Buscar

S1P1 - DRGE

Prévia do material em texto

S1P1 - Doença do Refluxo gastroesofágico
1. Doença do Refluxo gastroesofágico (DRGE)
Anatomia e Histologia do esôfago:
A parte superior do esôfago possui um músculo denominado esfincter esofágico superior (EES), responsável por abrir espaço necessário, afrouxando o esôfago para passagem de alimentos ou líquidos.
A parte inferior do esôfago faz ligação com o estômago e recebe o nome de junção gastroesofágica. Nesta área, existe a presença do esfíncter inferior do esôfago (EEI), que auxilia no controle da passagem do alimento até o estômago. Esta ação faz com que o ácido estomacal e as enzimas digestivas não cheguem ao esôfago.
O esôfago é composto por várias camadas que formam sua parede. São elas:
1. Mucosa: corresponde a camada que reveste o interior do esôfago. Se divide:
· Epitélio: é a camada mais interna do esôfago e é formada por células denominadas células escamosas.
· Lâmina própria: é a camada de tecido conjuntivo formada sob o epitélio.
· Muscular da mucosa: representa a fina camada de músculo que fica localizado sob a lâmina própria.
2. Submucosa: representa a camada de tecido conjuntivo que fica localizado abaixo da mucosa, apresentando vasos sanguíneos e nervos, plexo mioentérico de Meissner. É nesta camada que o esôfago apresenta glândulas que secretam muco.
3. Muscular própria: é uma camada de músculo que atua contraindo-se para que o alimento ingerido seja empurrado da garganta, passando pelo esôfago até chegar ao estômago.
4. Adventícia: corresponde a camada mais externa do esôfago, sendo formada por um tecido conjuntivo.
 
Componentes da camada mucosa
1 – Revestimento por epitélio estratificado pavimentoso não corneificado (em vermelho).
2 – Tecido conjuntivo frouxo ou denso não modelado que suporta o epitélio de revestimento, chamado lâmina própria (em azul claro).
3 – Camada de músculo liso denominada muscular da mucosa (em verde claro).
Submucosa (destacada em azul, formada por TCD não modelado. Uma das características marcantes do esôfago é a presença de glândulas do tipo mucoso na camada submucosa. No restante do tubo digestivo somente o duodeno possui glândulas na camada submucosa.
Muscular da parede pode ser vista, ressaltada em verde escuro). Dependendo da região do esôfago esta musculatura é formada por músculo estriado esquelético (é o que se vê na imagem) ou por músculo liso.
A transição entre a mucosa do esôfago e do estômago é abrupta. É caracterizada pela substituição do epitélio estratificado pavimentoso não corneificado do esôfago pelo epitélio colunar simples do estômago. 
A mucosa do estômago possui pequenas reentrâncias denominadas fossetas gástricas ou fovéolas gástricas.
Refluxo Gastroesofágico (RGE)
Definição
Consiste na passagem do conteúdo gástrico para o esôfago, com ou sem regurgitação e/ou vômito. Esse refluxo pode ser considerado fisiológico, aquele que ocorre várias vezes ao dia em lactentes, crianças, adolescentes e adultos, quando ocasiona poucos ou nenhum sintoma, com duração menor que 3 minutos, principalmente no período pós-prandial. O refluxo gastroesofágico é quando o alimento retorna para o esôfago, pois o esfincter localizado entre o estômago e o esôfago permanece aberto. 
No lactente, é muito frequente, o RGE fisiológico acompanhar-se de regurgitações ou “golfadas” que não se associam a redução no ganho de peso ou outras manifestações clínicas. Trata-se de um distúrbio funcional gastrintestinal transitório e dependente da imaturidade funcional do aparelho digestivo no primeiro ano de vida.
Pode também representar uma doença (doença do refluxo gastroesofágico – DRGE), quando causa sintomas ou complicações. Os sintomas presentes da DRGE pediátrica incluem: regurgitações e/ou vômitos, irritabilidade, choro excessivo, anorexia, recusa alimentar, perda ponderal, entre outros.
DRGE:
Refluxo interprandial recorrente, de longa duração, com sintomas que resultam em agressão da mucosa esofágica pelo conteúdo ácido do estômago refluído.
Fator de risco:
Os fatores que predispõem refluxo gastroesofágico incluem
a) os que reduzem o tônus do EEI: como hérnia de hiato, fumaça do cigarro, álcool, chocolate, medicamentos depressores do sistema nervoso central, 
b) aumentam a pressão intra-abdominal: obesidade, gravidez, retardo do esvaziamento gástrico e aumento de volume do estomago.
