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9 788578 176358 w w w. u n i s u l . b r UnisulVirtual Palhoça, 2014 Universidade do Sul de Santa Catarina Negócios jurídicos Créditos Universidade do Sul de Santa Catarina – Unisul Reitor Sebastião Salésio Herdt Vice-Reitor Mauri Luiz Heerdt Pró-Reitor de Ensino, de Pesquisa e de Extensão Mauri Luiz Heerdt Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional Luciano Rodrigues Marcelino Pró-Reitor de Operações e Serviços Acadêmicos Valter Alves Schmitz Neto Diretor do Campus Universitário de Tubarão Heitor Wensing Júnior Diretor do Campus Universitário da Grande Florianópolis Hércules Nunes de Araújo Diretor do Campus Universitário UnisulVirtual Fabiano Ceretta Campus Universitário UnisulVirtual Diretor Fabiano Ceretta Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) - Educação, Humanidades e Artes Marciel Evangelista Cataneo (articulador) Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Ciências Sociais, Direito, Negócios e Serviços Roberto Iunskovski (articulador) Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Produção, Construção e Agroindústria Diva Marília Flemming (articuladora) Unidade de Articulação Acadêmica (UnA) – Saúde e Bem-estar Social Aureo dos Santos (articulador) Gerente de Operações e Serviços Acadêmicos Moacir Heerdt Gerente de Ensino, Pesquisa e Extensão Roberto Iunskovski Gerente de Desenho, Desenvolvimento e Produção de Recursos Didáticos Márcia Loch Gerente de Prospecção Mercadológica Eliza Bianchini Dallanhol Livro didático UnisulVirtual Palhoça, 2014 Designer instrucional Luiz Henrique Queriquelli Negócios jurídicos Gisele Rodrigues Livro Didático Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul Copyright © UnisulVirtual 2014 Professor conteudista Gisele Rodrigues Designer instrucional Luiz Henrique Queriquelli ISBN 978-85-7817-635-8 Projeto gráfico e capa Equipe UnisulVirtual Diagramador(a) Marina Broering Righetto Revisor(a) Amaline Boulos Issa Mussi Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição. 3421 C54 Goedert, Gisele Rodrigues Martins Negócios jurídicos : livro didático / Gisele Rodrigues Martins Goedert ; design instrucional Luiz Henrique Queriquelli. – Palhoça : UnisulVirtual, 2014 94 p. : il. ; 28 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7817-635-8 1. Direito civil. 2 Direito e fato. I. Queriquelli, Luiz Henrique. II. Título. Sumário Introdução | 7 Capítulo 1 Fatos jurídicos | 9 Capítulo 2 Negócio jurídico | 21 Capítulo 3 Defeitos e invalidade dos negócios jurídicos | 39 Capítulo 4 Atos ilícitos e prova nos negócios jurídicos | 57 Capítulo 5 Prescrição e decadência | 75 Considerações Finais | 89 Referências | 91 Sobre o Professor Conteudista | 93 7 Introdução Este livro didático se propõe a oferecer uma introdução ao segundo momento da parte geral do Código Civil, também chamado de Livro III, em que se supera a conceituação da pessoa enquanto sujeito de direitos e obrigações e se assume o indivíduo como sujeito principal dos acontecimentos que produzem efeitos no mundo jurídico. De maneira geral, o Direito Civil está presente em todos os momentos. Quaisquer acontecimentos sociais, ações ou omissões provocadas pelo comportamento humano em geral podem ter influência no mundo jurídico. De que forma se pode minimizar esses efeitos, para que os sujeitos envolvidos tenham condições de manter uma convivência harmoniosa e pacífica em sociedade? A resposta a esta pergunta você encontra ao longo das páginas que seguem. Portanto, convido-o/a a esta leitura, a fim de obter o aprofundamento necessário para entender melhor tais questões. Como você poderá observar, o primeiro capítulo pretende apresentar o conceito de fato jurídico em sentido estrito, bem como identificar a classificação de fato jurídico em sentido amplo. Por meio desses conceitos, será possível contextualizar a finalidade negocial e os modos de aquisição, conservação, modificação e extinção de direitos, que são a chave para o início do estudo propriamente dito, referente ao negócio jurídico. É justamente a partir da formação do negócio jurídico que se pode verificar a formação das relações jurídicas e a formalização das obrigações. Dentre as inúmeras classificações que serão estudadas nessa etapa, partiremos para o estudo dos elementos constitutivos do negócio jurídico, identificados pelos planos de existência, validade e eficácia dos negócios jurídicos. Os negócios jurídicos nem sempre serão perfeitos e, por vezes, apresentarão vícios ou defeitos que acabarão culminando com a sua invalidade. Nesse contexto, será possível identificar os defeitos que podem ocorrer nos negócios jurídicos em geral, tais como o erro substancial, o dolo, a coação, o estado de perigo, a lesão e a fraude contra credores. Em razão disso é que se menciona a invalidade do negócio jurídico. Esta invalidade ocasionada pelos defeitos apresentados poderá culminar com a inexistência do negócio jurídico, com a nulidade absoluta (negócio nulo) ou, ainda, com a nulidade relativa ou anulabilidade (negócio anulável). 8 Você verá, ainda, que há situações nas quais a parte ou as partes podem atuar contrariamente ao que o direito determina, e acabar, por vezes, causando algum prejuízo tanto para elas mesmas quanto para terceiros. Essa atuação contrária pode se identificar como um ato ilícito, o que invariavelmente provocará a configuração da responsabilidade civil, ou seja, originará o dever de indenizar. Na continuidade do estudo, abordaremos um assunto de fundamental importância para o negócio jurídico que é a prova. Sabe-se que, de maneira geral, em nome da segurança jurídica, a prova é elemento essencial para a configuração da responsabilidade civil originada por um negócio jurídico. Poderá esta ser identificada através da confissão, da documentação apresentada, das testemunhas, pela presunção e, ainda, pela designação de perícia. Finalizando nosso estudo, conheceremos as regras que podem limitar ou autorizar o exercício do direito, identificadas em nosso livro como a prescrição e a decadência. Afinal, o direito não socorre a quem não o exerce em tempo hábil. Desejo que este momento sirva de estímulo ao estudo do Direito Civil e tenha o poder de transformar positivamente seu modo de ver e estudar o Direito! Sucesso, sempre! 9 Habilidades Seções de estudo Capítulo 1 Fatos jurídicos Seção 1: Fato jurídico Seção 2: Atos lícitos Seção 3: Finalidade negocial Este capítulo desenvolverá em você a habilidade de conceituar os fatos jurídicos em sentido estrito e em sentido amplo. Além disso, ao final do seu estudo, você estará apto/a a distinguir as modalidades de finalidade negocial, entre elas, a aquisição, a conservação, a modificação e a extinção de direitos. 10 Capítulo 1 Seção 1 Fato jurídico A partir de agora, adentraremos no segundo momento da parte geral do Código Civil, não mais conceituando a pessoa enquanto sujeito de direitos e obrigações, mas a pessoa como parte essencial e sujeito principal dos acontecimentos que produzem efeitos no mundo jurídico. Para tanto, segundo Pablo Stolze Gagliano (GAGLIANO, 2010 p. 331), “todo acontecimento, natural ou humano, que determine a ocorrência de efeitos constitutivos, modificativos ou extintivos de direitos e obrigações, na órbita do direito, denomina-se fato jurídico.” Interessante a argumentação de Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 314), quando aponta que o direito também tem seu ciclo vital: nasce, desenvolve-se e extingue-se. Essas fases ou momentos decorrem de fatos denominados fatos jurídicos, exatamente por produzirem efeitos jurídicos. Nem todo acontecimento constitui fato jurídico. Alguns são simplesmente fatos, irrelevantes para o direito. Somente o acontecimento da vida relevante para o direito, mesmo que seja fato ilícito, pode ser considerado como fato jurídico. Fato jurídico não é um conceito de direito civil, mas de todo o direito. Assim, seu estudo é mais apropriado nateoria geral do direito, pois não apenas se aplica às situações juscivilistas mas também às de todos os demais ramos de direito privado ou público. (LOBO, 2011, p. 221). Nem todos os fatos jurídicos são objeto do Código Civil, no entanto está regulada no Livro III da Parte Geral, a matéria que se denomina “fatos jurídicos”. Para Paulo Lobo, fatos jurídicos são todos os fatos naturais ou de conduta aos quais o direito atribui consequências jurídicas. (LOBO, 2011, p. 221). Verifica-se, assim, que todo fato, para ser considerado jurídico, deve passar por um juízo de valoração. O ordenamento jurídico, que regula a atividade humana, é composto de normas jurídicas, as quais preveem hipóteses de fatos e consequentes modelos de comportamento considerados relevantes, e que, por isso, foram normatizados. Estes, depois de concretizados, servem de suporte fático para a incidência da norma e o surgimento do fato jurídico. (GONÇALVES, 2011, p. 314). 1.1 Fatos jurídicos em sentido amplo O fato jurídico pode ser fato jurídico em sentido amplo (lato sensu) e fato jurídico em sentido estrito (stricto sensu). Este último refere-se tão somente aos acontecimentos naturais que possam produzir efeitos na órbita jurídica. Fato jurídico lato sensu é todo acontecimento que se encontra regulado pelo direito. 