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INSTRUMENTAÇÃO BIOMÉDICA Adriana Dalpicolli Rodrigues Controle da qualidade laboratorial Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever os objetivos do controle de qualidade laboratorial. � Identificar os parâmetros associados à avaliação interna e externa da qualidade laboratorial. � Analisar os parâmetros associados ao controle analítico da qualidade. Introdução Os resultados dos exames laboratoriais são muito importantes para a conduta diagnóstica e terapêutica dos pacientes. Por isso, é necessário que os laboratórios padronizem os processos, garantam a confiabilidade e a reprodutibilidade dos resultados, e diminuam a possibilidade de erros, para que fique próxima a 0% em todas as fases laboratoriais (pré-analítica, analítica e pós-analítica). O controle de qualidade tem esse objetivo e deve ser realizado de modo interno (amostras selecionadas ou adquiridas com o fabricante do reagente do teste) ou externo (amostras obtidas por cadastros em programas nacionais de qualidade), com amostras de referência no setor analítico do laboratório. Neste capítulo, você vai conhecer quais são os objetivos do controle de qualidade laboratorial, identificar os parâmetros associados à avalia- ção interna e externa da qualidade e também vai analisar os que estão associados ao controle analítico. Controle de qualidade laboratorial e seus objetivos O termo “qualidade” pode ser definido como excelência, valor, conformidade com especificações predefinidas (como leis, diretrizes, resoluções, programas de qualidade) ou atendimento às necessidades e expectativas dos clientes/ pacientes. A resolução voltada à qualidade dos serviços oferecidos pelos laboratórios é a Resolução de Diretoria Colegiada (RDC) n.º 302, de 31 de outubro de 2005, da Anvisa. Entretanto, a qualidade não tem mais somente a função de cumprimento da legislação vigente, ou seja, acabou se tornando um instrumento que faz parte do segmento da saúde, como os laboratórios de análises clínicas, na competição no mercado de trabalho, no custo-benefício do produto oferecido — no caso, resultado de exames e atendimento ao pa- ciente —, possibilidade de rastreabilidade dos procedimentos realizados, etc. A evolução dos sistemas de garantia da qualidade é evidente em razão da frequente pressão de ordem pública e privada (XAVIER; DORA; BARROS, 2016; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). De modo geral, o controle de qualidade, também conhecido como o controle do processo estatístico, é uma medida adotada nos laboratórios de análises clínicas com o objetivo de proporcionar melhoria contínua e padronização dos procedimentos realizados na rotina, assegurando a garantia da qualidade (refere-se ao conjunto de atividades planejadas e sistemáticas que são necessá- rias para promover a confiança de que a entidade atenderá os requisitos para a qualidade) de seus serviços ou produtos. O controle da qualidade compreende técnicas e atividades operacionais que se destinam a monitorar um processo e eliminar as causas de desempe- nho insatisfatório em todas as etapas do ciclo da qualidade. Essa ferramenta auxilia ao laboratório a “evitar falhas/erros” e, como consequência, evitar danos irreversíveis à saúde de um indivíduo. Em outras palavras, busca-se, com o controle de qualidade, a emissão de laudos/resultados o mais próximo da realidade do paciente (MCPHERSON; PINCUS, 2013; XAVIER; DORA; BARROS, 2016). Para se obter e manter a qualidade dos exames oferecidos em um labora- tório é necessária a padronização dos processos envolvidos, desde o acesso e a solicitação/requisição do profissional da saúde até a liberação do laudo do exame realizado pelo paciente. Para isso, é importante que sejam preparados procedimentos operacionais padrão (POPs) de todos os processos realiza- dos no laboratório e que tenham revisão anual para possíveis atualizações. Controle da qualidade laboratorial2 Isso permite que, mesmo que ocorra mudança de pessoal, as práticas sempre sejam realizadas da mesma maneira, desde o atendimento até a entrega final do laudo. Além disso, deve-se sempre procurar detectar as prováveis fontes de erro em cada processo e trabalhar com a prevenção e/ou correção dessas situações não conformes, de forma mais precoce possível. O objetivo principal é o estabelecimento de procedimentos para as diversas etapas laboratoriais que envolvem a realização de um exame, permitindo, assim, a monitoração e a análise das situações adversas àquelas normatizadas. Desse modo, costuma-se dividir o controle de qualidade em três fases: pré-analítica, analítica e pós- -analítica (XAVIER; DORA; BARROS, 