nos adverte Bechara (2006, p. 48), “igual atenção deverá merecer da escola o ensino da leitura, da redação e da aula de gramática”.
Atenção!
O uso coloquial da língua deve ser realizado sem que gere qualquer tipo de preconceito ou discriminação. Sendo adotada como objeto de análise em sala de aula, essa variante ganhará importância e deixará de ser rejeitada.
Afinal, não existem sociedades em que todos os seus membros falem da mesma forma, e tais variações refletem o papel que essas pessoas exercem naquele grupo. É por meio dessas variações que a língua adquire uma maior expressividade para dar conta de todas as suas necessidades, seja a conversa na feira livre ou o texto esteticamente criativo da literatura, passando pelo humor e pela música.
Conforme comentamos, a questão não é deixar de ensinar a gramática normativa, já que ela, por si, não consegue dar conta de todas as necessidades do falante, mas, sim, entender que a pluralidade linguística deve estar presente na escola.
Para Bechara (2006), o ensino gramatical tradicional é antieconômico, banal e inatural, porque ensina o que a maioria dos alunos já sabe, devendo ser substituído por estudo de uso. Nesse sentido:
a educação linguística põe em relevo a necessidade de que deve ser respeitado o saber linguístico prévio de cada um, garantindo-lhe o curso na intercomunicação social, mas também não lhe furta o direito de ampliar, enriquecer e variar esse patrimônio inicial.
(BECHARA, 2006, p. 11)
A defesa de um modelo em detrimento do outro acaba apresentando um resultado danoso porque se privilegia o ensino de uma variedade em detrimento de outra. Por isso, a proposta mais sensata é estudar as variedades linguísticas, entendendo como cada uma tem o seu lugar e a sua importância.
Uma das tarefas do ensino de língua na escola seria, então, discutir os valores sociais atribuídos a cada variante linguística, enfatizando a carga de discriminação que pesa sobre determinados usos da língua, de modo a conscientizar o aluno de que sua produção, oral ou escrita, estará sempre sujeita a uma avaliação social, positiva ou negativa.
(BAGNO, 2002, p. 75)
Perceba que o estudante precisa saber que será avaliado pelo uso que fizer da língua, seja na oralidade seja na escrita.
O professor entra nesse contexto dando suporte aos alunos para que usem a língua de acordo com os contextos adequados.
Diversidade linguística e aprendizado do aluno
O estudante e a diversidade de falares
Todos os falares têm igual valor, e quando o estudante usa a modalidade formal, ele o faz para aumentar a sua bagagem cultural e transitar nos diversos espaços da sociedade em que a língua culta é privilegiada, não para substituir sua maneira de falar.
Na simples troca de ambientes, o falante vai mudar a maneira de se expressar, já que a sociedade não é uniforme e a escola tem um potencial enorme de inovar a partir dessa informação, mostrando que podem ocorrer trocas incríveis e que cada grupo tem sua maneira de falar.
Como nos lembra Antunes (2009, p. 35), “as línguas estão a serviço das pessoas, de seus propósitos interativos reais, os mais diversificados”, e isso ocorre de acordo com as formas que os contextos assumem, com as situações e os estados nos quais que os interlocutores se encontram.
Para a Linguística, com sua abordagem científica sobre a linguagem, a língua serve para aproximar as pessoas, já que considera todas as manifestações como igualmente válidas, enquanto a abordagem tradicional considera as variações como erros.
Em alguns casos, é comum que o estudante use na escrita uma transcrição da forma como fala, elaborando um texto com estilo e redação não considerados válidos para uma gramática padrão, mas perfeitamente eficaz na oralidade.
Ao aprender as características das diferentes modalidade e registros da língua, com as peculiaridades de escrita e da fala, o estudante se conscientizará de que a oralidade nem sempre segue as regras da gramática padrão e que a norma padrão não é necessariamente aplicável a toda e qualquer situação, mas apenas uma variedade que ganhou prestígio por outras questões, não pela linguagem.
Ao promover esse tipo de ensino, o professor é capaz de acolher as variações que convivem naquele contexto, reconhecer e respeitar a identidade dos alunos, focando a construção do conhecimento.
Tudo isso serve para reforçar que o modelo culto não é absoluto e que os estudantes são diferentes, o que demanda um ensino de língua que lide com as mudanças e a pluralidade, já que a língua é heterógena e dinâmica.
Castilho (2002) nos lembra de que a criança, ao chegar à escola, já conhece as complexidades da língua que fala, ou seja, já tem certo domínio sobre uma língua natural. A criança vem de uma fase de aprendizagem da língua falada, no contexto da família, e passa para a aprendizagem da língua escrita, no ensino básico.
Ainda de acordo com Castilho (2002, p. 10), na aprendizagem no seio da família e no contexto escolar, a criança teve de dominar pelo menos quatro sistemas:
Léxico
Semântica
Discurso
Gramática
O professor no ensino médio e, depois, no ensino superior, deverá suscitar no aluno esse conhecimento, levando o estudante a rememorar essa aprendizagem e nela avançar. Para Castilho (2002, p. 10), o professor deve promover experiências pedagógicas que levem “o aluno a exteriorizar as regularidades discursivas, semânticas e sintáticas que ele internalizou quando aprendeu a falar e a escrever em sua língua”.
Apesar do enorme preconceito do uso da variante não padrão escrita ou falada, dentro e fora da escola, há a necessidade de se desenvolver uma abordagem pautada na variedade linguística existente em nosso país e na importância da heterogeneidade para o crescimento dos estudantes. A forma que a escola ainda lida com isso acaba afastando o estudante do verdadeiro objetivo do ensino de língua, que é a habilidade comunicativa, seja escrita ou falada.
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Diversidade linguística na sala de aula
Assista agora a um vídeo em que são comentadas as implicações da diversidade linguística no trabalho do professor de língua portuguesa na educação básica.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
2:56 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Como se estabeleceu a norma padrão da língua
2:14 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Adequação no uso da língua e contextos sociais
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
A importância dada à normatividade gramatical remonta à Grécia Antiga, quando os estudiosos tinham a preocupação de evitar as “deformações” do uso da língua grega. Nesse sentido, a concepção de língua da maioria das pessoas está sob essa influência. Sobre essa temática, é correto afirmar que
A
a língua escrita era pouco valorizada, já que limitavaas transformações naturais que se processavam no falar da elite, as quais davam grande dinâmica e riqueza à língua.
B
a normatividade gramatical atendia aos interesses de uma elite intelectual que excluía pessoas comuns, mulheres e escravos, estabelecendo as regras quanto ao certo e errado.
C
como entidade imutável e homogênea, a língua escrita e falada era valorizada pela importância que tinha nas relações comerciais e nas trocas culturais características da época.
D
o falar característico da elite intelectual grega priorizava, assim como hoje, a comédia como fonte de produção da norma culta, promovendo a disseminação do falar correto para a população.
E
as regras e os padrões linguísticos estabelecidos pela elite intelectual grega eram adotados nos documentos oficiais, nas relações comerciais e nas atividades de rua com vistas à oficialização de um falar padrão.
O conceito de uso normativo da língua, privilegiando um determinado modelo em detrimento de outros, começa na Grécia Antiga e mostra que a distorção sobre o sentido do uso da língua vem de muito tempo. A língua era vista como um elemento para as elites exercerem seu poder sobre os outros grupos. Tal conceito permanece até hoje e se manifesta em situações que não consideram as variantes como formas linguísticas válidas, sendo tratadas como erros. A escola tradicional passou a considerar apenas um modelo que não existe na prática, exceto na literatura clássica, o que acaba distanciando os falantes do prazer de estudar a gramática e da descoberta do texto.
Questão 2
“A linguagem tem um lado individual e um lado social, sendo impossível conceber um sem o outro.” (SAUSSURE, 1996, p. 15)
Sobre a afirmação e sua implicação para a atividade do professor de língua portuguesa, é correto afirmar que
A
a linguagem possui uma dimensão individual ligada à fala e uma dimensão coletiva relacionada com a escrita, por isso, o professor precisa separar as atividades de produção escrita e oral.
B
a linguagem como instrumento de interação promove a dimensão individual e coletiva por meio da escrita, o que deve levar o professor a privilegiar a escrita em detrimento da oralidade.
C
a linguagem não está desvinculada de um contexto social, sua produção é individual e coletiva, podendo ser articulada pelo professor independentemente do contexto social e das variações.
D
a linguagem do cotidiano está estreitamente articulada a um contexto social e coletivo, por isso, a dimensão individual deve ser deixada de lado pelo professor nas aulas de língua portuguesa.
E
a língua, em suas dimensões coletiva e individual, está intrinsecamente ligada às transformações sociais, assim, o professor pode trabalhar a partir de uma análise linguística criteriosa, levando em conta essas transformações, as questões cotidianas e a diversidade.
Saussure, o pai da Linguística, entre o final do século XIX e o início do século XX, ao ministrar o Curso de Linguística Geral, afirmava que a linguagem tem uma abordagem social e uma individual. O seu lado social está ligado ao aspecto coletivo e às transformações sociais. Nesse sentido, a Linguística Aplicada também se volta para as demandas sociais que surgem no dia a dia, bem como para a diversidade linguística. Assim, evita-se a separação entre teoria e prática, tornando a abordagem da linguagem mais acessível e prática para todos os interessados no tema.
3 - Linguística Aplicada ao Ensino de Leitura e Escrita
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar as contribuições da Linguística Aplicada para o ensino de leitura e escrita.
A escola e o ensino da leitura e da escrita
O Papel da Escola no Ensino da Leitura e da Escrita
O ensino da língua portuguesa na escola tem o objetivo de preparar o estudante para lidar com as diversas manifestações da linguagem, seus variados usos e expressões, o que inclui a gramática normativa e a língua culta, a fim de que ele tenha acesso a outras áreas de conhecimento e desenvolva as competências leitora e escritora indispensáveis para a vida em sociedade.
Assim, o desenvolvimento de tal saber vai implicar a leitura e o olhar crítico sobre o texto, ou seja, a produção escrita seguindo o padrão normativo, a análise da linguagem em manifestações literárias, visuais e outras, para que ele possa compreender o mundo melhor.
Pensando como a Linguística Aplicada pode contribuir de forma específica para o ensino de leitura e escrita nas aulas de língua portuguesa, podemos propor que o professor deva provocar os alunos a formular perguntas que os próprios estudantes junto com o professor poderão responder. O que, tradicionalmente, tem acontecido é que o docente responde a perguntas que os estudantes não fizeram, o que é pouco produtivo.
O papel da escola deve ser levar o aluno a atingir o seu desenvolvimento linguístico, mas a escola ainda precisa lidar com uma fragmentação bastante comum no ensino da língua materna: leitura e compreensão, literatura, gramática e produção de textos.
Tais divisões muito rígidas impossibilitam uma reflexão e uma ação sobre as questões linguísticas, fazendo com que o estudante apenas decodifique e analise a língua, em momentos separados, sem que esse aluno tenha noção do todo da linguagem.
O papel desempenhado pelo professor vai além de ensinar a gramática normativa, que é uma variante da língua cobrada pela sociedade, pois o docente deve levar o aluno a ampliar seus conhecimentos com outras manifestações e outros níveis de uso da língua. Assim, o aluno terá oportunidade de desenvolver sua capacidade comunicativa.
A Linguística Aplicada nos ajuda a compreender que o ensino da língua materna deve ser amplo, valorizando a fala, que é a modalidade aprendida naturalmente e que está em constante transformação, e apresentando características que precisam ser analisadas em sala de aula.
Atenção!
Os documentos oficiais que norteiam o ensino enfatizam a articulação entre a leitura e a escrita, já que formam um todo sobre a língua. Ao se fazer um recorte com a intenção de facilitar o estudo, é necessário que as unidades ou os segmentos estejam relacionados com outros elementos do processo de construção do texto oral e/ou escrito, ou seja, devem estar articulados sempre.
Ainda são poucos os trabalhos que investigam o atual documento que serve para nortear os currículos escolares no Brasil. Estamos nos referindo à Base Nacional Comum Curricular – a BNCC. Esse documento, assim como qualquer diretriz curricular, deve ser trabalhado sem se perder de vista o objetivo de direcionar a educação para uma formação humana integral e para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa e participativa.
O texto da BNCC nos informa que tal documento possui um “caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica” (BRASIL, 2017, p. 7).
No caso da língua portuguesa, entendemos que todas as modalidades da língua são essenciais. Tanto a escrita quanto a fala, em suas diversas manifestações e registros, devem ser trabalhadas nas aulas e atividades de língua portuguesa.
Integração da oralidade e da escrita
Atividades integrando oralidade e escrita
Quem está no espaço de sala de aula ministrando a língua materna sabe que os alunos apresentam muita dificuldade para escrever e mesmo reproduzir a oralidade em atividades de produção textual.
É bastante comum que os estudantes escrevam da maneira como se fala, por isso é tão importante que a escola trabalhe a oralidade, mostrando que existem semelhanças e diferenças entre as modalidades da língua.
O aluno precisa aprender que não existe uma gramática finalizada e pronta para a fala, mas há diferenças entre os textos produzidos pela fala e pela escrita, afinal, a escrita tem a necessidade de usar uma seleção vocabular mais ampla, uma sintaxe específica, diferente da oralidade, entre outras características que a distinguem. Por isso, o professor precisa reforçar que a interação na oralidade se dá de forma pessoal, de modo geral, olhono olho, enquanto na escrita isso não acontece.
A escrita pode ser planejada, revista e reelaborada, a fala, por sua vez, não admite essa possibilidade.
Ao escrever, podemos consultar outras fontes; na oralidade, isso não é possível. Pode-se afirmar que a fala apresenta todo seu processo de criação enquanto se dá a própria comunicação entre os interlocutores. A escrita, por sua vez, mostra o produto ou resultado desse processo separado do momento em que o texto será recepcionado pelo seu destinatário ou leitor.
Considerando as articulações entre oralidade e escrita, ao mesmo tempo em que se reconhece também suas distinções, é preciso trabalhar ambas as modalidades em sala de aula.
Cada item apresentado para o estudo da língua precisa estar ligado a um projeto, com dados selecionados, sobre os quais os alunos podem pensar perguntas específicas. Os dados são a fala e a escrita dos próprios alunos, que servirão para os alunos analisarem a fala e a escrita que lhes são familiares e compará-las com trechos do modelo culto da língua.
Pode-se propor que os alunos, orientados pelo docente, gravem as próprias conversas e façam as transcrições, permitindo que o professor e outros estudantes entendam e explicitem como funcionam os mecanismos da oralidade.
A partir dessa atividade, alguns trechos podem ser escritos, permitindo que os estudantes façam observações sobre a fala e a escrita.
Atividades como essas podem ser mais interessantes do que formatos de aulas meramente expositivas em que a língua portuguesa é ensinada em um contexto de passividade dos alunos e desconectada do mundo real do uso da oralidade e da escrita.
Recomendação
Desenvolver atividades que integrem oralidade e escrita, aproximando o aprendizado da língua dos usos que são familiares ao aluno, pode levar o estudante a analisar e questionar os dados que ele mesmo coletou, ainda mais agora que o acesso à informação e a seu processamento digital é cada vez maior.
Usando aparelhos de celular que gravam facilmente a fala dos alunos e, ao mesmo tempo, permitem acesso a uma infinidade de textos, as aulas e atividades de língua portuguesa podem explorar a riqueza da diversidade linguística.
O ensino da língua precisa valorizar os saberes não valorizados, que agregam às experiências dos discentes saberes que devem ser aplicados para além da escola, unindo as demandas curriculares às necessidades de aprendizagem. Essas necessidades podem ser identificadas pelo trabalho cuidadoso da escola e dos docentes.
Algumas questões podem ser respondidas para se desenvolver esse trabalho que articula os saberes valorizados pela escola e os saberes que extrapolam o mundo da escola:
	Como a fala é organizada?