11 Negócios Jurídicos Desdobra-se em fato jurídico stricto sensu, ato-fato jurídico, ato jurídico stricto sensu e negócio jurídico. (ROBERTO SENISE LISBOA, 2004, p. 368). Para Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 315-316), os fatos naturais, também denominados fatos jurídicos em sentido estrito, por sua vez, dividem-se em: 1. ordinários: como o nascimento e a morte, que constituem, respectivamente, o termo inicial e final da personalidade, bem como a maioridade, o decurso do tempo, todos de grande importância, e outros. Logo, pode ser entendido como um evento natural bastante comum e previsível; 2. extraordinários, que se enquadram, em geral, na categoria do fortuito e da força maior: terremoto, raio, tempestade etc. Ou seja, é o evento decorrente da natureza. Confira, agora, a conceituação de fato jurídico em sentido amplo. 1.2 Fatos jurídicos em sentido estrito Os fatos jurídicos em sentido amplo podem ser classificados em: 1. fatos naturais ou fatos jurídicos stricto sensu; e 2. fatos humanos ou atos jurídicos lato sensu. Os primeiros decorrem de simples manifestação da natureza e os segundos da atividade humana. Os fatos humanos ou atos jurídicos em sentido amplo são ações humanas que criam, modificam, transferem ou extinguem direitos. Estes, por sua vez, dividem- se em lícitos e ilícitos. Seção 2 Atos lícitos Para efeito de conceituação, consideram-se lícitos os atos humanos a que a lei defere os efeitos almejados pelo agente. Praticados em conformidade com o ordenamento jurídico, produzem efeitos jurídicos voluntários, queridos pelo agente. Os ilícitos, por serem praticados em desacordo com o prescrito no ordenamento jurídico, embora repercutam na esfera do direito, produzem efeitos jurídicos involuntários mas impostos por esse ordenamento. Em vez de direito, criam deveres, obrigações. Hoje se admite que os atos ilícitos integram a 12 Capítulo 1 categoria dos atos jurídicos pelos efeitos que produzem. Estes estão regulados nos artigos 186 e 927 do Código Civil, em que se ressalta a obrigação de indenizar. (GONÇALVES, 2011, p. 316). Os atos ilícitos serão objeto de estudo em momento oportuno, cabendo, primeiramente, nos dedicarmos ao estudo dos atos denominados lícitos. Em se tratando de matéria com diversidade de classificações idealizadas pelos autores da área, e, ainda, com o intuito de tornar o estudo mais fácil e didático, utilizar-se-á a classificação proposta por Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 251): Os atos lícitos dividem-se em: a. ato jurídico em sentido estrito ou meramente licito; b. negocio jurídico; e c. ato fato jurídico. 2.1 Ato jurídico em sentido estrito (stricto sensu) Nessa espécie, há uma manifestação de vontade do agente, mas suas consequências são as previstas em lei e não na vontade das partes. O ato jurídico em sentido estrito promana de manifestação ou declaração unilateral de vontade, projetando-se na orbita jurídica de terceiros. Não depende de assentimento ou concordância do destinatário ou beneficiário para que seja considerado válido e eficaz. Lobo (2011, p. 237) ainda menciona que outra nota determinante e peculiar do ato jurídico em sentido estrito é que seu autor não pode definir seus efeitos, seus limites e seu alcance. A vontade é sua, podendo ou não exteriorizá-la, mas, desde o momento que o faz, perde o controle de sua destinação. A lei é que define para que serve essa vontade exteriorizada, qual ou quais pessoas podem ser afetadas por ela, positiva ou negativamente, e seus preciosos fins. Para Tartuce (2011, p. 312), um bom exemplo de ato jurídico stricto sensu é o reconhecimento de um filho. Digamos que uma pessoa teve um filho fora do casamento e, como pai, quereria reconhecê-lo. Com o reconhecimento, surgem efeitos legais, como direito do filho de usar o nome do pai, o dever do último de prestar alimentos, direitos sucessórios, dever de apoio moral, entre outros. Sendo reconhecido um filho, os efeitos decorrentes do ato não dependem da vontade da pessoa que fez o reconhecimento, mas da lei, da norma jurídica. Como é notório, não pode o pai limitar esses direitos decorrentes de lei. 13 Negócios Jurídicos Ou seja, o efeito da manifestação da vontade está predeterminado na lei, e a ação humana se baseia não em uma vontade qualificada mas em uma simples intenção. (GONÇALVES, 2011, p. 251). 2.2 Negócio jurídico Para efeitos da classificação estudada, “Negócio jurídico é todo evento decorrente da vontade humana, que se consubstancia em um conjunto de atos jurídicos dependentes entre si, dispostos pelos negociantes em uma ordem temporal lógica, para obtenção do resultado ou interesse pretendido pelas partes.”(LISBOA, 2004, p. 371). Essa modalidade ainda será estudada pormenorizadamente. 2.3 Ato-fato jurídico Além dos conceitos acima, alguns autores defendem a existência de um instituto denominado ato-fato jurídico. Impende salientar que o Código Civil não recepcionou essa modalidade, no entanto a doutrina se manifesta, em grande parte, pela sua existência, ainda que controversa. Para Tartuce (2011, p. 310), o ato-fato jurídico pode ser conceituado como “um fato jurídico qualificado por uma atuação humana, por uma vontade não relevante juridicamente.” Os atos-fatos jurídicos são atos ou comportamentos humanos em que não houve vontade, ou, se houve, o direito não as considerou. Nos atos-fatos jurídicos, a vontade não integra seu suporte fático. É a lei que os faz jurídicos e atribui consequências ou efeitos a eles, independentemente de estes terem sido queridos, ou não. Das espécies de fatos jurídicos, a menos conhecida, ou menos precisa, é o ato-fato jurídico, por se encontrar a meio caminho entre o fato jurídico em sentido estrito e o ato jurídico em sentido amplo. (LOBO, 2011, p. 232). A título de esclarecimento, Pablo Stolze Gagliano (2010, p. 339) traz o exemplo da compra e venda feita por crianças. Ninguém discute que a criança, ao comprar o doce no boteco da esquina, não tem a vontade direcionada à celebração do contrato de consumo. Com efeito, o que se ressalta, na verdade, é a consequência do ato, ou seja, o fato resultante, sem se dar maior significância se houve vontade, ou não, de realizá-lo. Percebe-se que, em alguns momentos, torna-se bastante difícil diferenciar o ato-fato jurídico do ato jurídico em sentido estrito. 14 Capítulo 1 Para facilitar a compreensão da classificação estudada, vejamos o seguinte esquema: Fatos jurídicos (em sentido amplo) Fatos naturais Fatos humanos (atos jurídicos em sentido amplo) Ordinários Ato jurídico em sentido estrito ou meramente lícitoNegócio jurídico Ato-fato jurídico Extraordinários Lícitos Ilícitos Cumprido o estudo da classificação, o próximo tópico dedica-se ao estudo da Finalidade Negocial, que abrange os efeitos constitutivos, modificativos ou extintivos de direitos e obrigações. Estes efeitos são considerados fatores determinantes na configuração do fato jurídico (ato jurídico em sentido amplo), especialmente do negócio jurídico e do ato ilícito, que será objeto de estudo em momento posterior. Seção 3 Finalidade negocial No negócio jurídico, a manifestação da vontade tem finalidade negocial, que abrange a aquisição, conservação, modificação ou extinção de direitos. 3.1 Aquisição de direitos Ocorre aquisição de um direito com a sua incorporação ao patrimônio e à personalidade do titular. O Código Civil atual não menciona expressamente a aquisição dos direitos, diferente do que ocorria no Código Civil de 1916, mais precisamente no artigo 74, que dispõe: Art. 74. Na aquisição dos direitos se observarão estas regras: I - adquirem-se os direitos mediante ato do adquirente ou por intermédio de outrem; II - pode uma pessoa adquiri-los para si, ou para terceiros; Figura 1.1 – Classificação dos fatos jurídicos Fonte: Gonçalves (2011, p. 250). 15 Negócios Jurídicos III - dizem-se atuais os direitos completamente adquiridos, e futuros os cuja aquisição não se acabou de operar. Parágrafo único. Chama-se deferido o direito futuro, quando sua aquisição pende somente do arbítrio do sujeito; não deferido, quando se subordina a fatos ou condições falíveis. No entanto, mesmo não fazendo mais parte do nosso Código Civil atual, como se trata de conceito consagrado pela doutrina, ainda é bastante utilizado. (GAGLIANO, 2010, p. 335). Antes de se estudar a aquisição de direitos propriamente dita, faz-se necessário o esclarecimento de alguns conceitos fundamentais, expressos no já mencionado art. 74, III, do Código Civil anterior, tais como a terminologia direito atual, direito futuro, dentre outros, que, no entanto, como já foi dito, continuam com sua essência preservada. 