Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
SOCIOLOGIA RICHARD T. SCHAEFER 6a EDIÇÃO 6a EDIÇÃO As aulas de Sociologia, consideradas pelo autor deste livro “o laboratório ideal onde pode- mos estudar nossa própria sociedade e as dos nossos vizinhos globais”, permitem ao aluno desenvolver o pensamento crítico, tornando-o capaz de aplicar as teorias e os conceitos sociológicos para avaliar as interações e as instituições humanas e, assim, encontrar expli- cações sociológicas para os diversos fenômenos que permeiam as relações sociais. O aluno inicia estudando o que é Sociologia e o seu objeto de pesquisa para depois entrar em contato com temas de interesse imediato e, em sua maior parte, com temas mais abrangentes, que lhe permitirão desenvolver o pensamento crítico e a imaginação sociológica. As seções “Use a Sua Imaginação Sociológica” e “Pense Nisto”, por exemplo, dão suporte à proposta do autor. Sociologia aborda temas que vão da educação bilíngüe à existência da escravidão em pleno século XXI, incluindo o estudo da imigração, da situação dos moradores de rua, da superpo- pulação, do processo do envelhecimento das pessoas nas diferentes culturas, até problemas mais recentes como os ataques de 11 de setembro de 2001 e suas conseqüências sociais – como as pessoas passaram a lidar com a situação depois desse acontecimento e, em espe- cial, como elas reagem diante das minorias. Aplicações Livro-texto para a disciplina Introdução à Sociologia dos cursos de graduação em Socio- logia, Filosofia, Psicologia, Pedagogia, Administração de Empresas, Economia, História, Engenharia, entre outros, bem como dos cursos de pós-graduação (MBA e lato sensu) destas mesmas áreas, especialmente de Administração de Empresas. R ich ard T. Sch aefer SO C IO LO G IA Sociologia www.grupoa.com.br Sociologia Schaefer.indd 1 24/10/13 09:53 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) S294s Schaefer, Richard T. Sociologia [recurso eletrônico] / Richard T. Schaefer ; tradução: Eliane Kanner, Maria Helena Ramos Bononi ; revisão técnica: Noêmia Lazzareschi, Sérgio José Schirato. – 6. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2014. Publicado também como livro impresso em 2006. ISBN 978-85-8055-316-1 1. Sociologia. I. Título. CDU 316 Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052 Índice para catálogo sistemático: 1. Sociologia 301 Iniciais_eletronica.indd 2 23/10/13 15:15 302 Capítulo 12 vISÃO glObAl dA fAMílIA Entre os tibetanos, uma mulher pode estar casada com mais de um homem, geralmente irmãos. Esse sistema per- mite que filhos compartilhem a quantidade limitada de terra boa. Entre os betsileos de Madagáscar, um homem tem várias mulheres, cada uma delas morando em uma aldeia diferente onde ele cultiva arroz. Onde quer que ele tenha o melhor campo de arroz, a mulher morando nele é considerada a sua primeira mulher. Entre os ianomami do Brasil e da Venezuela, é considerado adequado ter relações sexuais com primos do sexo oposto se eles forem filhos do irmão da mãe ou da irmã do pai. Porém, se os primos do sexo oposto forem filhos da irmã da sua mãe ou do irmão do seu pai, essa mesma prática é considerada incesto (Haviland et al., 2005; Kottak, 2004). Como esses exemplos ilustram, há diversas varia- ções na família de uma cultura para outra. No entanto, a família como instituição social está presente em todas as culturas. Além disso, certos princípios gerais referentes a sua composição, padrões de parentesco e de autoridade são universais. Composição: O Que É a Família? Se baseássemos nossas informações sobre o que é uma família no que vemos na televisão, cenários muito estra- nhos poderiam aparecer. Os meios de comunicação nem sempre apresentam uma visão realista da família. Além disso, muitas pessoas ainda pensam na família em termos bem restritos – um casal casado e seus filhos solteiros morando juntos, como aquelas dos antigos programas de TV. Contudo, esse é apenas um tipo de família, que os sociólogos chamam de família nuclear. A expressão família nuclear é bastante apropriada, visto que esse tipo de família serve como núcleo ou centro do qual grupos familiares são construídos. A maioria das pessoas nos Estados Unidos vê a famí- lia nuclear como o arranjo familiar preferível. No entanto, no ano 2000, apenas um terço dos domicílios norte-ame- ricanos se encaixava nesse modelo. A proporção de do- micílios nos Estados Unidos que são compostos de casais casados com filhos morando junto diminuiu constante- mente nos últimos 40 anos e estima-se que vá continuar diminuindo. Ao mesmo tempo, a quantidade de casas com pais ou mães solteiros aumentou (ver Figura 12-1). Uma família na qual os parentes – avós, tias ou tios – moram na mesma casa é conhecida como família es- tendida. Embora não sejam comuns, esses arranjos de moradia oferecem certas vantagens em comparação com a família nuclear. Crises, como as provocadas por morte, divórcio e doença, exercem menos pressão sobre os membros da família, já que mais pessoas podem oferecer ajuda e apoio emocional. Além disso, a família estendida esse trecho de The war against parents, o estudioso de filosofia Cornel West enfatiza quão profundamente sua vida familiar foi modificada pelo divórcio, um dos muitos fatores sociais que gradativa mas inevitavelmente vira- ram a família nuclear de cabeça para baixo. A família de hoje não é o que era há um século ou mesmo na ge- ração anterior. Novos papéis, novas distinções de sexo, novos padrões de criação de filhos se combinaram para criar formas inéditas de vida familiar. Hoje em dia, por exemplo, uma quantidade cada vez maior de mulheres está assumindo o papel de provedora, sejam elas casa- das sejam mães solteiras. Famílias mistas – resultado do divórcio e de um novo casamento – são quase a regra. E muitas pessoas estão buscando relações íntimas fora do casamento, seja em uma parceria gay seja em acordos de coabitação. Este capítulo discute a família e as relações íntimas nos Estados Unidos e em outras partes do mundo. Como veremos, os padrões de família diferem de uma cultura para outra e também na mesma cultura. No entanto, a família é universal – encontrada em todas as culturas. Uma família pode ser definida com um conjunto de pessoas ligadas por parentesco de sangue, por casamento ou algum outro tipo de relacionamento acordado, ou adoção, e que compartilha a responsabi- lidade básica de reprodução e cuidado dos membros da sociedade. Como são as famílias nas várias partes do mundo? Como as pessoas selecionam os seus parceiros? Quando um casamento termina, como o divórcio afeta os fi- lhos? Quais são as alternativas para a família nuclear, e o quanto elas predominam? Neste capítulo examinare- mos a família e os relacionamentos íntimos dos pontos de vista funcionalista, do conflito e interacionista. Vamos examinar as variações nos padrões de estado civil e vida familiar, incluindo a criação de filhos, dando atenção especial à quantidade cada vez maior de pessoas em famílias com renda dupla ou de pai ou mãe