	De que modo ocorre a passagem entre as falas dos interlocutores em uma conversação?
	Como o ouvinte toma a vez para falar?
	Quais as marcas linguísticas encontradas na oralidade?
Com essas questões em mão, o professor pode partir para as observações de como o texto é organizado, considerando outro tipo de perguntas:
	Como os argumentos são desenvolvidos no texto escrito?
	Quais mecanismos linguísticos são utilizados para apresentar a informação na escrita e na oralidade?
	Quais os conectivos são utilizados na fala e quais são mais recorrentes na escrita?
Depois de passar por essas etapas, pode-se entrar na análise gramatical propriamente dita do texto com perguntas que podem tratar de alguns pontos, tais como:
	a função das palavras encontradas no texto;
	o modo como as palavras se agrupam; e
	as correspondências ou não entre os marcadores conversacionais da oralidade e da escrita.
É claro que esses são apenas alguns pontos, pois o professor poderá explorar outras questões gramaticais e linguísticas.
Assim, as aulas ganham um ar de descoberta científica, como deveriam ser desde o início.
Integração da gramática e os usos da língua
Atividades integrando gramática e usos da língua
Tudo isso serve para descrever uma língua viva no espaço da sala de aula, a partir de dados coletados pelos próprios alunos, de perguntas feitas a partir da atividade e da elaboração de sua resposta.
A partir dessas atividades de coleta e trabalho com a língua nos seus contextos de uso, deve ser feita a orientação para que os alunos verifiquem o que já foi escrito sobre aquilo que eles pesquisaram, usando, para isso, as gramáticas e os livros didáticos.
Para que esse processo seja bem-sucedido, é necessário que o professor seja capacitado a fim de encontrar alternativas metodológicas para o ensino da língua materna.
Atenção!
A missão do professor de português vai muito além de ensinar acentuação gráfica ou regras gramaticais, o docente de língua deve formar cidadãos para viverem em um ambiente de diversidade, ou seja, democrático, sendo crítico, julgando e escolhendo aquilo que lhe parece melhor.
O famoso jingle da Caixa Econômica Federal – que já tem mais de três décadas e se tornou a mensagem publicitária mais antiga ainda em uso no Brasil – dizia: “Vem para a Caixa você também. Vem!”.
Essa mensagem ou texto é um exemplo de propaganda marcada pela oralidade.
Na frase, haveria um erro, de acordo com a gramática normativa. O verbo “vir” é usado no imperativo, na segunda pessoa do singular (vem), embora o pronome utilizado seja o “você”, que deveria levar o verbo a ser empregado na terceira pessoa (venha).
Um emprego assim é bastante recorrente na oralidade, mas condenado pela gramática normativa, que apresentaria a frase como “Vem para Caixa tu também” ou “Venha para a Caixa você também”. Logo, a propaganda fez um uso coloquial da linguagem.
Ao explicar o caso, o professor pode lembrar que o pronome “você” tem origem em “vossa mercê”, sendo uma forma de tratamento que deve fazer concordância com a terceira pessoa, embora se refira à segunda pessoa, tu. No jingle do banco federal, foi feita a mistura no uso do verbo no imperativo.
Faz tempo que a recomendação das gramáticas em relação ao imperativo deixou de ser usada na oralidade de vários lugares do país, ficando restrita à escrita formal.
No exemplo, conforme foi dito, temos uma forma que mescla a segunda e a terceira pessoa para se dirigir ao interlocutor. A intenção é ser mais próximo da língua falada, já que o modelo formal não atingiria as necessidades comunicacionais e levaria à perda da rima. O uso da norma gramatical, nesse caso, seria bem aceita apenas por uma parcela pequena da população. Fazendo uma combinação entre o “tu” e o “você”, prática bastante atual na fala da maioria das pessoas, a frase ganha mais apelo popular.
O chamado duplo tratamento, que confunde e mistura o uso da segunda e pessoa de tratamento, é tratado como vício de linguagem na gramática normativa, mas é bastante comum no português falado, resultando em frases como a do nosso exemplo: “Vem [tu] pra Caixa você também. Vem!”.
Outra peça publicitária que também fez isso foi um anúncio da Embratel, que dizia o seguinte: “Você quer um desconto? Faz um 21!”. Note que o uso do “você” deveria levar o verbo “fazer” a seguinte forma no imperativo: faça. Assim, conforme a gramática normativa, para adequar a frase à norma padrão, deveríamos reescrevê-la da seguinte maneira: “Você quer um desconto? Faça um 21!”.
Outro exemplo vem da peça publicitária para a campanha de prevenção à AIDS, que diz: “Se você não se cuidar, a AIDS vai te pegar”, objetivando alcançar a maior parte da população. Essa campanha também segue o português coloquial atual para o tratamento da segunda pessoa, usando o verbo na terceira pessoa do singular, seguido do pronome oblíquo de segunda pessoa. A sugestão normativa seria: “Se você não se cuida, a AIDS vai pegá-lo.”, mas perderia a rima.
Outro caso é o da propaganda do refrigerante Sprite que alardeava: “Obedeça sua sede”. A frase contém um problema de regência, já que o verbo “obedecer” é transitivo indireto, tendo como obrigatório o uso da preposição “a”, pois quem obedece, obedece a alguma coisa ou a alguém. Logo, a forma correta de acordo com a gramática normativa é: “Obedeça a sua sede”. Perceba que o uso da crasena frase é facultativo, pois antes de pronomes possessivos, tais como “sua”, “tua”, “minha”, “nossa” e “vossa”, podemos optar por usá-la ou não.
Como temos visto, há frases utilizadas em propagandas famosas que não são aceitáveis no português escrito formal porque apresentam incorreções, como a flexão equivocada do verbo no imperativo e o uso embaralhado das formas de tratamento.
Como fica, então, a questão do ensino a partir desses dois exemplos?
Diríamos para os alunos que eles poderiam escrever assim em situações formais?
Não! As campanhas, no contexto da linguagem publicitária, tinham um objetivo de alcançar o maior número de pessoas possível, logo, eram adequadas para aquele fim. Assim, conhecer a norma significa escrever de acordo com a demanda comunicacional a ser atendida.
Ensino de leitura
A importância do ensino de leitura
Outra preocupação do profissional que ministra as aulas de língua portuguesa é com a leitura, que não é uma atividade muito simples e fácil.
A prática de leitura pode ser considerada uma experiência exclusiva, um exercício dialógico, que envolve a decifração, a interpretação e a compreensão, como formas de interação com o texto.
Assim, todos nós estamos em constante interação com o texto. Como afirma Garcez, “nenhuma atividade humana permite, até hoje, a espécie de diálogo atemporal que a leitura proporciona” (GARCEZ, 2000, p. 5).
Reflexão
A leitura é algo bastante complexo e envolve diversos aspectos, que vão da decodificação de letras até a compreensão do texto por meio de certas estratégias. Por isso, existem inúmeras abordagens sobre a leitura.
A leitura como decodificação
Uma abordagem entende a leitura como a decodificação, a partir de um olhar mais estruturalista. Nessa concepção, o texto é entendido como um código a ser decifrado e a leitura concebida como um tipo de extração do significado.
Nessa perspectiva, as letras devem ser entendidas de modo individual pelo leitor, formando palavras até chegar ao significado. Logo, o leitor faz uma leitura indutiva, capturando as informações de maneira linear e construindo o seu significado por meio das partes, sem um conhecimento anterior.
Tal abordagem tem um foco na interpretação mecânica do texto, por meio da decodificação da escrita, ao recuperar elementos que aparecem explicitamente no texto.
Uma palavra que pode resumir tal abordagem é “extração”, caracterizando um processo inicial da leitura.
Assim, quando as atividades didáticas solicitam que os alunos “extraiam” determinadas informações de um texto, elas estão limitando a abordagem, deixando de lado ou para outro momento as relações do texto ou daquela informação solicitada com outros conhecimentos.
A leitura como atividade cognitiva
Outra abordagem entende a leitura como uma atividade cognitiva que busca a compreensão. Essa perspectiva da leitura aborda uma mudança bastante significativa que aponta para conhecimentos prévios trazidos pelo leitor.
Os conhecimentos prévios correspondem ao repertório do aluno, ao conhecimento de mundo, de práticas da sociedade, de textos, da linguagem, entre outros saberes.
Atenção!
Esses conhecimentos são essenciais para identificar o texto como um todo orgânico e relacionar suas partes como uma peça coerente, além de contribuir para a atribuição de sentidos a partir da leitura de outros textos.
Uma das características dessa abordagem é que o leitor constrói hipóteses e, para isso, utiliza seus conhecimentos prévios na leitura. O leitor é capaz de absorver as ideias do texto a partir de conhecimentos diversos, em vez de compreender apenas as palavras.
Desse modo, a leitura começa na decodificação, mas não se limita a essa fase inicial.
Na compreensão, o leitor passa pela decodificação (quando reúne informações fonológicas, fonéticas, morfológicas, sintáticas) e pela construção da coerência (quando integra essas informações a seus conhecimentos). O leitor também mobiliza diversos tipos de conhecimentos prévios e utiliza estratégias antes, durante e depois do processamento de informações.
(CAFIERO, 2005, p. 38)
A leitura como prática social
Uma terceira forma de abordar a leitura é compreendê-la como prática social. Tal proposta afirma que há uma interação entre texto e leitor.
É preciso entender que a complexidade do processo da leitura nos leva a ir além dessas duas primeiras abordagens que apresentamos, mas sem eliminá-las ou optar por uma ou outra.
Devemos, também, ir além da decodificação ou da abordagem cognitiva do texto. De acordo com Leffa (1996, p. 17), precisamos considerar um terceiro aspecto: “o que acontece quando leitor e texto se encontram”.
Assim, na abordagem da leitura como prática social, conforme Leffa (1996), teremos de considerar três elementos:
O papel do leitor
O papel do texto
A interação entre o leitor e o texto
De acordo com essa proposta, a compreensão de um texto só será possível se houver afinidade entre o leitor e o texto, o que se dá por meio de conhecimentos prévios, que vão interagir com as informações textuais e resultarão na compreensão do texto.
Tal abordagem promove a interação entre leitor e texto, estimulando um diálogo entre eles e uma resposta, considerando o leitor, o texto e o autor, ou seja, a interação entre sujeitos que trazem conhecimentos específicos.
A leitura é uma prática social discursiva que envolve diversas capacidades, tais como:
Identificação de informações
Ativação de conhecimentos anteriores
Inferências e recuperação dos contextos de produção
Desse modo, a atividade de leitura envolve dimensões inter-relacionadas a procedimentos de decodificação e à reflexão. A prática da leitura também é guiada por certas condições de produção, permitindo que os gêneros textuais possam ser reelaborados, valorizando aspectos estéticos, culturais, políticos e ideológicos, capazes de estabelecer relações intertextuais e interdiscursivas.
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Linguística Aplicada e ensino de leitura e escrita
Assista agora a um vídeo em que se comenta o papel da escola no ensino da leitura e da escrita a partir da Linguística Aplicada, enfatizando a formação e atuação do professor de língua portuguesa.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
3:10 min.
Módulo 3 - Vem que eu te explico!
O papel da escola no ensino de língua portuguesa
2:46 min.
Módulo 3 - Vem que eu te explico!
Ensino de gramática e diferentes usos da língua
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Analise as afirmativas acerca da contribuição da Linguística Aplicada ao ensino da leitura.
I – A relação entre o leitor e o texto contribui para o estabelecimento de uma prática de leitura adequada e a produção de sentido.
II – A leitura como processo de decodificação e como atividade cognitiva são conceitos necessários e suficientes que abarcam todas as dimensões e aspectos necessários para o trabalho com o texto.
III – Para além da decodificação e da atividade cognitiva, a leitura também implica uma prática social.
Está correto apenas o que se afirma em:
A
I.
B
II.
C
III.
D
I e II.
E
I e III.
As afirmativas I e III estão corretas porque a leitura envolve processos de decodificação, atividade cognitiva e, também, prática social, caracterizando uma interrelação entre leitor e texto. A afirmativa II está incorreta porque as dimensões da decodificação e da atividade cognitiva são necessárias, mas não suficientes, havendo a necessidade da cooperação entre leitor e texto.
Questão 2
A Linguística Aplicada tem muito a contribuir para o ensino da língua materna, ao oferecer o saber sobre a constituição da língua e seu funcionamento como instrumento de comunicação inserido em um contexto social e histórico. Nesse sentido, é correto afirmar que no ensino da língua materna
A
deve-se promover o desenvolvimento linguístico com ênfase na leitura, gramática e produção textual, trabalhando atividades de análise da língua materna.
B
é preciso valorizar a fala, aprendida na escola, associada à leitura e à escrita, em contextosescolares, eliminando as falas trazidas pelos alunos.
C
deve-se valorizar a escrita, já que a fala é aprendida naturalmente pelo aluno e o contexto social em que ele vive, por si, promove o desenvolvimento da oralidade.
D
deve-se promover a integração entre fala, leitura e escrita, aproximando o aluno da norma culta, que é suficiente para a sua integração em diferentes contextos sociais.
E
é necessário promover de maneira dinâmica a leitura e a escrita em momentos distintos, pois são práticas independentes e não articuladas.
A Linguística, de modo geral, não considerava o contexto sócio-histórico em que ocorriam as interações da comunicação. Com a Linguística Aplicada, esse quadro mudou. No ensino da língua portuguesa, enquanto língua materna, a Linguística Aplicada enfatiza a valorização da fala, que o estudante já traz em uma experiência anterior à escola, que deve ser associada à leitura e à escrita, sem que haja a supervalorização das normas prestigiadas socialmente em detrimento do acolhimento ao aluno com suas variações linguísticas. Obviamente, a norma padrão não deve ser abandonada, mas colocada em perspectiva na sala de aula.
Linguística e educação bilíngue
Prof. Nataniel Gomes
Descrição
Conceito de ensino bilíngue, políticas linguísticas para a educação bilíngue e a contribuição da Linguística para a educação bilíngue.
Propósito
Compreender as concepções de ensino bilíngue e as contribuições dos estudos linguísticos na educação bilíngue para o desenvolvimento das competências necessárias à atuação como professor de Língua Portuguesa na educação básica.
Objetivos
Módulo 1
Ensino bilíngue: conceitos e definições
Identificar os diversos conceitos e definições ligados ao bilinguismo.
Módulo 2
Políticas linguísticas para a educação bilíngue
Reconhecer as políticas linguísticas para a educação bilíngue.
Módulo 3
Linguística e a educação bilíngue
Relacionar os estudos linguísticos à educação bilíngue.
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Introdução
Os limites da sua linguagem são os limites do seu mundo.
(WITTGENSTEIN, 2001, p. 5)
O domínio de uma segunda língua passou a ser reconhecido como um diferencial no mercado de trabalho, sobretudo em um mundo globalizado. Responsáveis e pais começaram a buscar formas para facilitar o ingresso de crianças e jovens no contexto de segunda língua, principalmente em escolas.
Muitos se perguntam se realmente a melhor opção seria matricular as crianças em escolas bilíngues. Ou seja, garantir a vivência delas em ambientes que privilegiam o domínio da segunda língua, oferecendo um ensino de qualidade e contemplando aspectos sociais, culturais e linguísticos.
Essas e outras questões sobre o bilinguismo ganham cada vez mais interesse e apontam para o entendimento de que ampliar os limites da linguagem também significa ampliar as possibilidades e o próprio mundo.
Por isso, vamos estudar esse assunto tão interessante!
1 - Ensino bilíngue: conceitos e definições
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar os diversos conceitos e definições ligados ao bilinguismo.
O bilinguismo
A demanda pelo bilinguismo
Existem mais de seis mil idiomas em uso no mundo. Na verdade, esse número pode até ser muito maior, já que nem sempre é fácil diferenciar língua de dialeto.