3.1.1 Conceituações necessárias Antes de você estudar as formas de aquisição, é necessário entender os conceitos de: • direito atual; • direito futuro; • direitos eventuais; • expectativa de direito; • direitos condicionais. Direito atual é o que, tendo sido adquirido, está em condições de ser exercido, por estar incorporado ao patrimônio do adquirente. Direito futuro é aquele cuja aquisição ainda não se operou, que não pode ser exercido. Sua realização depende de uma condição ou prazo. Há fatos que devem acontecer, para que esse direito se aperfeiçoe. Por exemplo: no compromisso de compra e venda de imóveis a prazo, o direito real só surgirá com o pagamento final do preço e o registro no competente Cartório do Registro de Imóveis. A expressão direito futuro abrange gênero que compreende todas as relações potenciais ainda não exercíveis ou exercitáveis, por faltar-lhes um ou outro elemento. O direito não se corporificou. Com essa terminologia, compreendemos não só os direitos a termo e os condicionais, propriamente ditos, como também os chamados direitos eventuais, matéria da qual nos ocuparemos a seguir. Nesse sentido, Silvio de Salvo Venosa (2007) ainda elucida que o direito futuro 16 Capítulo 1 pode ser deferido. É, conforme a lei, aquele que, para o complemento de sua aquisição há dependência exclusiva de um ato do próprio sujeito, de sua própria aceitação. São exemplos dessa categoria a situação do herdeiro ou do legatário na transmissão da herança. Em que pese a herança se transmitir automaticamente, o ato jurídico só se completa pela aceitação dos titulares, pois os herdeiros podem renunciar à herança. O direito futuro será não deferido quando, para seu aperfeiçoamento, houver dependência de condições falíveis, que escapam ao mero arbítrio do interessado. É o caso da promessa de recompensa, pois dependerá de credor, inicialmente incerto, que aceite e realize as condições da promessa, para que possa exigir recompensa. O direito eventual é direito incompleto, que pode ter vários aspectos. O direito eventual é direito futuro, pois depende de um acontecimento para completar-se, mas já apresenta características embrionárias, isto é, já apresenta características em alguns de seus elementos constitutivos. Trata-se de relação jurídica ainda incompleta. Podem ser exemplificados pela venda de coisa alheia: quem vende algo que ainda não possui, fica na dependência de adquirir a coisa para poder transmiti-la. Nesses casos, os direitos já se apresentam moldados, faltando apenas um ou alguns elementos para completá-los. Pode ser direito quase completo, apresentando-se como direito futuro, mas, com certa relação com o presente, já desfruta de alguma proteção jurídica. Algumas vezes o direito se forma gradativamente. Na fase preliminar, quando há apenas esperança ou possibilidade de que ele seja adquirido, a situação é de expectativa de direito. Consiste esta, pois, na mera possibilidade de se adquirir um direito, tal qual ocorre no direito sucessório. (GONÇALVES, 2011, p. 321). A lei só concede proteção jurídica quando a expectativa de direito se transforma em direito eventual, isto é, quando a expectativa se converte em direito. Enquanto não houver proteção jurídica, estaremos diante de mera expectativa, e não de um direito. (VENOSA, 2007, p. 391). Os direitos condicionais partem da noção de condição dada pelo art. 121 do Código Civil: condição é a cláusula que subordina o ato jurídico a evento futuro e incerto. Direitos condicionais, portanto, são os subordinados a evento futuro e incerto. Para tanto, o Código Civil define: “Considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.” (art. 121). Tanto nos direitos eventuais como nos condicionais existe subordinação a evento futuro e incerto. Há numerosas coincidências nessas duas categorias. 17 Negócios Jurídicos Os direitos eventuais, contudo, trazem elemento futuro e incerto inerente e essencial ao próprio negócio jurídico, enquanto, nos direitos condicionais, o fato dito condicional é externo ao ato. Nem todo elemento futuro e incerto deve ser considerado condição. O negócio jurídico eventual é negócio jurídico ainda incompleto o qual necessita que algo ocorra para completar-se. É de índole interna. Quem vende, por exemplo, coisa que ainda não tem, depende de obtê-la para poder transmiti-la. Nos direitos condicionais, o direito já se perfez. Apenas se agregou um elemento externo, uma condição, para ser exercido, uma vez que sua existência jurídica depende desse elemento condicional. A condição aposta a um direito é acessória. No direito eventual, o evento futuro e incerto é essencial à integração do direito. Temos de concluir que, para fins práticos, tanto o direito eventual como o direito condicional devem ser tratados de maneira idêntica. (VENOSA, 2007, p. 389-392). Feitas as considerações necessárias no tocante à contextualização do modo de aquisição dos direitos, buscaremos, a partir de agora, compreender sua classificação. Inicialmente, a aquisição dos direitos poderá ser originária ou derivada. (GONÇALVES, 2011, p. 320). 3.1.2 Formas de classificar a aquisição A aquisição de direitos pode ser originária, derivada, gratuita ou onerosa, ou a título singular ou universal. Será originária quando a aquisição ocorre no momento do surgimento do direito; do início da relação jurídica. Ou seja, quando se dá sem qualquer interferência do anterior titular. Ocorre, por exemplo, na ocupação de coisa sem dono: nasce o direito de se obter a posse, mesmo que o imóvel tenha sido direito de propriedade anterior de alguém. Derivada é a aquisição que decorre de transferência feita por outra pessoa. Nesse caso, o direito é adquirido com todas as qualidades ou defeitos do titulo anterior, vistoque ninguém pode transferir mais direitos do que tem. Por exemplo, o direito de usufruto deriva do direito à propriedade ou posse. Mas o direito ao usufruto não é, exatamente, um direito originário, pois não deriva de uma relação jurídica. Classificamos uma aquisição como gratuita ou onerosa de acordo com a existência, ou não, de uma contraprestação para a aquisição do direito. Quanto à sua extensão, poderá ser a título singular ou universal: ocorre no tocante a bens determinados: em relação ao comprador, na sucessão inter vivos, e em relação ao legatário, na sucessão causa mortis. A título universal, quando o adquirente sucede o seu antecessor na totalidade de seus direitos, como se dá com o herdeiro. 18 Capítulo 1 3.2 Conservação de direitos Em se tratando da segunda modalidade da finalidade negocial, qual seja, a conservação de direitos, entende-se que, para resguardar ou conservar seus direitos, o titular deverá valer-se de algumas medidas, muitas vezes de caráter acautelatório, podendo ser sistematizadas, segundo Pablo Stolze Gagliano (2010, p. 337), da seguinte forma: • Atos de conservação: atos praticados pelo titular do direito para evitar o perecimento, turbação, esbulho de seu direito. É o exemplo evidente das medidas e ações cautelares. • Atos de defesa do direito lesado: tendo ocorrido a violação ao direito, o ajuizamento de ações cognitivas ou executivas, no exercício do direito constitucional de ação (art. 5º, XXXV, da CF/88), é a medida adequada para a conservação do direito. • Atos de defesa preventiva: antes mesmo da violação – mas diante da sua ameaça evidente – é possível o ajuizamento de procedimentos próprios para uma defesa preventiva, como é o caso dos interditos proibitórios ou no estabelecimento de cláusulas contratuais, com evidente característica de defesa preventiva extrajudicial, como, por exemplo, a fiança. • Autotutela: ocorrida a violação, a ordem jurídica admite, sempre excepcionalmente, a pratica de atos de autotutela, como por exemplo, o direito de greve, no direito do trabalho. 3.3 Modificação de direitos Para melhor compreensão desse item, podemos dizer que os direitos subjetivos nem sempre conservam suas características originárias ou permanecem inalterados no decorrer de sua existência, o que significa que podem sofrer modificações. Para grande parte da doutrina, as modificações podem ser objetivas ou subjetivas: 19 Negócios Jurídicos A modificação objetiva diz respeito ao seu objeto. A alteração pode ser tanto de quantidade – volume, ou qualidade – conteúdo de objeto ou direitos. Pode afetar a quantidade ou a qualidade do direito, forma ou intensidade de exercê-lo. A modificação subjetiva refere-se ao titular. É a alteração da titularidade do objeto ou direito, pode-se dar tanto pela substituição do sujeito ativo ou passivo quanto pela multiplicação ou concentração de sujeitos ou mesmo desdobramento da relação jurídica. É como se o alienante perdesse o direito para quem alienou. Como exemplo, temos o contrato de compra e venda. Nele, o antigo proprietário perde o direito de domínio do bem, no entanto o direito à propriedade ainda existe, sendo este exercido pelo comprador que, a partir desse momento, será o novo titular. Ressalte-se que a modificação subjetiva é possível para a maioria dos direitos, exceto aos direitos personalíssimos. (GAGLIANO, 2010, p. 336). 3.4 Extinção de direitos Assim como podem ser adquirido, conservado ou modificado, o direito também poderá ser extinto. Aliás, são várias as razões que podem autorizar a extinção dos direitos. Para Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 324), costumam ser mencionadas, entre outras, as seguintes: o perecimento do objeto sobre o qual recaem, alienação, renúncia, escoamento do prazo, prescrição e decadência. Algumas causas de extinção podem ser: • objetivas (perecimento do objeto sobre o qual recaem), • subjetivas (quando o direito é personalíssimo e morre o seu titular); e outras ainda, • concernentes ao vinculo jurídico (perecimento da própria pretensão ou do próprio direito material, como na prescrição e na decadência). Finalizado o estudo das classificações atinentes aos fatos jurídicos propriamente ditos e considerando o estudado na finalidade negocial, o próximo tópico se destina à abordagem do Negócio Jurídico, modalidade de ato jurídico em sentido amplo. 21 Habilidades Seções de estudo Capítulo 2 Negócio jurídico Seção 1: Negócio jurídico: contextualização e conceito Seção 2: Classificação dos negócios jurídicos Seção 3: Planos de existência, validade e eficácia Este capítulo desenvolverá em você a habilidade de conceituar e classificar os negócios jurídicos. Além disso, ao final do seu estudo, você estará apto/a a distinguir o que é necessário para que um negócio jurídico tenha existência, validade e eficácia. 