solteiros. Analisaremos o divórcio nos Estados Unidos e vários estilos de vida, como a coabitação, o re- lacionamento entre lésbicas e entre gays e o casamento sem filhos. Na seção de política social, discutiremos a polêmica questão do casamento gay. N Capitulo 12.indd 302 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 303 constitui uma unidade econômica maior do que a família nuclear. Se a família estiver envolvida em um empreen- dimento comum – uma fazenda ou um pequeno negócio –, os seus membros adicionais podem representar a dife- rença entre a prosperidade e o fracasso. Considerando esses tipos de família diferentes, nós nos limitamos à forma de casamento característica dos Estados Unidos – a monogamia. O termo monogamia descreve uma forma de casamento na qual uma mulher e um homem são casados apenas um com ou outro. Alguns estudiosos, observandoa alta taxa de divórcio nos Esta- dos Unidos, sugeriram que uma “monogamia em série” é uma descrição mais precisa da forma que o casamento assume nesse país. Na monogamia em série, uma pessoa pode ter vários cônjuges ao longo de sua vida, porém apenas um cônjuge de cada vez. Algumas culturas permitem que uma pessoa tenha vários maridos ou esposas simultaneamente. Essa forma de casamento é conhecida como poligamia. Na verdade, a maioria das sociedades no mundo, no passado e no pre- sente, preferiu a poligamia à monogamia. O antropólogo George Murdock (1949, 1957) realizou uma amostragem com 565 sociedades e descobriu que, em mais de 80% delas, algum tipo de poligamia era a forma preferida. Em- bora a poligamia tenha diminuído constantemente du- rante a maior parte do século XX, em pelo menos cinco países na África 20% dos homens ainda têm casamentos polígamos (Population Reference Bureau, 1996). Existem dois tipos básicos de poligamia. Segundo Murdock, a mais comum – endossada pela maior parte das culturas nas quais ele analisou amostras – é a poligi- nia. Poliginia se refere ao casamento de um homem com mais de uma mulher ao mesmo tempo. As esposas geral- mente são irmãs, que se supõe tenham valores semelhan- tes e já viveram a experiência de morar na mesma casa. Nas sociedades políginas, uma quantidade relativamente pequena de homens de fato tem várias esposas. A maio- ria das pessoas vive em famílias monogâmicas; ter várias esposas é visto como um sinal de status. A outra principal variação da poligamia e á polian- dria, na qual uma mulher tem mais de um marido ao mesmo tempo. Esse é o caso das culturas dos todas no sul da Índia. Porém, a poliandria é, hoje, cada vez mais rara. Ela vem sendo aceita por algumas socie- dades muito pobres que praticam o infanticídio feminino (matança de bebês meninas) e, em razão disso, têm uma quantidade rela- tivamente pequena de mulheres. Como várias outras sociedades, as culturas poliandras reduzem o valor social da mulher. Padrões de Parentesco: De Quem Somos Parentes? Muitos de nós podemos rastrear nossas raízes examinando uma árvore genealógica ou ouvindo os membros mais idosos da família – e as vidas dos nossos ancestrais que morreram muito antes de nas- cermos. No entanto, a linhagem de uma pessoa é muito mais do que simplesmente uma história pes- soal: também reflete os padrões sociais que regem a descendência. Em todas as culturas, as crianças encontram parentes com os quais espera-se que tenham um vínculo emocional. A condição de ter la- ços com outras pessoas é chamada de parentesco. No entanto, o pa- rentesco é aprendido de maneira FigurA 12-1 Domicílios Norte-americanos por Tipo de Família, 1940–2003 Casais casados 84% Domicílios chefiados por mulheres 14% Domicílios chefiados por homens 1% Domicílios chefiados por mulheres 11% Domicílios não de famílias 11% Domicílios chefiados por homens 2% Domicílios chefiados por homens 4% Casais casados 74% Domicílios não de famílias 15% Domicílios chefiados por mulheres 9%Domicílios chefiados por homens 2% Casais casados 61% Casais casados 52% Domicílios não de famílias 32% Domicílios chefiados por mulheres 12% Domicílios não de famílias 26% 1940 1960 1980 2003 Fonte: Fields, 2003; ver também McFalls Jr., 2003, p. 23. Capitulo 12.indd 303 23/10/13 15:06 304 Capítulo 12 cultural e não é totalmente deter- minado por laços biológicos ou de sangue. Por exemplo, a adoção cria um parentesco que é reconhecido legalmente e socialmente aceito. A família e o grupo de parentes não são necessariamente a mesma coisa. Enquanto a família é uma unidade de pessoas que moram na mesma casa, os parentes nem sem- pre moram juntos ou atuam como um órgão coletivo todos os dias. Os grupos de parentes incluem tias, tios, primos, genros, noras, sogros, sogras etc. Em uma sociedade como a norte- americana, o grupo de parentes pode reunir-se apenas às vezes, para um casamento ou funeral. Mas os laços de parentesco com freqüência criam obrigações e responsabilidades. Po- demos nos sentir impelidos a ajudar nossos parentes, ou nos sentir livres para recorrer a vários tipos de ajuda, incluindo empréstimos e cuidar de crianças. Como identificamos grupos de parentes? O princípio de descendência designa as pessoas com base na relação delas com a mãe ou com o pai. Existem três formas bá- sicas de determinar a descendência. Os Estados Unidos e o Brasil seguem o sistema de descendência bilateral, o que significa que ambos os lados da família de uma pessoa são considerados igualmente importantes. Por exemplo, não se dá mais valor aos irmãos do pai do que aos da mãe. A maioria das sociedades – segundo George Mur- dock, 64% – dá preferência a um lado ou outro da família quando rastreia a sua descendência. Na descendência patrilinear (do latim pater, pai), apenas os parentes do pai são importantes em termos de propriedade, herança e laços emocionais. Opostamente, nas sociedades que apóiam a descendência matrilinear (do latim, mater, mãe) só os parentes da mãe são importantes. Novas formas de tecnologia reprodutiva irão promo- ver uma nova maneira de encarar o parentesco. Hoje em dia, a combinação de processos biológicos e sociais pode “criar” um membro da família, o que requer que sejam feitas mais distinções sobre quem é parente de quem. Padrões de Autoridade: Quem Manda? Imagine que você se casou recentemente e tenha de começar a tomar decisões sobre o futuro da sua nova família. Você e seu(sua) parceiro(a) deparam com várias questões. Onde irão morar? Como irão mobiliar a casa? Quem vai cozinhar, fazer as compras e cuidar da limpeza? Os amigos de quem serão convidados para jantar? Toda vez que é preciso tomar uma decisão, uma questão é levantada: quem tem o poder de decidir? Simplificando, quem manda na família? Os teóricos do conflito analisam essas questões no contexto da estratificação tradicional dos sexos, na qual os homens têm assumido uma posição de domínio sobre as mulheres. As sociedades variam na forma como o poder é distribuído na família. Uma sociedade que espera que os homens dominem em todas as tomadas de decisões fami- liares é denominada patriarcal. Nas sociedades patriar- cais, como a iraniana, o homem