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1 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 Módulo dermato 1. RELACIONAR O MECANISMO DO ALCOOL COM A HEPATOPATIA CRONICA. O álcool consegue produzir efeitos adversos em diversos órgãos, sendo que especificadamente no fígado sua patogênese pode ser compreendida com uma evolução em três fases: esteatose, hepatite alcoólica e cirrose. O principal fator determinante para evolução do indivíduo dentre essas fases se deve ao fato da quantidade de consumo de álcool, bem como a presença de fatores “amplificadores de risco”. O álcool é absorvido pelas mucosas gástricas (75%) e pela parede intestinal (25%) através do processo de difusão passiva, não havendo a necessidade de digestão. No estômago aparece a primeira etapa do processo de digestão, pela presença de três isoenzimas as quais variam de acordo com fatores étnicos. No fígado o metabolismo apresenta três vias: desidrogenase alcóolica no citosol dos hepatócitos, sistema oxidativo do etanol (MEOS) e na catalase presente nos peroxissomos Em geral, o aumento da oxidação do etanol culmina na produção em excesso de NADH, alterando a homeostase da célula, favorecendo o acúmulo de ácido lático, redução do pH, redução da capacidade dos rins de excretar ácido úrico, levando a um estado de hiperuricemia. Em homens o consumo > 80 g/dia por mais de dez anos e mulheres > 30-40 g/dia por mais de dez anos já é o suficiente para gênese de esteatose hepática. Um fator que contribui para um menor limiar de quantidade de álcool em mulheres é a menor concentração da enzima álcool desidrogenase que permite uma maior concentração do mesmo no sangue quando comparado com o sexo masculino na mesma quantidade de ingesta. Alguns fatores são responsáveis pela amplificação do risco da evolução da esteatose hepática para a hepatite alcóolica. São eles: a presença de hepatites virais crônicas (B e C), obesidade, hemocromatose, desnutrição, polimorfismo nos genes que codificam as enzimas do citocromo P450, presença de TNF-alfa. A ausência desses fatores reduz a chance de um indivíduo passar pela evolução dos estágios em 5%. O etanol absorvido após a ingesta é metabolizado predominantemente na região centrolobular do lóbulo hepático, local em que há uma maior concentração da enzima álcool desidrogenase. O metabolismo do excesso do etanol resulta em um consumo acentuado de oxigênio, prejudicando o funcionamento das mitocôndrias, bloqueando a oxidação de ácidos graxos e culminando no acúmulo de gotículas de gordura nos hepatócitos. O principal metabólito envolvido na degradação do álcool é o acetaldeído, substância na qual apresenta um poder de toxicidade importante no organismo, interagindo com proteínas presentes nos hepatócitos e induzindo uma resposta imune com a formação de “neoantígenos”. O processo arrastado e crônico culmina na formação de áreas de necrose inflamatória decorrente da toxicidade do metabólito e o acúmulo de substâncias reativas do oxigênio oriundas do metabolismo do etanol. Outra característica presente na hepatopatia alcóolica é o aumento da absorção de toxinas bacterianas como LPS (lipossacarídeo) que culmina na ativação das células de Kupffer e indução da produção e liberação de citocinas inflamatórias como TNF-alfa. Tal persistência resulta em fibrose e desestruturação do parênquima hepático, favorecendo a formação de cirrose pela indução de secreção de colágeno pelas células estreladas. O metabolismo do álcool aumenta a necessidade de nutrientes, como: colina e ácido fólico (anemia megaloblástica) e redução de albumina. A desnutrição pode também ser secundária a ingesta alcoólica o que sugere um má-absorção, disfunção dos enterócitos, piora da secreção das proteínas e piora do metabolismo das vitaminas. A esteatose-hepatite, chamada também de hepatite alcoólica é marcada pela presença de necrose hepática, presença de infiltrado neutrofílico, distribuição central, presença de corpúsculos de Mallory (acúmulo intracitoplasmáticos de material eosinofilico, Sp1 - A vida e dura! 