As quatro línguas mais faladas atualmente, na ordem, são:
	Inglês
	Mandarim
	Hindi
	Espanhol
É evidente que o inglês se tornou uma língua franca, ou seja, de comércio e contato em todo o mundo. Isso não nos leva a ignorar que, em cada país ou região, pode haver outra língua, além do inglês e da língua materna, que também desperte interesses ou seja relevante em alguma perspectiva.
Em nosso país, há uma demanda cada vez maior pela educação bilíngue. Uma prova disso é o crescimento de escolas desse segmento, que buscam atender aos interesses de muitos pais e à própria demanda imposta pelo mercado de trabalho. São escolas que procuram superar a seguinte situação: nem todos os docentes dominam uma segunda língua.
Saiba mais
A Associação Brasileira do Ensino Bilíngue (Abebi) estima que, entre 2014 e 2019, houve um crescimento de 6 a 10% de escolas bilíngues privadas no Brasil. A Abebi também aponta que, em 2019, cerca de 1.200 escolas eram bilíngues ou desenvolviam algum programa do tipo.
Durante um bom tempo, havia a crença de que o ensino de uma segunda língua poderia confundir os jovens aprendizes, dificultando a aprendizagem da língua materna e da estrangeira. Esse conceito ainda persiste no entendimento de muita gente.
Já se sabe, porém, que o bilinguismo traz inúmeros benefícios para o falante. Podemos citar pelo menos dois deles:
Identificação com outra cultura
Possibilidade de se colocar no lugar do outro a partir de seu contexto linguístico e cultural.
Aprimoramento de aspectos cognitivos
Ressignificação de conceitos e expansão da memória.
Alguns estudiosos chegam a afirmar que o bilíngue tende a se tornar mais analítico em sua tomada de decisões. Uma hipótese é que, ao adquirir uma língua, o falante percebe determinadas nuanças do idioma, o que implica atenção redobrada.
Exemplo
Talvez por isso estudantes bilíngues tendam a obter resultados melhores em testes com matemática ou em atividades multitarefas.
Concepção de bilinguismo
O que é bilinguismo
Existem diversas definições para o bilinguismo: uma das mais comuns está ligada à coexistência de dois sistemas linguísticos utilizados por um falante. Mas há outros sentidos para o termo.
Para alguns, o bilíngue é capaz de falar duas línguas sem esforço; para outros, seria aquele indivíduo que se expressa sem cometer erros graves e mantém uma pronúncia correta. As fartas definições e divergências sobre o termo acontecem por falta de critérios para uma definição mais consensual entre os estudiosos.
Na verdade, a compreensão do bilinguismo mudou com o avanço dos estudos da Linguística, mas isso não elimina de todo a dificuldade de se estabelecer uma definição que ajude a delimitar o termo de forma suficientemente exata. No século XX, a definição mais comum para o bilinguismo estava ligada a indivíduos que dominavam duas ou mais línguas perfeitamente.
Para Grosjean (2017), as situações a seguir seriam casos de bilinguismo:
Crianças cujos pais falam duas línguas e aprenderam esses idiomas simultaneamente antes dos três anos de idade.
Jovens que participam de jogos virtuais em uma comunidade na qual determinado idioma é a língua de contato.
Pessoas que leem e escrevem frases básicas de determinada língua.
Indivíduos que entendem determinada língua, mas não conseguem falar.
Grosjean (2017) entende que os falantes bilíngues usam duas línguas que aprenderam ou adquiriram em seu cotidiano, alternando seu uso de acordo com suas necessidades e objetivos, como apresentamos nos quatro casos acima.
Esses falantes se valem do conhecimento linguístico que têm e das suas habilidades para comunicação, seja no ato de ler, de ouvir, de falar ou de escrever nos idiomas que fazem parte das suas experiências do dia a dia.
Se for feita uma rápida pesquisa nos dicionários, é provável que o termo “bilinguismo” apareça associado ao indivíduo que fala duas línguas.
Vejamos como o linguista canadense William Francis Mackey (apud MEGALE, 2005, p. 3) resume as quatro questões que devem ser levadas em conta no estudo do bilinguismo:
Grau de proficiência
Não precisa ser equivalente em todos os níveis linguísticos, pois “o indivíduo pode, por exemplo, apresentar vasto vocabulário em uma das línguas, mas nela apresentar pronúncia deficiente”.
Função e o uso das línguas
Em outras palavras, as circunstâncias nas quais o falante usa duas línguas devem ser estudadas no bilinguismo.
Alternância de código
Ou seja, a constância e as condições em que o falante muda o uso de uma língua para a outra devem ser consideradas na definição do bilinguismo.
Interferência
O modo como uma língua influencia a outra e como uma interfere na outra precisa ser considerado na pesquisa sobre o bilinguismo.
Harmers e Blanc (2000 apud MEGALE, 2005, p. 3-5) avançam nessa questão do estudo e definição do bilinguismo e propõemseis dimensões que devem ser consideradas. Veja cada uma delas a seguir:
Competência relativa
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Apresenta duas competências linguísticas relacionadas às seguintes definições:
	Bilinguismo balanceado: o falante bilíngue balanceado é aquele que possui competência linguística semelhante nas duas línguas em questão, mesmo que a fluência não seja elevada.
	Bilinguismo dominante: corresponde ao falante que possui competência maior em uma das línguas em questão - normalmente, na língua nativa.
Organização cognitiva
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Trata de dois conceitos:
	Bilinguismo composto.
	Bilinguismo coordenado.
O falante é considerado bilíngue composto quando apresenta apenas uma representação cognitiva para duas traduções análogas, enquanto o bilíngue coordenado é aquele que tem duas representações para as duas traduções. O falante pode ser mais composto em determinados conceitos e mais coordenado em outros.
Um indivíduo que estudou duas línguas na infância ao mesmo tempo deve apresentar uma representação cognitiva para as duas traduções. Já o falante que aprendeu a segunda língua em contextos diferentes da língua materna normalmente apresenta representações distintas para as duas traduções.
Idade de aquisição
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A faixa etária afeta vários aspectos do desenvolvimento do falante, como o desenvolvimento linguístico, neuropsicológico, cognitivo e sociocultural. Essa dimensão divide o bilinguismo em infantil, adolescente e adulto.
O bilinguismo infantil acontece de forma simultânea ao desenvolvimento cognitivo, podendo influenciar esse desenvolvimento. Haveria uma subdivisão do bilinguismo infantil em:
	Bilinguismo simultâneo: ocorre com as duas línguas simultaneamente.
	Bilinguismo consecutivo: a segunda língua é adquirida na infância após a aquisição da estrutura da língua materna.
Já o bilinguismo adolescente ou adulto ocorre durante essas faixas etárias.
Presença ou não de indivíduos falantes da segunda língua
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De acordo com a presença ou a ausência de usuário de segunda língua no ambiente do aprendiz, teremos:
	Bilinguismo endógeno: duas línguas são utilizadas como nativas na comunidade, podendo ou não ser usadas para propósitos institucionais.
	Bilinguismo exógeno: os dois idiomas são considerados oficiais, mas não são utilizados de forma institucional.
Status da segunda língua
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A partir da situação da segunda língua na comunidade do estudante, o falante pode desenvolver o bilinguismo aditivo ou o subtrativo.
	Bilinguismo aditivo: as duas línguas são valorizadas no desenvolvimento cognitivo da criança, e a aquisição da segunda língua ocorre sem prejuízo da língua materna.
	Bilinguismo subtrativo: a língua materna é desvalorizada no ambiente da criança, produzindo desvantagens no processo de aquisição da segunda língua, ocorrendo a perda ou o prejuízo da língua materna.
Identidade cultural
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Desde o aspecto cultural, podemos ter os bilíngues:
	Biculturais: o falante se identifica em dois grupos culturais, sendo reconhecido em ambos.
	Monoculturais: o falante se identifica e é reconhecido apenas por um dos grupos; embora seja bilíngue, ele permanece monocultural.
	Aculturais: o falante abandona sua identidade cultural ligada à língua materna e assume valores de falantes da segunda língua.
	Descultural: o falante abandona sua identidade cultural, porém não consegue assumir perspectivas culturais dos falantes da segunda língua.
Harmers e Blanc compreendem o bilinguismo a partir de concepções multidimensionais que levam em conta a linguística e outras ciências, como a Psicologia e a Sociologia. Essa é a tendência atual - e assim é que se deveria estudar o bilinguismo, levando em conta a análise individual, interpessoal, intergrupal e mesmo social (MEGALE, 2005).
Bilinguismo e aquisição da linguagem
Abordagem gerativista
Ainda é bastante comum questionar o bilinguismo, afirmando que ele não existe em nosso país. Quando se faz uma declaração assim, acaba-se excluindo os falantes de outras línguas, inclusive aqueles com competência em uma das quatro habilidades, conforme veremos mais adiante.
Para o linguista norte-americano Thomas Roeper (1999), todo falante nativo tem um conjunto de pequenas gramáticas para diferentes domínios.
Nesse sentido, todo falante é bilíngue, ou seja, todos são bilíngues no próprio idioma.
A partir de uma perspectiva gerativista de Chomsky, a língua seria o estado estacionário de desenvolvimento de uma “gramática materna” ou internalizada. Desse modo, o usuário, ao ser exposto a diferentes gramáticas, produz variações dessa gramática materna ou internalizada.
O mesmo processo acontece quando se alguém se expõe a diferentes línguas simultaneamente. Por isso, Roeper (1999) usa o conceito das “gramáticas múltiplas” ou “bilinguismo universal”.
Conforme a teoria de Chomsky sobre a aquisição da linguagem, a criança inserida em duas línguas desenvolve duas gramáticas, as quais chamaremos de língua A e de língua B. Assim, as duas línguas terão algo bem próximo do mesmo nível de desempenho linguístico por parte do falante.
A partir de um olhar do bilinguismo consecutivo apresentado anteriormente, assim como ocorre na aquisição da língua materna, as crianças encontram uma atividade semelhante ao processo de desenvolvimento da língua: a necessidade de dominar um sistema gramatical a partir dos dados linguísticos apresentados a ela.
A aquisição é um problema que Chomsky (2002) tem tentado responder também é conhecida como “Problema de Platão” (baseado no diálogo Mênon, de Platão). No famoso diálogo, Sócrates demonstra para Ménon que possuímos certos conceitos matemáticos, mesmo sem passar pela escola, que nos permitem que fazer cálculos geométricos de forma intuitiva.
Podemos saber bastante, mesmo com poucas evidências.
Tal questão na área da Linguística tem servido para nortear o processo de aquisição da linguagem. É uma forma de tentar explicar como é possível adquirir a língua materna de forma inata se os dados apresentados são caóticos - e isso ocorre em uma idade na qual a criança ainda não realiza raciocínios lógicos e analíticos.
Uma pressuposição importante no processo de aquisição é que o falante não é exposto a dados ordenados e a todas as estruturas que a língua possui, mas, mesmo assim, ele adquire a língua. Ou seja, o surgimento de propriedades abstratas, para as quais o aprendiz não recebeu instrução formal, indica a existência de princípios da gramática universal guiando ou restringindo as possíveis gramáticas da segunda língua.
Gramática universal
Conceito de Chomsky que pode ser resumido como o conhecimento inato que o ser humano possui para adquirir a língua materna.
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Conceitos de bilinguismo
No vídeo a seguir, confira as explicações sobre o contexto, os conceitos e as abordagens teóricas do bilinguismo.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
2:42 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Benefícios do bilinguismo para o estudante
2:58 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Os conceitos de bilinguismo
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Pesquisas recentes indicam que falar duas línguas pode ter um profundo impacto no modo como pensamos e agimos, sendo uma exigência cada vez mais presente no mundo contemporâneo caracterizado por um globalismo que aprofunda as conexões entre pessoas de diferentes origens linguísticas. Nesse sentido, assinale a alternativa que apresenta corretamente as vantagens do bilinguismo.
A
Combate ao envelhecimento, menor flexibilidade mental e maior apreensão da realidade multicultural.
B
Maior desenvolvimento cognitivo, capacidade de apreensão do diferente e expansão da memória.
C
Menor capacidade de análise e maior percepção das nuances do idioma e capacidade de múltiplas tarefas.
D
Maior possibilidade de visão do ponto de vista alheio, redução da ampliação da memória e menor flexibilidade mental.
E
Maior capacidade de concentração, menor capacidade imagéticae de controle da atenção e maior percepção da multiculturalidade.
No passado, havia o mito de que aprender ou adquirir uma segunda língua poderia prejudicar o uso da língua materna. Mas as pesquisas mostram que dominar duas línguas confere um benefício cognitivo, incluindo a capacidade de memória. Além disso, há uma exigência cada vez mais profunda no mundo contemporâneo caracterizado por globalização, práticas interculturais e respeito à diversidade, o que pode ser fomentado pela aprendizagem de outra língua.
Questão 2
A partir de investigações desenvolvidas por pesquisadores da área do bilinguismo, há uma discussão sobre aspectos e definições desse conceito. Atualmente, a tendência nos estudos linguísticos, em termos de concepção de bilinguismo, aponta para a opção por:
A
conceitos estritamente linguísticos.
B
conceitos fundamentalmente multidimensionais.
C
definições focadas na dimensão política.
D
compreensão do bilinguismo em termos de cultura.
E
compreensão do bilinguismo focada na geopolítica.
Os trabalhos de Harmers e Blanc e a tendência atual apontam para uma compreensão multidimensional do bilinguismo, levando em conta fatores interculturais, aspectos políticos e sociais, assim como a dimensão linguística e o perfil do falante ou do estudante (faixa etária, ambiente de convivência etc.), entre outros aspectos implicados no bilinguismo.
2 - Políticas linguísticas para a educação bilíngue
Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer as políticas linguísticas para a educação bilíngue.
Estudos sobre políticas linguísticas
Políticas linguísticas
De acordo com Calvet (2008), as políticas linguísticas correspondem a decisões em diferentes âmbitos e níveis de governo sobre as relações que ocorrem entre a sociedade ou as pessoas e as línguas.
É perceptível o aumento da oferta bilíngue, assim como a crescente preocupação sobre o melhor momento para se começar a aprender uma nova língua. Além disso, também se debate sobre as variadas políticas linguísticas envolvidas no ensino bilíngue, já que não há, por enquanto, políticas oficiais e integradas sobre o tema.
Apesar de seu expressivo crescimento, não há números oficiais dessas escolas, legislação específica sobre seu funcionamento e as pesquisas sobre educação bilíngue de elite no contexto brasileiro ainda são incipientes, visto que os estudos realizados internacionalmente nem sempre nos trazem dados aplicáveis a nossa realidade.
(LIBERALI; MEGALE, 2011, p.1)
Os estudos sobre as políticas linguísticas têm se desenvolvido nas últimas seis décadas, em especial nos últimos quarenta anos. Infelizmente, ainda não existe uma teoria que dê conta da complexidade de situações envolvidas na linguagem a partir de aspectos sociais, culturais, políticos, econômicos etc.
Por isso, alguns sugerem que a ênfase para tentar responder às demandas surgidas deveria ser a seguinte: campos de investigação versus teorias de política linguísticas.
Para Ricento (2000), o desenvolvimento das pesquisas sobre as políticas linguísticas tem a ver com os processos de descolonização e formação de países na África e na Ásia, além do domínio teórico do estruturalismo e da noção de que os problemas linguísticos poderiam ser resolvidos por meio do “planejamento linguístico”. Por isso, no início, muitos trabalhos estavam focados na tipologia linguística e no planejamento com o propósito de modernizar países que tinham conseguido sua independência.
Curiosidade
A diversidade era entendida como um obstáculo para o desenvolvimento dessas nações, enquanto a homogeneidade estava ligada aos avanços e ao desenvolvimento para a modernização.
Na década de 1970, como as políticas de modernização e planejamento linguístico dos países que haviam conquistado a independência fracassaram, alguns pesquisadores destacaram problemas que acarretaram seu insucesso, tais como:
Variáveis envolvidas.