mais velho em geral tem o maior poder, embora se espere que as esposas sejam tratadas com respeito e bondade. O status de uma mulher no Irã é definido pela relação com um parente do sexo masculino, quase sempre como esposa ou filha. Em mui- tas sociedades patriarcais, é mais difícil para as mulheres obter o divórcio do que para os homens. Opostamente, nas sociedades matriarcais as mulheres têm mais auto- ridade do que os homens. As sociedades matriarcais, que são pouco comuns, surgiram entre as sociedades tribais dos nativos norte-americanos e nos países nos quais os homens estavam ausentes por longos períodos de tempo em razão de guerra ou de expedições para obter comida (Farr, 1999). Em um terceiro tipo de padrão de autoridade, a família igualitária, os cônjuges são considerados iguais. Porém, isso não significa que todas as decisões são com- partilhadas nesse tipo de família. As mulheres podem ter autoridade em algumas esferas e os homens, em outras. Esse grupo de parentes turcos foi fotografado em Berlim, Alemanha. Embora os membros das três gerações mostradas aqui não morem todos na mesma casa, o apoio que dão uns aos outros lhes ajuda a superar os desafios especiais que enfrentam como imigrantes. p. 278 Capitulo 12.indd 304 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 305 Muitos sociólogos acham que a família igualitária está começando a substituir a família patriarcal como norma social nos Estados Unidos. EStUdAndO A fAMílIA Nós realmente precisamos da família? Há mais de um século, Friedrich Engels ([1884] 1959), um colaborador de Karl Marx, descreveu a família como a fonte suprema de desigualdade social por causa do seu papel na transfe-rência de poder, propriedade e privilégios. Mais recente- mente, os teóricos do conflito vêm argumentando que a família contribui para a injustiça social, nega às mulheres oportunidades que são dadas aos homens e limita a li- berdade no tocante à expressão sexual e à seleção de par- ceiros. Por sua vez, a teoria funcionalista se concentra na maneira como a família atende às necessidades dos seus membros e contribui para a estabilidade social. A teoria interacionista leva em consideração os relacionamentos íntimos pessoais que ocorrem na família. Teoria Funcionalista A família exerce seis funções principais, que foram es- boçadas pela primeira vez há 65 anos pelo sociólogo William F. Ogburn (Ogburn e Tibbits, 1934): 1. Reprodução. Para se manter, qualquer sociedade tem de substituir os membros que vão morrendo. Nesse sentido, a família contribui para a sobrevi- vência humana com a sua função de reprodução. 2. Proteção. Ao contrário dos filhotes de outras es- pécies animais, as crianças precisam de cuidados constantes e segurança econômica. Em todas as culturas, a família assume a responsabilidade má- xima pela proteção e educação das crianças. 3. Socialização. Os pais e outros parentes monitoram o comportamento da criança e lhe transmitem as normas, os valores e o idioma da sua cultura. 4. Regulação do comportamento sexual. As normas sexuais estão sujeitas a mudanças com o decorrer do tempo (por exemplo, nos costumes referentes ao namoro) e entre culturas (compare a severa Arábia Saudita com a mais permissiva Dina- marca). No entanto, quaisquer que sejam a época e os valores culturais de uma sociedade, os padrões de comportamento social são definidos mais clara- mente no círculo familiar. 5. Afeto e companheirismo. Idealmente, a família oferece aos seus membros relacionamentos caloro- sos e íntimos, ajudando-os a se sentir satisfeitos e seguros. Evidentemente, o membro de uma família pode encontrar essas recompensas fora da família – nos colegas de escola e de trabalho – e pode até considerar a sua casa como um cenário desagra- dável ou injurioso. Mesmo assim, esperamos que nossos parentes nos entendam, importem-se co- nosco e nos apóiem se precisarmos deles. 6. Dar status social. Herdamos uma posição social decorrente do histórico social e da reputação dos nossos pais e irmãos. A família dá ao recém-nas- cido um status atribuído com base na raça e na etnia que ajuda a determinar o seu papel no sis- tema de estratificação da sociedade. Além disso, os recursos da família afetam a capacidade dos filhos de buscarem determinadas oportunidades, como educação superior e aulas especiais. Tradicionalmente, a família tem exercido uma série de outras funções, como oferecer treinamento religioso, educação e lazer. Mas Ogburn argumentou que outras instituições sociais gradativamente assumiram muitas dessas funções. Em certa época, a educação era dada no seio da família. Hoje ela é responsabilidade de profissio- nais que trabalham em escolas e faculdades. Até mesmo a tradicional função recreativa da família foi transferida para grupos de fora, como os clubes atléticos e salas de bate-papo da Internet. Teoria do Conflito Os teóricos do conflito vêem a família não como uma en- tidade que contribui para a estabilidade social, mas como um reflexo da riqueza e do poder desiguais que observa- mos nas sociedades maiores. As feministas e os teóricos do conflito observam que a família legitimou e perpetuou o domínio masculino. Durante a maior parte da história humana – e em uma vasta gama de sociedades –, os mari- dos exerceram uma autoridade e um poder esmagadores na família. Só depois da primeira onda de feminismo contemporâneo nos Estados Unidos, na metade do sé- culo XIX, o status histórico das mulheres e das crianças como propriedade legal dos maridos foi questionado de maneira relevante. Embora a família igualitária se tenha tornado um padrão mais comum nos Estados Unidos nas últimas décadas – decorrência, em grande parte, do ativismo das feministas no final da década de 1960 e início da década de 1970 –, a preponderância masculina na família não desapareceu. Os sociólogos observaram que as mulheres têm uma probabilidade muito maior de deixarem o seu emprego quando seus maridos encontram oportunidades de emprego melhores do que os homens quando suas mulheres recebem ofertas de emprego atraentes (Bielby e Bielby, 1992). E, infelizmente, muitos maridos reforçam o seu poder e controle sobre suas esposas e seus filhos com atos de violência doméstica. O Quadro 12-1 analisa dados sobre violência em casa em diversas culturas. Os teóricos do conflito também encaram a família como uma unidade econômica que contribui para a in- p. 16 Capitulo 12.indd 305 23/10/13 15:06 306 Capítulo 12 justiça social. A família é a base para a transferência de poder, propriedade e privilégios de uma geração para outra. Os Estados Unidos são vistos como uma terra de oportunidades, mas a mobilidade social é restrita de modo significativo. Os filhos herdam o status privilegiado ou menos privilegiado de seus pais (e, em alguns casos, de gerações anteriores também). Como assinalam os teóricos do conflito, a classe social dos pais influencia bastante as experiências de socialização dos filhos e o grau de proteção que recebem. Isso significa que o status socioeconômico da família de uma criança terá uma