2 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 por consequência da lesão induzida pelo etanol). A presença da infiltração neutrofílica e presença de necrose são os grandes marcos da esteato-hepatite alcoólica. A cirrose hepática constitui o surgimento da fibrose hepática, sendo necessário um remodelamento da citoarquitetura do parênquima hepático. No parênquima hepático há a presença de sinusoides para promover a circulação entre os sistemas porta e circulação sistêmica, em que as substâncias provenientes da digestão são captadas para ser metabolizadas. Tais vasos são frenestrados e desprovidos de membrana basal (facilitando a saída de substâncias para o espaço do Disse). Outra célula importante envolvida nos mecanismos de patogênese é a células estreladas. Tais células armazenam vitamina A e possuem um metabolismo quiescente que frente a indução de um processo inflamatório os efeitos parácrinos das citocinas pró-inflamatórias (secretadas pelas células de Kupffer) induz a síntese e secreção de matriz celular, resultando na formação rede de fibrose. As características clínicas da hepatite alcoólica são icterícia, anorexia, febre e hepatomegalia dolorosa. Testes laboratoriais revelam transaminases moderadamente elevadas (tipicamente menos de 300 int. unidade/mL), com uma razão (AST) para (ALT) de dois ou mais. Os pacientes também podem apresentar dor no quadrante superior direito/epigástrico, encefalopatia hepática e sinais de desnutrição. Sinais e sintomas — Os sinais e sintomas comuns da hepatite alcoólica incluem: Icterícia que se desenvolveu nos três meses anteriores à apresentação. Anorexia. Febre. A febre só deve ser atribuída à hepatite alcoólica quando outras fontes são excluídas, incluindo peritonite bacteriana espontânea, pneumonia e infecções do trato urinário. Dor abdominal no quadrante superior direito/epigástrica, que pode ser grave o suficiente para simular um abdome agudo. Distensão abdominal por ascite. Fraqueza muscular proximal devido à perda de massa muscular. Pacientes com hepatite alcoólica grave e/ou cirrose subjacente podem apresentar sinais de encefalopatia hepática. EXAME FÍSICO – No exame físico, os pacientes geralmente apresentam hepatomegalia, que muitas vezes reflete os efeitos combinados de fígado gorduroso e inchaço dos hepatócitos devido à retenção de proteínas associada à lesão celular. O fígado pode estar sensível, mas a presença de dor abdominal mais difusa é incomum e sugere outros diagnósticos, como peritonite bacteriana espontânea. Um sopro ouvido sobre o fígado também é uma característica da hepatite alcoólica grave e foi relatado em mais de 50% dos pacientes. Os pacientes geralmente têm ascite, que pode ser devido à cirrose subjacente com hipertensão portal ou obstrução venosa portal transitória por edema hepático. A paracentese deve ser realizada, sob orientação ultrassônica, se necessário, em todos os pacientes com ascite confirmada presente na ultrassonografia. A presença de estigmas de doença hepática crônica (por exemplo, angiomas em aranha, eritema palmar, ginecomastia) sugere doença avançada com cirrose subjacente. Em pacientes desnutridos (comum naqueles com hepatite alcoólica grave), o exame físico pode revelar perda de massa muscular proximal e diminuição da força de preensão. A desnutrição é um fator de risco independente para mortalidade e complicações infecciosas, e as infecções são mais comuns em pacientes com hepatite alcoólica do que aqueles com apenas cirrose alcoólica. 