Dificuldade de avaliar as políticas implementadas.
Complexidade da reorganização das sociedades de países recém-independentes.
Políticas linguísticas e colonização
O que se percebe nesse contexto é que a língua do colonizador foi usada com a intenção de modernizar o país, mas enfatizou a dominação social e cultural de um povo que já havia conquistado a sua independência. Naquele momento, a política linguística, de modo geral, enfatizava o monolinguismo como uma ideologia que nada tem de científico, mas, em vez disso, presta seus favores à manutenção dos mesmos grupos que dominavam aquelas nações colonizadas.
À medida que a língua inglesa se torna dominante, a questão dos direitos linguísticos vira uma pauta de discussão. Daí surge a noção de uma ecologia das línguas, enfatizando a diversidade linguística com a proposta de ampliar os direitos de falantes de todas as línguas (RICENTO, 2000).
Nesse contexto, as investigações buscam entender as relações entre ideologia e política linguística, o que orienta a escolha de determinadas línguas e como seus lugares são marcados por meio da linguagem.
Na verdade, podemos identificar a política linguística mesmo nas situações em que ela não é explícita ou oficialmente estabelecida.
Desse modo, nos países, nos grupos sociais ou mesmo nas instituições em que não encontramos o registro formal de políticas linguísticas, a natureza da política linguística dessas sociedades deve ser buscada ou identificada por meio de estudos das práticas e crenças linguísticas dessas comunidades ou instituições. Por outro lado, nas sociedades ou comunidades em que tal política se faz presente de maneira formal e registrada por escrito, não há uma garantia de que o efeito dela nas práticas linguísticas seja consistente e certo (SPOLSKY, 2004).
Políticas linguísticas e ideologia
No caso da educação bilíngue, a política linguística está ligada às ações individuais de grupos socialmente definidos ou de organizações sobre essas questões de linguagem, como é o caso do ambiente de sala de aula, no qual os alunos entendem que o docente define quem fala e o que fala, além de julgar se a manifestação linguística está correta ou não.
Atenção!
Vale destacar que a linguagem e as políticas linguísticas estão inseridas em ambientes de grande complexidade, em meios interativos e em constante transformações. Essas mudanças, por menores que sejam, afetam o todo. Por isso, seu estudo precisa levar em conta fatores não linguísticos, como os aspectos políticos, demográficos, sociais, culturais, religiosos, psicológicos etc. Esses fatores estão vinculados às tentativas de intervenção nas práticas linguísticas e nas crenças de pessoas ou grupos, além das mudanças subsequentes que podem ou não ocorrer (SPOLSKY, 2004).
As políticas linguísticas geralmente são encontradas em documentos oficiais, como cláusulas constitucionais ou regulamentações administrativas. Mas elas também podem ser vistas em documentos que falam sobre investimentos na área.
Por outro lado, em muitos casos, ocorre uma total ausência de documentos, embora sempre haja o aspecto ideológico sobre o uso da linguagem e seus padrões de uso.
Segundo Spolsky (2004), existem geralmente três motivações para as políticas linguísticas:
Identidade com o interesse de estabelecer o status de nação por meio de uma língua homogênea.
A questão da imagem, a qual estabelece que aquela língua precisa ser disseminada para criar um conceito positivo para quem ainda não a usa “corretamente”.
Insegurança, que tem relação com o uso não padronizado da língua para as necessidades do falante na sociedade.
Existem diversos grupos sociais, comunidades e espaços que, além da escola, podem ser estudados nesse processo da política linguística bilíngue.
Para muitos autores, as políticas linguísticas são um subcampo da Linguística Educacional, que é uma área da Linguística Aplicada. Por isso, destacamos todo o contexto da independência de países após a Segunda Guerra, que teve bastante impacto na educação - em especial, na escolha das línguas que deveriam ser ensinadas.
Na América do Sul, houve o rebaixamento e uma tentativa de extermínio das línguas indígenas por parte docolonizador, que não admitia seu uso no sistema educacional. Atualmente, há uma pressão para que o inglês seja utilizado nas escolas. No Brasil, isso ocorreu quando ele foi tornado obrigatório nos ensinos fundamental e médio.
Conforme já mencionamos, o bilinguismo é uma forma de política linguística que pode ser implementada pelo Estado, por instituições ou mesmo individualmente, se contrapondo ao conceito de monolinguismo, ainda muito arraigado em nosso país. Entender as políticas linguísticas é compreender as ideologias envolvidas e como determinados projetos são capazes de naturalizar políticas implementadas para atender aos interesses de grupos dominantes.
Por isso, certos governos podem se utilizar do senso comum para validar ou justificar suas políticas linguísticas. Desse modo, conforme adverte Mulon (2017), é possível que certos usos linguísticos produzam determinados resultados sociais ou ideológicos.
Exemplo
Políticos ou movimentos políticos que optam pelo uso de uma língua não oficial por representarem determinado segmento ou grupo que não usa a língua oficial, como ocorre com o talian, falado por imigrantes italianos em cidades do sul do Brasil.
A forma como essas ideologias linguísticas são construídas pode ser objeto dos estudos linguísticos.
Um dos maiores impactos na educação bilíngue tem a ver com a conexão entre língua e identidade como uma tentativa de homogeneização para impor um padrão a ser utilizado em toda uma nação.
Política linguística no Brasil
Em nosso país, o Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística (IPOL) se dedica às políticas linguísticas, desenvolvendo projetos que apoiam comunidades de línguas e variedades minoritárias do Brasil e do Mercosul para a manutenção e a promoção da diversidade linguística.
Uma das ações do IPOL é a cooficialização de línguas em alguns munícipios, podendo essas línguas cooficializadas serem usadas em documentos oficiais com patamar idêntico ao da língua portuguesa.
Cooficialização
Cooficialização de uma língua consiste num dispositivo jurídico que possibilita a emissão de documentos oficiais e a prestação de serviços públicos numa língua além do português, bem como a possibilidade de essa língua cooficializada circular em diversos espaços públicos, incluindo as escolas.
Comentário
Para se ter uma ideia do processo de cooficialização de língua no Mercosul e no Brasil, o IPOL apresentava uma situação, em agosto de 2021, na qual 21 línguas em 45 municípios brasileiros eram cooficializadas.
Como vimos anteriormente, a educação bilíngue tem se tornado cada vez mais frequente em nosso país, sendo uma prática que cresce entre as escolas.
Liberali e Megale (2011) comparam nosso contexto ao da Colômbia, em que:
O avanço de carreira é dependente em alto grau da proficiência em língua inglesa, e a educação bilíngue é vista como a chave para o desenvolvimento da língua estrangeira.
(MEJÍA, 2004, apud LIBERALI; MEGALE, 2011, p. 101)
O multilinguismo de nosso país remonta ao período anterior ao descobrimento. O colonizador português, afinal, encontrou mais de mil línguas indígenas aqui.
A partir daquele momento, instalou-se uma ideologia que visava à destruição de tais línguas por meio da imposição da língua portuguesa. Essa ideologia foi responsável pela morte e extinção de 85% dessas línguas ao longo de 500 anos.
Para o senso comum, é corrente afirmar que o brasileiro fala português, desconsiderando as línguas nativas e as dos imigrantes. Por isso, é importante uma verdadeira reorientação, do ponto de vista linguístico, sobre comunidade e identidade e sobre o conceito de bilinguismo.
O conceito da hierarquia entre as línguas ainda é muito forte. Nele, cria-se uma noção de superioridade ou inferioridade entre determinadas línguas, além do mito de que certos idiomas são mais fáceis ou mais difíceis de se aprender.
Educação bilíngue
Educação bilíngue no Brasil
Considerando o ambiente escolar bilíngue, é possível encontrar propostas sobre educação bilíngue começando com o próprio processo de alfabetização.
No site de diversas escolas, aparece o projeto político pedagógico (PPP) com algumas informações sobre o bilinguismo. Trechos do PPP costumam afirmar que os alunos são alfabetizados no ensino fundamental (inicialmente na língua materna), iniciando-se, em seguida, a preparação para a alfabetização na língua estrangeira.
Projetos assim entendem que a alfabetização deve ser realizada primeiramente na língua materna e só depois na estrangeira. A intenção seria evitar que um código linguístico interferisse no outro. Isso denota, de acordo com visões monoglóssicas do bilinguismo, uma noção de purismo linguístico.
Visões monoglóssicas
Caracterizam-se pela separação de uma língua como primeira língua e da outra como língua adicional, ou seja, as línguas correspondem a espaços autônomos e independentes nos quais sentidos ou significados de uma língua são transferidos de um sistema linguístico para outro.
Outras escolas destacam em seu PPP que o ensino da língua estrangeira serve para facilitar a interação dos estudantes com outras culturas. Segundo essas instituições, com a globalização, o conhecimento de uma segunda língua tem um papel primordial na formação profissional do estudante.
Certas escolas oferecem muitas opções de aspectos multilíngues, tais como:
Professores brasileiros e estrangeiros qualificados.
Turmas com número de alunos de acordo com padrões daquela língua estudada, seja inglês, francês, alemão ou outra qualquer.
Preparação para a certificação em línguas estrangeiras.
Programa de diplomas certificados internacionalmente.
É curioso observar que a quantidade de alunos raramente é explicitada, mas se supõe que ela seja menor que o número tradicionalmente encontrado nas salas de aula, revelando uma visão xenocentrista de mundo, ou seja, produtos, estilos ou ideias de outras culturas são preferenciais em vez daqueles relativos à própria cultura.
Escolas que têm a alfabetização separada parecem sugerir um purismo linguístico e uma visão monoglóssica do bilinguismo, levando a uma concepção compartimentada da língua como unidades estanques trabalhadas pedagogicamente de forma separada.
Normalmente, essas escolas têm aulas ministradas em determinada língua estrangeira e outras na língua materna.
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Embora haja uma orientação para o bilinguismo, elas se mantêm com línguas e usos separados.
Outro ponto abordado nessas diferentes escolas - e que serve como propaganda - é que parte dos seus professores é nativo da língua que ensinam. O que está por trás disso é a ideia de que, por ser nativo, esse docente domina o ensino desse idioma e fala por determinada cultura, sendo supostamente seu melhor representante.
Essa é uma visão ainda muito homogênea do falante e da língua. Seria como se ele não passasse por algum processo de hibridismo linguístico durante o contato com outras línguas e culturas, sobretudo em um mundo globalizado.
O que podemos perceber é que a educação bilíngue ainda caminha cercada de propaganda e expectativas, prometendo cursos multilíngues, enquanto a legislação ainda impõe uma política linguística que se baseia no mito do monolinguismo na educação básica.
Legislação educacional e bilinguismo
Essa realidade pode começar a mudar com a aprovação das diretrizes curriculares nacionais para a oferta de educação plurilíngue. Essas diretrizes foram elaboradas e propostas pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) na forma do Parecer CNE/CEB nº 2/2020 a fim de serem homologadas e se tornarem finalmente uma resolução.
O documento aborda diversas temáticas relacionadas com plurilinguismo, bilinguismo e cooficialização de línguas. Entre elas, destacam-se:
	Diversidade e valorização das línguas das populações indígenas.
	Direitos linguísticos e sociais da população surda.
	Educação em regiões de fronteira e interculturalidade.
	Educação plurilíngue a partir da língua portuguesa e de línguas adicionais na educação básica.
O Parecer CNE/CEB nº 2/2020 faz menção à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) parareforçar que a língua inglesa se tornou a única língua adicional na educação básica - mais especificamente, a partir do 6º ano do ensino fundamental.
Mas o cumprimento desse requisito não precisa limitar a experiência linguística na educação básica, pois outras línguas adicionais podem ser ofertadas aos alunos.
A expectativa é que não somente as chamadas línguas de prestígio social estejam presentes, mas que também se faculte o aprendizado de línguas indígenas, africanas e outras. De qualquer modo, as competências e habilidades dispostas na BNCC devem constituir o arcabouço para a elaboração das diversas possibilidades de programas de educação plurilíngue do país.
(BRASIL, 2020, p. 19)
O documento (BRASIL, 2020, p. 20) traz várias recomendações, tais como:
	O estabelecimento, por parte do MEC e das redes públicas de ensino, de parcerias com instituições de ensino superior de reconhecida notoriedade na área de bilinguismo a fim de promover políticas de educação plurilíngue.
	Criação de espaço e condições para o desenvolvimento de plataforma digital com materiais e recursos didáticos para educação plurilíngue.
	Fomento à política de educação plurilíngue, envolvendo formação inicial e continuada de professores nas instituições de educação superior (IES).
	Fomento a bolsas de estudo e a pesquisas acadêmicas interdisciplinares em programas de pós-graduação nas modalidades de educação plurilíngue.
	Criação ou adoção de padrões de avaliação e de certificação de proficiência para docentes em nível nacional.
	Criação ou adoção de padrões de avaliação e de certificação de proficiência linguística e em conteúdos para estudantes em nível nacional.
	Criação de política nacional de avaliação para educação plurilíngue.
	Revisão e modernização dos cursos de Pedagogia, Letras e demais licenciaturas, visando a formar docentes conforme as demandas decorrentes das diretrizes curriculares nacionais para a oferta de educação plurilíngue.
Formulado a partir do Parecer CNE/CEB nº 2/2020 (BRASIL, 2020, p. 24), o projeto de resolução estabelece as seguintes definições:
Escola bilíngue
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Escola caracterizada por promover currículo único, integrado e ministrado em duas línguas de instrução, visando ao desenvolvimento de competências e habilidades linguísticas e acadêmicas dos estudantes nessas línguas (art. 2º).
Escola com carga horária estendida em língua adicional
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Escola com currículo bilíngue optativo que se caracteriza por promover o currículo escolar em língua portuguesa em articulação com o aprendizado de competências e habilidades linguísticas em línguas adicionais, sem que o desenvolvimento linguístico ocorra integrada e simultaneamente ao dos conteúdos curriculares (art. 3º).
Escola brasileira com currículo internacional
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Escola que se caracteriza pelo estabelecimento de parcerias e pela adoção de materiais e propostas curriculares de outro país, ofertando, portanto, currículos em língua portuguesa e línguas adicionais (art. 4º).
Outros pontos estabelecidos pelo documento são:
Carga horária de língua adicional nas escolas bilíngues
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Entre 30 e 50% das atividades curriculares na educação infantil e no ensino fundamental. Mínimo de 20% da grade curricular oficinal no ensino médio.
Carga horária de língua adicional na escola com currículo bilíngue optativo
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Mínimo de três horas semanais.
Carga horária de língua adicional na escola brasileira com currículo internacional
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O tempo é de escolha da instituição.
Projeto pedagógico
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O projeto pedagógico bilíngue das instituições que oferecem todas as etapas da educação básica deve contemplar a educação infantil, o ensino fundamental e o médio.
Formação de professores bilíngues
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Os docentes devem ter formação complementar em educação bilíngue de 120 horas e comprovação de proficiência de nível mínimo B2 (CEFR – common european framework).
Além dessas diretrizes, não devemos nos esquecer de outro importante documento, a Lei nº 14.191, de 3 de agosto de 2021, que altera a Lei nº 9.394 (LDB) para dispor sobre a modalidade de educação bilíngue de surdos. No próximo módulo, trataremos de alguns aspectos relacionados à educação bilíngue e ao aluno surdo.
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Políticas linguísticas e educação bilíngue
Veja no vídeo a apresentação das principais questões sobre políticas linguísticas para educação bilíngue no Brasil.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
3:20 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Bilinguismo: aspectos políticos e ideológicos
3:38 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Legislação e educação bilíngue no Brasil
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Os estudos sobre políticas linguísticas nos mostram que tais políticas se dão em diversos níveis ou dimensões. Elas ocorrem no âmbito internacional, nacional, estadual e municipal, trazendo implicações para a educação bilíngue. Esses estudos inicialmente estão relacionados com:
A
processos de descolonização.