influência marcante na sua nutrição, assistência médica, moradia, nas oportunidades de educação e, em vários aspectos, nas suas oportunidades de vida na idade adulta. Por esse motivo, os teóricos do conflito argumen- tam que a família ajuda a manter a desigualdade. Teoria interacionista Os interacionistas se concentram no âmbito micro da família e outros relacionamentos íntimos. Estão interes- sados na maneira como as pessoas interagem umas com as outras, ou parceiras de coabitação ou casais casados há muito tempo. Por exemplo, em um estudo de domicílios de brancos e negros com pai e mãe, os pesquisadores des- cobriram que, quando os pais estão mais envolvidos com seus filhos (lendo para eles, ajudando-os com a lição de Fonte: American Bar Association, 1999; Gelles e Gornell, 1990; Heise et al., 1999; Rennison e Welchans, 2000; Spindel et al., 2000; Valdez 1999; J. J. Wilson, 2000. p. 220-222 O telefone toca duas ou três dezenas de vezes por dia na Hotline Ami-gos da Família em San Salvador, a capital de El Salvador. Sempre que o staff recebe uma queixa de violência familiar, uma equipe para crises é despachada imediatamente para a casa da pessoa que ligou. Quem trabalha nos casos ofe- rece consolo às vítimas e reúne provas para usar na acusação do agressor. Nos primeiros três anos de sua existência, o Amigos da Família lidou com 28 mil casos de violência doméstica. Agredir fisicamente a mulher e outras formas de violência doméstica não são práticas restritas aos homens de El Salva- dor. Com base em estudos realizados no mundo todo, é possível fazer as seguintes generalizações: • As mulheres correm mais risco de violência por parte de homens conhecidos. • A violência contra as mulheres ocorre em todos os grupos socioeconômicos. • A violência familiar é tão perigosa quanto ataques feitos por estranhos. • Embora as mulheres às vezes apresentem comportamento violento em relação aos homens, a maioria dos atos violentos que pode causar ferimentos é praticada por homens contra mulheres. • A violência em relacionamentos íntimos tende a aumentar com o decorrer do tempo. • A agressão emocional e psicológica pode ser tão debilitadora quanto a agressão física. • O uso de álcool exacerba a violência familiar, mas não a provoca. Utilizando os modelos do conflito e feminista, pesquisadores descobriram uma queixa para cada 25 crianças. Um outro estudo nacional descobriu que um milhão de crimes violentos por ano são cometidos por cônjuges, namorados ou namoradas atuais ouantigos. No Brasil, os principais casos aten- didos nas Delegacias Especializadas de Defesa da Mulher são: lesão corporal, estupro, atentado violento ao pudor, rapto, ameaça, calúnia, difamação e injúria. Pes- quisa da Organização Mundial da Saúde divulgada em 2005 aponta que 29% das mulheres brasileiras relataram ter sofrido violência física ou sexual pelo menos uma vez na vida e 16% classificaram a agressão como violência grave, isto é, ser chutada, arrastada pelo chão ou ameaçada ou fe- rida com qualquer tipo de arma. Em 2005, só nas delegacias especializadas de atendi- mento à mulher de São Paulo foram re- gistrados 310.058 boletins de ocorrência. Vamos Discutir 1. Você conhece alguma família na qual já ocorreu violência domés- tica? A(s) vítima(s) procurou(aram) ajuda de fora e, em caso afirmativo, ela foi eficaz? 2. Por que o grau de igualdade em um relacionamento pode estar ligado à probabilidade de violência domés- tica? Como os teóricos do conflito explicam esse resultado? que, nos relacionamentos nos quais a desigualdade entre homens e mulheres é grande, a probabilidade de ataque às esposas aumenta drasticamente. Essa descoberta indica que grande parte da violência entre pessoas que são íntimas, mesmo quando de natureza sexual, re- fere-se mais ao poder do que ao sexo. A família pode ser um lugar perigoso não só para as mulheres, mas para as crianças e os idosos também. Em 2000, órgãos públicos nos Estados Unidos re- ceberam mais de 3 milhões de queixas de violência e negligência praticadas contra crianças. Isso significa que foi realizada A família pode ser um lugar perigoso não só para as mulheres, mas para as crianças e os idosos também. Sociologia na Comunidade global 12-1 vIOLênCIA DOMéSTICA 306 Capitulo 12.indd 306 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 307 casa ou restringindo o tempo que assistem à televisão), as crianças têm menos problemas de comportamento, dão- se melhor umas com as outras e são mais responsáveis (Mosley e Thomson, 1995). Um outro estudo interacionista analisou o papel do padrasto ou da madrasta. A quantidade cada vez maior de pais e mães solteiros que se casam novamente despertou o interesse naqueles que estão ajudando a criar os filhos dos outros. Estudos revelaram que as madrastas têm mais probabilidade do que os padrastos de aceitar a culpa pelo mau relacionamento com os seus enteados. Os interacio- nistas são de opinião que os padrastos (como a maioria dos pais) podem não estar acostumados a interagir dire- tamente com crianças quando a mãe não está presente (Bray e Kelly, 1999; Furstenberg e Cherlin, 1991). Visão Feminista Pelo fato de o “trabalho de mulher” tradicionalmente ter- se concentrado na vida familiar, os sociólogos feministas se interessaram muito pela família como uma instituição social. Como vimos no Capítulo 11, as pes- quisas sobre o papel dos sexos no cuidar dos filhos e nas tarefas domésticas foram vastas. Os sociólogos analisaram em particular detalhes como o fato de as mulheres traba- lharem fora afetar o seu cuidado dos filhos e suas tarefas domésticas – deveres que Arlie Hochschild (1989, 1990) chamou de “segundo turno”. Atualmente, os pesquisadores reconhecem que, para muitas mulheres, o segundo turno inclui cuidar dos pais que estão envelhecendo. Os teóricos do feminismo exortaram os cientistas sociais e órgãos sociais a repensar o conceito que as fa- mílias nas quais não há um homem adulto presente são automaticamente um motivo de preocupação ou até de problemas. Também contribuíram para pesquisas sobre mulheres solteiras, domicílios só com o pai ou só com a mãe e casais de lésbicas. No caso das mães solteiras, os pesquisadores se concentraram na resiliência de vários desses domicílios, apesar do estresse econômico. Segundo Velma McBride Murray e seus cols. (2001) na University of Georgia, esses estudos mostram que, entre os negros, as mães solteiras dependem muito dos parentes para obter recursos materiais, conselhos sobre o papel de mãe e apoio social. Analisando as pesquisas feministas sobre a família como um todo, um estudioso concluiu que a família é a “fonte da força das mulheres” (L. Richardson et al., 2004). Por fim, as feministas enfatizam a necessidade de investigar tópicos negligenciados nos estudos sobre a família. Por exemplo, em uma quantidade pequena mas significativa de domicílios com duas rendas, a mulher ga- nha mais do que o marido. A socióloga Suzanne Bianchi estima que em 11% dos casamentos a mulher ganha pelo menos 60% da renda da família. Porém, além dos