2. RELACIONAR AS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS COM A FISIOPATOLOGIA DA HEPATOPATIA. DOENÇAS HEPÁTICAS Existem diversas doenças que acometem o fígado e vias biliares e também as mucosas e a pele. Serão abordadasa cirrose, a hemocromatose, as hepatites virais e também a porfiria cutânea tarda e a doença de Wilson. A) CIRROSE 3 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A cirrose hepática pode causar diferentes sinais semiológicos. O eritema palmar, aranhas vasculares, hemangioma arteriovenoso (facial), circulação colateral em cabeça de medusa, flushing, facies pletórica, angioendoteliomatose, prurido, alterações ungueais, queda de cabelo, rarefação dos pelos corporais, vasculite, reações urticariformes e icterícia são manifestações comuns. As alterações ungueais são inespecíficas, podendo surgir em outras doenças como a síndrome nefrótica ou após quimioterapia por exemplo. Mesmo assim, estão classicamente associadas as unhas de Terry, apresentando‐se com o leito ungueal branco com faixa distal rosa ou acastanhada; e as unhas de Muehrcke, com faixas brancas transversais. Baqueteamento digital e contratura de Dupuytren também podem ser encontradas B) HEMOCROMATOSE C) HEPATITE VIRAL Existem vários achados cutâneos relacionados às hepatites virais. Em todas elas podem ser encontradas icterícia e urticária. Na hepatite B e C, pode haver urticária‐vasculite. No paciente com hepatite B aguda pode ocorrer edema periorbital, exantema, reações liquenoides, doença do soro símile e PAN. No quadro crônico estão descritas crioglobulinemia mista, vasculite, exantema, síndrome de Gianotti‐Crosti. A hepatite C tem relação com prurido, crioglobulinemia, porfiria cutânea tarda, vasculite, livedo reticular, líquen plano, síndrome de Sjögren, urticária e PAN. O hepatocarcinoma, uma das complicações da infecção crônica pelo vírus C, tem relação bem estabelecida com a crioglobulinemia mista, a PCT e com o líquen plano. D) PORFIRIA CUTÂNEA TARDA A porfiria cutânea tarda (PCT) é doença causada pela deficiência da enzima hepática uroprofirinogênio descarboxilase que altera a síntese do heme e afeta o fígado e a pele. A fotossensibilidade é a regra e manifesta‐se como vesico‐bolhas que geralmente evoluem com milia, alteração pigmentar e cicatrizes. Outros achados são hipertricose e lesões fibrosas cicatriciais. E) DOENÇA DE WILSON A doença de Wilson (DW) é distúrbio do metabolismo do cobre que leva a seu acúmulo no fígado, mas também em outros órgãos e tecidos. As manifestações mucocutâneas podem ocorrer em decorrência dessa deposição, secundária ao tratamento com D‐ penicilamina ou como repercussão de cirrose hepática. As alterações mais descritas são hiperpigmentação distal nos membros inferiores, a lúnula azul e o anel de Kayser‐Fieischer (círculo de pigmentação na periferia da córnea). 3. ENTENDER A FISIOPATOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO DA ICTERICIA A icterícia é definida como uma coloração amarelada na pele, da esclerótica e do frenulo da língua, provocada por um aumento da fração indireta da bilirrubina, gerando quando >7mg/dl ou da sua fração direta, menos frequente. A icterícia decorrente do aumento da fração indireta de bilirrubina confere a pele uma tonalidade amarela brilhante ou alaranjada. Já nas condições associadas à hiperbilirrubinemia direta, esta confere uma cor amarelo-esverdeada. A grande complicação desta impregnação não acontece a nível cutâneo, mas sim encefálico. Pois, em níveis muitos elevados, a bilirrubina indireta pode cruzar a barreira hematoencefálica produzindo efeitos tóxicos obre os neurônios, levando a um quadro de encefalopatia bilirrubínica; FISIOPATOLOGIA Cerca de 85% da bilirrubina produzida no corpo tem origem na degradação de hemácias senis. O produto final desta destruição das hemácias idosas é a liberação da Hemoglobina. Então, a Hb é quebrada em duas partes: globina e heme. O heme por sua vez ainda pode ser quebrado em duas partes: ferro e protorfirina. Agora que o corpo conseguiu reaproveitar o ferro, sobra a protoporfirina, que inicialmente será transformada em biliverdina, que rapidamente é reduzida a bilirrubina. HEME » PROTOPORFIRINA » BILIVERDINA » BILIRRUBINA Esta bilirrubina se liberta do interior dos macrófagos e chega ao plasma. Mas por ser insolúvel neste meio, ela precisa caminhar pelo plasma ligada a uma proteína solúvel (albumina). E como a bilirrubina não se encontra diretamente no plasma, mas ligada a albumina, chamamos de bilirrubina indireta. Obs: depois de entender que a bilirrubina indireta tem origem na degradação da hemoglobina ao passar pelo baço, consegue entender melhor por que a hemólise aumenta a produção de bilirrubina indireta. 