22 Capítulo 2 Seção 1 Negócio jurídico: contextualização e conceito Neste tópico, será abordado o negócio jurídico, parte da matéria considerada fundamental para a compreensão dos demais conceitos da parte geral, bem como da parte especial do Código Civil. É no negócio jurídico que reside toda a essência para a formação das relações jurídicas e a formalização das obrigações. Historicamente, o negócio jurídico teve início na doutrina germânica, conforme contextualiza Pablo Stolze Gagliano (2010, p. 347): A categoria dos negócios jurídicos desenvolveu-se graças ao labor da doutrina germânica em período relativamente recente. Por isso, Clóvis Bevilaqua, ao elaborar o Código Civil em 1899, não cuidou de dispensar a devida atenção, deixando de consagrá-la em seu projeto. Aliás, analisando as suas normas, verificamos que, em nenhum momento, utilizou-se a expressão negócio jurídico, não obstante o tratamento legal dado ao “ato jurídico” fosse perfeitamente aplicável. Tal inconveniente foi contornado pelo Novo Código Civil, cuja Parte Geral, da lavra do Min. Moreira Alves, merecedora de justos elogios, disciplina exaustivamente a categoria de negócios jurídicos, sem desconsiderar os atos jurídicos em sentido estrito. A partir do Código Civil atual, pode-se dizer que houve uma verdadeira revolução no modo de se visualizarem as obrigações, os contratos, o casamento e, sobretudo, os negócios jurídicos, já que profundas foram as alterações sociais e econômicas pelas quais passou o mundo civilizado. Importante salientar que o Código Civil de 2002 não buscou conceituar tanto o ato jurídico stricto sensu quanto o negócio jurídico, demonstrando somente quais seriam os seus elementos estruturais (art. 104 do CC). O foco principal do negócio jurídico, a manifestação da vontade, sofreu um verdadeiro impacto, apontando alguns autores que é praticamente impossível, hoje, a sua manifestação inequívoca e plena, a exemplo dos contratos de adesão. (TARTUCE, 2011, p. 314). Ou seja, o negócio jurídico passou por algumas mudanças significativas ao longo dos tempos. No negócio jurídico há uma composição de interesses, um regramento bilateral de condutas, como ocorre na celebração de contratos. A manifestação da vontade tem finalidade negocial, que, como já vimos no capítulo anterior, em geral se traduz em criar, adquirir, transferir, modificar ou extinguir direitos. (GONÇALVES, 2011, p. 326). 23 Negócios Jurídicos Para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona (2010, p. 353), “negócio jurídico é a declaração de vontade, emitida em obediência aos seus pressupostos de existência, validade e eficácia, com o propósito de produzir efeitos admitidos pelo ordenamento jurídico pretendidos pelo agente.” Já Maria Helena Diniz conceitua o negócio jurídico como o “poder de autorregulação dos interesses que contém a enunciação de um preceito, independentemente do querer interno.” (DINIZ, 2004, p. 472) Seção 2 Classificação dos negócios jurídicos Conceituado o negócio jurídico, passamos ao estudo da sua classificação. Em se tratando da classificação dos negóciosjurídicos, além de ser extensa, há clara divergência doutrinária no tocante à sua concepção e subdivisão. Desta forma, optamos pela classificação que se apresenta de maneira mais didática, qual seja, a de Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 327-337), que dispõe poderem os negócios jurídicos ser classificados em: • unilaterais, bilaterais e plurilaterais; • gratuitos, onerosos, neutros e bifrontes; • inter vivos e mortis causa; • principais e acessórios; • solenes ou formais e não solenes ou de forma livre; • simples, complexos e coligados; • dispositivos e obrigacionais; • fiduciário e simulado. Confira o que determina cada classificação. 2.1 Unilaterais, bilaterais e plurilaterais Quanto ao número de declarantes ou de manifestações de vontade necessárias ao seu aperfeiçoamento, os negócios jurídicos classificam-se em unilaterais, bilaterais ou plurilaterais. 24 Capítulo 2 2.1.1 Negócios jurídicos unilaterais Negócios jurídicos unilaterais são os que se aperfeiçoam com uma única manifestação de vontade (Exemplo: testamento, codicilo, instituição de fundação, aceitação e renúncia da herança, promessa de recompensa etc.). Subdividem-se em duas espécies: • receptícios – são aqueles em que a declaração de vontade tem de se tornar conhecida do destinatário para produzir efeitos (exemplo: denúncia ou resilição de um contrato, revogação de mandato etc.); • não receptícios – são aqueles em que o conhecimento por parte de outras pessoas é irrelevante (exemplo: testamento, confissão de dívida etc.). 2.1.2 Negócios jurídicos bilaterais Negócios jurídicos bilaterais são aqueles que se perfazem com duas manifestações de vontade coincidentes sobre o objeto. Essa coincidência chama- se consentimento mútuo ou acordo de vontades (contratos em geral). Podem existir várias pessoas no polo ativo e, também, várias no polo passivo, sem que o contrato deixe de ser bilateral pela existência de duas partes, pois estas não se confundem com aquelas. Em outras palavras, o que torna o contrato bilateral é a existência de dois polos distintos, independentemente do número de pessoas que integre cada polo. 2.1.3 Negócios jurídicos plurilaterais Negócios jurídicos plurilaterais são os contratos que envolvem mais de duas partes, ou seja, mais de dois polos distintos (exemplo: contrato social de sociedades com mais de dois sócios). 2.2 Gratuitos, onerosos, neutros e bifrontes Quanto às vantagens patrimoniais que podem produzir, os negócios jurídicos classificam-se em gratuitos e onerosos, neutros e bifrontes. 2.2.1 Negócios jurídicos gratuitos Negócios jurídicos gratuitos são aqueles em que só uma das partes aufere vantagens ou benefícios (Exemplo: doação pura ou comodato). 25 Negócios Jurídicos 2.2.2 Negócios jurídicos onerosos Negócios jurídicos onerosos são aqueles em que ambos os contratantes auferem vantagens ou benefícios, aos quais, porém, corresponde uma contraprestação (Exemplo: compra e venda, empreitada, locação etc.). Pode-se dizer, portanto, que todo negócio oneroso é bilateral, mas a recíproca não é verdadeira (Exemplo: doação, comodato). Os negócios jurídicos onerosos podem ser: • comutativos – quando a prestação de uma parte depende de uma contraprestação da outra, que é equivalente, certa e determinada; • aleatórios – quando a prestação de uma das partes depende de acontecimentos incertos e inesperados. A álea, a sorte, é elemento do negócio (Exemplo: contrato de seguro). 2.2.3 Negócios jurídicos neutros Há negócios que não podem ser incluídos na categoria dos onerosos, nem dos gratuitos, pois lhes falta atribuição patrimonial. São chamados de neutros e se caracterizam pela destinação dos bens. Em geral, coligam-se aos negócios translativos, que têm atribuição patrimonial, como, por exemplo, a instituição das cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade. 2.2.4 Negócios jurídicos bifrontes Negócios jurídicos bifrontes são os contratos que podem ser onerosos ou gratuitos, segundo a vontade das partes (Exemplo: mútuo, mandato, depósito etc.). A conversão de negócio jurídico só se torna possível, se o contrato é definido na lei como negócio gratuito, pois a vontade das partes não pode transformar um contrato oneroso em gratuito, uma vez que subverteria a sua causa. Nem todos os contratos gratuitos podem ser convertidos em onerosos por convenção das partes. A doação e o comodato, por exemplo, ficariam desfigurados, se tal acontecesse, pois se transformariam, respectivamente, em venda e locação. 2.3 Negócios jurídicos inter vivos e causa mortis Considerando o momento da produção dos efeitos, os negócios jurídicos podem ser classificados em inter vivos e causa mortis. 26 Capítulo 2 Inter vivos – destinam-se a produzir efeitos desde logo, isto é, estando as partes ainda vivas (Exemplo: promessa de venda e compra). Causa mortis – são os negócios jurídicos destinados a produzir efeitos após a morte do agente (Exemplo: testamento). 2.4 Negócios jurídicos principais e acessórios Quanto ao modo de existência, os negócios jurídicos poderão ser principais e acessórios. Negócios jurídicos principais são os negócios jurídicos que têm existência própria e não dependem da existência de qualquer outro para produzir efeitos (Exemplo: compra e venda, locação etc.). Negócios jurídicos acessórios são os que têm sua existência subordinada a um negócio jurídico principal (Exemplo: cláusula penal, fiança etc.), de forma que seguem o destino do principal. Extinta a obrigação principal, extingue-se também a acessória, mas o contrário não persiste. 2.5 Negócios solenes ou formais e não solenes ou de forma livre Em relação às formalidades a serem observadas, os negócios jurídicos estão subdivididos em solenes ou formais e não solenes ou de forma livre. 2.5.1 Negócios jurídicos solenes ou formais São os negócios jurídicos que devem obedecer à forma prescrita em lei para que se aperfeiçoem. Quando a forma é exigida como condição de validade do negócio, este é solene e a formalidade é ad solemnitatem, isto é, constitui a própria substância do ato (Exemplo: escritura pública na alienação de imóvel, no testamento público etc.). Mas determinada forma pode ser exigida apenas como prova do ato. Nesse caso, se diz tratar-se de uma formalidade ad probationem tantum (Exemplo: assento do casamento no livro de registro – art. 1536). 2.5.2 Negócios jurídicos não solenes ou de forma livre Em regra, os negócios jurídicos obedecem a forma livre. Como a lei não reclama nenhuma formalidade para o seu aperfeiçoamento, podem ser celebrados por qualquer forma, inclusive a verbal (art. 107 – CC). 