estudos de casos individuais, pouco se pesquisou sobre como essas famílias podem diferir daquelas nas quais o marido é o principal provedor (Tyre e McGinn, 2003, p. 47). A Tabela 12-1 resume as quatro principais perspecti- vas teóricas sobre a família. cASAMEntO E fAMílIA Hoje, cerca de 90% de todos os homens e mulheres nos Estados Unidos se casam pelo menos uma vez na vida. Historicamente, o aspecto mais constante da vida familiar nesse país foi o alto índice de casamentos. Na verdade, apesar do alto índice de divórcios, há alguns indícios de um miniboom de casamentos tardios. Nesta parte do capítulo, iremos analisar vários as- pectos do amor, do casamento e de ser pai ou mãe nos Estados Unidos e compará-los com exemplos de outras culturas. Embora estejamos acostumados a pensar no romance e na seleção de parceiros como uma questão estritamente de preferência individual, a análise socioló- gica nos diz que as instituições sociais e normas e valores culturais distintos também têm um papel importante. Paquera e Seleção de Parceiros “Os meus parceiros de rúgbi se revirariam nos seus tú- mulos”, diz Tom Buckley da sua paquera on-line e do Os interacionistas estão particularmente interessados nas formas como os pais e as mães se relacionam uns com os outros e com os seus filhos. Essa mãe e os seus dois filhos estão expressando uma relação íntima e carinhosa, que é uma das bases de uma família forte. p. 283 Capitulo 12.indd 307 23/10/13 15:06 308 Capítulo 12 quanto em outros países (ver Figura 12-2). Aspectos da Seleção de Parceiros Muitas sociedades têm normas explícitas ou implícitas que de- finem possíveis parceiros como aceitáveis ou inaceitáveis. Essas normas podem ser diferenciadas em termos de endogamia e exoga- mia. A endogamia (do grego en- dom, dentro) especifica os grupos nos quais se pode encontrar um parceiro e proíbe casamento com outros. Por exemplo, nos Estados Unidos, espera-se que as pessoas se casem dentro do seu próprio grupo racial, étnico ou religioso, e elas são firme- mente dissuadidas ou até proibidas de se casarem fora do seu grupo. A endogamia visa reforçar a coesão do grupo sugerindo aos jovens que devem casar-se com alguém “do mesmo nível”. Opostamente, a exogamia (do grego exo, fora) exige que a seleção de parceiros seja feita fora de determinados grupos, geralmente fora da própria família ou de deter- minada parentela. O tabu do incesto, uma norma social comum a quase todas as sociedades, proíbe relacionamen- tos sexuais entre determinados parentes culturalmente especificados. Para as pessoas nos Estados Unidos e no Brasil, por exemplo, esse tabu significa que elas têm de se casar fora da família nuclear. Não podem casar-se com seus irmãos e, na maioria dos estados norte-americanos, é proibido o casamento entre primos de primeiro grau. As restrições endogâmicas podem ser encaradas como preferências por um grupo em detrimento de ou- tros. Nos Estados Unidos, essas preferências ficam mais evidentes nas barreiras raciais. Até a década de 1960, al- guns estados declararam casamentos inter-raciais ilegais. Mesmo assim, a quantidade de casamentos entre negros e brancos no país aumentou mais de sete vezes nas últi- mas décadas, saltando de 51 mil em 1960 para 395 mil em 2002. Além disso, 25% das mulheres ásio-americanas e 12% dos homens ásio-americanos secasaram com al- guém que não possui ascendência asiática. O casamento com outras etnias é ainda maior entre os hispânicos: 27% de todos os hispânicos casados têm um cônjuge não-his- pânico. Porém, embora todos esses exemplos de exoga- mia racial sejam dignos de nota, a endogamia continua sendo a norma social nos Estados Unidos (Bureau of the Census, 1998, 2003a, p. 59). O Relacionamento Amoroso A geração atual de alunos universitários aparentemente tem maior probabilidade de “ficar” ou fazer cruzeiros em grandes pacotes do que seus pais e avós. Mesmo assim, subseqüente casamento com Terri Muir. Mas Tom e Terri não estão sozinhos no ato de acessar a Internet para par- ticipar de serviços de namoro. Há uma ou duas gerações, os casais se conheciam no colégio ou na faculdade, mas agora que as pessoas estão se casando mais tarde, a Inter- net se tornou o novo local de encontro para quem está inclinado a um romance. Hoje em dia, milhares de sites se oferecem para ajudar as pessoas a encontrar parceiros e todo mês 45 milhões de acessantes só nos Estados Unidos os visitam. Não obstante as histórias de sucesso, como a dos Muirs, esses serviços de namoro on-line são tão bons quanto as pessoas que os utilizam: os perfis pessoais dos assinantes – a base para possíveis namoros – em geral contêm informações falsas ou enganosas (Harmon, 2003; B. Morris, 1991, p. D1). O romance pela Internet é apenas a prática mais re- cente de paquera. No Uzbequistão, país da Ásia Central, e em várias outras culturas tradicionais desse continente, a paquera é definida, em grande parte, pela interação de dois casais de pais e mães, que arranjam casamentos para os seus filhos. Normalmente, uma jovem uzbequistanesa é educada para aguardar com ansiedade o seu casamento com um homem que viu apenas uma vez, ou seja, quando ele é apresentado à sua família no momento da inspeção final do dote dela. Nos Estados Unidos, por sua vez, a paquera é feita basicamente por pessoas que têm interesse romântico umas pela outras. Nessa cultura, a paquera exige que os interessados se baseiem muito em jogos, gestos e sinais intrincados. Apesar dessas diferenças, seja nos Estados Unidos, no Uzbequistão ou em outro lugar, a paquera é influenciada pelas normas e pelos valores de uma sociedade maior (C. J. Williams, 1955). Uma tendência inequívoca na seleção de parceiros é que o processo aparentemente está levando mais tempo hoje do que no passado. Uma série de fatores, incluindo a preocupação com a segurança financeira e a inde- pendência pessoal, contribuiu para esse adiamento do casamento. A maioria das pessoas hoje tem bem mais do que 20 anos quando se casam, tanto nos Estados Unidos Funcionalista A família como entidade que contribui para a estabilidade social Papéis dos membros da família Conflito A família como entidade que perpetua a desigualdade Transmissão da pobreza ou da riqueza pelas gerações Interacionista Os relacionamentos entre os membros da família Feminista A família como entidade que perpetua o papel dos sexos Domicílios chefiados por mulheres Perspectiva Teórica Ênfase R es u m in d o Tabela 12-1 teorias Sociais sobre a família Capitulo 12.indd 308 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 309 em algum momento da sua vida adulta, a grande maioria dos alunos de hoje irá encontrar alguém que ama e se envolver em um relacionamento de longo prazo que se concentra em criar uma família. Os pais nos Estados Unidos tendem a valorizar o amor como justificativa para o casamento e incentivam seus filhos a criar relacionamentos íntimos com base no amor e no afeto. Músicas, filmes, livros, revistas, progra- mas de televisão e até desenhos animados e histórias em quadrinhos reforçam