4 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A bilirrubina indireta segue em direção ao fígado, onde sofre 3 processos: CAPTAÇÃO, CONJUGAÇÃO E EXCREÇÃO! Isso significa que num primeiro momento, os hepatócitos irão captar a BI disponível no sangue e já dentro dos hepatócitos, ela sofre a transformação em um composto solúvel através da enzima glicuroniltransferase, num processo que chamamos de conjugação. Dessa forma, a conjugação é responsável por transformar BI (insolúvel) em BD (solúvel) para então ser excretado. A BD ao ser excretada pela bile diretamente no lúmen intestinal e atingir o íleo terminal e colón, tem uma parte metabolizada por bactérias, dando origem a um novo composto: o urobilinogênio. Uma parte desse urobinogênio é absorvida e retorna a circulação para ser excretado na urina (urobilina). O restante que não foi capturado pelas bactérias sai nas fezes e passa a se chamar estercobilina, sendo o responsável pela coloração fecal. Bilirrubina insolúvel = indireta = não conjugada; Bilirrubina solúvel = direta = conjugada. ETIOLOGIA HIPERBILIRRUBINEMIA INDIRETA Quem é que pode causar aumento da fração indireta? Uma vez que só existem três processos entre a BI e a BD, só teremos aumento de BI se houver alteração em um deles. Logo, as principais causas são: I. Superprodução de bilirrubina indireta: hemólise; II. Diminuição da captação: medicamentos (ex.: rifampicina), jejum prolongado, infecções; III. Diminuição na conjugação: síndromes genéticas e imaturidade do sistema de conjugação (recém-natos). Para facilitar: ao encontrarmos um paciente com aumento predominante de BI, vamos pensar sempre assim: o distúrbio foi causado por hemólise ou distúrbios primários (síndrome genética)? HIPERBILIRRUBINEMIA DIRETA Considere agora que a bilirrubina já passou pelas fases de captação e conjugação e se encontra em sua forma solúvel (bilirrubina direta). O que poderia levar ao acúmulo desta forma (BD)? Ou os hepatócitos estão lesados e não conseguem excretar bilirrubina para os canalículos biliares ou há alguma obstrução que não permite que a bile chegue ao intestino. Portanto, teremos ou uma síndrome colestática ou uma síndrome de lesão hepatocelular. I. SINDROME HEPATOCELULAR = HEPATITE: conjunto de sinais e sintomas que surgem quando os hepatócitos estão sendo lesados em grande escala. Não necessariamente na hepatite viral, mas qualquer forma de agressão ao parênquima hepático; II. SÍNDROME COLESTÁTICA = OBSTRUÇÃO BILIAR: conjunto de sinais e sintomas que surgem quando a arvore biliar é obstruída, seja dentro do fígado (nas pequenas vias biliares) ou não (ductos hepático/colédoco); 5 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 A etapa "limitante" do metabolismo da bilirrubina – ou seja, aquela que é mais sensível, mais facilmente abalável – é a terceira (excreção da BD formada para o canalículo biliar). Isto porque se trata de uma fase que ocorre por um processo ativo dependente de ATP. E quando há lesão hepática, esse é o primeiro processo a limitar o metabolismo da bilirrubina. Ou seja, em condições adversas, os hepatócitos conseguem captar, conjugar, mas têm dificuldade em excretar! E é por esse motivo que, na lesão hepatocelular, o fígado acumula BD. QUADRO CLÍNICOTanto na lesão hepatocelular quanto na colestase existe icterícia, colúria e acolia fecal, fadiga, anorexia, náuseas, vômitos e dor no hipocôndrio direito. O único sinal clinico que pode efetivamente ajudar na diferenciação é o prurido, que embora possa surgir na lesão hepatocelular, ocorre de forma muito mais característica na síndrome colestática e resulta do acumulo de ácidos e sais biliares na pele. Colúria: coloração acastanhada-escura da urina (cor de coca-cola). Acontece pela presença de BD na urina. Somente as condições que aumentam a BD podem originar coluria. Assim, quando elevada no sangue, a BD consegue ser filtrada pelos glomérulos, aparecendo na urina. Acolia fecal: coloração esbranquiçada das fezes. Qualquer condução que reduza a presença de BD na bile, como é o caso da colestase, pode originar fezes pálidas, esbranquiçadas. EXAMES LABORATORIAIS Valores normais: bilirrubina total (até 1,0 mg/dl); bilirrubina direta (0,3 mg/dl); bilirrubina indireta (0,9 mg/dl). Como a clínica por si só não é capaz de diferenciar as duas principais causas de icterícia (hepatocelular x colestática), sobrou para os exames laboratoriais a responsabilidade desta distinção. 