1) doenças neurológicas, 2) prematuridade, 3) obesidade, 4) fibrose cística ou displasia broncopulmonar, 5) antecedente familiar de DRGE e 6) malformações congênitas do trato gastrintestinal alto (hérnia hiatal, hérnia diafragmática, atresia esofágica, fístula traqueoesofágica).
Etiopatogenia
A etiopatogenia da DRGE é multifatorial e envolve vários mecanismos intrínsecos ou não. Fatores que possam prejudicar a competência dos mecanismos anti–RGE (anatômicos ou não), favorecem a ocorrência de relaxamentos transitórios do esfíncter esofagiano inferior (RTEEI). Esse é considerado o principal fator na etiopatogênese da DRGE.
- O RGE primário resulta de disfunção da junção esofagogástrica. 
- O RGE secundário associa-se a condições específicas como estenose congênita do esôfago, fístula traqueo-esofágica, atresia de esôfago, distúrbios da deglutição, estenose hipertrófica do piloro, úlcera gástrica ou duodenal, pâncreas anular, pseudo-obstrução intestinal, alergia alimentar (proteína do leite de vaca), infecção urinária, parasitoses intestinais, doenças genético-metabólicas, asma, fibrose cística e alterações do sistema nervoso central.
Fisiopatologia
A fisiopatologia da doença do refluxo gastroesofágico é multifatorial e de forma simples está relacionada ao desequilíbrio entre mecanismos de proteção e agressão à mucosa esofágica. 
  Diversas estruturas formam, do ponto de vista anatômico, a barreira anti-refluxo que é constituída pelo EEI (adaptado para gerar zona de alta pressão), esôfago abdominal, hiato diafragmático (fibras crura diafragmática – onde o esôfago penetra no abdome que se contrai aumentando a pressão intraluminal do EEI), ângulo de His, válvula de Gubaroff e ligamento frenoesofágico (fáscia subdiafragmática – impedir a Pressão intratorácica negativa). 
  Mecanismos de proteção adicionais como a motilidade esofágica, a produção adequada de saliva e a integridade do epitélio auxiliam na defesa da mucosa esofagiana e protegem contra o surgimento de dano tecidual. 
A DRGE é multifatorial e envolve a função do esfíncter esofágico inferior, o peristaltismo esofágico e o esvaziamento gástrico. 
O esfíncter esofágico inferior (EEI), é a principal estrutura da barreira anti-refluxo e a maioria dos pacientes (60%) com DRGE apresenta o funcionamento inadequado dessa estrutura. 
- A efetividade da barreira anti-refluxo pode também ser alterada por outros mecanismos, como:
· Perda de tono do esfíncter esofágico inferior.
· Aumento da frequência de relaxamentos transitórios. 
· Perda do peristaltismo secundário depois de um relaxamento transitório.
· Aumento do volume ou pressão no estômago.
· Produção aumentada de ácido.
- O refluxo recorrente pode danificar a mucosa, resultando em inflamação, “refluxo gastresofágico”.
- A lesão da mucosa esofágica está relacionada com a composição destrutiva do material refluído e com o tempo que ele permanece em contato com a mucosa.
- Os líquidos ácidos do estômago (pH < 4,0) são particularmente deletérios. Normalmente, o refluxo gastresofágico é neutralizado e eliminado pela peristalse esofágica e pelo bicarbonato da saliva. 
- As hérnias hiatais (evaginação da porção superior do estômago para o tórax através do hiato diafragmático) parecem ter relação com a gravidade e refratariedade ao tratamento clínico da esofagite de refluxo. Aumento da pressão intra-abdominal permanente (obesidade) ou transitória (inspiração profunda, tosse, exercício físico, manobra de Valsalva, constipação e outros) e postura predominante em decúbito são fatores que predispõem ao refluxo. 
- ACALASIA = ausência de relaxamento do EEI. Pode ser primária devido a interrupção dosestímulos originados do pleno neural entérico e do nervo vago, degeneração da inervação que coordena a motilidade do órgão, ou secundária a destruição das células ganglionares dos plexos nervosos que ocorre na doença de Chagas ou a outras condições, como poliomielite, neuropatia diabética, amiloidose e sarcoidose. Estase do conteúdo alimentar na luz do órgão resulta em dilatação progressiva (megaesôfago) e se manifesta com disfagia progressiva, aspiração de conteúdo alimentar para as vias respiratórias e desnutrição.
Manifestações clínicas:
Os vômitos e as regurgitações são as manifestações clínicas mais comuns da DRGE em lactentes
· Típicas: significa que são esofagianos. Pirose (queimação retroesternal). Obs. Diferente de azia = queimação epigástrica; regurgitação (percepção de um fluido ácido na boca.
· Atípicas: sintomas extraesofagianos – erosão do esmalte dentário devido ao refluxo ácido, faringite, laringite, sinusite crônica, otite média, tosse crônica, broncoespasmos, pneumonia aspirativa, anemia ferroproiva.