B
domínio das teorias gerativistas.
C
aversão ao planejamento linguístico.
D
formação de países europeus.
E
modernização a partir de formação de poliglotas.
As pesquisas sobre as políticas linguísticas vinculam-se aos processos de descolonização, aos processos de independência e à modernização de países na África e na Ásia, assim como ao domínio da teoria estruturalista e ao entendimento de que o avanço e o desenvolvimento dependiam da homogeneidade linguística, isto é, de um planejamento linguístico contrário à diversidade linguística.
Questão 2
Na relação entre políticas linguísticas e educação bilíngue no Brasil, podemos reconhecer:
A
apagamento das línguas dos imigrantes.
B
longa tradição de legislação educacional voltada para a educação bilíngue.
C
presença de processos de cooficialização.
D
proibição do uso de línguas estrangeiras no contexto escolar.
E
adoção de várias línguas oficiais no Brasil.
No Brasil, em dezenas de municípios, ocorre a cooficialização de línguas, na qual a língua cooficializada é aceita em documentos oficiais, além do português. Nessa situação, tal língua é usada em vários espaços e situações, incluindo o espaço escolar.
3 - Linguística e a educação bilíngue
Ao final deste módulo, você será capaz de relacionar os estudos linguísticos à educação bilíngue.
Estudos linguísticos e bilinguismo
O mito do monolinguismo
O mito do monolinguismo em nosso país é capaz de promover o apagamento de povos indígenas, imigrantes, surdos e falantes que usam modelos da língua portuguesa não culta, tornando seus falantes estigmatizados, uma vez que as línguas utilizadas são de tradição oral, quase sempre sem escrita.
Usamos o termo “mito” pelo fato de que os estudos da Linguística Aplicada acerca do bilinguismo - ainda relativamente recentes na comparação com outras subáreas da Linguística - mostram a não pertinência da crença ou ideologia em uma língua única e absoluta.
O linguista e professor Marcos Bagno (1999, p. 27) lembra que os estudos linguísticos têm comprovado que não existe uma “língua no mundo que seja ‘una’, uniforme e homogênea”. Desse modo, o monolinguismo não passa de uma ficção.
Toda e qualquer língua humana viva é, intrinsecamente e inevitavelmente heterogênea, ou seja, apresenta variação em todos os seus níveis estruturais (fonologia, morfologia, sintaxe, léxico etc.) e em todos os seus níveis de uso social, variação regional, social, etária, estilística etc.
(BAGNO, 1999, p. 228)
Além disso, o bilinguismo geralmente é entendido a partir das línguas prestigiadas no chamado bilinguismo de elite, ou seja, o bilinguismo ligado a línguas de prestígio no âmbito nacional ou internacional.
O que se pode perceber é que o bilinguismo/multilinguismo é muito mais complexo do que se imagina, passando inclusive pelas variedades da língua portuguesa.
Com base em tudo que foi visto até agora, podemos depreender que nosso país não estimula o ensino bilíngue, principalmenteentre as minorias, ou seja, tal política linguística do monolinguismo é tratada de forma natural. Isso gera um sentimento de inferioridade das línguas faladas, porque elas não são reconhecidas.
Mesmo em comunidades urbanas, percebe-se que a língua utilizada no ambiente escolar é diferente da falada no ambiente doméstico ou mesmo na comunidade. O contexto sociolinguístico no qual o professor está inserido em nosso país, afinal, é extremamente complexo.
Bagno (2009, p. 9) ressalta que o Brasil foi um campo muito fértil para a aplicação dos postulados teóricos e da metodologia de trabalho empírico da sociolinguística variacionista. Para ele, desde os anos 1970, “tem se acumulado um respeitável volume de investigações aqui empreendidas dentro desse paradigma”.
A linguística tem apresentado dados a favor de uma educação inclusiva, reconhecendo e valorizando a diversidade linguística.
Para Hornberger (1991, apud CAVALCANTI, 1999), há três modelos sobre a educação bilíngue:
Modelo de transição
Modelo no qual a língua do estudante serve como meio para se chegar à língua dominante.
Modelo de manutenção
Modelo no qual a língua da comunidade é considerada como algo de direito, mas que pode servir como um tipo de transição para a língua-alvo da sociedade dominante.
Modelo de enriquecimento
Modelo que entende a língua como recurso para estudantes de comunidades minoritárias ou da sociedade dominante.
Mas quando a diversidade linguística não é considerada e o monolinguismo é naturalizado, os questionamentos sobre variedade linguística são silenciados. Nem mesmo as variedades que o aluno encontra na família são mencionadas.
Diversidade linguística e bilinguismo
Para a Linguística, não há variantes superiores ou inferiores de determinado sistema linguístico. O que existem são variantes que podem ser consideradas de prestígio, estigmatizadas ou neutras. Por isso, é tão importante que o profissional da educação tenha acesso à Linguística.
Temos em qualquer língua as chamadas variantes padrão e variantes não padrão. Os princípios que regulam as propriedades das variantes padrão e não padrão geralmente extrapolam critérios puramente linguísticos. Na maioria das vezes, o que se determina como sendo uma variante padrão relaciona-se à classe social de prestígio e a um grau relativamente alto de educação formal dos falantes. Variantes não padrão geralmente desviam-se desses parâmetros.
(SILVA, 1996, p. 12)
A maioria dos cursos de formação de professores, inclusive o curso de Letras, não forma profissionais para trabalhar com falantes heterogêneos com uma lista de conflitos e problemas dos mais variados, estando inseridos em comunidades que passam a cada dia mais por transformações intensas.
Questões como diversidade linguística e cultural precisam estar inseridas no espaço da sala de aula. Se não for assim, haverá um distanciamento do ensino em relação ao contexto de diversidade no qual o aluno está inserido.
É fundamental que o professor tenha acesso a disciplinas, como, por exemplo, Linguística, Linguística Aplicada, Sociolinguística e outras, de modo que ele seja sensibilizado para o contexto sociolinguístico que existe em nosso país. Com isso, o profissional terá suporte para combater as ideologias que se apoiam nas diferenças linguísticas para manter políticas de discriminação, preconceito e exclusão social.
Normalmente, os cursos de Letras, quando se trata do ensino de língua materna, ainda são voltados para um tipo de falante ideal em uma comunidade homogênea, o que é bem diferente da realidade brasileira, sobretudo das minorias.
Na formação de professores, principalmente nos cursos de Pedagogia e de Letras, deve-se valer dos estudos linguísticos, em particular das pesquisas provenientes da Sociolinguística, para oferecer ao futuro profissional da educação uma visão e a fundamentação teórica que o ajudem a lidar com a diversidade linguística do nosso país.
A escola brasileira está presente nos mais diversos contextos, mas os currículos ainda estão longe de alcançar essa meta da diversidade.
Bilinguismo e minorias
Educação bilíngue de minorias
Em algumas instituições privadas, pais, responsáveis e professores esperam que os alunos venham a dominar uma língua adicional durante a sua vida estudantil.
Mas como ficam outros grupos minoritários na questão do bilinguismo, como os indígenas e os surdos?
Cavalcanti (1999) chama a atenção para o fato de o Brasil não reconhecer nem encorajar o ensino bilíngue em relação às minorias linguísticas.
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A legislação tem mudado um pouco esse cenário em função das leis que procuram assegurar a educação bilíngue para comunidades indígenas e de surdos.
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O esforço e a dedicação das organizações não governamentais (ONG) e da comunidade acadêmica também objetivam mudar esse quadro.
Vamos destacar alguns pontos sobre o bilinguismo no contexto dos surdos e das populações indígenas no Brasil.
Educação bilíngue e povos indígenas
O cenário de alguns povos indígenas é marcado por uma língua falada, mas não necessariamente escrita, ou seja, marcada pela oralidade. Trata-se, portanto, de um contexto bem diferente do abordado até aqui, normalmente chamado de bilinguismo de elite.
Assim, levando em conta o contato das comunidades indígenas com a sociedade dominante, a necessidade do bilinguismo se tornou ainda mais urgente. Ele é utilizado por professores indígenas ou não indígenas em processos muito rápidos de escolarização dessas comunidades sem ser devidamente acompanhado da implementação e discussão das necessidades reais que o grupo entende como prioritário.
Nesse caso, notamos uma ausência de políticas linguísticas que sustentem os professores indígenas, além da dificuldade com alunos em diferentes níveis de conhecimento linguístico da língua materna e da língua portuguesa.
D’Angelis (1996 apud NOBRE, 2012) aponta algumas estratégias para o sucesso do ensino da língua materna em comunidades indígenas:
Ocupação de espaços não ocupados pela língua portuguesa.
Tomada de "lugares" hoje ocupados pela escrita da língua portuguesa para a escrita na língua indígena.
Tomada ou criação de lugares "nobres" de veiculação da língua indígena falada.
Infelizmente, podemos notar uma ausência de uma política linguística para os indígenas. O que existe é uma tentativa homogeneização linguística, ainda que de forma sutil.
Basta consultar documentos, como a Constituição Federal de 1988, por exemplo, que considera a língua portuguesa como oficial, salvo entre os povos indígenas que podem usar suas línguas maternas no ensino. Atualmente, existe a compreensão de que as línguas indígenas são consideradas línguas nacionais, além da língua portuguesa.
E qual é o papel da Linguística na educação bilíngue de língua em indígenas?
De acordo com o Censo 2010 (IBGE, 2012), a população indígena em nosso país é de 896,9 mil. Desse contingente, 572 mil indígenas vivem em área rural, dos quais 517 mil moravam em terras indígenas reconhecidas oficialmente, ou seja, 57,5% do número total da população indígena. Outro dado importante do censo é que houve um crescimento de indígenas morando em áreas urbanas.
Sobre as línguas ministradas nas escolas indígenas, dados estatísticos da educação escolar indígena (BRASIL, 2007) apontam que, em 78,3% das escolas indígenas, as aulas são ministradas na língua indígena; as outras 21,7%, em língua portuguesa.
A partir desses dados, a Linguística tem o papel de:
Influenciar no comportamento sobre a aquisição da linguagem, a estrutura ou o uso de códigos linguísticos, abrangendo todas as esferas de poder.
Delimitar soluções para questões de linguagem, as quais, geridas por aquele povo, ajudam na manutenção de sua língua frente a outra, que é majoritária.
Desse modo, a linguística pode ter um papel de planejamento, seja no corpus coletado e suas intervenções, no status social da língua e em sua relação com outra língua ou na aquisição para ampliar aquela língua.
Ao se pensar no papel da Linguística em escolas indígenas bilíngues, nota-se que, em muitas delas, os professores são indicadospelas comunidades, sendo muitas vezes oriundos do próprio local, o que pode auxiliar no ensino da língua.
Além disso, a escola, por intermédio da Linguística, é capaz de implementar e criar sistemas de escrita quando o povo é ágrafo, além de poder produzir material didático de qualidade. Consequentemente, isso tudo pode fazer com que uma língua passe por um verdadeiro “avivamento” linguístico, garantindo a transmissão dela além do ambiente escolar.
Confira o relato de uma situação concreta na qual podemos verificar a importância da Linguística na escola bilíngue:
No estado do Acre [...] apresentou-se uma situação peculiar em que algumas línguas indígenas – também faladas no Peru e na Bolívia, países vizinhos – já possuíam sistemas ortográficos nos seus países. Essa situação exigiu uma tomada de posição bastante desafiadora, pois, em vez de incorporarem os sistemas já adotados, os professores indígenas e seus consultores buscaram desenvolver sistemas de escrita que fossem o resultado de suas demandas e descobertas com a escola e com a escrita, por consequência. Por conta dessa situação, algumas línguas indígenas possuem convenções ortográficas diferentes em cada lado da fronteira política, o que, até o momento, não se configurou em uma dificuldade no intercâmbio escrito entre os vários falantes, especialmente os que habitam as regiões fronteiriças e se utilizam da língua escrita na comunicação.
(PAULA, 2015, p. 120-121)
A produção escrita na língua materna dos indígenas satisfaz à necessidade de:
	Publicação de material didático.
	Circulação das histórias daquele povo.
	Provisão de todo tipo de texto demandado pela comunidade.
	Elaboração de placas sinalizando pontos importantes da terra.
Tudo isso pode ser feito a partir de uma educação linguística nesse contexto da cultura e comunidade indígenas.
O profissional com uma boa bagagem linguística pode contribuir para a análise da língua, ajudando em sua descrição, propondo soluções ortográficas e potencializando o impacto dela no povo, o que vai gerar uma verdadeira emancipação para os falantes, além da autoestima em relação à língua.
Educação bilíngue e comunidade surda
Assim como os indígenas, a comunidade de surdos também não é contemplada da forma devida quando o tema é o bilinguismo. A abordagem bilíngue busca formar o surdo nas duas línguas: a língua de sinais e a da comunidade ouvinte - no nosso caso, a língua portuguesa.
As propostas para o ensino passaram a tomar forma a partir do Decreto nº 5.626/2005, que regulamentou a Lei da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Assim, os surdos tiveram direito ao conhecimento da língua de sinais e a língua portuguesa passou a ser utilizada na escrita, assumindo o papel da segunda língua. Com isso, a educação dos surdos passou a ser bilíngue.
Ainda que a legislação garanta o direito de a Libras ser a primeira língua do surdo e o português escrito, sua segunda língua, a educação bilíngue do surdo precisa ser garantida concretamente no dia a dia das famílias e do ambiente escolar.
Estudos linguísticos apontam que o bilinguismo que propõe o acesso de duas ou mais línguas no contexto escolar é o mais adequado para a comunidade surda, sendo que a língua de sinais é a primeira língua.
A Libras deve ser a L1, ou seja, a primeira língua da criança surda brasileira e a língua portuguesa deve ser sua L2, segunda língua. A razão dessa afirmação é que [ambas] estão relacionadas com o processo de aquisição dessas línguas, considerando a condição física das pessoas surdas: são surdas. Então, qualquer língua oral exigirá certos procedimentos para ser adquirida por uma pessoa surda.
(QUADROS, 1997, p. 67)
Vale destacar que o surdo adquire a língua de sinais por meio da experiência visual com outros usuários da língua numa experiência que, além de cultural, é linguística. Pesquisas mostram que a aquisição da língua de sinais ocorre de maneira igual à de outras línguas e no mesmo período que o de uma criança ouvinte, ou seja, do balbucio, passando pelo período pré-linguístico, estágio de um sinal, das primeiras e múltiplas combinações, desde que inseridas em um ambiente linguístico favorável.
A voz dos surdos são as mãos e os corpos que pensam, sonham e expressam. As línguas de sinais envolvem movimentos que podem parecer sem sentido para muitos, mas que significam a possibilidade de organizar as ideias, estruturar o pensamento e manifestar o significado da vida para os surdos.
(QUADROS, 1997, p. 119)
Quando os pais da criança surda são ouvintes, nem sempre esse ambiente linguístico favorável é garantido para a aquisição e o desenvolvimento da língua de sinais.
As barreiras linguísticas que existem em decorrência de uma língua de contato que possa ser compartilhada na família ficam ainda maiores quando a criança entra na escola, já que raramente os professores dominam a língua de sinais. Além disso, muitos intérpretes que trabalham em escolas têm uma formação com lacunas, podendo haver um contexto no qual o preconceito ainda é existente.
O bilinguismo do surdo inclui o desenvolvimento do aluno dentro e fora do ambiente escolar.
O surdo deve ser exposto à língua de sinais entre zero e três anos como primeira língua e como língua de instrução, além do ensino do português como língua oficial do país, para garantir o acesso aos cidadãos surdos brasileiros do conhecimento formal.
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A aquisição da língua de sinais ajuda no desenvolvimento linguístico e cognitivo, facilitando o processo de aprendizagem e servindo para a leitura e a compreensão, além de dar acesso a conhecimentos culturais e sociais.