1. Alanina Aminotransferase (ALT) = Transaminase Glutâmico-Pirúvica (TGP); 2. Aspartato Aminotransferase (AST) = Transaminase Glutâmico-Oxalacética (TGO); 3. Fosfatase alcalina (FA); 4. Gamaglutamiltransferase (GamaGT). Um pequeno "escape" fisiológico dessas transaminases dos hepatócitos para a circulação explica uma concentração sérica de até 45 U/L (valor de referência). Entretanto, as condições que promovem lesão dos hepatócitos geralmente determinam um grande extravasamento dessas enzimas para a corrente sanguínea. A TGP é mais especifica do fígado – praticamente só encontrada nos hepatócitos. A TGO pode ser encontrada no fígado, mas também em outros tecidos, como miocárdio musculoesquelético, rins e cérebro. A Fosfatase Alcalina (FA) é formada pelo hepatócito e pode ser encontrada tanto em seu interior quanto nos canalículos biliares. Sua produção aumenta em duas situações: 1. Quando a pressão no interior do sistema biliar é elevada, extravasando para a corrente sanguínea durante o processo de colestase (retenção biliar); e 2. Nas doenças infiltrativas hepáticas, como neoplasias e granulomas. 6 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 Obs: Como existe também a fosfatase alcalina óssea, sempre quando encontramos a FA sérica elevada, precisamos confirmar se realmente a sua origem é hepática. Fazemos isso, solicitando pelo menos mais uma enzima que se eleva na colestase... Pode ser a Gamaglutamiltransferase (Gama GT) ou a 5’- nucleotidase (5’-NT), ambas produzidas e liberadas pelas células epiteliais dos dúctulos biliares. ■ REGRA PRÁTICA 1: se o aumento das transaminases for maior que dez vezes o valor de referência (alguns falam > 300 U/L), a síndrome é com certeza hepatocelular. ■ REGRA PRÁTICA 2: se o aumento da FA exceder 4x o valor de referência, a síndrome é com certeza colestática. ■ REGRA PRÁTICA 3: níveis de transaminases superiores a 1.000 U/L, com ALT > AST são bastante sugestivos de hepatite viral aguda!!! Outras causas são: intoxicação por paracetamol, isquemia hepática grave. ■ REGRA PRÁTICA 4: nas hepatites em geral, os níveis de ALT costumam ser superiores aos de AST – a inversão deste padrão clássico, em especial quando AST > 2x ALT, sugere bastante a hepatite alcoólica como responsável pelo quadro. Nestes casos, a gamaGT costuma estar bem elevada (por um mecanismo diferente da colestase) Dentre as “provas de função hepática”, destacam-se a albumina e o tempo de protrombina (INR). Estas medem o poder de síntese dos hepatócitos; quando gravemente disfuncionantes, sintetizam menos albumina (hipoalbuminemia) e menos fatores de coagulação (TAP alargado). 4. INTERPRETAR AS ALTERAÇÕES LABORATORIAIS PRESENTES NA HEPATOPATIA (PROVAS DE FUNÇÃO, LESÃO E COLESTÁTICAS) 5. COMPREENDER OS FATORES DE PIORA DA CIRROSE 6. EXPLICAR A IMPORTANCIA DO TRATAMENTO MULTIPROFISSIONAL E IMPACTO NO PACIENTE ETILISTA! 7. COMPREENDER A CORRELAÇÃO ENTRE OS DISTÚRBIOS METABÓLICOS E AS MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS; Diabetes mellitus 1. Necrobiose lipoídica: doença inflamatória crônica não pruriginosa, granulomatosa com degeneração do colágeno. Habitualmente, inicia‐se com pápulas eritematosas e evolui lentamente para placa marrom‐ amarelada com centro atrófico e telangiectasias. Há maior prevalência em mulheres do que em homens, e é comumente localizada na região anterior das pernas com localização simétrica. Em 35% dos casos, as lesões podem ulcerar, comumente complicadas por infecções bacterianas secundárias. A maioria dos casos tem curso crônico, porém algumas vezes pode ocorrer melhora espontânea. 