o tema do amor. Ao mesmo tempo, a sociedade norte-americana espera que os pais e os cole- gas ajudem a pessoa a confinar a sua busca de um parceiro a membros “socialmente aceitáveis” do sexo oposto. A maioria das pessoas nos Estados Unidos considera natural a importância de se apaixonar, mas a junção de amor e casamento não é de maneira nenhuma uma uni- versalidade cultural. Muitas culturas do mundo dão prio- ridade à seleção de outros fatores além dos sentimentos românticos. Nas sociedades com casamentos arranjados pelos pais ou por autoridades religiosas, as considerações econômicas têm um papel importante. Supõe-se que o ca- sal recém-constituído desenvolva um sentimento de amor depois da formalização da união legal, se é que tanto. Mesmo nos Estados Unidos, algumas subculturas continuam com as práticas de casamento arranjado das suas culturas nativas. Entre os sikhs e os hindus que imigraram da Índia, entre os muçulmanos e os judeus hassídicos, os jovens permitem que seus pais ou casamen- teiras designadas encontrem seu (sua) parceiro(a) em sua comunidade étnica. Como declarou um jovem sikh: “Eu, com certeza, vou me casar com a pessoa que meus pais querem que eu case. Eles me conhecem melhor do que eu me conheço”. Jovens que emigraram sem as suas famílias geralmente recorrem à Internet para encontrar parceiros que tenham o seu histórico e suas metas. Os anúncios matrimoniais para a comunidade hindu são veiculados em sites, como SuitableMatch.com e Indolink.com. Como observou uma jovem judia hassídica, o sistema de casa- mentos arranjados “não é perfeito e não funciona para todo mundo, mas esse é o sistema que conhecemos e no Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Homens Mulheres Estados Unidos México Polônia Israel Finlândia Egito Canadá Austrália 10,6 21,6 10,8 25,1 11,9 56,1 5,1 11,7 32,4 39,5 38,9 54,6 22,9 52,1 19,3 33,2 FigurA 12-2 Porcentagem de Pessoas de 20 a 24 Anos que se Casaram pelo menos uma vez, Países Selecionados Pense nisto Por que a porcentagem de moças casadas é particularmente alta no Egito, no México e na Polônia? E particularmente baixa na Finlândia? Fonte: United nations Population Division, 2001a. As uniões inter-raciais, cada vez mais comuns e aceitas, estão dificultando as definições de raça. Os filhos desse casal inter-racial seriam considerados negros ou brancos? Capitulo 12.indd 309 23/10/13 15:06 310 Capítulo 12 qual confiamos, a maneira como arrumamos parceiros e aprendemos a amar. Portanto, ele funciona para a maioria de nós (R. Segall, 1998, p. 48, 53). Os seus pais e/ou casamenteiras vão arranjar um casamento para você. Que tipo de pessoa vão selecionar? As chances de você ter um casamento bem-sucedido serão maiores ou menores do que se você próprio selecionasse seu cônjuge? Variações na Vida Familiar e relacionamentos Íntimos Nos Estados Unidos, a classe social, a raça e a etnia criam variações na vida familiar. Estudar essas variações pro- porciona uma compreensão mais sofisticada dos estilos contemporâneos de família nesse país. Diferenças de Classe Social Vários estudos documentaram as diferenças na organiza- ção familiar entre as classes sociais nos Estados Unidos. Na classe mais alta, a ênfase é dada à linhagem e à manutenção da posição familiar. Se você pertence à classe alta, não é apenas um membro de uma família nuclear, mas um mem- bro de uma tradição familiar maior (pense nos Rockfellers ou nos Kennedys). Portanto, as famílias da classe alta se preocupam muito com o que consideram um treinamento adequado para os seus filhos. As famílias das classes mais baixas geralmente não têm o luxo de se preocupar com o “nome da família”; sua prioridade é lutar para pagar as contas e sobreviver a crises em geral associadas a uma vida de pobreza. A probabilidade de ter apenas um dos pais em casa é maior, o que cria desafios especiais no tocante ao cuidar dos filhos e às finanças. Os filhos das famílias da classe mais baixa geralmente assumem responsabilidades de adultos – incluindo o casamento e a maternidade ou paternidade – mais cedo do que as crianças de classerica. Isso ocorre, parcialmente, porque podem não ter o dinheiro necessá- rio para continuar na escola. As diferenças de classes sociais na vida familiar são menos notáveis hoje em dia do que antigamente. No passado, os especialistas em família concordavam que o contraste nas práticas de educação das novas gerações era pronunciado. Observou-se que as famílias de classes mais baixas eram mais autoritárias na criação dos filhos e mais propensas a utilizar castigo físico. As famílias de classe média eram mais permissivas e mais contidas na puni- ção a suas crianças. No entanto, essas diferenças podem ter diminuído à medida que uma quantidade cada vez maior de famílias de todas as classes sociais recorria aos mesmos livros, revistas e até programas de televisão para obter conselhos sobre como educar seus filhos (Kohn, 1970; Luster et al., 1989). Entre os pobres, as mulheres têm um papel impor- tante no apoio financeiro da família. Os homens podem ganhar salários baixos, estar desempregados ou total- mente ausentes da família. Em 2003, 28% de todas as famílias chefiadas por mulheres sem marido presente se encontravam abaixo da linha de pobreza do governo. Esse índice para os casais casados era de apenas 5,4% (DeNa- vas-Walt et al., 2004, p. 10). Muitos grupos raciais e étnicos aparentemente têm características familiares distintas. Porém, os fatores ra- ciais e de classe social, em geral, estão ligados. Quando se examina a vida familiar entre as minorias raciais e ét- nicas, é preciso ter em mente que determinados padrões podem resultar de fatores associados à classe social e culturais também. Diferenças Raciais e Étnicas O status subordinado das minorias raciais e étnicas nos Estados Unidos afeta profundamente suas vidas familia- res. Por exemplo, os negros com renda mais baixa, os ín- dios norte-americanos e a maioria dos grupos hispânicos e grupos asiáticos selecionados consideram criar e manter uniões matrimoniais bem-sucedidas uma tarefa difícil. A reestruturação econômica dos últimos 50 anos, descrita pelo sociólogo William Julius Wilson (1996) e outros, afetou principalmente as pessoas que moram em cidades do interior e áreas rurais desertas, como as reservas. Além disso, a política de imigração dos Estados Unidos complicou a mudança de famílias intactas da Ásia e da América Latina. A família negra sofre de vários estereótipos negativos e errôneos. É verdade que, em uma proporção conside- ravelmente maior de famílias negras, o marido não está presente em casa (ver Figura 12-3). No entanto, as mães solteiras negras em geral pertencem a redes de parentes estáveis e funcionais, apesar das pressões do sexismo e do racismo. Os membros dessas redes – predominantemente parentes mulheres, como mães, avós e tias – aliviam a pressão financeira compartilhando bens e serviços. Além desses fortes laços familiares, a vida familiar dos negros vem enfatizando um profundo compromisso religioso e grandes aspirações de