27 Negócios Jurídicos 2.6 Negócios jurídicos simples, complexos e coligados Quanto ao número de atos necessários, classificam-se em negócios jurídicos simples, complexos ou coligados. Simples são os negócios que se constituem por ato único. Complexos são os que resultam da fusão de vários atos com eficácia independente. Compõem-se de várias declarações de vontade, que se completam, emitidas pelo mesmo sujeito ou diferentes sujeitos, para a obtenção dos efeitos jurídicos pretendidos na sua unidade (Exemplo: alienação de um imóvel em prestações, que se inicia pela celebração de um compromisso de compra e venda e se completa com a outorga da escritura definitiva). O negócio jurídico complexo é único e não se confunde com o coligado. Coligados são os que se compõem de vários outros negócios jurídicos distintos (Exemplo: arrendamento de posto de gasolina, coligado pelo mesmo instrumento ao contrato de locação das bombas, de comodato de área para funcionamento de lanchonete, de fornecimento de combustível, de financiamento etc.). 2.7 Negócios jurídicos dispositivos e obrigacionais Considerando as modificações que podem produzir, os negócios jurídicos poderão ser dispositivos ou obrigacionais. Dispositivos são aqueles utilizados pelo titular para alienar, modificar ou extinguir direitos(Exemplo: a constituição de usufruto em favor de terceiro). Obrigacionais são os que, por meio de manifestações de vontade, geram obrigações para uma ou para ambas as partes, possibilitando às mesmas a exigência de uma contraprestação (Exemplo: compra e venda. Um se dispõe a pagar o preço e o outro a entregar a coisa). 2.8 Negócio fiduciário e negócio simulado Por derradeiro, quanto ao modo de obtenção do resultado, o negócio jurídico pode ser fiduciário e simulado. Negócio fiduciário é aquele em que alguém, o fiduciante, transmite um direito a outrem, o fiduciário, que se obriga a devolver esse direito ao patrimônio do transferente ou a destiná-lo a outro fim. Visam as partes um fim prático, 28 Capítulo 2 realizando um negócio cujos efeitos ultrapassam os objetivos do que foi celebrado. Há uma discrepância entre o negócio jurídico utilizado e os fins a serem buscados. Negócio simulado é o que tem aparência contrária à realidade, ou seja, não é válido. Embora, nesse sentido, seja semelhante ao negócio fiduciário, neste as declarações de vontade são falsas (Exemplo: declarações falsas para fraudar o Fisco). Finalizando esta etapa, analisaremos nesse momento as regras referentes aos elementos constitutivos do negócio jurídico, já apontadas anteriormente, quais sejam, os Planos de Existência, Validade e Eficácia. Seção 3 Planos de existência, validade e eficácia Seguindo a linha dos doutrinadores que estudam o tema, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona (2010, p. 354-355) entendem que, para apreendê-lo sistematicamente – e não simplesmente reproduzir regras positivadas –, faz-se mister analisá-lo sob os três planos em que pode ser visualizado: Existência: um negócio jurídico não surge do nada, exigindo-se, para que seja considerado como tal, o atendimento a certos requisitos mínimos; Validade: o fato de um negócio jurídico ser considerado existente não quer dizer que ele seja considerado perfeito, ou seja, com aptidão legal para produzir efeitos; Eficácia: ainda que um negócio jurídico existente seja considerado válido, ou seja, perfeito para o sistema que o concebeu, isto não importa em produção imediata de efeitos, pois estes podem estar limitados por elementos acidentais da declaração. Estes três Planos (Existência – Validade – Eficácia) são denominados pela doutrina como a “Escada Ponteana”, em homenagem ao grande jurista brasileiro Pontes de Miranda. Observe o gráfico: 29 Negócios Jurídicos Figura 2.1 - Escada ponteana: existência, validade e eficácia Plano da validade: • capacidade (do agente); • liberdade (da vontade ou consentimento); • licitude, possibilidade, determinabilidade (do objeto); • adequação (das formas). (requisitos da validade) Plano da eficácia: • condição; • termo; • consequências do inadimplemento negocial (juros, multas, perdas e danos); • outros elementos. (efeitos do negócio) Plano da existência: • agente; • vontade; • objeto; • forma. (pressupostos de existência) Fonte: Tartuce (2011, p. 320). Vejamos, cada um deles pormenorizadamente. 3.1 Plano de existência Inicialmente, não discutiremos a validade ou eficácia do negócio jurídico, mas tomaremos como base a existência, ou não, do mesmo. Para isso, o Plano de Existência é composto por alguns elementos constitutivos ou denominados pressupostos de validade, que, para Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 360), são: • manifestação de vontade; • agente emissor da vontade; • objeto; e • forma. 30 Capítulo 2 3.1.1 Manifestação da vontade A manifestação de vontade pode ser expressa (quando for demonstrada pela palavra escrita ou falada, ou por meio de gestos e sinais) ou, ainda, poderá ser tácita (quando resultante de um comportamento do agente). (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010, p. 363). Entende-se, ainda, que o silêncio também pode significar manifestação de vontade, conforme determina o Art. 111 do CC: “O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração de vontade expressa.” Ou, ainda, o Art. 147 também do CC: “Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado.” Note-se que o emprego de meios que neutralizem a manifestação volitiva, tais como a violência física ou, até mesmo, a hipnose, torna inexistente o negócio jurídico. Ainda em se tratando da manifestação da vontade, temos a reserva mental. Ocorre reserva mental quando um dos declarantes oculta a sua verdadeira intenção, isto é, quando não quer um efeito jurídico que declara querer. Tem por objetivo enganar o outro contratante ou declaratário. Se este, entretanto, não soube da reserva, o ato subsiste e produz os efeitos que o declarante não desejava. Ou seja, a reserva é o que se passa na mente do declarante, não produzindo efeitos. Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 352) esclarece: Alguns exemplos são mencionados, ora agindo o declarante de boa-fé, ora de má-fé. Da primeira hipótese é aquele em que o declarante manifesta a sua vontade no sentido de emprestar dinheiro a um amigo (contrato de mútuo), porque este tinha a intenção de suicidar-se por estar em dificuldades financeiras. A intenção do declarante não é a de realizar o contrato de mútuo, mas, tão somente, salvar o amigo do suicídio. Ainda assim, o propósito do engano continua presente, sendo hipótese típica de reserva mental. Passemos ao próximo elemento, qual seja, o agente emissor da vontade. 31 Negócios Jurídicos 3.1.2 Agente emissor da vontade Ora, sem o sujeito, não se pode falar em ato, mas, tão somente, em fato jurídico em sentido estrito. A participação do sujeito de direito (pessoa natural ou jurídica) é indispensável para a configuração existencial do negócio jurídico. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010 p. 362). Ou seja, o negócio jurídico dependerá de uma pessoa para manifestar sua vontade. Importa salientar que uma parcela significativa da doutrina trata este elemento juntamente com o anterior, formando um só elemento, denominado manifestação ou declaração de vontade, ou, apenas, vontade. A subdivisão desses elementos foi realizada com o intuito de promover a compreensão do tema de maneira mais didática. 3.1.3 Objeto Todo negócio jurídico pressupõe a existência de um objeto, sendo este não necessariamente um bem exclusivamente material mas também imaterial, como no caso de um contrato de direito autoral. Assim, na análise do objeto, Sebastião José de Assis Neto (2009, p. 167) observa que o conteúdo das obrigações contraídas pelas partes também está englobado no objeto. Para o autor, deve-se observar que o objeto do negócio engloba não só um bem especificamente descrito na declaração de vontade mas ainda o conteúdo das obrigações contraídas pelas partes. 3.1.4 Forma Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona (2010, p. 363) entendem que a forma é o meio pelo qual a declaração se exterioriza, ou, em outras palavras, o tipo de manifestação através do qual a vontade chega ao mundo exterior. Sem uma forma pela qual se manifeste a vontade, por óbvio, o negócio jurídico inexiste, uma vez que a simples intenção encerrada na mente do agente (cogitação) não interessa para o direito. Importante que não se confunda a forma como se exterioriza a declaração, que é elemento constitutivo, com a forma legalmente prescrita, que é requisito de validade. Assim, é possível que um negócio exista, mas não atenda ao requisito da forma legalmente prescrita, o que poderia torná-lo inválido, embora existente. (OLIVEIRA, 2012). Encerrado o estudo do Plano de Existência, passa-se à abordagem do Plano de Validade do Negócio Jurídico. Vejamos: 32 Capítulo 2 3.2 Plano de validade do negócio “A validade do negócio jurídico requer: I – agente capaz; II – objeto lícito possível, determinado ou determinável; III –forma prescrita ou não defesa em lei.” (CC. Art. 104). 3.2.1 Agente capaz São capazes as pessoas que estão aptas a exercer pessoalmente os atos da vida civil. Lembre-se: nada impede que a pessoa considerada incapaz seja titular do direito a ponto de realizar um negócio jurídico, no entanto esta deverá ser representada ou assistida conforme a sua incapacidade. Relembre: Quadro 2.1 - Incapacidade absoluta e incapacidade relativa Incapacidade Absoluta art. 3º Incapacidade Relativa art. 4º Representação Tutor Assistência Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I - os menores de dezesseis anos; Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; Representação Curador Assistência II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV - os pródigos. Fonte: Elaboração do autor (2014). Esse pressuposto está diretamente vinculado ao estudado na Introdução ao Direito Civil. Desta forma, resta-nos esclarecer alguns pontos no tocante à figura da representação. O negócio jurídico é realizado ou celebrado pelas partes diretamente, na maioria dos casos. Mas um terceiro pode agir em nome e no interesse da pessoa que é parte no negócio jurídico (representado), para tanto exercendo determinados poderes. Essa intermediação denomina-se representação, e a pessoa que age em nome de outra é o representante. (LOBO, 2011, p. 255). 