2. Scleredema adultorum de Buschke: caracterizado por endurecimento extenso lentamente progressivo, semelhante à esclerodermia da pele do dorso, região cervical posterior, ombros e face. É definida por deposição de colágeno e mucopolissacarídeos na derme, com espessamento da pele, rigidez e comprometimento da motilidade, principalmente nos ombros. É desordem rara, que pode ser sub‐ reconhecida. Também pode ser encontrado em outras doenças como neoplasias, paraproteinemias e infecções. Pápulas de Huntley (pequenas pápulas eritematosas agrupadas) podem estar presentes. Na doença extensa, toda a pele, bem como órgãos internos, como pulmão, pode estar envolvida. 3. Bulose diabeticorum: geralmente em pacientes com diabetes de longa data (também pode ser manifestação inicial da doença), que se manifesta com bolhas serosas tensas sem sinais de inflamação cutânea e indolores. Surgem predominantemente nas extremidades inferiores, especialmente nos pés; entretanto, podem acometer as mãos e o tronco. As lesões emergem rapidamente e cicatrizam em algumas semanas. Cerca de 0,5% dos indivíduos com diabetes desenvolvem bolhas específicas no curso da doença. 7 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 4. Granuloma anular (GA): caracteriza‐se por pápulas normocrômicas a eritematosas, formando placas de conformação anular no dorso dos pés e mãos ou na superfície extensora de articulações (como o cotovelo). Costuma aparecer em diabéticos, mas a associação com doenças infecciosas, como hepatite e HIV, e tumores, como linfoma e carcinoma, também é descrita. A doença é frequentemente assintomática e as lesões involuem no centro da placa com hipo ou hiperpigmentação. A maioria das lesões cicatriza espontaneamente. Formas disseminadas de GA são cosmeticamente inestéticas e podem ser algo pruriginosas. 5. Acantose nigricans: caracteriza‐se por placas hiperpigmentadas intertriginosas. Região cervical e axilas são comumente afetadas no paciente diabético. Em geral, antecede o diagnóstico de diabetes e pode aparecer no estado de hiperinsulinemia com valores normais de hemoglobina glicosilada. Também pode ser observada na síndrome dos ovários policísticos e em obesos. Pode se manifestar como doença paraneoplásica e em doenças gastrintestinais malignas. Além disso, casos induzidos por fármacos foram relatados. 6. Vitiligo: como doença autoimune, ocorre concomitante a outras doenças autoimunes com frequência, como diabetes mellitus insulinodependente e doenças da tireoide. As lesões acrômicas frequentemente afetam as extremidades, face e região cervical, bem como tronco, e tendem a ser simétricas e de fácil diagnóstico. 7. Carotenodermia: pele e unhas amareladas podem ser atribuídas à hipercarotenemia em diabéticos. 8. Líquen plano: cerca de 25% dos pacientes com líquen plano têm diabetes. Os achados clínicos mostram lesões característica acompanhadas de prurido localizadas nos tornozelos e punhos, com envolvimentoopcional da mucosa. Outras doenças sistêmicas também podem estar associadas ao líquen plano, como enfermidades hepáticas, intestinais e timoma. 9. Colagenose reativa perfurante adquirida: doença cutânea rara, vista em pacientes diabéticos, bem como na doença renal crônica e hiperuricemia. A patogênese permanece desconhecida. Embora seja rara, a clínica é típica: pápulas e nódulos eritematosos pruriginosos umbilicados que representam a eliminação transepidérmica de debris dérmicos. O fenômeno de Koebner é comum nesses pacientes. 