2016; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). Fase pré-analítica A fase pré-analítica é composta por várias etapas, as quais: � prescrição do exame pelo médico ou demais profissionais da saúde; � preparação do paciente (jejum, repouso, medicação, dieta, etc.); � procedimentos que envolvem a coleta do sangue; � manipulação do material coletado (homogeneização, centrifugação); � armazenamento (controle de temperatura) da amostra antes da deter- minação analítica (realização do exame propriamente). A fase analítica é descrita como a principal responsável pelos erros laboratoriais (em torno de 68% a 93%), pois é mais difícil de ser controlada, quando comparada com as demais fases analítica e pós-analítica, que apresentam maior controle em razão da informatização e da automatização nos processos, que permitiram redução significativa do número de erros. É muito difícil de se ter controle em alguns eventos associados à fase pré- -analítica, pois, por exemplo, o paciente pode não realizar o preparo adequado (como jejum insuficiente) para a coleta do exame e relatar, no laboratório, que fez tudo conforme recomendações. Outras situações que podem ocorrer são as seguintes: 3Controle da qualidade laboratorial � solicitação errada feita pelo médico; � ilegibilidade da requisição; � identificação equivocada das amostras obtidas do paciente; � erro cadastral; � coleta de amostras em tubos errados, por exemplo, coletar um hemo- grama em tubo de soro em vez de tubo de sangue total, o que impos- sibilita a realização do exame; � coagulação de amostra de sangue total; � não homogeneização das amostras, o que propicia a formação de coá- gulos ou microcoágulos; � volume insuficiente de amostra; � garroteamento prolongado do braço do paciente, o que predispõe à agregação plaquetária ou ao aumento na concentração de determinados metabólitos; � hemólise, lise das hemácias, que deixa a amostra avermelhada; � transporte e armazenamento da amostra em temperatura inadequada ou por tempo prolongado. Para evitar esses problemas é preciso se cercar de procedimentos e controles bem definidos, que busquem aumentar a segurança e a confiabilidade dessa fase. A educação continuada dos profissionais que realizam o atendimento, a coleta e manipulam as amostras também se mostra extremamente importante. Taxas elevadas de rotatividade de pessoal de atendimento e coleta, negligên- cia, falta de entendimento sobre boas práticas em laboratório e treinamento insuficiente também são fatores que contribuem diretamente para as falhas da fase pré-analítica e que dificultam que o objetivo do controle de qualidade seja atingido (XAVIER; DORA; BARROS, 2016; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). Fase analítica A fase analítica tem início com a validação do sistema analítico por meio do controle da qualidade interno e é finalizada quando a determinação analítica gera o resultado do exame em questão. Erros laboratoriais nessa fase podem chegar a 16%. Os avanços tecnológicos, envolvendo automação em vez de testes manuais, e o desenvolvimento de novas metodologias permitiram melhora significativa da reprodutibilidade dos dados. Outros fatores também contri-buíram, como a maior segurança quanto à manipulação de fluidos biológicos com o uso de tubos primários nos equipamentos; aumento da capacidade de Controle da qualidade laboratorial4 produção de exames por hora; maior agilidade na liberação de resultados com confiabilidade; diminuição do volume de amostra e de reagentes necessários para as determinações analíticas, entre outros. Para a garantia da qualidade nessa fase é importante que sempre sejam considerados os seguintes aspectos: � modelo de reação do teste; � sensibilidade analítica (capacidade de detecção de analitos em baixas concentrações); � especificidade analítica (capacidade de determinação exclusiva do parâmetro desejado); � princípios de calibração e padronização; � otimização da reação; � rigor do procedimento analítico. Fatores que demonstram desempenho dos métodos, intervalo operacional ou linearidade (valor máximo detectável), precisão (capacidade de reprodução do resultado), recuperação, efeito de interferências e exatidão (resultados repre- sentativos da realidade do paciente) devem obrigatoriamente ser conhecidos, monitorados e constantemente avaliados pelos profissionais que realizam as análises nos laboratórios (XAVIER; DORA; BARROS, 2016). Fase pós-analítica A fase pós-analítica abrange os procedimentos realizados após a efetivação do exame, que são: � cálculo de resultados; � análise de consistência dos resultados; � liberação dos laudos; � armazenamento de material ou amostra do paciente � transmissão e arquivamento de resultados. Nessa fase, o desenvolvimento da tecnologia da informação promoveu um aumento significativo da qualidade, ao eliminar ou minimizar importantes fontes de erro, como letra/número ilegível, erros na conversão de unidades de medida (programas de conversão automática) e ausência de item exigido pela legislação para contemplar o laudo ao conseguir padronizar suas “máscaras”. 