realização. Os pontos fortes dessas famílias ficaram evidentes durante a escravidão, quando os negros demonstraram uma extraordinária capacidade de manter laços familiares apesar do fato de não terem proteção legal e, na verdade, freqüentemente serem for- çados a se separar (Willie e Reddick, 2003). Como os negros, os índios norte-americanos se baseiam nos elos familiares para amortecer muitas das dificuldades que enfrentam. Na reserva navajo, por exem- plo, ser pai ou mãe na adolescência não é encarado como crise no mesmo grau que em outras partes dos Estados Unidos. Os navajo delineiam a sua descendência matri- linearmente. Os casais moram com a família da mulher após o casamento, o que permite que os avós ajudem na Use a Sua Imaginação Sociológica p. 218 Capitulo 12.indd 310 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 311 criação de filhos. Embora os navajo não aprovem a gravi- dez na adolescência, o profundo compromisso emocional de suas famílias estendidas proporciona um ambiente caloroso em casa para as crianças sem pai (Dalla e Gam- ble, 2001). Os sociólogos também observaram diferenças nos padrões familiares entre outros grupos raciais e étnicos. Por exemplo, os homens norte-americanos de origem mexicana são descritos como viris e tendo valor pessoal e orgulho da sua hombridade, o que é denominado machismo. Os norte-americanos de origem mexicana também são descritos como mais ligados à família do que várias outras subculturas. O familismo se refere ao orgulho da família estendida, que é expresso pela ma- nutenção de laços estreitos e fortes obrigações para com os parentes fora da família imediata (o núcleo familiar). Tradicionalmente, os norte-americanos de origem mexi- cana colocam a proximidade com a sua família estendida acima de outras necessidades e desejos. Porém, esses padrões familiares estão mudando em resposta às mudanças no status social, nos feitos na área de educação e nas profissões dos latinos. Como os outros norte-americanos, os latinos voltados para a carreira e em busca de parceiros mas com pouco tempo livre estão recorrendo aos sites da Internet. À medida que os latinos e outros grupos vão assimilando a cultura dominante nos Estados Unidos, a sua vida familiar adquire as caracterís- ticas positivas e negativas associadas aos domicílios dos brancos (Becerra, 1999; Vega, 1995). Padrões de Criação de Filhos na Vida Familiar Os nayars do sul da Índia reconhecem o papel biológico dos pais, mas o irmão mais velho da mãe é responsável pelos filhos dela. Ao contrário, os tios têm apenas um papel periférico no cuidado das crianças nos Estados Unidos. Tomar conta de crianças é uma função universal da família. No entanto, a forma como as diversas socie- dades atribuem essa função aos membros familiares pode variar muito. Mesmo nos Estados Unidos, os padrões de criação de filhos variam. Aqui iremos analisar o fato de ser pai, mãe, avô ou avó, a adoção, as famílias com duas rendas, as famílias de pais e mães solteiros e as famílias substitutas. O Papel de Pai, Mãe, Avô e Avó A socialização das crianças é fundamental para a manu- tenção de qualquer cultura. Conseqüentemente, ser pai ou mãe é um dos papéis sociais mais importantes (e que mais exige) nos Estados Unidos. A socióloga Alice Rossi (1968, 1984) identificou quatro fatores que complicam a transição para a condição de pai ou mãe e o papel da so- cialização. Primeiro, há pouca socialização antecipatória para o papel de cuidador(a). O currículo p. 91 Famílias com pai e mãe Famílias só com a mãe sustentadas pela mãe Asiáticos ou das Ilhas do Pacífico Famílias só com o pai sustentadas pelo pai 2000 79% 14% 7% 1970 1970 1970 89% 9% 2% 4% 68% 28% 81% 15% 4% Brancos Afro-americanos Hispânicos 2000 65% 26% 9% 2000 45% 47% 8% 2000 79% 16% 5% 1980 84% 11% 5% FigurA 12-3 Aumento de Famílias só com Pais ou só com Mães nos Estados Unidos, 1970–2000 Nota: “Filhos” se referem a menores de 18 anos. não estão incluídas pessoas sem parentesco que moram juntas sem a presença de crianças. Os dados iniciais sobre norte-americanos de origem asiática são de 1980. Fonte: Bureau of the Census, 1944, p. 63; Fields, 2001, p. 7. Famílias só com a mãe sustentadas pela mãe 7% Como grupo , os domic ílios d os no rte- americ anos d e orig em asiátic a são semel hantes aos do s bran cos Capitulo 12.indd 311 23/10/13 15:06 312 Capítulo 12 escolar normal dá atenção restrita aos assuntos mais importantes para a vida familiar bem-sucedida, como o cuidar de crianças e manter a casa. Em segundo lugar, há apenas um aprendizado limitado durante o período da gravidez em si. Em terceiro, a transição para a pater- nidade ou maternidade é bem abrupta. Ao contrário da adolescência, ela não é prolongada, diversa da transição para o trabalho, os deveres de tomar conta não podem ser cumpridos gradativamente. Por fim, na opinião de Rossi, a sociedade norte-americana precisa dediretrizes claras e úteis para uma paternidade ou maternidade bem-sucedida. Há pouco consenso quanto a como os pais podem criar filhos felizes e bem ajustados – ou mesmo sobre o que significa ser bem ajustado. Por esses motivos, o preparo para ser pai ou mãe envolve desafios difíceis para a maioria dos homens e das mulheres nos Estados Unidos. Um avanço recente na vida familiar nos Estados Unidos é a extensão do papel de pai ou mãe, na medida em que filhos adultos continuam morando em casa ou voltam para ela após a faculdade. Em 2000, 56% dos ho- mens e 43% das mulheres de 18 a 24 anos moravam com seus pais. Alguns desses filhos adultos ainda buscavam uma educação, porém, em muitos casos, as dificulda- des financeiras estavam no âmago desses arranjos de moradia. Enquanto os aluguéis e os preços dos imóveis subiram assustadoramente, os salários dos trabalhado- res mais jovens não acompanharam esse crescimento e muitos deles se vêem sem condições de pagar pelas suas próprias moradias. Além disso, com muitos casamentos acabando em divórcio – mais nos primeiros sete anos de união –, os filhos e filhas divorciados geralmente voltam a morar com seus pais, às vezes com seus próprios filhos (Fields, 2003). Esse arranjo de moradia é um avanço positivo para os membros da família? Os cientistas sociais apenas co- meçaram a analisar o fenômeno, às vezes chamado de “geração bumerangue” ou “a síndrome do ninho cheio” na imprensa popular. Uma pesquisa na Virgínia aparen- temente mostrou que nem os pais nem os filhos adultos estavam contentes com o fato de continuar a viver juntos. Os filhos se sentiam ressentidos e isolados, mas os pais também sofriam: aprender a viver sem filhos em casa é uma fase fundamental da vida adulta e pode ser um momento decisivo para um casamento (Berkeley Wellness Letter, 1990; Mogelonsky, 1996). Em algumas casas, o ninho cheio abriga netos. Em 2002, 5,6 milhões de crianças, ou 8% de todas as crianças nos Estados Unidos, moravam em uma casa com um avô ou uma avó. Em cerca de um terço desses domicílios, não havia pai ou mãe presentes para assumir a responsabili- dade pelas crianças. Dificuldades