A educação bilíngue para surdos está inserida em um contexto de grandes disputas e de tensão entre a língua de sinais e a língua portuguesa, já que ambas são manifestações linguísticas assimétricas.
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Linguística e educação bilíngue
Assista aos comentários sobre as contribuições dos estudos linguísticos (em especial, da Linguística Aplicada e da Sociolinguística) para a educação bilíngue.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
2:22 min.
Módulo 3 - Vem que eu te explico!
Contribuição da Linguística para a educação bilíngue
2:22 min.
Módulo 3 - Vem que eu te explico!
Contribuição dos estudo sociolinguísticos para o bilinguismo
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Ainda que o Brasil apresente um sem-número de línguas (em especial, as variedades de línguas indígenas), ainda persiste o mito do monolinguismo, que é visto como natural. Entre os prejuízos causados por esse mito, podemos citar a:
A
criação da ilusão da existência do bilinguismo, ou seja, a existência de mais de uma língua em um país como o Brasil, que adota o português em todo o território nacional.
B
valorização das línguas faladas pelas minorias, isto é, das comunidades falantes de variedades não dominantes, promovendo a autoestima desses grupos desprestigiados.
C
criação de modelos estereotipados de sucesso com a valorização das tradições linguísticas preexistentes, anteriores ao processo de colonização e que impuseram a língua do colonizador.
D
estigmatização dos povos indígenas, imigrantes, surdos e falantes que não se utilizam de modelos da norma culta, uma vez que as línguas utilizadas por eles são de tradição oral, quase sempre sem escrita.
E
visibilização das minorias bilíngues, já que ressalta as diferenças entre as línguas, valorizando as tradições e combatendo a visão estereotipada que desprestigia as línguas de tradição oral.
No Brasil, além do português com incontáveis variantes, há as línguas indígenas, que são quase 200, assim como as línguas de imigrantes e seus descentes e a língua de sinais. Apesar de tudo isso, ainda permanece no senso comum a noção de que se fala apenas uma língua aqui: é o chamado monolinguismo. Tal preconceito acaba estigmatizando as nações indígenas, os surdos e os imigrantes, já que quase todos esses outros modelos predominam na linguagem oral, sem escrita. Sobre as variantesda língua portuguesa, o famoso gramático e membro da Academia Brasileira de Letras Evanildo Bechara já disse que o brasileiro precisa ser um poliglota dentro do próprio idioma.
Questão 2
De modo geral, os cursos de formação de professores, incluindo o curso de Letras, apresentam sérias deficiências no que se refere à formação de profissionais preparados para lidar com falantes heterogêneos. Para superar essas deficiências, é fundamental:
A
inserir na formação docente aspectos ligados à diversidade linguística e cultural, além de promover o acesso do professor a disciplinas que o sensibilizem para o contexto sociolinguístico existente no país.
B
promover a formação do falante ideal em comunidades heterogêneas, de modo a proporcionar uma instrução de excelência que atenda às necessidades das minorias existentes na realidade brasileira.
C
promover mudanças curriculares que incluam o bilinguismo como instrumento de socialização das minorias em uma abordagem focada na língua padrão, quebrando paradigmas da superioridade linguística.
D
promover o desenvolvimento de habilidades cognitivas superiores que atendam ao monolinguismo brasileiro e fortaleçam a unidade nacional a partir do aprofundamento da identidade com a língua materna.
E
promover ideologias que se apoiem nas diferenças linguísticas, dando suporte ao combate a políticas de discriminação, preconceito e exclusão social tão comuns na sociedade brasileira e que se refletem no cotidiano das escolas.
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De modo geral, as licenciaturas, inclusive na área de Letras, ainda não conseguem preparar os professores para lidar com falantes heterogêneos, o que acontece no cotidiano da sala de aula nas mais variadas manifestações e variações. Para tentar suprir essa carência, é primordial que os cursos tenham disciplinas que tratem da diversidade linguística no Brasil ou no mundo. Esse é o caso da Sociolinguística, que estuda a língua na sociedade e suas variações de uso, seja tal uso social, diacrônico, estético ou geográfico, além das línguas consideradas minoritárias, como as línguas indígenas, a língua de sinais, a falada pelos imigrantes e outras.
A produção de materiais didáticos
Prof.ª Maria Tedesco
Descrição
Dialogismo, multimodalidade e outras contribuições linguísticas na construção e na análise de materiais didáticos.
Propósito
Compreender as relações entre a construção de materiais didáticos e as contribuições dos estudos linguísticos para o desenvolvimento da prática docente na área de língua portuguesa.
Preparação
Tenha ao seu alcance o Dicionário de Termos Linguísticos, disponível no Portal da Língua Portuguesa, para entender termos específicos da área.
Objetivos
Módulo 1
Dialogismo, multimodalidade e material didático
Relacionar o conceito de dialogismo e multimodalidade com a construção de material didático.
Módulo 2
Análise de material didático à luz da linguística
Identificar critérios para análise de materiais didáticos a partir da contribuição dos estudos linguísticos.
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Introdução
A produção de material didático, especialmente em relação ao desenvolvimento textual, possui especificidades que reservam a qualidade ao processo de aprendizagem. Se, no fim do século XX, predominava o texto impresso em forma de livros didáticos e de apostilas, ele, no século XXI, coexiste com o material impresso e o virtual – e principalmente com os materiais que servem de base para a modalidade a distância.
De qualquer forma (presencial ou a distância), o material didático é preparado para que o estudante acompanhe seu curso contando com um recurso de apoio essencial para os estudos e o desenvolvimento do conhecimento. Em ambos, o cuidado com o conteúdo e o texto é de fundamental importância.
Há, no entanto, a necessidade de cuidado com a forma e a diagramação. Para a modalidade EaD, também é essencial o uso de outras ferramentas, como as videoaulas e a integração com o ambiente virtual de aprendizagem (AVA), bem como de outras características, como o design visual do material produzido. Nesse caso, o material didático para essa modalidade é preparado para que o estudante acompanhe seu curso, contando com recursos de apoio a seus estudos.
É importante ter em mente que, em um país como o Brasil, de acentuada diversidade cultural e profundas desigualdades sociais, é preciso haver um olhar cuidadoso para a equidade na educação. Essa equidade requer que os estudantes tenham acesso às informações diversificadas a fim de poder transformá-las em conhecimento. Para tanto, o acesso ao material didático plural e diverso é, sem dúvida, um caminho promissor.
1 - Dialogismo, multimodalidade e material didático
Ao final deste módulo, você será capaz de relacionar o conceito de dialogismo e multimodalidade com a construção de material didático.
Linguagem e construção textual
O conceito de linguagem
Uma das tarefas essenciais do exercício docente diz respeito à preparação constante de material didático, de exercícios variados e de atividades de avaliação a fim de verificar o aprendizado dos estudantes. Na sua formação docente, sem dúvida, essa deve ser uma preocupação central tanto da sua parte quanto da parte dos cursos que você frequenta.
Por isso, vamos discutir neste material a necessidade de parâmetros linguísticos para a elaboração de materiais didáticos. Comecemos retomando o conceito de linguagem.
Por esse conceito ser intrínseco à ideia de ser humano, é muito importante que retomemos as concepções de língua, de texto e de sujeito para que você entenda a necessidade de desenvolvimento de habilidades de linguagem.
É fundamental compreender que nós não somos sujeitos isolados no mundo. Na verdade, somos sujeitos essencialmente históricos e sociais, já que estamos marcados pelo que se constrói em sociedade, isto é, na interação que temos com o (s) outros(s) nela. Não vivemos sozinhos – e a consequência dessa condição básica é que carregamos diferentes saberes.
Entender a língua(gem) como forma de interação é compreender o caráter ativo dos sujeitos na produção do social. Eles participam ativamente das situações linguageiras nas quais estão engajados e (re)produzem o social, sendo atores nas representações sociais sem as quais a comunicação não poderia existir.
Nessa concepção dialógica, os sujeitos são vistos como atores/construtores sociais, enquanto o texto é o lugar de interação. Nesse sentido, é possível que o falante resgate do texto uma gama de implícitos, pois o que está na superfície dele é apenas uma ponta do “querer dizer” do produtor do texto.
A tarefa de compreensão deixa de ser entendida como uma simples detecção da representação mental ou uma mera decodificação da mensagem. Este entendimento é fundamental, quando se pensa em relações de aprendizado, como a que acontece na sala de aula, e, sobretudo, quando se pensa em construção de material didático.
Compreender o texto falado ou escrito deve ser considerado uma atividade de interação de alta complexidade de produção de sentidos, sendo ela realizada a partir do texto e dos elementos linguísticos que estruturam a superfície textual.
Tais elementos linguísticos correspondem à gramática da língua, ou seja, à materialização de dois processos essenciais:
Seleção de palavras
Combinação de palavras
A partir dessa seleção e combinação, serão formados frases, orações, períodos e parágrafos que constituem o texto. O princípio básico é que o sentido de um enunciado, de um texto, é construído justamente na interação texto/sujeito (também denominados coenunciadores). Por isso, não se trata de um sentido preexistente.
A atividade de linguagem tem pelo menos duas demandas:
	Exige da parte do produtor do texto um projeto de dizer;
	Exige da parte de quem interpreta (o leitor e o ouvinte) uma participação ativa na construção de sentidos.
Essa construção de sentidos se dará a partir das pistas linguísticas que o texto oferece, considerando o querer dizer desse interlocutor. Jogamos, portanto, um jogo de linguagem. Nós, interlocutores, somos estrategistas que mobilizam muitos saberes.
Esses saberes podemser de ordem:
Sociocognitiva
Interacional
Textual
Dessa maneira, precisamos ter a clareza de que a linguagem é a capacidade humana de manifestar expressões de sentimentos, de desejos, de opiniões e de troca de informações em diferentes culturas.
Linguagem dialógica e material didático
A linguagem carrega, em sua essência, o significado de dialogismo, consistindo na construção e na reflexão sob a forma de interação entre os sujeitos de linguagem.
Mikhail Bakhtin em 1920.
Para o filósofo russo e pesquisador da comunicação humana Mikhail Bakhtin (1999), a dialogicidade favorece a aquisição do conhecimento pela interação, uma vez que a linguagem medeia a ação do sujeito sobre o objeto, desempenhando a função mediadora.
Piva, Freitas e Miskulin nos apresentam alguns fatores que influenciam na dialogicidade:
É através da interação com o outro e seus enunciados individuais que ocorre a assimilação da expressividade conferida às palavras e aos enunciados. Todo enunciado tem um autor. Ele é elaborado visando a uma compreensão responsiva ativa do destinatário. Para facilitar a compreensão responsiva de um enunciado, alguns fatores, como o grau de informação do destinatário e o seu conhecimento especializado na área, devem ser considerados. Isso se deve a que são esses fatores os determinantes na escolha do gênero e do estilo do enunciado.
(PIVA; FREITAS; MISKULIN, 2009, p. 5, grifos nossos)
Em relação ao que nos interessa aqui, o material didático, a dialogicidade precisa ser considerada em todos os momentos:
	Na concepção e no planejamento.
	Na elaboração.
	Na apresentação.
	Nas interações a partir do material.
O material didático deve ser pensado como apoio ao estudo, oferecendo condições para o desenvolvimento da aprendizagem dos estudantes, mesmo que eles estejam realizando seus estudos de forma individual e a distância. O mais significativo é que o leitor, isto é, o estudante, sinta que há uma voz conduzindo (ou ajudando a conduzir) o seu processo de aprendizagem e de construção de conhecimento.
No desenvolvimento de materiais didáticos, é importante utilizar uma linguagem conhecida como dialógica instrucional. O produtor do texto (o professor, o especialista ou o conteudista) precisa escrever seu material de modo a estar sempre presente, conversando com o leitor (o estudante) em um diálogo encorajador, condutor do processo de aprendizagem.
Esse diálogo deve incluir aconselhamento a respeito do que fazer, ou seja, deve servir de encorajamento para os alunos, reforço e incentivo.
(LAASER, 1997, p. 76)
Desse modo, é preciso haver uma intencionalidade na escrita do material didático voltada para a conversa ou o diálogo com o leitor ou usuário do material. Confira dois exemplos que contrastam os diferentes usos da linguagem:
Exemplo 1
O respondente tem de ser capaz de interpretar o conceito de oração, levando em consideração que esse conceito envolve uma visão específica da construção do parágrafo, pois é o conjunto de orações que o forma. Nessa perspectiva, deve relacionar o uso da língua (dentro e fora da sala de aula) e das várias linguagens em diferentes contextos.
Exemplo 2
Olá, caro estudante! Eu sou João Enunciador e vou acompanhar você nas incursões sobre o conceito de língua e de linguagem e suas funções principais. Um conceito importante nos estudos de língua é o conceito de oração. Você deve ser capaz de interpretar o conceito de oração, levando em consideração que se trata de elemento fundamental na construção do parágrafo de um texto, por exemplo. O conjunto de orações é que forma um parágrafo. Então, fique atento! Relacione os diferentes usos da língua (dentro e fora da sala de aula) e as várias linguagens em diferentes contextos.
Ao comparar os exemplos 1 e 2, você deve perceber bem a diferença entre eles em relação à linguagem:
Sobre o exemplo 1:
Possui uma linguagem mais pesada, mais distante e de comando, sem preocupação em se aproximar do leitor. Na verdade, não há interesse no outro ou em como a informação vai chegar. O objeto é a ação, a atividade desejada.
Sobre o exemplo 2:
É mais dialógico, porque, na apresentação textual, há a preocupação de se mostrar para o leitor, conduzindo o passo a passo que deseja. O conteúdo é o mesmo, mas a forma de dizer é mais próxima, delicada. O leitor sabe que tem uma voz ali conduzindo o processo.
A linguagem dialógica precisa estar presente tanto em materiais didáticos que usam o impresso como suporte material quanto naqueles com suporte digital. O aluno ou leitor deve ser encorajado ou convidado à interlocução.
Na construção textual, algumas preferências podem contribuir para tal dialogicidade e interlocução no material didático. Uma das formas de realizar essa interlocução e aproximação do aluno ou leitor é o uso da primeira pessoa do plural (“nós”) e do pronome “você” em vez de frases ou textos impessoalizados.
Espera-se que os conceitos sejam aprendidos antes da realização das atividades.
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Esperamos que você aprenda os conceitos antes de realizar as atividades.
Nos conteúdos on-line ou em materiais em suporte digital, o uso de links e outros recursos de interatividade também pode contribuir para a dialogicidade do material didático. Desse modo, a linguagem hipermidiática é explorada em favor da interatividade com o material.
Multimodalidade no material didático
Modalidades de linguagem
Você ainda se lembra dos conceitos de linguagem verbal, não verbal e mista?
Linguagem verbal
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É caracterizada pelo uso de palavras (escritas ou faladas), constituindo as modalidades oral e escrita de nossa língua, os principais registros de linguagem. Estudadas nas aulas de português, essas duas modalidades nos permitem a comunicação com nossos pares na sociedade em que vivemos.
No entanto, sabemos que a comunicação humana não ocorre somente por meio desses dois tipos de modalidades e seus registros. Antes mesmo que houvesse a palavra escrita, o chamado homem pré-histórico já desenhava para se comunicar.
Linguagem não verbal
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Imagens, gestos, cores e expressões faciais, entre outros elementos visuais, caracterizam outro tipo de linguagem humana: a não verbal. Ela, portanto, se vale de outros signos ou sinais distintos da palavra.
Nem todo indivíduo, entretanto, é capaz de compreender que esses elementos constituem um tipo de comunicação. Por não terem esse entendimento, muitas pessoas têm dificuldade para construir sentido em práticas comuns do dia a dia.
Um exemplo disso é a ironia expressa pelo tom de voz ou o traço de humor de uma tirinha gerado por uma expressão facial do personagem.
Linguagem mista
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As modalidades de linguagem descritas acima não estão destinadas a um uso estanque. No entanto, a linguagem verbal e a não verbal frequentemente se articulam, tornando-se o que, por muito tempo, conhecíamos por linguagem mista.