33 Negócios Jurídicos O Código Civil traz um capítulo dedicado à Representação, conforme se observa: CAPÍTULO II Da Representação Art. 115. Os poderes de representação conferem-se por lei ou pelo interessado. Art. 116. A manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes, produz efeitos em relação ao representado. Art. 117. Salvo se o permitir a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou por conta de outrem, celebrar consigo mesmo. Parágrafo único. Para esse efeito, tem-se como celebrado pelo representante o negócio realizado por aquele em quem os poderes houverem sido subestabelecidos. Art. 118. O representante é obrigado a provar às pessoas, com quem tratar em nome do representado, a sua qualidade e a extensão de seus poderes, sob pena de, não o fazendo, responder pelos atos que a estes excederem. Art. 119. É anulável o negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou. Parágrafo único. É de cento e oitenta dias, a contar da conclusão do negócio ou da cessação da incapacidade, o prazo de decadência para pleitear-se a anulação prevista neste artigo. Art. 120. Os requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas respectivas; os da representação voluntária são os da Parte Especial deste Código. Chama a atenção o disposto no art. 117 em relação à restrição legal para a realização do autocontrato, ou contrato consigo mesmo. É importante destacar, segundo Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 379), que o contrato consigo mesmo, enquanto manifestação de uma representação, em uma interpretação a contrario sensu do dispositivo legal, é aceitável, desde que a modalidade contratual adotada seja permitida legalmente ou, omissa a norma legal, desde que houver livre manifestação de vontade do representado. Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 366) classifica a representação em três espécies: a legal, judicial e convencional. 34 Capítulo 2 • Representação legal decorre de lei, ou seja, a lei confere poderes para administrar bens e interesses alheios, como, por exemplo, os curadores em relação aos curatelados. • Representação judicial é aquela em que o juiz nomeia o representante como nos casos do inventariante nomeado para cuidar dos interesses de herdeiros etc. • Representação convencional é a espécie em que o indivíduo nomeia um representante para que este o represente em determinados atos, seja de forma geral ou especial. Pode ser exemplificada como aquela em que o representante poderá alienar ou dar quitação pelo representado. Feitas as elucidações em relação à Representação, passa-se ao próximo pressuposto que é a licitude do objeto. 3.2.2 Licitude, possibilidade e determinação do objeto Continuando, o art. 104, II determina que a validade do negócio jurídico requer, ainda, objeto lícito, possível, determinado ou determinável. Pois bem. Objeto lícito é aquele que não atenta contra a lei, a moral ou os bons costumes. O objeto deve ser, também, possível. Quando impossível, o negócio é nulo. A impossibilidade pode ser física ou jurídica. Impossibilidade física - A impossibilidade física é aquela que emana das leis físicas ou naturais. Deve ser absoluta, isto é, atingir a todos, indistintamente. A relativa, que atinge o devedor, mas não outras pessoas, não constitui obstáculo ao negócio jurídico (Art. 106 do CC/02). Impossibilidade jurídica - A Impossibilidade jurídica do objeto ocorre quando o ordenamento jurídico proíbe, expressamente, negócios a respeito de determinado bem, como a herança de pessoa viva (CC. art. 426) e alguns bens fora do comércio. O objeto do negócio jurídico deve ser, igualmente, determinado ou determinável (indeterminado relativamente ou suscetível de determinação no momento da execução). (GONÇALVES, 2011, p. 359). 3.2.3 Forma prescrita ou não defesa em lei A forma do negócio jurídico em princípio é livre, quando não for substancial. A desobediência à forma prescrita em lei é a causa da nulidade, a modalidade mais forte de invalidade. A forma que invalida é substancial – formalismo negocial (ad substantiam) – e não a formalidade com finalidade simplesmente probatória (ad probationem). 35 Negócios Jurídicos A forma substancial tem por objetivo obrigar as pessoas a refletir sobre as consequências daquele negócio jurídico, a facilitar o reconhecimento do negócio jurídico por terceiros e quando se impuser maior segurança. A forma especial só pode ser exigida quando a lei assim determinar, para determinadas situações. (LOBO, 2011, p. 250). Do ponto de vista da forma, o negócio jurídico é solene (ou formal) se a manifestação de vontade precisa ser feita de uma forma especial e solene (forma prevista em lei). Para finalizar, podemos concluir que a regra geral de liberdade de forma só poderá ser rebatida quando a lei expressamente o determinar. Passamos agora ao último plano da escada ponteana. 3.3 Plano de eficácia do negócio jurídico Percebe-se que alguns negócios jurídicos não produzem efeitos imediatamente depois de realizados. No entanto podem as partes estabelecer cláusulas, de modo que os efeitos desses negócios estejam subordinados a acontecimentos futuros para que passem a ser exigíveis. A estes acontecimentos podemos denominar de condição, termo e modo ou encargo. Para a doutrina, esses acontecimentos também podem ser chamados de elementos acidentais do negócio jurídico. 3.3.1 Condição A condição é a cláusula contratual acessória, derivada da vontade das partes, que subordina a eficácia do negócio jurídico a um acontecimento futuro e incerto. A condição poderá ser de duas espécies: suspensiva ou resolutiva. De acordo com o art. 125 do Código Civil, a condição suspensiva não deixa acontecerem os efeitos práticos do negócio até a sua ocorrência, isto é, os efeitos do negócio passam a ocorrer no momento em que a condição acontece. Fábio Ulhoa Coelho(2003, p. 318), exemplifica: Se Darcy, produtor de laranjas, vende a Evaristo, que fabrica suco, todas as frutas de sua próxima safra, podem eles pactuar que o negócio fique sujeito à colheita. Quer dizer, caso se perca a produção em razão de uma geada, Darcy não será obrigado a vender a laranja, nem Evaristo a comprá-la. O negócio jurídico existe, é valido, mas somente produzirá efeitos se houver a colheita. 36 Capítulo 2 Na condição suspensiva, os efeitos do negócio jurídico só se projetam com a verificação do evento (art. 125, CC) e, na resolutiva, deixam de existir caso o evento se verifique (art. 127, CC). O exemplo da venda da laranja condicionada à colheita da safra é pertinente à condição suspensiva. Para exemplificar a condição resolutiva, Paulo Lobo (2011, p. 265) expõe: pago- lhe uma mesada até a conclusão de seu curso universitário, ou seja, o negócio jurídico produz desde já seus efeitos, que se extinguirão quando a condição se concretizar. O negócio existe, é valido, e seus efeitos acontecem desde o momento do pagamento da mesada até o da conclusão do curso universitário. Neste caso, a condição resolutiva é o “término do curso universitário”. A doutrina costuma proibir as condições que privarem de todo efeito o negócio jurídico (perplexas); as que o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes (denominadas puramente potestativas); as ilícitas, as física ou juridicamente impossíveis e as incompreensíveis ou contraditórias. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010, p. 445). 3.3.2 Termo e prazo Denomina-se Termo o que o direito civil considera o início e o fim do tempo do negócio jurídico. O termo é a determinação acessória, estabelecida pelas partes, que condiciona a produção dos efeitos práticos do negócio a um acontecimento futuro e certo. Todo negócio jurídico tem termos inicial e final, até mesmo quando aparenta ser instantâneo. Quando alguém fez uma proposta de venda de algo e o outro imediatamente aceitou, houve algum tempo – minutos, segundos – entre a aceitação, que fez exsurgir o início do negócio jurídico, e o pagamento do preço após a entrega da coisa, que é seu termo final. (LOBO, 2011, p. 267). Assim como a condição, esta cláusula refere-se a acontecimento futuro, ficando descaracterizada no caso de o evento já ter ocorrido. O termo não suspende a aquisição do direito por ser evento futuro, mas dotado de certeza. Difere da condição, que subordina a eficácia do negócio a evento futuro e incerto. Sendo o termo um acontecimento certo, inexiste estado de pendência, não se cogitando de retroatividade, existente apenas no negócio condicional. O titular do direito a termo pode, com maior razão, exercer sobre ele atos conservatórios. Pode ocorrer, em certos casos, a conjugação de uma condição e um termo no mesmo negócio jurídico. Por exemplo: “dou-te um consultório se te formares em medicina até os 25 anos.” (GONÇALVES, 2011, p. 391). Para Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 391), há várias espécies de Termo. Estas podem ser na forma: convencional (estabelecido pelas partes), de direito (decorre da lei), de graça (dilação de prazo concedida ao devedor). 