5Controle da qualidade laboratorial O sistema de interfaceamento de resultados, que é a transmissão da infor- mação do equipamento para o sistema de informática do laboratório, permitiu a redução significativa de erros nessa fase, visto que um dos principais erros são os de digitação. Erros que ainda podem ocorrer são associados a problemas no inter- faceamento do resultado no laudo, falta de informação sobre fatores interferentes na metodologia utilizada, entrega do resultado do exame fora do prazo contratado e interpretação equivocada do resultado pelo profissional da saúde que solicitou o exame. Os erros nessa fase correspondem a 9 a 19%. Algumas recomendações que podem ser seguidas para minimizar e/ou eliminar os erros potenciais da fase pós-analítica são as seguintes (XAVIER; DORA; BARROS, 2016): � atualizações periódicas nas “máscaras” dos laudos e/ou sempre que houver mudança de metodologia; � equipamento ou valores de referência; � realização de testes no sistema de liberação técnica e interfaceamento, objetivando identificar e rastrear possíveis falhas no sistema. Para melhor acompanhamento dos processos de todas as fases laboratoriais é importante que sejam utilizados indicadores de desempenho, que consistem em medições de processos. Somente é possível melhorar aquilo que se pode medir. Indicadores devem ter metas bem definidas, que agreguem valor ao pro- cesso, além de estarem representados em gráficos que demonstrem claramente a realidade encontrada. Quando os índices ultrapassam as metas estabelecidas, um plano de ação deve ser desenvolvido para que o problema seja corrigido e erros futuros sejam evitados. Alguns exemplos de indicadores que podem ser preparados são (VIEIRA et al., 2011; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018): � número de erros de cadastros de pacientes; � número de pacientes atendidos; � número de recoletas de amostras biológicas; � amostras solicitadas e não coletadas; � falhas na coleta; � problemas de transporte da amostra (temperatura inadequada); � índice de satisfação de clientes (conhecido por meio de pesquisas de satisfação médica, de pacientes ou de clínicas); � resultados entregues dentro do horário prometido; � sucesso na comunicação de resultados críticos; � percentual de laudo retificado. Controle da qualidade laboratorial6 A Figura 1 mostra um exemplo de gráfico de indicador. Figura 1. Indicador de recoleta de amostra por setor laboratorial, com meta de 1%. Fonte: Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (2018, p. 10). Avaliação interna e externa: parâmetros associados O controle de qualidade deve ser realizado de maneira interna e externa para garantir a qualidade dos processos realizados nos laboratórios de análises clínicas, devendo incluir avaliações estatísticas e não estatísticas. Controle interno de qualidade O controle interno de qualidade está diretamente vinculado à exatidão e à precisão dos exames e consiste em procedimentos dirigidos na fase analítica em relação ao exame laboratorial de amostras de pacientes. Esse tipo de con- trole é utilizado com o intuito de avaliar se o sistema analítico está operando dentro dos limites de tolerância predefinidos pelo fabricante do equipamento e/ou do reagente utilizado para análise. Esse tipo de controle apresenta as seguintes funções: � controlar o desempenho de materiais como reagentes e demais insumos, equipamentos e métodos analíticos e registrar as ações executadas; 7Controle da qualidade laboratorial � identificar mudanças na estabilidade dos processos, por aumento da variabilidade ou por introdução de desvios ou tendências na calibração do teste; � criar sinais de alerta para prevenir a liberação de resultado equivo- cado e indicar a necessidade de ações preventivas ou corretivas pelo laboratorista. O controle interno é uma espécie de material de referência utilizado como responsável pelo monitoramento frequente da reprodutibilidade dos resulta- dos dos exames na fase analítica, identificando e eliminando erros ineren- tes ao processo das análises quantitativas e qualitativas (XAVIER; DORA; BARROS, 2016). Medidas preventivas devem ser realizadas quando o nível de desempenho estiver sinalizando uma tendência para o não