A linguagem mista, assim, corresponde à integração ou à articulação entre a linguagem verbal e a não verbal. A expressão “linguagem mista”, porém, está caindo em desuso. Em seu lugar, vem se estabelecendo o termo e o conceito de “multimodalidade”.
Multimodalidade diz respeito à junção de variados modos de linguagem para a construção de textos e o estabelecimento de comunicação. Você já havia pensado nisso, tendo em vista o acesso total que todos temos às redes sociais, espaço discursivo no qual a interseção de linguagens é muito, muito forte?
É importante entender a raiz da palavra “modalidade”. Para Leeuwen (2005), modalidade é uma abordagem semiótica relativa à verdade e se refere a:
Pontos de representação
Fato versus ficção, realidade versus fantasia, real versus artificial e autêntico versus falso.
Pontos de interação social
A realização da verdade também é uma realização social.
Por que existe esse aspecto de representação e de interação social? Porque a apreensão da realidade se dá por meio de representação ou da linguagem: o que é julgado como verdadeiro em um contexto social não é necessariamente considerado do mesmo modo em outros.
Na sua formação como professor de linguagem ou educador,você deve entender que os linguistas não se questionam sobre a verdade. Na verdade, eles indagam como ela é representada e de que modo os recursos semióticos são utilizados para expressar essa verdade.
Textos multimodais
Podemos entender a multimodalidade como o texto construído a partir do uso de diferentes modalidades de linguagem, isto é, tipos distintos de linguagem. Kress e Leeuwen (1996; 1998) apresentam sete pressupostos teóricos sobre modalidade:
	Todos os textos são, de certa maneira, multimodais. Nenhum texto é elaborado em um único modo. Multimodalidade significa que a linguagem é parte de um conjunto multimodal. A linguagem verbal é considerada o modo mais importante nos contextos de ensino e de aprendizagem.
	Certos textos e objetos existem predominantemente em um modo ou em outros modos, além da linguagem. Há sistemas de comunicação e de representação conhecidos na cultura como multimodais, embora todos os sistemas sejam multimodais.
	Os significados são construídos, distribuídos, recebidos, interpretados e refeitos na interação dos modos comunicativos e representacionais. Todas as interações são multimodais. O olhar, o gesto e a postura tendem a dar suporte à fala, reforçando ou modificando-a. A imagem é pensada estar em relação de apoio à escrita.
	Cada modo semiótico em um conjunto multimodal é considerado como o realizador de um trabalho comunicativo diferente.
	A multimodalidade entende que todos os modos têm, como a linguagem verbal, sido influenciados por usos sociais culturais e históricos para realizar funções sociais.
	Os significados dos signos derivados dos recursos semióticos multimodais são sociais, como a fala. Isso significa que eles são regulados por normas e regras que operam no momento de construção do signo, sendo influenciados por motivações e interesses do construtor do signo em um contexto social específico.
	A abordagem multimodal busca compreender a articulação dos diversos modos semióticos utilizados em contextos sociais concretos, ou seja, nas práticas sociais, com o objetivo de se comunicar.
Ao se elaborar um texto, determinados termos são escolhidos para produzir significados. Tais produções de significados podem ser observadas em textos não verbais cujas escolhas de elementos, cores e formas são ricas em significados que precisam ser percebidos pelos leitores.
A partir da concepção de elemento (a exemplo da imagem, que contribui para a confecção de um significado), torna-se fundamental o desenvolvimento das habilidades de leitura para haver uma análise técnica e detalhada. Desta forma, a língua está situada no emaranhado das relações humanas e, ao tentarem representar o contexto social, os textos configuram-se de tal forma que há uma relação cada vez mais estreita e integrada entre imagem e palavra:
Com o advento das novas tecnologias, com muita facilidade se criam imagens, novos layouts, bem como se divulgam tais criações para uma ampla audiência. Todos os recursos utilizados na construção dos gêneros textuais exercem uma função retórica na construção de sentidos dos textos. Cada vez mais se observa a combinação de material visual com a escrita; vivemos sem dúvida, numa sociedade cada vez mais visual.
(DIONISIO, 2008, p. 132)
Para que um texto seja considerado formalmente multimodal, ele precisa apresentar em sua composição a junção dos dois tipos de linguagem: a verbal e a não verbal. Vamos pensar em alguns textos multimodais presentes em nosso dia a dia.
Exemplo
Uma reportagem de um jornal televisivo, no qual há a imagem dos apresentadores e sua fala, isto é, seu discurso oral, além de seu tom de voz, de suas expressões faciais e de seus gestos. As telenovelas também constituem exemplos de textos multimodais.
Atenção!
É preciso estar claro que não se trata de um conceito que passou a existir agora, na contemporaneidade.
A ampliação de usos dos gêneros multimodais ocorre com o advento das mídias digitais e da internet. Novos gêneros vão surgindo dada a necessidade de comunicação dos seres humanos. Esses gêneros se caracterizam como textos multimodais, integrando e articulando escrita, imagem, som etc.
Exemplo
Os chamados vlogs, formato de blog em vídeo no qual um indivíduo compartilha, na internet, relatos e experiências sociais acerca de um assunto.
Destaca-se, com isso, a influência do avanço tecnológico para o surgimento de novos textos multimodais em nosso cotidiano trazidos pelos novos dispositivos de comunicação. Evidentemente, esses textos estão por toda parte, não se limitando à sala de aula.
Muitos deles já tinham espaço em sala de aula, como as charges, as tirinhas e as campanhas publicitárias, demostrando que a linguagem verbal e a não verbal andam juntas na composição de textos multimodais.
Multimodalidade nos textos e na sala de aula
A ampliação nos modos de comunicação exige, portanto, não apenas estudo e sistematização da multimodalidade, mas também o diálogo entre os recursos multimodais, o docente e o estudante.
Além desses textos multimodais da atualidade, geralmente há, em uma sala de aula, várias linguagens presentes em diversos textos ou situações de comunicação. Listaremos algumas a seguir:
	O conteúdo escrito na lousa;
	O docente falando e gesticulando durante uma explicação;
	As ilustrações do livro didático;
	As imagens e o som da projeção de um filme.
A multimodalidade, portanto, não se resume a um conteúdo específico da língua portuguesa, devendo interessar os docentes das demais disciplinas, como Ciências, Geografia, História, Matemática e Física, uma vez que ela ampliará as habilidades de leitura e, por conseguinte, a concepção de leitura e de produção de texto do estudante a partir de gráficos, de mapas e de figuras, entre outros exemplos.
A consequência dessa ampliação de gêneros é a necessidade de renovação de algumas práticas de ensino de professores que ainda não deram uma chance para a tecnologia, apoiando-se somente no quadro e no livro didático impresso. Os materiais didáticos, afinal, não precisam se limitar à escrita e às imagens no impresso.
Na verdade, há cada vez mais material didático disponível em ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) a partir da articulação de diversas linguagens e da integração com diferentes recursos de interatividade. Diante disso, torna-se indispensável que os professores integrem novos suportes multimodais na elaboração de seus materiais didáticos.
Vamos fazer um exercício de resgate de memória? Quem não teve aquele professor de Biologia que desenhava uma mitocôndria no quadro a fim de tornar mais compreensível o conteúdo?
Hoje em dia, com tantos recursos tecnológicos que também se configuram como recursos multimodais, os docentes devem engajar-se em uma série de práticas que, sem dúvida, enriquecerá suas aulas. A realidade aumentada é um exemplo desse tipo de recurso que permite ao professor ir além do quadro ou da lousa.
Essa inclusão só se tornará plena quando o professor trouxer esses textos multimodais para suas aulas. Cabe ao docente despertar o interesse do estudante para novos aprendizados; para isso, deve-se transpor o livro didático e trabalhar com um conteúdo mais dinâmico.
Ainda que o docente não disponha de grandes dispositivos tecnológicos, como um celular ou um notebook, ele pode trabalhar de forma inovadora, saindo da prática convencional de escrever o conteúdo no quadro para o aluno copiar e, em seguida, escutar a explicação do professor.
Quantas vezes liberamos o espaço de dois tempos de uma aula para trabalhar um documentário ou mesmo um filme? Para alguns docentes, a proposta pode não parecer válida, porém, em uma turma de ensino médio, por exemplo, no estudo do gênero resenha, podemos solicitar ao aluno a elaboração de uma resenha sobre o filme ou o documentário visto.
Além disso, no conteúdo sobre resenha, o docente pode tratar da produção de resenha oral, já que ela é muito praticada hoje em dia nas redes sociais. Esse tipo de atividade permite ao aluno desenvolver a habilidade de produção de resenha escrita e falada.
Tal atividade atende às orientaçõesda Base Nacional Comum Curricular (BNCC) ao trabalhar com a produção de texto oral, tópico bastante sugerido nesse documento que norteia a educação básica.
Hoje em dia, não é possível sustentar o ensino de uma língua sem considerar a presença de outras linguagens nos textos. Alguns gêneros textuais, como o cartão postal, as propagandas em outdoors, os sites de internet ou os cartazes publicitários em lojas, só são compreendidos em função da associação entre palavras e imagens.
Atenção!
É responsabilidade do docente não incluir um texto multimodal ou utilizar um recurso midiático de forma vazia, isto é, que não traga nenhum retorno para a compressão do conteúdo ou que não desenvolva alguma habilidade, seja ela de leitura ou de produção de texto.
Primeiramente, o professor deve atentar para o objetivo de sua aula, como ampliar a leitura de textos imagéticos ou aperfeiçoar a produção de textos publicitários. A partir dos objetivos traçados, ele pode buscar os textos multimodais ou os meios multimodais que os veiculam para serem usados como exemplos ou atividades, podendo cumprir, dessa forma, seu propósito.
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Dialogismo e multimodalidade em materiais didáticos
Veja agora como o material didático construído a partir de uma linguagem dialógica e multimodal contribui para uma melhor aprendizagem.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
2:42 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Linguagem dialógica na construção do material didático
3:02 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Multimodalidade na construção do material didático
3:07 min.
Módulo 1 - Vem que eu te explico!
Multimodalidade na sala de aula
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Leia a citação a seguir:
A verdadeira substância da linguagem não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas, nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada pela enunciação ou pelas enunciações. A interação constitui, assim, a realidade fundamental da linguagem.
(BAKHTIN, 1999, p. 123)
A partir do conceito de linguagem como interação, é correto afirmar que:
A
a construção do material didático deve partir do entendimento de que a linguagem é, acima de tudo, instrumento de comunicação; portanto, o conteúdo didático deve ser fundamentalmente informativo.
B
a elaboração do material didático tem de partir da compreensão de que a linguagem é essencialmente um código a ser partilhado; assim, o conteúdo didático deve ser principalmente um conjunto de informações compartilhadas.
C
a produção do material didático precisa estar baseada no entendimento da linguagem como expressão do pensamento; desse modo, o conteúdo didático tem de privilegiar a equivalência entre a mensagem e a ideia do autor.
D
a construção do material didático deve partir do entendimento de que a linguagem é principalmente interação; portanto, o conteúdo didático precisa ser fundamentalmente dialógico.
E
a construção do material didático tem de levar em conta que a linguagem é principalmente interatividade; por isso, o conteúdo didático deve ser essencialmente digital e “gamificado”.
.
A linguagem deve ser entendida para além da expressão do pensamento e da comunicação, pois ela é experiência de interação. Assim, o material didático precisa privilegiar a interação por meio da linguagem dialógica, seja ela em meio impresso ou digital.
Questão 2
Assinale a alternativa que relaciona corretamente o conceito de multimodalidade com a construção de material didático.
A
Na elaboração e no uso de material didático, é necessário articular e integrar diferentes linguagens verbais e não verbais, buscando a interatividade e a aprendizagem do aluno.
B
Na construção e na distribuição de material didático, é fundamental juntar as linguagens usadas na internet para que o aluno consiga estudar somente em meios virtuais.
C
Na produção e na circulação de material didático, é preciso privilegiar a linguagem escrita, porque o aluno tem dificuldade de aprender por meio de outras linguagens.
D
Os materiais didáticos devem explorar as linguagens não verbais, porque os alunos estão mais acostumados aos meios digitais, sendo desnecessário o trabalho com a linguagem verbal.
E
A multimodalidade demanda a construção de materiais didáticos que reproduzem a interação das redes sociais, focando a aprendizagem espontânea e independente da mediação docente na educação básica.
A construção do material didático, bem como sua utilização, demanda a integração de várias modalidades de linguagem sem se optar exclusivamente por uma delas, o que dá a oportunidade de o aluno aprender com diferentes recursos e de forma participativa. Desse modo, o discente pode trabalhar conceitos a partir de explicações escritas, ilustrações ou exemplificações, as quais, por sua vez, incluem, entre outros exemplos, imagens, simulações ou animações e aplicações do conceito a partir do que é exibido em um vídeo.
2 - Análise de material didático à luz da linguística
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar critérios para análise de materiais didáticos a partir da contribuição dos estudos linguísticos.
Novos suportes, novas linguagens e multiletramento
Suportes midiáticos e construção de material didático
Neste módulo, faremos algumas reflexões sobre a construção de materiais didáticos a partir da inclusão dos novos suportes midiáticos e dos textos multimodais. Também consideraremos os possíveis benefícios dessa inclusão para a execução das aulas e para a prática docente.
A BNCC ajuda-nos a pensar sobre as demandas que docentes e alunos têm diante do contexto cultural no qual vivemos:
Docentes
Muitas vezes inserido em culturas diferentes, o professor deve compreender o meio social de seus estudantes a fim de se tornar um conhecedor dos suportes midiáticos disponíveis, partindo do horizonte cultural do estudante para elaborar o processo de ensino e aprendizagem.
Alunos
Por estar cada vez mais engajado na cultura social, o estudante precisa ser instruído sobre o forte apelo emocional dessa cultura para não privilegiar análises superficiais dos textos que circulam nesse meio.
Daí a importância de conhecermos os diferentes universos, pois, afinal, como se pode instruir sobre algo que não se maneja? Acerca das novas linguagens e dos novos modos de aprendizagem, a BNCC destaca o seguinte:
Contudo, também é imprescindível que a escola compreenda e incorpore mais as novas linguagens e seus modos de funcionamento, desvendando possibilidades de comunicação (e de manipulação), e que eduque para usos mais democráticos das tecnologias e para uma participação mais consciente na cultura digital. Ao aproveitar o potencial de comunicação do universo digital, a escola pode instituir novos modos de promover a aprendizagem, a interação e o compartilhamento de significados entre professores e estudantes.
(BRASIL, 2017, p. 61)
Além de uma aula mais dinâmica e atualizada, a incorporação dos textos multimidiáticos também estimula o docente a aprender a usar as novas mídias. Desse modo, ele pode ficar mais próximo dos estudantes ou do contexto midiático e digital no qual os alunos, hoje em dia, estão inseridos.
Essa prática de pesquisa levará docentes de diferentes gerações a entender que cada aula e cada turma é única. Dessa forma, suas aulas não precisam ser iguais, ficando pautadas somente no livro didático.
Exemplo
Para conversar com a realidade da nova geração, o docente pode acrescentar textos, recursos e temas que levantem discussões pertinentes sobre um conteúdo estudado ou o meio social em que estão inseridos.
A inclusão das linguagens multimodais contribui não apenas para a elaboração de materiais personalizados e adequados, como também para a inserção de muitos docentes no meio digital.
Dessa forma, é fundamental que as instituições de ensino públicas ou privadas despertem esse interesse nesses profissionais por meiode palestras e de oferecimento de cursos, contribuindo para que eles sejam capazes de utilizar novos recursos e linguagens na construção de seus materiais didáticos.