37 Negócios Jurídicos O mesmo autor ainda dispõe: Pode ocorrer que o termo, embora certo e inevitável no futuro, seja incerto quanto à data de sua verificação. Exemplo: determinado bem passará a pertencer a tal pessoa a partir da morte de seu proprietário. A morte é certa, mas não se sabe quando ocorrerá. Neste caso, a data é incerta. Sob esse aspecto, o termo pode ser dividido em incerto, como no referido exemplo, e certo, quando se reporta a determinada data do calendário ou a determinado lapso de tempo. A data em que têm início os efeitos do negócio jurídico chama-se termo inicial, termo suspensivo ou dies a quo; a data que estes têm fim é denominada termo final, termo resolutivo ou dies ad quem. Ao termo inicial e final, diz a lei, aplica- se, no que couber, o disposto, respectivamente, sobre condição suspensiva e resolutiva, conforme dispõe o art. 135 do Código Civil. (COELHO, 2003, p. 322). Prazo é o tempo decorrido ou a decorrer entre a declaração e o termo, ou entre o termo inicial e o final. A lei prevê as regras para a contagem dos prazos, conforme se verifica na leitura do art. 132 do Código Civil: Art. 132. Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do começo, e incluído o do vencimento. § 1o Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia útil. § 2o Meado considera-se, em qualquer mês, o seu décimo quinto dia. § 3o Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se faltar exata correspondência. § 4o Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto. Especificamente para os testamentos, presume-se o prazo em favor do herdeiro, e, nos contratos, em proveito do devedor, salvo, quanto a esse, se do teor do instrumento, ou das circunstâncias, resultar que se estabeleceu a benefício do credor, ou de ambos os contratantes. (TARTUCE, 2011, p. 339). 3.3.3 O modo ou encargo Modo ou encargo é o ônus que recai sobre uma das partes do negócio jurídico, que deve suportá-lo como requisito para aquisição e exercício do direito. Não se confunde com condição, pois não suspende ou extingue a eficácia do negócio 38 Capítulo 2 jurídico. Contudo, as partes podem ajustar que, enquanto não for atendido, o encargo suspenda a aquisição ou o exercício do direito. Pode ser entendida como cláusula acessória, determinada pela vontade das partes, obrigando o beneficiário do negócio jurídico à realização de determinado ato. É cláusula típica das liberalidades (especialmente a exemplo das doações, testamentos etc.). O encargo não pode ser fixado nos negócios onerosos, pois equivaleria a uma contraprestação. No caso de descumprimento, o negócio continua sendo válido e eficaz, restando, apenas, a opção da cobrança judicial do encargo. O valor do encargo não pode ser superior ao do objeto doado, pois isso cortaria o caráter de liberalidade da doação. Entendemos que, para se configurar o contrato, a liberalidade deve consistir no valor prevalecente, no confronto entre o objeto doado e o encargo proposto. Como exemplo, podemos citar: “doação de imóvel para que se construa um hospital.” (LOBO, 2011, p. 270-271). A regra geral positivada de interpretação dos negócios jurídicos é, sem sombra de dúvida, o já transcrito art. 112 do CC, em que se vislumbra, claramente, a ideia de que a manifestação de vontade é seu elemento mais importante, muito mais, inclusive, do que a forma com que se materializou. O art. 112 do CC assim dispõe: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”; e, também, o art. 113 do CC: “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. O Código Civil, por sua estrutura, é permeado de cláusulas gerais. Estas permitem a interpretação e a utilização dos princípios basilares já estudados em Introdução ao Direito Civil, tais como a socialidade, eticidade e operabilidade englobando a boa-fé objetiva, ética, a função social, dentre outros. Enfim, encerrado o estudo de Negócio Jurídico, você vai seguir para o terceiro capítulo, que diz respeito aos Defeitos do Negócio Jurídico. 39 Habilidades Seções de estudo Capítulo 3 Defeitos e invalidade dos negócios jurídicos Seção 1: Defeitos dos negócios jurídicos Seção 2: Invalidade dos negócios jurídicos Este capítulo desenvolverá em você a habilidade de identificar os defeitos que podem ocorrer nos negócios jurídicos em geral, tais como o erro substancial, o dolo, a coação, o estado de perigo, a lesão e a fraude contra credores. Além disso, ao final do seu estudo, você estará apto/a a compreender a invalidade do negócio jurídico ocasionada pelos defeitos identificados. 40 Capítulo 3 Seção 1Defeitos dos negócios jurídicos A importância de se estudarem os defeitos dos negócios jurídicos reside na identificação dos vícios que podem macular o ato jurídico celebrado, atingindo a sua vontade ou gerando repercussão social, tornando o negócio passível de ação anulatória ou declaratória de nulidade pelo prejudicado. (TARTUCE, 2011, p. 349). Consideram-se defeitos do negócio jurídico, para o Código Civil: o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo, a lesão e a fraude contra credores. Vejamos, nesse momento, cada um deles. 1.1 Erro Erro consiste em uma falsa representação da realidade. Nessa modalidade de vício de consentimento, o agente engana-se sozinho. Quando é induzido em erro pelo outro contratante ou por terceiro, caracteriza-se o dolo. (GONÇALVES, 2011, p. 398). O erro é um engano fático, uma falsa noção, em relação a uma pessoa, objeto do negócio ou direito, que acomete a vontade de uma das partes que celebrou o negócio jurídico. (TARTUCE, 2011, p. 350). Para Pablo Stolze Gagliano (2010, p. 386), embora a lei não estabeleça distinções, o erro é um estado de espírito positivo, qual seja, a falsa percepção da realidade, ao passo que a ignorância é um estado de espírito negativo, o total desconhecimento do declarante a respeito das circunstâncias do negócio. O erro, entretanto, só é considerado como causa de anulabilidade do negócio jurídico, se for: • essencial (substancial); ou • escusável (perdoável). Assim dispõe o art. 138 do CC: “São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.” Ato contínuo, a legislação, em seu art. 139, trata de conceituar o erro substancial: Art. 139. O erro é substancial quando: I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais; 41 Negócios Jurídicos II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante; III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico. Ou seja, substancial é o erro que incide sobre a essência (substância) do ato que se pratica, sem o qual este não se teria realizado. É o caso do colecionador que, pretendendo adquirir uma estátua de marfim, compra, por engano, uma peça feita de material sintético. (GAGLIANO, 2010, p. 386). 1.1.1 Erro substancial Em razão das diversas classificações apresentadas pelos doutrinadores, utilizaremos, para efeitos do presente estudo, a classificação do erro substancial proposta por Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 400-403), que expõe: a. Erro sobre a natureza do negócio (error in negotio): é aquele que ocorre quando a pessoa pretende celebrar um negócio jurídico, mas, na verdade, acaba realizando outro diferente daquilo que pretendia. Um exemplo de erro sobre a natureza do negócio é pensar estar alugando o imóvel para alguém, quando, na verdade, está vendendo o bem para esta pessoa. b. Erro sobre o objeto principal da declaração (error in corpore): é aquele que incide sobre a identidade do objeto. O indivíduo manifesta interesse sobre um determinado objeto, no entanto, na celebração do negócio, sua vontade acaba recaindo sobre objeto diverso do pretendido. Exemplo: o de um comprador o qual acredita estar adquirindo um terreno que supõe valorizado, pois situado em uma rua importante, mas que, na verdade, tem pouco valor, porque localizado em rua do mesmo nome, porém de um pequeno vilarejo. c. Erro sobre as qualidades essenciais do objeto principal (erro in substantia ou error in qualitate): essa espécie de erro ocorre quando uma das partes acredita que o objeto do negócio jurídico possui qualidades as quais, posteriormente, verifica-se inexistirem. Exemplo: quando se adquire um quadro pensando ser original pelo alto preço, mas, na verdade, tratava-se de cópia. d. Erro quanto à identidade ou qualidade da pessoa a quem se refere a declaração de vontade (error in persona): relaciona-se tanto à identidade quanto às qualidades de uma pessoa. Para que seja possível anular um negócio jurídico em que haja erro com relação 42 Capítulo 3 à identidade ou qualidade da pessoa, é necessário que este erro tenha influenciado diretamente e de modo relevante a declaração de vontade do autor do erro. Exemplo: doação ou testamento deixando bens a alguém que o doador ou testador pensa ser seu filho natural, mas que, na verdade, não é. e. Erro de direito (error juris): é o falso conhecimento, ignorância ou interpretação errônea do que dispõe a lei no caso em concreto. Nestes casos, o agente pensa que está atuando de acordo com a lei, mas não está, seja porque a lei mudou, seja porque foi revogada, seja porque a interpretação feita foi incorreta, seja porque não existe lei regulamentando tal situação. Logo, apesar do disposto no art. 3º da LINDB, o qual determina que “ninguém se escusa de cumprir a lei alegando que não a conhece”, este não se pode confundir com o erro de direito, uma vez que tal erro pode ser arguido quando a pessoa tinha o propósito de cumprir a lei, mas, achando que a conhecia, realizou negócio jurídico por ela vedado, não autorizado, ou em desacordo com a norma. Exemplo: pessoa que contrata a importação de determinada mercadoria ignorando existir lei que proíbe tal importação. Como tal ignorância foi causa determinante do ato, pode ser alegada para anular o contrato, sem com isto pretender que a lei seja descumprida. 