atendimento dos requisitos em períodos futuros. Por exemplo, há algumas medidas estabelecidas pelos fabricantes dos equipamentos que devem ser realizadas periodicamente ou diariamente, como processos de lavagem, e tem o objetivo de evitar problemas futuros. Já medidas corretivas devem ser realizadas quando o nível de desempenho do processo indicar que já existe o não atendimento dos requisitos estabelecidos. Por exemplo, o resultado do controle interno ficou fora dos desvios estabelecidos, sendo necessária alguma atitude, como a substi- tuição de reagentes, troca de água, etc., para após da sequência da rotina laboratorial. Para que o controle seja uma ferramenta útil ao laboratório é importante seguir algumas ações, que são (MCPHERSON; PINCUS, 2013; XAVIER; DORA; BARROS, 2016): � estabelecimento, de modo claro e objetivo, dos critérios para controlar todas as metodologias, selecionando as ferramentas mais sensíveis aos diferentes tipos de erro, como, por exemplo, regras de Westgard, em que o número da frente refere-se ao número de ocorrências que determinada falha aconteceu (Quadro 1) e gráficos de Levey-Jennings (Figura 2); Controle da qualidade laboratorial8 � monitoramento do desempenho dos exames laboratoriais, procurando manter rotinas preventivas quanto a desvios, eventos adversos, e ainda, quando necessário, medidas corretivas imediatas; � análise das circunstâncias da não conformidade ou do erro, quando detectados, procurando determinar e eliminar sua causa raiz. Fonte: Adaptado de McPherson e Pincus (2013, p. 119). Regra Significado Falha que detecta 125 Uma observação excede 2 desvios padrão (DP) do valor alvo. Imprecisão ou distorção sistemática. 135 Uma observação excede 3 DP dovalor alvo. Imprecisão ou distorção sistemática. 225 Duas observações sequenciais ou observações para duas amostras de controle de qualidade na mesma análise, excedem 2 DP do valor alvo na mesma direção. Distorção sistemática. 22,55 Duas observações sequenciais ou observações para duas amostras de controle de qualidade na mesma análise, excedem 2,5 DP do valor alvo na mesma direção. Distorção sistemática. R45 A faixa entre duas observações na mesma análise excede 4 DP. Imprecisão. 10m Dez observações sequenciais estão no mesmo lado do valor alvo (média). Distorção sistemática, tendência. 815 Oito observações sequenciais para o mesmo material excedem 1 DP na mesma direção do valor alvo. Distorção sistemática, tendência. Quadro 1. Resumo das regras de Westgard 9Controle da qualidade laboratorial Figura 2. Exemplo de gráfico de Levey-Jennings. Fonte: Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (2018, p. 34). As amostras de controle possuem valores conhecidos pelo fabricante (disponibilizados normalmente em bulas) e seu monitoramento é realizado por meio das análises estatísticas, como média, DP e coeficiente de variação. O gráfico de Levey-Jennings e as regras múltiplas de Westgard são ferramentas utilizadas há, pelo menos, 20 anos, mundialmente difundidas na avaliação do controle de qualidade interno. Esse controle permite a avaliação do erro aleatório de uma análise (VIEIRA et al., 2011). Controle externo de qualidade O controle externo de qualidade, também conhecido como avaliação externa da qualidade ou ensaio de proficiência, por sua vez, é uma atividade de avaliação do desempenho de sistemas analíticos por meio de ensaios de proficiência, análise de padrões certificados e comparações interlaboratoriais. Esse tipo de controle está fundamentado na comparação entre os resultados de determinado parâmetro (exame) do laboratório participante e a média de consenso de um grupo de laboratórios. As empresas provedoras de ensaios de proficiência distribuem de forma periódica, em geral, uma vez ao mês (mas pode ser a cada três meses ou outro período estabelecido entre empresa provedora e laboratório participante), alíquotas de um mesmo material para os diversos laboratórios participantes do programa. As amostras devem apresen- tar as mesmas características, ou o mais próximo disso possível, dos fluidos biológicos utilizados nos laboratórios, assim como a estabilidade que deve Controle da qualidade laboratorial10 manter essas características dentro do período entre manufatura, transporte, recebimento e determinação dos testes em questão. O programa geralmente pode agrupar os resultados enviados pelos laboratórios por ensaio, metodologia ou por equipamento e, então, calcula a média de consenso de cada parâmetro. Essa ação promove a comparação da exatidão dos analitos entre os laboratórios participantes (a representatividade desses grupos está vinculada a um número mínimo de participantes). Com