 
Complicações: 
- complicações esofágicas: esofagite, estenose esofágica e esôfago de Barrett***.
- extra esofágicas da DRGE (respiratórias, otorrinolaringológicas, neurocomportamentais e orais).
As alterações neurocomportamentais como: distúrbios do sono, a irritabilidade e a síndrome de Sandifer, (que se caracteriza por postura anormal da cabeça, com torcicolo, em crianças neurologicamente normais, na presença de esofagite de refluxo).
- O RGE pode causar doença respiratória crônica através de três mecanismos: aspiração de quantidades significativas do conteúdo gástrico (macroaspiração) para as vias aéreas superiores e pulmões, causando pneumonias de aspiração, mais comum em crianças que apresentam distúrbios de deglutição; aspiração de pequenas quantidades do conteúdo gástrico (microaspiração), ocasionando reação inflamatória secundária; e acidificação intratraqueal que, por estímulo de terminações nervosas, pode desencadear broncoespasmo.
- A halitose e as erosões dentárias são alterações orais
Sinais de alarme 
· Perda ponderal;
· Sangue oculto nas fezes; 
· Anemia. 
 ***Esôfago de Barrett: corresponde a uma doença que resulta da complicação do refluxo gastroesofágico, causando exposição da mucosa do esôfago ao conteúdo gástrico.
Como consequência, o esôfago sofre alteração no tipo de célula que forma esta região, sendo esta uma tentativa do organismo de protege contra a acidez. A cicatrização das erosões acontece por meio de metaplasia intestinal, onde o epitélio estratificado do esôfago é substituído pelo epitélio glandular intestinal, dotado de mais resistência ao ácido. Mais propenso a evoluir com displasia progressiva de suas células que pode culminar em transformação neoplásica maligna (adenocarcinoma).
As pessoas portadoras desta doença são mais propensas a desenvolver câncer no esôfago. Os sintomas são semelhantes àqueles das outras doenças do esôfago, ou seja, azia, má digestão, sensação de queimação, dor e inflamação na garganta.
Importante: estratificação e manejo do paciente com esôfago de Barret
· Ausência de displasia: EDA 3 a 5 anos (livro do MEDCURSO)
· Displasia de baixo grau: EDA de 6m a 12m ou terapia endoscopia (ressecção da mucosa e ablação com ondas de radiofrequência;
· Displasia de alto grau: terapia endoscopia ou esofagectomia.
Diagnóstico
É fundamental levar em consideração a história clínica e o exame físico, incluindo a avaliação detalhada da história clínica, incluindo tipo e características dos sintomas, como intensidade, frequência, fatores desencadeantes, de melhora, a evolução e o impacto na qualidade de vida. 
as queixas do paciente juntamente com o resultado dos exames a serem realizados, podem ser solicitados endoscopia digestiva alta (EDA), pHmetria ou impedâncio-pHmetria. 
· pHmetria esofágica: padrão ouro. A pHmetria avalia o paciente em condições mais fisiológicas e por longos períodos, quantifica o RGE e correlaciona os episódios de refluxo com os sinais e sintomas. indicações da pesquisa de RGE por meio da pHmetria continuam sendo: avaliação de sintomas atípicos ou extradigestivos da DRGE; pesquisa de RGE oculto; avaliação da resposta ao tratamento clínico em pacientes portadores de esôfago de Barrett ou de DRGE de difícil controle; além de avaliação pré e pós operatória do paciente com DRGE.
· Manometria esofágica: avalia a motilidade do esôfago, estando indicada naqueles pacientes que apresentam quadro sugestivo de dismotilidade, cujos principais sintomas são a disfagia e a odinofagia. Pode ser útil nos pacientes que têm endoscopia negativa, buscar uma possível alteração da motilidade, como a acalásia ou outras condições que mimetizam a DRGE.
· EDA com biopsia: permite a avaliação macroscópica da mucosa esofágica e a coleta de material para estudo histopatológico, possibilitando o diagnóstico das complicações esofágicas da DRGE (esofagite, estenose péptica ou esôfago de Barrett), tão importantes para a orientação da terapêutica adequada e do prognóstico do paciente. Tem papel fundamental no diagnóstico diferencial com outras doenças pépticas e não pépticas, como a esofagite eosinofílica (EoE), a esofagite fúngica, a úlcera duodenal, a gastrite por H. pylori, a gastroenteropatia eosinofílica, as malformações e neoplasias, capazes de produzir sintomas semelhantes aos da DRGE.
· Teste terapêutico empírico com supressão ácida. consistem em administrar um inibidor da bomba de prótons por 7 a 14 dias para determinar se os sintomas são aliviados.