especiais são inerentes nesses tipos de relacionamentos, incluindo preocupações legais com a custódia, questões financeiras e problemas emocionais tanto para os adultos quanto para os jovens. Não é de admirar que tenham surgido grupos de apoio, como “Avós como Pais”, para ajudar (Fields, 2003). Adoção No sentido legal, a adoção é um processo que permite a transferência dos direitos legais, das responsabilidades e dos privilégios de pai ou mãe “para novos pais ou mães” (E. Cole, 1985, p. 638). Em muitos casos, esses direitos são transferidos dos pais biológicos para os pais adotivos. Da perspectiva funcionalista, o governo tem muito interesse em incentivar a adoção. Na verdade, os elabora- dores de política têm interesse humanitário e financeiro no processo. Teoricamente, a adoção oferece um am- biente familiar estável para crianças que de outra maneira não receberiam cuidados satisfatórios. Além disso, os dados do governo mostram que as mães solteiras que ficam com os seus bebês tendem a ser de um status so- cioeconômico mais baixo e requerem ajuda pública para sustentar os seus filhos. Então, o governo poderia reduzir as suas despesas com assistência social se as crianças fos- sem transferidas para famílias auto-suficientes economi- camente. Porém, da perspectiva interacionista, a adoção pode exigir que a criança se ajuste a um ambiente familiar e uma maneira de criar filhos muito diferentes. Cerca de 4% de toda a população dos Estados Unidos é adotada, e cerca de metade dessas adoções foi feita por indivíduos sem parentesco com as pessoas adotadas na época do seu nascimento. Existem, nos Estados Unidos, dois métodos legais de se adotar uma pessoa que não é parente: a adoção pode ser feita por intermédio de uma agência licenciada ou, em alguns estados, mediante um acordo particular sancionado pelos tribunais. As crianças adotadas podem vir dos Estados Unidos ou do exterior. Em 2003, mais de 21 mil crianças entraram no país como filhos adotivos de cidadãos norte-americanos (Children’s Bureau, 2003; Department of State, 2004; Fisher, 2003). Em alguns casos, as pessoas que adotam não são casadas. Em 1995, uma importante decisão de um tribu- nal de Nova York determinou que um casal não tem de ser casado para adotar uma criança. De acordo com essa decisão, casais heterossexuais não-casados, casais de lés- bicas e casais de gays podem adotar legalmente crianças em Nova York. Escrevendo para a maioria, a juíza Judith Kaye argumentou que, ampliando os limites de quem pode ser legalmente reconhecido como pai ou mãe, o Estado poderia ajudar mais crianças assegurando “o me- lhor lar possível”. Com essa decisão, Nova York se tornou o terceiro Estado (depois de Vermont e Massachusetts) a reconhecer o direito de casais não-casados de adotar filhos (Dão, 1995). Para cada criança adotada, muitas mais continuam nas alas de serviços de proteção à criança patrocina- dos pelo Estado. Em qualquer momento tomado para medição, mais de meio milhão de crianças nos Estados Unidos estão vivendo em lares adotivos. Essas crianças Capitulo 12.indd 312 23/10/13 15:06 Os Relacionamentos Íntimos 313 geralmente mudam de uma família para outra durante a sua infância e adolescência. Todo ano, cerca de 20 mil delas chegam à idade de 18 anos e entram na fase adulta sem o apoio financeiro ou emocional de uma família permanente (Children’s Bureau, 2002; C. J. Williams, 1999). Famílias de Duas Rendas A noção de uma família ser composta de um marido que ganha salário e de uma mulher que fica em casa foi subs- tituída pelo domicílio de duas rendas. Entre as pessoas casadas com 25 a 34 anos de idade, 92% dos homens e 75% das mulheres estavam no mercado de trabalho em 2002. Por que houve um aumento na quantidade de casais com duas rendas? Um fator importante é a necessidade financeira. Em 2003, a renda média dos domicílios com ambos os cônjuges empregados era 99% mais do que nos domicílios nos quais apenas uma pessoa estava tra- balhando fora de casa (US$ 71.496 contra US$ 35.977). Evidentemente, em razão das despesas relacionadas ao trabalho, como creche, nem todo o segundo salário de uma família é uma renda de fato adicional. Entre os ou- tros fatores que contribuíram para o aumento do modelo de duas rendas estão a queda na taxa de natalidade, o aumento na proporção de mulheres com educação uni- versitária, a mudança na economia norte-americana de indústria de fabricação para serviços e o impacto do mo- vimento feminista na transformação da consciência das mulheres (DeNavas-Walt et al., 2004, tabela HINC-01). Famílias só com o pai ou só com a mãe Nos Estados Unidos, no final do século XIX, a imigração e a urbani- zação tornaram cada vez mais difí- cil manter as comunidades do tipo Gemeinschaft, onde todo mundo conhecia todo mundo e comparti- lhava a responsabilidade pelas mães solteiras e seus filhos. Em 1883, foram fundadas as Casas Florence Crittenton na cidade de Nova York – e posteriormente em todo o país – como refúgio para prostitutas (na época, estigmatizadas como “mulhe- res desonradas”). Em pouco tempo as casas Crittenton começaram a aceitar mães solteiras como mora- doras. No início da década de 1900, o sociólogo W. E. B. Du Bois (1911) observou que a institucionalização das mães solteiras estava ocorrendo nas famílias segregadas. Na época em que ele estava escrevendo, havia sete casas para mães solteiras negras, bem como uma casa Crittenton para esse fim. Nas últimas décadas, o estigma associado a mãe sol- teiras e outros pais solteiros diminuiu consideravelmente. As famílias só com o pai ou só com a mãe, nas quais só o pai ou só a mãe está presente para cuidar dos filhos, difi- cilmente pode ser considerada uma raridade nos Estados Unidos. Em 2000, cerca de 21% das famíliasde brancos com filhos menores de 18 anos, 35% das famílias hispâni- cas com filhos e 55% das famílias negras com filhos (ver Figura 12-3) eram chefiadas só pelo pai ou só pela mãe. As vidas dos pais e mães solteiros e seus filhos não são mais difíceis do que a vida em uma família nuclear tradicional. É errado pressupor que uma família só com O pai cuida do café da manhã enquanto a mãe se apressa para o trabalho nessa família de duas rendas. Uma proporção cada vez maior de casais nos Estados Unidos rejeita o modelo de família nuclear tradicional do marido como o provedor e a mulher como a pessoa que cuida da casa. A maioria dos lares nos Estados Unidos não é composta de pai e mãe morando com seus filhos solteiros. Capitulo 12.indd 313 23/10/13 15:06 Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. O que é sociologia A imaginação sociológica Você é o que você tem? A sociologia e as ciências sociais Sociologia e senso comum O que é teoria sociológica? O desenvolvimento da sociologia As perspectivas teóricas mais importantes Perspectiva funcionalista Perspectiva do conflito Perspectiva interacionsita A abordagem sociológica Comparação das perspectivas teóricas mais importantes Desenvolvendo a imageinação sociológica A teoria na prática Pesquisa em ação
Compartilhar