essa participação efetiva, o laboratório poderá garantir que os resultados dos analitos que fazem parte desses ensaios se aproximem o máximo possível de um valor real, dentro de uma variabilidade analítica permitida (XAVIER; DORA; BARROS, 2016). As empresas responsáveis por todo esse processo fazem também uma avaliação do desempenho de cada laboratório participante, analito e/ou iden- tificação por um período equivalente ao ano de participação. Nas avaliações por analitos e/ou identificação, aqueles com desempenho adequado integrarão a listagem do certificado de proficiência dos ensaios daquele laboratório participante (XAVIER; DORA; BARROS, 2016). É necessário gerenciar os resultados obtidos pelo controle de qualidade interno e externo por parte da equipe técnica do laboratório, analisar de forma crítica e realizar um acompanhamento contínuo, possibilitando a implantação de ações para eliminar desvios observados no processo. A investigação não deve se limitar apenas a resultados inadequados, mas sim, aos meios de pre- venção para que os erros sejam evitados (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). Controle analítico da qualidade laboratorial A fase analítica é a única fase do laboratório em que o analista, em geral, o biomédico ou o bioquímico, não tem contato direto com o paciente, mas precisa estar à disposição do profissional solicitante do exame para discutir resultado ou até mesmo repassar algum resultado crítico (valores que expõem o paciente a risco de vida). Para que o profissional do laboratório e o solicitante confiem no resultado, é importante que se tenha um bom sistema de gestão da qualidade. Embora essa fase seja rica em automação e em informatização, se não for adequadamente controlada pode gerar erros que afetarão diretamente o diag- nóstico do paciente. Para que os erros sejam evitados é indispensável o controle de qualidade interno e externo de todos os testes realizados pelo laboratório, independentemente de suas características (quantitativo, semiquantitativo ou qualitativo). Quando não há amostras comerciais de determinado teste, o 11Controle da qualidade laboratorial laboratório deve adotar formas alternativas descritas na literatura científica, tais como (XAVIER; DORA; BARROS, 2016): � seleção de amostras de pacientes com valores baixos, normais e aumentados; � preparação de pool de amostra; � troca de amostra entre laboratórios; � análises realizadas entre laboratoristas do próprio laboratório (princi- palmente associadas à microscopia), etc., desde que sejam manipuladas conforme as boas práticas e estabilidade inerentes a cada espécie de material. Para a grande parte dos testes, principalmente os automatizados dos setores bioquímica e imunologia, é possível a aquisição de amostras (soro) controle comerciais que, em geral, consiste em uma preparação em matriz proteica humana estabilizada e liofilizada, contendo vários analitos cujos valores foram ajustados por meio da adição de extratos de tecidos animais ou outros compos- tos não proteicos como materiais químicos purificados). Essa amostra chega ao laboratório, muitas vezes, liofilizada, a qual deve ser hidratada segundo as normas do fabricante, aliquotada em volumes de uso diário e congelada para manter a estabilidade. Diariamente, as alíquotas das amostras-controle devem ser descongeladas e processadas no respectivo equipamento antes de iniciar a rotina das amostras de paciente. O manuseio e o procedimento dessas amostras devem seguir o mesmo padrão que é realizado com as amostras dos pacientes. Em geral, são processadas duas amostras controles nos equipamentos, uma normal e uma alterada (indicativa de patologia). Alguns fabricantes podem for- necer amostras com valores baixos, normais e aumentados (quando comparados aos valores de referência do teste) para uma melhor verificação da exatidão e precisão do equipamento. Após o processamento do controle, os resultados devem ser plotados em gráficos (como de Levey-Jennings) e avaliados de acordo com metas previamente estabelecidas ou como as regras de Westgard. O que acaba sendo mais utilizado pelos laboratórios é que os resultados do controle devem estar dentro de até dois desvios padrões da média do respectivo analito para que as amostras dos pacientes possam ser processadas com mais segurança (MCPHERSON; PINCUS, 2013; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). Controle da qualidade laboratorial12 Quando algum valor fica “fora” dos desvios, ou seja, não apresenta os resultados dentro do que está estabelecido pelos desvios permitidos ou na bula, alguma providência deve ser tomada para identificar a fonte de erro. Nesses