1.1.2 Erro escusável Erro escusável refere-se à espécie de erro justificável, desculpável, exatamente o contrário de erro grosseiro ou inescusável, de erro decorrente do não emprego de diligência ordinária. O Código Civil adotou o critério de comparar a conduta do agente com a da média das pessoas. Nesse caso, pode o juiz considerar escusável, por exemplo, a alegação de erro quanto à natureza do negócio, como, por exemplo, a celebração de um contrato de compra e venda julgando tratar-se de contrato de doação feito por uma pessoa rústica e analfabeta e, por outro lado, considerá- la inescusável, injustificável quando o mesmo contrato for celebrado por um advogado. (GONÇALVES, 2011, p. 405). Conforme dissemos acima, apresentamos, aqui, algumas das espécies de erros na classificação de Carlos Roberto Gonçalves. Importante salientar que existem outras classificações propostas por outros doutrinadores as quais merecem ser estudadas também. Fique atento/a! 43 Negócios Jurídicos 1.2 Dolo Considera-se dolo a malícia ou o artifício inspirado na má-fé para induzir a outra parte a realizar o negócio jurídico em seu prejuízo. É o enganar consciente. Vem do latim dolus, com o significado de ardil, logro, artifício, esperteza. (LOBO, 2011, p. 280). Assim, exemplificam Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 390-391) que o sujeito que vende uma caneta de cobre, afirmando tratar-se de ouro, atua com dolo, e o negócio jurídico poderá ser anulado. Em tempo: o dolo não se presume das circunstâncias de fato, devendo ser provado por quem o alega, ou seja, dispensa a prova de efetivo prejuízo para sua caracterização. De acordo com o art. 145 do Código Civil, “São os negócios jurídicos anuláveis por dolo, quando este for a sua causa”. Para tanto, convém classificar as espécies de dolo. Quanto à extensão dos efeitos no negócio jurídico, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 391) definem que o dolo poderá ser: • principal (essencial); ou • acidental. O dolo, para invalidar o ato, deve ser principal – atacando a causa do negócio em si -, uma vez que o acidental, aquele que não impediria a realização do negócio, gera, apenas, a obrigação de indenizar. No dolo principal, uma das partes do negócio utiliza artifícios maliciosos, para levar a outra a praticarum ato que não praticaria normalmente, visando obter vantagem, geralmente contemplando o enriquecimento sem causa. (TARTUCE, 2011, p. 355). O dolo acidental, que não é causa para o negócio, não pode gerar a sua anulabilidade, mas, somente, a satisfação em perdas e danos a favor do prejudicado. Nesse sentido, demonstra o art. 146 do CC: “O dolo acidental só obriga à satisfação das perdas e danos, e é acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo.” Para esclarecer o disposto no artigo acima, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 392) exemplificam: 44 Capítulo 3 [...] o sujeito declara pretender adquirir um carro, escolhendo um automóvel com cor metálica, e, quando do recebimento da mercadoria, enganado pelo vendedor, verifica que a cor é, em verdade básica. Neste caso, não pretendendo desistir do negócio, poderá exigir compensação por perdas e danos. Diferente seria se o sujeito somente interessasse comprar o veículo se fosse da cor metálica – hipótese em que o elemento faria parte da causa do negócio jurídico. Nesse caso, tendo sido enganado pelo vendedor para adquirir o automóvel, o comprador buscaria a anulação do negócio jurídico com base em dolo. Vejamos as demais classificações apontadas pela doutrina. 1.2.1 Dolus bonus e dolus malus Esta classificação possui sua origem no Direito Romano e considera o dolus bonus como aquele tolerável e insuficiente para viciar a manifestação da vontade. É comum no comércio em geral e considerado normal quando, por exemplo, os vendedores exageram na qualidade das mercadorias. Ainda assim, é importante salientar que O Código de Defesa do Consumidor proíbe a propaganda enganosa, de modo que tal dolo não será tolerado se enganar o consumidor. Já o dolus malus é revestido de gravidade, exercido com o propósito de ludibriar e de prejudicar. Pode consistir em atos e palavras e até mesmo no silêncio maldoso. Para diferenciar entre o dolo tolerável do que vicia o consentimento caberá ao juiz a análise do caso concreto. 1.2.2 Dolo positivo (ou comissivo) e dolo negativo (ou omissivo) O primeiro é o que se pratica por meio de ações, condutas comissivas e o segundo por omissão intencional. Ocorre tal dolo quando a parte silencia sobre circunstâncias importantes do negócio, não revelando (ou omitindo) fatos que, se viessem à tona, a vítima não faria o negócio. Observe a previsão legal: Art. 147. Nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela o negócio não se teria celebrado. Ou seja, provada tal circunstância, admite-se a anulação do negócio jurídico. 45 Negócios Jurídicos 1.2.3 Dolo de terceiro Esta espécie fundamenta-se no art. 148 do Código Civil que dispõe: Art. 148. Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou. Ou seja, o dolo, pode ser praticado por uma terceira pessoa que não faz parte do negócio, mas engana a vítima para ajudar o outro interessado. Nesse caso, temos o dolo de terceiro que pode gerar tanto a anulação do negócio quanto o pagamento de perdas e danos à vítima. Assim, exemplifica Gonçalves (2011, p. 419): Se o adquirente é convencido, maldosamente, por um terceiro, de que o relógio que está adquirindo é de ouro, sem que tal afirmação tenha sido feita pelo vendedor, e este ouve as palavras de induzimento utilizadas pelo terceiro e não alerta o comprador, o negócio torna-se anulável. Entretanto, se a parte a quem aproveite (o vendedor) não soube do dolo de terceiro, não se anula o negócio, mas caberá ao lesado reclamar perdas e danos. Incumbe ao lesado provar, na ação anulatória, que a outra parte, beneficiada pelo dolo de terceiro, dele teve ou deveria ter conhecimento. 1.2.4 Dolo do representante Nessa espécie, quem age com dolo não é um terceiro, mas sim o próprio representante da parte. Para tanto, eis o dispositivo legal: Art. 149. O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve; se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele por perdas e danos. Justamente por ser o representante da parte, poderá enganar a vítima, para beneficiar o seu representado. A lei distingue o dolo praticado pelo representante legal (no caso os pais, tutores ou curadores) do dolo praticado pelo representante convencional (mandatário ou procurador). No caso do dolo praticado por representante legal, os representados deverão ser responsabilizados até o limite da vantagem obtida no negócio. Já no caso do procurador, a responsabilidade é solidária, ou seja, ambos terão responsabilidade perante a vítima do dolo. 46 Capítulo 3 1.2.5 Dolo bilateral O dolo bilateral está regulado pelo art. 150 do Código Civil, dispondo que “se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para anular o negócio, ou reclamar indenização.” Nesse caso, há dolo, má-fé das duas partes na celebração do negócio, não havendo na lei a possibilidade de se invocar anulação ou perdas e danos. 1.3 Coação Coação pode ser conceituada como sendo uma pressão física ou moral exercida sobre o negociante, visando obrigá-lo a assumir uma obrigação que não lhe interessa. Aquele que exerce a coação é denominado coator e o que a sofre, coato, coagido ou paciente. (TARTUCE, p. 359). A coação está fundamentada a partir do art. 151 do Código Civil: Art. 151. A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação. Para tanto, a doutrina também identifica suas espécies: • coação física (vis absoluta); e • coação moral (vis compulsiva). A coação física é aquela que age diretamente sobre o corpo da vítima. A doutrina entende que este tipo de coação neutraliza completamente a manifestação da vontade, tornando o negócio jurídico inexistente, e não simplesmente anulável. Imagine a hipótese de um lutador de boxe pegar a mão de uma velhinha analfabeta, à força, para apor a impressão digital em um instrumento de contrato que ela não quer assinar. Logicamente que um exemplo como este parece um tanto absurdo, mas é uma situação em que sequer se discute a invalidade do negócio jurídico, pois ele não será considerado juridicamente existente. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2010, p. 395). Por outro lado, há também a coação moral. Esta pode ser conceituada como a coação efetiva e presente, causando fundado temor de dano iminente e considerável à pessoa do negociante, à sua família, à pessoa próxima ou aos seus bens, conforme identificado acima, no art. 151 do CC. (TARTUCE, 2011, p. 360). 47 Negócios Jurídicos Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2010, p. 395) definem como aquela espécie que incute na vítima um temor constante e capaz de perturbar seu espírito, fazendo com que ela manifeste seu consentimento de maneira viciada. É importante lembrar que o magistrado deverá observar, na identificação da coação, o determinado no Código Civil em seu art. 152: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam influir na gravidade dela.” Desse modo, para tornar mais claro o entendimento a respeito da coação, Tartuce (2011, p. 361) exemplifica: Pensemos o caso em que alguém celebra um casamento sob pressão de ameaça do irmão da noiva. Se a última
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