A partir dessa perspectiva, entendemos que uma mudança de tal ordem não ocorre instantaneamente. Não é adequado acreditar ou afirmar que, de uma hora para outra, os estudantes terão acesso a variados tipos de textos multimodais e estarão inseridos em uma concepção de leitura que vai além da decodificação de signos linguísticos. Isso não é possível, já que a prática de inclusão de novos recursos midiáticos e linguagens multimodais não é uma tarefa tão simples.
No entanto, a escola, em geral, precisa incentivar a apropriação dos recursos digitais e criar as condições para que o docente seja capaz de contextualizar e aplicar em sua prática docente as diversas mídias digitais. Pesquisas e estudos na área da Linguística e da Educação têm nos ajudado a perceber que os novos suportes midiáticos e as novas linguagens multimodais reforçam o conceito de multiletramento.
Já sabemos que a multimodalidade nos remete à natureza de um texto ou de uma comunicação que utiliza mais de uma linguagem para efetuar sua finalidade discursiva.
Isso faz com que seja necessário ao indivíduo da atualidade a capacidade de construir sentido para compreender tais textos com múltiplas linguagens.
Desse modo, o termo “multiletramento” designa a habilidade de leitura desses textos multimodais. Com isso, a concepção de leitura se amplia, não se resumindo apenas à prática de leitura de textos escritos.
No contexto do multiletramento, a leitura corresponde à capacidade de construir sentido para, entre outras, as seguintes formas de linguagem:
	imagem
	gesto
	movimento
	cor
Dica
Vale lembrar que a BNCC defende a apropriação das múltiplas linguagens e reforça a importância do multiletramento para uma melhor atuação nas práticas sociais (ROJO, 2012).
O material didático virtual
Nós devemos reconhecer cada vez mais a dinamicidade da vida e do mundo no qual vivemos. Nessa sociedade global, as informações são transmitidas em grande quantidade e praticamente em tempo real. Na verdade, a noção de tempo é afetada pelas inovações tecnológicas, enquanto as barreiras ou distâncias espaciais são quebradas ou reduzidas em virtude da virtualização.
A educação tem acompanhado, em parte, essa dinâmica em função da necessidade de atender às atuais demandas da sociedade e do mundo do trabalho. Tal desafio se tornou ainda maior e urgente após o período de distanciamento social imposto pela pandemia de covid-19.
Hoje em dia, o aluno pode ter acesso ao conhecimento sem precisar sair de casa graças a:
Novas tecnologias
Modalidade a distância
Ensino híbrido
Com isso, a aprendizagem e a construção do conhecimento se estendem mais facilmente para além dos limites físicos da sala de aula e do tempo no ambiente escolar.
O material didático, desse modo, precisa acompanhar os desafios da aprendizagem em ambientes virtuais, devendo ser analisado ainda quanto ao favorecimento da interatividade, da autoaprendizagem e do engajamento do aluno nas propostas e nos propósitos do material.
O material didático em ambientes virtuais também deve ser considerado e avaliado a partir de sua contribuição para o desenvolvimento da autonomia do aluno, que tem de avançar no seu aprendizado por outros meios que não só a ação do professor.
Segundo Averbug (2003, p. 4), o aluno precisa ser levado “a aprender, refletir e questionar, a buscar soluções e inovar, a reconstruir os conhecimentos, a relacionar conceitos e aplicar na vida pessoal e profissional”. Essa autonomia pode ser mais favorecida quando o material didático é construído com a preocupação voltada para o estudante, usando linguagem adequada para sua aprendizagem.
Análise de materiais didáticos
As discussões em torno da inserção da multimodalidade em sala de aula são realmente necessárias – principalmente nas aulas de língua portuguesa – por promover uma concepção de língua baseada nas práticas sociais e nos usos reais da língua. Dessa forma, combate-se a predominância dos materiais didáticos moldados de acordo com os exercícios típicos de manuais gramaticais (ainda prevalecentes, em geral, nos livros didáticos e materiais escolares).
Não estamos propondo a erradicação dos exercícios de fixação da nomenclatura das classes gramaticais, das funções sintáticas ou das orações e da prescrição das regras gramaticais.
Defendemos, na verdade, um espaço para esse e outros tipos de atividades, porque o que ocorre, em muitos conteúdos de português, é a manutenção de um material didático que simplesmente lista uma série de frases para que o estudante identifique e/ou classifique o assunto solicitado.
Essa metodologia muitas vezes torna a tarefa maçante, pois, para o aluno, estudar português resume-se a identificar e a classificar aspectos estruturais da língua, não havendo, às vezes, espaço para reflexões de outra natureza.
Exemplo
Pensar no propósito comunicativo, no interlocutor, entre outros aspectos que contribuem para a construção de um texto.
Além disso, a aplicação ininterrupta desse tipo de material condiciona o pensamento do aluno a analisar e ter postura crítica em outros tipos de atividades não correspondentes ao ensino de língua. É comum ouvirmos questionamentos do tipo: “Hoje não vamos estudar português? Só interpretação?”.
Sendo assim, vamos observar alguns tipos de materiais didáticos para fazermos uma breve análise. O primeiro material foi elaborado a partir de uma perspectiva mais tradicional de ensino da língua; o outro, com uma abordagem dos multiletramentos por meio dos textos multimodais.
Vamos avaliar agora as principais diferenças entre esses materiais. Analisemos o primeiro material:
Modelo de lista de exercícios.
Nesse modelo de material de língua portuguesa, identificamos que a atividade conta com uma série de frases com preposições. Na verdade, a preposição é o assunto do material, no qual poderíamos reconhecer o seguinte objetivo: levar o aluno a identificar o valor semântico das preposições.
Também chama a nossa atenção o fato de as sentenças estarem descontextualizadas, isto é, de seu uso não corresponder a uma situação específica com propósito comunicativo.
Trata-se de um modelo genérico que, embora não tenha sido retirado de nenhum livro didático, é comum em sites da internet dedicados à aprendizagem da língua portuguesa. O material, em suma, demonstra o quanto essa metodologia ainda tem força e presença garantida na elaboração de materiais.
Comentário
O tipo de material no qual a língua escrita predomina não costuma explorar outros tipos de linguagens. Ele tampouco relaciona as imagens e as palavras. Há apenas um exercício de conteúdo específico sem contexto, propósito explicitado e imagem.
Em sua pesquisa denominada A abordagem da gramática em material didático do ensino médio, Luciana Castilho (2008) chama a atenção para as possibilidades das atividades sobre preposição em um material didático. A partir das sistematizações sobre essas atividades realizadas por Travaglia (2007), Castilho (2008) apresenta este quadro:
	Atividades que privilegiam a gramática:
	Objetivos dos exercícios
	Teórica
	• Expor a definição do conceito de preposição tomando como referência a teoria tradicional.
• Aprender a lista de preposições existentes.
• Saber sobre a existência de locuções e combinações.
• Dominar quais preposições regem determinados verbos.
	De uso
	• Reescrever trechos que estão na norma popular para a norma culta.
• Completar lacunas com as preposições, as combinações e as conjunções adequadas.
• Realizar exercícios estruturais que automatizem a regência de alguns verbos e/ou nomes.
	Normativa
	• Compreender as regras de uso da crase segundo a norma padrão.
• Aprender as regências dos nomes e/ou verbos de acordo com a norma culta.
• Identificar e corrigir trechos que não estejam de acordo com as regras da norma padrão.
	Reflexiva
	• Investigar os sentidos das preposições e as diferenças de sentido entre possibilidades alternativasde uso.
• Comparar textos similares construídos com as mesmas preposições.
• Confrontar possibilidades de usos diversos em diferentes situações.
Sistematizações da gramática.
Fonte: CASTILHO, 2008, p. 88.
O exemplo visto apresenta uma atividade que visa apenas ao reforço de um conteúdo específico. O produtor de textos didáticos, ao escrever o conteúdo para compor um material, precisa pensar em formas que forneçam mais abrangência ao acesso cognitivo do estudante.
Deve-se levar em conta:
	Objetivo de aprendizagem definido para o estudante;
	Metodologia mais adequada;
	Formato que mais favorece o engajamento e a aprendizagem do estudante.
A escrita do conteúdo tem de ocorrer de forma lógica e organizada para aumentar o entendimento e a motivação do leitor. É evidente que existem métodos de apresentação de conteúdos, modelos de estruturas e estratégias para se usar em cada momento.
Vejamos agora um segundo exemplo de atividade. O material a seguir é um caderno de atividades; publicado pela Imperial Editora, ele se atém à perspectiva da multimodalidade.
Podemos notar nele a presença de diversos tipos de linguagem, o que amplia o contato do aluno com múltiplas formas de interação. Tendo isso em vista, você agora verá alguns exemplos mais próximos do que é considerado multimodal:
Proposta didática – Atividade multimodal
Um gênero multimodal muito comum na escola – e presente nos materiais didáticos de língua portuguesa – é a tirinha, como ilustra o exemplo. A atividade em questão propõe a leitura de tirinhas e a identificação da presença dos traços de humor.
Podemos notar, portanto, que as atividades com textos multimodais extrapolam as temáticas gramaticais, voltando-se para as práticas de leituras. Isso é o que prevê a BNCC na seguinte habilidade:
Construir o sentido de histórias em quadrinhos e tirinhas, relacionando imagens e palavras e interpretando recursos gráficos (tipos de balões, de letras, onomatopeias).
(BRASIL, 2017, p. 97)
O segundo exemplo de material que acabamos de apresentar sugere o processamento cerebral de informações verbais e visuais. Essas informações visuais estão relacionadas com a habilidade proposta pela BNCC.
Podemos considerar que tanto o primeiro material quanto o segundo apresentam funcionalidades e alguma relevância para o ensino da língua. Por isso, tornam-se fundamentais, não devendo existir a exclusão de nenhum dos tipos, e sim um equilíbrio entre as abordagens, isto é, que o material disponha de conteúdos relativos à gramática da língua, que é estudada e apresentada a partir da multimodalidade textual.
Linguagem e avaliação de material didático
Como você se sente ao se deparar com um material mais instrucional e dialógico?
Certamente, a experiência de aprendizagem é mais significativa e interessante. Em parte, a boa experiência dela, a partir do material didático, depende de alguns fatores que devem estar presentes na elaboração do material.
Não queremos trazer receitas de bolo para a produção de material didático. No entanto, quatro passos essenciais precisam ser levados em conta na produção do material e na avaliação ou análise dele:
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	1) Deve ser/estar adequado ao grupo social a que se destina, ou seja, adaptado a um contexto sociocultural específico com objetivo de atingir o seu público-alvo: o aluno.
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	2) Precisa problematizar, provocando no leitor (o estudante) um ímpeto investigativo, reflexões e ações.
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	3) Tem de ser construído, provocando a contextualização e a interação do conteúdo com o estudante.
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	4) Deve utilizar uma linguagem apropriada para proporcionar a autonomia dos estudos do aluno, esclarecendo os objetivos do texto, as atividades e suas instruções para estimular a curiosidade do aluno na busca de novos recursos e referências bibliográficas complementares.
No caso do material didático em ambientes virtuais, é preciso dar atenção especial às relações entre as linguagens e os recursos implicados na construção desse material.
O uso criativo e criterioso da linguagem verbal e não verbal, além das funcionalidades que promovem a interatividade, pode contribuir para uma aprendizagem mais participativa.
A interatividade entre o aluno e o material didático também pode proporcionar um diálogo mais produtivo entre o aluno e o professor ou tutor. Assim, a partir do material didático, o estudante pode:
	Refletir.
	Questionar.
	Buscar soluções.
	Inovar.
	Reconstruir os conhecimentos.
	Relacionar conceitos.
	Estabelecer vínculos com sua futura atividade profissional.
Há alguns aspectos mais práticos que também precisamos considerar em relação à linguagem empregada na construção e na análise do material didático. Devemos conferir se os seguintes itens foram considerados:
	Utilização de vocabulário acessível e mais apropriado aos destinatários e às tarefas que eles devem realizar.
	Cuidado com a correção gramatical, a clareza do texto e o estilo dialógico.
	Preferência por frases menos extensas, na ordem direta e bem articuladas entre si.
	Escrita com estilo mais pessoal, como se estivesse conversando com o estudante, sem chegar a vulgarizar o conteúdo.
Para que as condições de construção de um bom material didático se realizem, é necessário que o conteudista saiba trabalhar adequadamente com a linguagem e possua conhecimentos fundamentais. À luz da linguística e baseado em Koch e Elias (2009), o conteudista de material didático precisa apresentar os seguintes conhecimentos:
Conhecimento linguístico
(ortográficos, gramaticais e lexicais)
Conhecimento enciclopédico
(embasamento cultural)
Conhecimento dos padrões textuais
(gêneros e intertextualidade)
Conhecimento interacional
(interação escritor/leitor)
Desse modo, se o autor de tal material didático fizer, em seu texto, o bom uso desses conhecimentos, com o emprego adequado da linguagem, seja ela verbal, não verbal e/ou verbo-visual, dentro de um contexto, ele proporcionará uma boa interação entre o autor, o estudante e o conteúdo.
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Contribuição dos estudos linguísticos para análise de material didático
Assista ao vídeo no qual se debate a análise de material didático a partir de conceitos e perspectivas dos estudos linguísticos.
Vem que eu te explico!
Os vídeos a seguir abordam os assuntos mais relevantes do conteúdo que você acabou de estudar.
3:01 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Multiletramento e uso de material didático
3:07 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Análise de materiais didáticos e a busca da multimodalidade
3:19 min.
Módulo 2 - Vem que eu te explico!
Linguagem e análise do material didático
Falta pouco para atingir seus objetivos.
Vamos praticar alguns conceitos?
Questão 1
Considere as afirmativas a seguir sobre análise de material didático:
	Exercícios de fixação devem ficar de fora do material didático de língua portuguesa, pois o estudo de aspectos gramaticais precisa ser descartado.
	Listar frases para que o aluno identifique ou classifique elementos gramaticais se torna inadequado quando passa a ser o foco do material didático.
	É recomendável a exploração da multimodalidade e do multiletramento no material didático de língua portuguesa, com exercícios que sejam contextualizados e tenham seu propósito explicitado.
Está correto apenas o que se afirma em:
A
I.
B
II.
C
III.
D
I e II.
E
II e III.
As afirmativas II e III estão corretas, porque o material didático de língua portuguesa não deve se limitar à identificação e à classificação de fatos ou elementos gramaticais, ficando reduzido a listas de exercícios descontextualizados e sem propósito adequado e explicitado. Antes disso, esse material tem de explorar as diferentes linguagens e as possibilidades de leitura e de trabalho com a língua. A afirmativa I está incorreta, já que os exercícios de fixação e o estudo da gramática não devem ser eliminados do material didático, embora essa dimensão não deva ser o assunto ao qual o material didático esteja reduzido ou limitado.
Questão 2
Considerando a dimensão da linguagem na elaboração, na circulação e no uso do materialdidático, marque a alternativa correta.
A
A linguagem do material didático de língua portuguesa precisa ser formal e impessoal para conferir institucionalidade, credibilidade e rigor teórico ao conteúdo.
B
As linguagens não verbais e midiáticas devem ser evitadas em materiais didáticos de língua portuguesa, já que a escrita tem de prevalecer.
C
A impessoalização da linguagem, buscando a instrução do aluno, tem de ser o estilo preponderante no material didático de língua portuguesa.
D
A linguagem mais pessoal pode favorecer o diálogo no material didático, provocando mais proximidade entre o autor e o leitor.
E
A linguagem acadêmica e o vocabulário técnico são desejáveis no material didático na educação básica, pois promovem mais interação com o conteúdo.
Entre os elementos que devem caracterizar o estilo da linguagem no material didático, encontra-se a escrita mais pessoal e dialógica, já que ela promove um tipo de conversação com o conteúdo apresentado. Do mesmo modo, as construções mais simples, o vocabulário mais acessível e o uso de diferentes linguagens e de recursos favorecem a interatividade com material e a melhor compreensão do que se propõe.

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