casos, as providências comumente tomadas pelos analistas do laboratório são as seguintes: � conferência da validade de todos os insumos utilizados; � substituição de reagente ou da água destilada que estão em uso no momento; � manutenção diáriaespecífica do equipamento (limpeza ou alguma lavagem automática); � verificação da temperatura ambiente (normalmente analisadores de hemograma não funcionam muito bem em ambientes muito frios e de bioquímica/imunologia não apresentam bom funcionamento em ambientes muito quentes); � passagem de uma nova amostra controle no equipamento (principal- mente amostras hematológicas podem necessitar boa homogeneização). Se nenhuma das alternativas citadas funcionar, pode ser necessária a calibração do teste. A calibração estabelece relação entre os valores indicados por um calibrador (solução aquosa de matriz proteica que possui uma quan- tidade conhecida por um ou mais analitos informada ao equipamento) e os valores representados por um material de referência ou os correspondentes das grandezas determinadas por padrões. O calibrador serve para padronizar o equipamento e, assim como o controle, é adquirido com o fabricante do equipamento. Após a calibração, é necessário que as amostras controle sejam processadas novamente, para validar o procedimento realizado. Além de toda essa avaliação citada, também é importante que os resultados do controle sejam observados quanto à existência de tendência “para cima ou para baixo” (em relação aos valores que deveriam ser encontrados) que possa comprometer os resultados dos pacientes. Quando mais de seis resultados de controle ficam do mesmo lado da média, indicam que há tendência e que, normalmente, está ocorrendo um erro sistemático (VIEIRA et al., 2011; MCPHERSON; PINCUS, 2013; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL, 2018). 13Controle da qualidade laboratorial Em relação ao controle de qualidade externo, as amostras chegam ao setor analítico no período previamente estabelecido por contrato (mensal, trimestral), em geral liofilizadas, precisando também, assim como os controles internos, serem hidratadas conforme instruções do fabricante. Após esse processo, é necessário que elas sejam colocadas no equipamento seguindo a mesma padro- nização das amostras dos pacientes. Essa amostra não precisa ser processada previamente à rotina de amostras de pacientes, como é feito com o controle interno, ela pode seguir a rotina normal. Depois de ser analisada a amostra, o resultado é enviado pela internet ao programa contratado. Na sequência, os resultados são recebidos e o participante que não estiver dentro das médias obtidas pelos demais participantes deve ser avaliado, justificado e tomadas medidas corretivas. Os programas de controle de qualidade externo mais utilizados em laboratórios de análises clínicas no Brasil são o Controllab (Controle de Qualidade para laboratórios), da Sociedade Brasileira de Patologia e Medicina Laboratorial, e Programa Nacional de Controle de Qualidade (PNCQ), da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (SBAC). Para obter mais informações sobre esses programas, acesse os links a seguir. https://qrgo.page.link/b4qpR https://qrgo.page.link/MJjwh Além do controle de qualidade interno e externo, é fundamental que os profissionais que atuam no setor técnico, na realização dos exames labora- toriais, sejam constantemente treinados, participem de eventos, congressos, cursos para atualização e reciclagem, garantindo, assim, conhecimento para a realização com qualidade de todas as etapas que envolvem a realização de um exame. Controle da qualidade laboratorial14 MCPHERSON, R. A.; PINCUS, M. R. (ed.). Diagnósticos clínicos e tratamento por métodos laboratorais de Henry. 21. ed. Barueri, SP: Manole, 2013. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA CLÍNICA E MEDICINA LABORATORIAL. Reco- mendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial (SBPC/ ML): fatores pré-analíticos e interferentes em ensaios laboratoriais. Barueri, SP: Manole, 2018. Disponível em: http://bibliotecasbpc.org.br/index.php?P=4&C=0.2. Acesso em: 27 set. 2019. VIEIRA, K. F. et al. A utilidade dos indicadores da qualidade no gerenciamento de laboratórios clínicos. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, v. 47, n. 3, p. 201−210, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/jbpml/v47n3/v47n3a02.pdf. Acesso em: 27 set. 2019. XAVIER, R. M.; DORA, J. M.; BARROS, E. (org.). Laboratório na prática clínica. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2016. (Série Consulta rápida). 15Controle da qualidade laboratorial
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