8 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 10. Angiopatia diabética e doenças de pele associadas à neuropatia: a) Síndrome do pé diabético: a combinação de angiopatia diabética, neuropatia e trauma mecânico desempenha um papel importante na sua patogênese, que cursa com úlcera crônica, na qual 25% dos pacientes desenvolvem complicações como infecções e osteomielite. b) Síndrome da mão diabética: o diabetes também pode provocar distúrbios musculoesqueléticos nas mãos, como limitação da mobilidade articular (LMA), doença de Dupuytren (DD) e síndrome do túnel do carpo (STC). A LMA é caracterizada por espessamento e rigidez do tecido conjuntivo periarticular das pequenas articulações da mão, causando limitação da extensão dos dedos. A DD é causada por fibrose e consequente espessamento e encurtamento da fáscia palmar, resultando em contraturas de flexão. Já a STC caracteriza‐se por hipo ou disestesias na área de inervação do nervo mediano da mão. c) Dermopatia diabética: pode resultar de pequenos traumas. É manifestação frequente do diabético e acompanha outras doenças como nefropatia, retinopatia ou neuropatia. A doença tende a aparecer nas extremidades inferiores de homens idosos. O achado clínico mostra máculas eritematosas assintomáticas ou pápulas de rápido crescimento. As lesões têm curso recorrente e melhoram espontaneamente, com formação de cicatrizes hipotróficas acastanhadas. 11. Infecções cutâneas comuns em pacientes com diabetes: manifestações cutâneas de infecções bacterianas e fúngicas são frequentes nos diabéticos. Infecções cutâneas recorrentes devem ser motivo de investigação de diabetes mellitus. O Staphylococcus aureus pode causar piodermites (foliculite, abcessos e impetigo). Já os estreptococos estão associados a ectima, celulite e impetigo contagioso estreptocócico (neste caso, Streptococcus – hemolítico). A fasciíte necrosante é complicação rara da infecção por Streptococcus; porém, S. aureus ou bactérias anaeróbias podem estar envolvidas. A gangrena de Fournier é variante perineal ou genitoanal grave da fasciíte necrosante com elevada taxa de mortalidade. A pele do trato otorrinolaringológico também é propensa a infecções bacterianas nos diabéticos. A otite externa maligna é infecção bacteriana invasiva comumente causada por Pseudomonas aeruginosa e pode ter curso letal. A infecção normalmente começa assintomática e causa otalgia com saída de secreção purulenta. Casos graves podem se estender, atingir o crânio e o sistema nervoso central, manifestando‐se com meningite e cerebrite. A candidíase é infecção fúngica comum em diabéticos. Candida albicans é o patógeno mais prevalente e pode afetar pele e mucosas, bem como a região periungueal (paroníquia). A infecção causada por dermatófitos (dermatofitose cutânea ou onicomicose) também é comum. Mucormicose rinocerebral é doença grave, de alta mortalidade e associada à cetoacidose diabética. É causada, principalmente, por espécies do gênero Rhizopus, Rhizomucor e Lichtheimia (previamente denominada Absidia), fungos oportunistas e angioinvasivos. Clinicamente, se inicia como sinusite com secreção nasal serosanguinolenta que evolui para edema periorbital, coloração eritemato‐violácea, com sinais de necrose cutânea, mucosa nasal e oral. Há sinais de toxemia, dor local e febre. Pode haver paralisia facial periférica. A evolução é rápida para grave comprometimento do sistema nervoso central. 12. Complicações da terapia antidiabética. a) Reações cutâneas causadas pela insulina: reações alérgicas sistêmicas: angioedema, urticária generalizada ou anafilaxia, rubor, prurido palmoplantar ou disseminado. As reações locais são urticariformes ou como eczema, com eritema, pápulas e vesículas no local da injeção, acompanhadas de prurido. Pode haver doença do soro‐símile. A lipodistrofia, menos comum que as reações alérgicas, ocorre após 6 a 24 meses de aplicação contínua de doses de insulina sempre no mesmo local. A introdução de insulinas purificadas reduziu a incidência de lipoatrofia. b) Reações cutâneas induzidas por antidiabéticos orais: são observados exantema macular, urticária e eritema multiforme. Fotossensibilidade pode ocorrer com a tolbutamida e a clorpropamida. Erupções liquenoides e lesões semelhantes à rosácea podem ocorrer em 1 a 5% dos indivíduos em uso de hipoglicemiantes orais. De todos os medicamentos hipoglicemiantes orais, as sulfonilureias são as que mais frequentemente causam farmacodermias (as de segunda geração causam menos efeitos adversos cutâneos do que as de primeira geração). 