- Radiografia contrastada de esôfago, estomago e duodeno (RxEED): Sua função é fazer a avaliação anatômica do trato digestório alto. Não deve ser usado para diagnosticar
Tratamento:
conservador (não medicamentoso): consiste em medidas educativas, como evitar ingerir líquidos durante as refeições, bebidas com alto índice de cafeína e até mesmo o uso de medicamentos. Dormir do lado esquerdo alivia devido a curvatura em J do estômago, que fica com a curvatura maior para baixo. Elevação da cabeceira, diminuir alimentos que relaxam o EEI ou com efeitos irritantes, fracionar refeições, fracionar refeições e em pequenas quantidades, eliminar fumo, diminuir o peso.
Tratamento medicamentoso
· antiácidos de contato, recomendados apenas como sintomáticos, para sintomas esporádicos ou diminuição da acidez noturna; hidróxido de alumínio; hidróxido de magnésio (deve ser evitado em pacientes com DRC)
· procinéticos, que ajudam a controlar os sintomas, principalmente de vômitos e regurgitação;
· medicamentos que diminuem a secreção ácida (antagonistas do receptor H2 da histamina ou IBP), quando os sintomas, como dor retroesternal e azia, e/ou complicações, como a esofagite, estão associados à ação do ácido no esôfago ou em outros órgãos, como os sintomas respiratórios.
Agentes procinéticos
Os procinéticos aumentam o tônus do EEI e melhoram a depuração esofágica e o esvaziamento gástrico.
Os efeitos colaterais dessas medicações são mais importantes do que os benefícios por eles alcançados, no tratamento da DRGE. Ex. Metoclopramida (melhora o esvaziamento gástrico e a peristalse esofágica, e aumenta a pressão no EEI), Bromoprida (Não existem ensaios clínicos controlados que apoiem a sua utilização ou comprovem seus benefícios na DRGE. Como apresenta efeitos colaterais neurológicos, como os extrapiramidais, não se deve indicá-la de rotina no tratamento da DRGE); Domperidona (aumenta a pressão no EEI e melhora a motilidade, podem ocorrer manifestações cardiovasculares associadas ao uso da domperidona, como prolongamento do intervalo QT e arritmias ventriculares).
Inibidores da secreção ácida
· Antagonistas do receptor H2 da histamina: são definidos como drogas de segunda linha. são fármacos que diminuem a acidez gástrica, por inibirem os receptores H2 de histamina nas células parietais gástricas, seu uso como sintomático, para alívio rápido dos sintomas. A eficácia dos bloqueadores H2 na cicatrização das lesões erosivas é maior nos casos leves e moderados. Como efeitos colaterais, algunslactentes podem apresentar cefaleia, sonolência, ato de bater a cabeça e outros, que são erroneamente interpretados como sintomas persistentes de refluxo, o que pode resultar em um aumento inapropriado da dose. 
· Inibidores da bomba de prótons: inibe a H+/K+ATPase, inibindo a via final da secreção ácida pelas células parietais. Droga de escolha para pacientes muito sintomático e com complicações, indicados nos casos de esofagite erosiva, estenose péptica ou esôfago de Barrett, bem como nas crianças que necessitam de um bloqueio mais efetivo da secreção ácida. A sua potente supressão ácida acarreta diminuição do volume intragástrico nas 24 horas, o que facilita o esvaziamento gástrico e diminui o volume do refluxo. Os IBP atualmente existentes são: omeprazol, pantoprazol, esomeprazol, lansoprazol, rabeprazol e dexlansoprazol. Podem causar quatro tipos de efeitos colaterais nas crianças: reações idiossincráticas, interações com outras drogas, hipergastrinemia e hipocloridria induzidas por droga. Os IBP devem ser usados antes da primeira refeição e protegidos do ácido gástrico pela cobertura entérica. Após uso prolongado, deve-se diminuir gradativamente a dose do IBP. Em alguns pacientes, a descontinuação abrupta do tratamento com IBP pode ocasionar um efeito rebote na produção de ácido, requerendo mais IBP.
Lactentes normais, com sintomas de RGE, devem ser tratados, inicialmente, com medidas conservadoras (orientações de dieta e posição) e avaliados para alergia à proteína do leite de vaca. A maioria desses lactentes melhora com o tempo e não apresenta doença induzida pelo ácido, não se beneficiando, portanto, com IBP. Se as medidas conservadoras falham, assim como a busca de outra etiologia, o paciente deve ser encaminhado ao gastroenterologista pediátrico.
Tratamento Cirúrgico 
Recomendado aos pacientes onde há necessidade de usar a medicação ininterruptamente, além dos intolerantes ao tratamento clínico prolongado e aqueles onde há formas complicadas da doença.

Continue navegando