13. Prurido: pode estar associado ao diabetes, e será discutido adiante. Dislipidemia a) Xantoma tuberoso: surge como pequenas pápulas, moles, amareladas, eritematosas, localizado em áreas 9 Marcela Oliveira - Medicina UNIFG 2022 de pressão (cotovelos, joelhos, região glútea); são indolores e se agrupam formando lesões tumorais. A presença de xantoma tuberoso sugere elevação do colesterol sérico e LDL, mas também pode ser visto com aumento de triglicerídeos. Tem maior associação com a hiperlipidemia mista tipo III e tipo IIa, maior incidência de doença vascular aterosclerótica e são raramente associados à hipercolesterolemia secundária.3 b) Xantoma tendinoso: corresponde a nódulos firmes de tamanhos variados e observados em áreas sobre tendões (geralmente tendões extensores das mãos, joelhos, cotovelos e tendão de Aquiles). Estão associados à hipercolesterolemia familiar ou secundária, assim como xantomatose cerebrotendinosa e beta‐sitosterolemia. Pacientes com xantomas tendinosos têm incidência extremamente alta de doença vascular aterosclerótica. c) Xantoma eruptivo: de manifestação abrupta e eruptiva, caracteriza‐se por múltiplas pápulas medindo de 1 a 4 mm, amareladas, com halo eritematoso. As lesões podem coalescer formando lesões nódulo‐ tumorais. Ocorre mais comumente sobre pontos de pressão e superfícies extensoras dos braços. Mais raramente, podem estar difusamente espalhados pelo tronco ou nas membranas mucosas. Ao contrário dos outros xantomas, o xantoma eruptivo pode ser pruriginoso. Estão ligados à hipertrigliceridemia secundária e, mais raramente, primária (tipos IV, V e I). Pacientes com xantoma eruptivo apresentam risco alto de ocorrência de pancreatite. d) Xantoma plano: é a manifestação clínica mais frequente, classificada em três tipos: xantelasma, xantoma estriado e xantoma plano. Os xantelasmas são pápulas poligonais, amareladas, localizadas nas pálpebras (mais comumente no canto medial). Pelo menos 50% dos pacientes com xantelasmas não apresentam dislipidemia. Quando lipídios séricos estão anormais (pacientes mais jovens), o colesterol é a fração geralmente elevada. Os pacientes podem também apresentar a córnea arcus como sinal de hipercolesterolemia. Algumas hiperlipoproteinemias secundárias, como colestase, também podem estar associadas com xantelasmas. ADRENAL 1. Síndrome de Cushing: corresponde ao conjunto de características clínicas causadas principalmente por hipercortisolemia. As manifestações cutâneas incluem face de lua, corcunda de búfalo, correspondente ao depósito de tecido adiposo na região dorso cervical, região cervical aumentada de diâmetro e curto,consequente ao acúmulo de gordura supraclavicular, exoftalmia, pelo depósito de gordura retro‐orbitária, hematomas espontâneos, cicatrização retardada de feridas, atrofia cutânea, striae distensae, hiperpigmentação, acantose nigricans, além de lesões acneiformes (acne dos corticoides). 2. Doença de Addison/insuficiência adrenal primária: decorre mais comumente por mecanismos autoimunes. As principais manifestações mucocutâneas são hiperpigmentação cutânea difusa, capilar e de mucosas. Também podemos observar perda de pelos axilares e pubianos além de bandas longitudinais hiperpigmentadas de localização ungueal. 3. Feocromocitoma: A única manifestação cutânea significativa do feocromocitoma é o rubor paroxístico mais proeminente na face, tórax e extremidades superiores. Quando os feocromocitomas ocorrem como parte de uma síndrome genética, as manifestações cutâneas dessa síndrome também podem ser aparentes. HIPOPITUITARISMO As lesões cutâneas podem ser a primeira indicação para a suspeita diagnóstica. A pele e os tecidos subcutâneos tornam‐se finos, os pelos escassos e a pele pálida ou amarelada. Os sinais de hipopituitarismo podem ser evidentes e pode haver sintomas da deficiência de gonadotrofina, especialmente redução na libido. As manifestações endócrinas do hipopituitarismo variam com o tipo, idade de desenvolvimento e grau da deficiência hormonal.
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