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MAUS TRATOS NA INFÂNCIA - HAM III

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1 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
↠ Três quartos das crianças de 2 a 4 anos do mundo – 
cerca de 300 milhões – sofrem agressão psicológica e/ou 
punição física tendo como autores os seus cuidadores 
(CORRÊA et. al., 2019). 
↠ No Brasil, estima-se que 10 a cada 1000 crianças seja 
vítima de violência e que dentre elas cerca de 2% a 3% 
morrem (CORRÊA et. al., 2019). 
↠ Pode ocorrer em diversos contextos incluindo o 
ambiente familiar, escolar e também na comunidade em 
geral (CORRÊA et. al., 2019). 
↠ O ambiente doméstico, que deveria representar 
segurança para a criança, pode ser palco de várias formas 
de maus-tratos (físicos, psicológicos, sexual, negligência 
etc.), muitas vezes com graves sequelas e até risco de 
morte (PESSO, 2011). 
IMPORTANTE: Embora frequente, a violência contra crianças e 
adolescentes é um capítulo pouco abordado durante a formação 
médica. Tal fato contribui para o subdiagnóstico dessa condição. Além 
disso, mesmo quando diagnosticado, o profissional de saúde, em geral, 
não sabe como conduzir o caso ou então possui receio de tomar as 
medidas cabíveis (CORRÊA et. al., 2019). 
MAUS TRATOS CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES 
↠ Maus tratos contra crianças e adolescentes ocorrem 
quando: “(...) um sujeito em condições de superioridade 
(idade, força, posição social ou econômica, inteligência, 
autoridade) comete um ato ou omissão capaz de causar 
dano físico, psicológico ou sexual, contrariamente à 
vontade da vítima (CORRÊA et. al., 2019). 
OBS.: Apesar da obrigatoriedade da notificação dos casos de maus 
tratos contra crianças e adolescentes, os profissionais de saúde 
tendem a não fazê-lo por uma série de razões, dentre elas o medo 
de retaliação por parte do agressor e a crença de que a notificação 
não irá resolver o caso (CORRÊA et. al., 2019). 
↠ A negligência ou abandono caracteriza-se pela 
omissão de cuidados básicos e de proteção à criança. É 
o tipo mais frequente de maus tratos e pode ocorrer de 
três maneiras: negligência física, negligência emocional, 
negligência educacional (CORRÊA et. al., 2019). 
↠ O abuso físico ocorre quando um indivíduo usa 
intencionalmente a força física para ferir a vítima. É o tipo 
de violência de maior visibilidade ou diagnóstico, pois deixa 
marcas, tais como equimoses, hematomas e soluções de 
continuidade (CORRÊA et. al., 2019). 
↠ O abuso sexual pode ocorrer de várias formas: (com 
penetração; sem penetração; com toque, carícias e 
exposição do genital; 
prostituição, voyeurismo, pornografia e assédio sexual 
(CORRÊA et. al., 2019). 
↠ O abuso psicológico ocorre quando há rejeição, 
discriminação ou desrespeito a criança. Punir, humilhar ou 
aterrorizar, bem como promover o isolamento social do 
indivíduo também são formas de abuso psicológico 
(CORRÊA et. al., 2019). 
 
VIOLÊNCIA FÍSICA 
➢ Pele: É o local do corpo mais atingido, com 
arranhões, lacerações, equimoses, hematomas e 
queimaduras em variados níveis de gravidade e 
com características diferentes das causadas por 
injúrias não intencionais. Lesões com formato 
definido podem sugerir o tipo do objeto utilizado 
na agressão, como mão, cintos, fivelas, fios ou 
cordões, mordidas e outros. (BURNS et. al., 2017). 
➢ Tecido conjuntivo e ósseo: As lesões de ossos 
e tecidos moles são as manifestações 
radiológicas mais comuns de abuso na infância e 
na adolescência, a segunda em frequência de 
uma maneira geral. As fraturas estão presentes 
em 36% dos pacientes vítimas de abuso físico, 
por isso, qualquer fratura deve ser analisada com 
cuidado, pois em 50% dos casos, são fraturas da 
diáfise dos ossos longos, semelhantes às que 
ocorrem no trauma acidental (BURNS et. al., 2017). 
OBS.: É importante precisar a época da fratura pela radiografia para 
verificar se existe incompatibilidade entre a história e o trauma. Atraso 
em dias para a busca de atendimento deve ser atentamente 
investigado e considerado, no mínimo, como negligência grave. 
(BURNS et. al., 2017). 
➢ Sistema Nervoso Central: As lesões 
intracranianas provocadas por abuso físico são 
as de maior gravidade, normalmente associadas 
HAM III 
2 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
com outros tipos de abuso, sendo as principais 
causas de morbidade e mortalidade, 
especialmente em menores de 2 anos de idade. 
As sequelas podem ser observadas em cerca 
de 80% dos que sofreram, quando crianças, 
agressões envolvendo região encefálica, sendo 
deficiência mental e déficits motores descritos 
em muitos casos (BURNS et. al., 2017). 
Síndrome do bebê sacudido (“shaken baby”): É uma das formas mais 
graves de lesão cerebral por violência contra crianças, provocada por 
sacudidas (uma ou mais) violentas do corpo da criança, que ocorre 
mais frequentemente até 2 anos de vida. As forças de aceleração e 
desaceleração, aliadas às de rotação, fazem a massa encefálica do 
bebê se movimentar bruscamente, com velocidades diferentes entre 
a parte superior, mais livre, e o tronco encefálico, que se chocam com 
a calota craniana, provocando vários tipos de lesões vasculares e 
teciduais, por contusão, rompimento ou cisalhamento. Como 
consequências imediatas, podem ser encontradas micro e macro-
hemorragias, contusões, rompimento de fibras nervosas, edema de 
sistema nervoso central e hemorragia retiniana, sem que haja, 
necessariamente, fratura da calota craniana (BURNS et. al., 2017). 
➢ Lesões abdominais: São frequentes em 
crianças maiores que deambulam e 
adolescentes, provocadas por agressão com as 
mãos (socos) ou com os pés, sendo os órgãos 
intra-abdominais colocados em 4º lugar em 
frequência de lesões intencionais. Esse tipo de 
trauma pode desencadear hemorragias em 
fígado, baço e pâncreas, hematomas em 
paredes do intestino, como duodeno e jejuno, 
levando a síndromes obstrutivas de difícil 
diagnóstico (BURNS et. al., 2017). 
 
DIAGNÓSTICO DE ABUSO FÍSICO EM CRIANÇAS 
↠ O conhecimento das formas de violência, bem como 
as suas manifestações é fundamental para realizar a 
suspeição clínica e, a partir disto, fazer o diagnóstico 
(CORRÊA et. al., 2019). 
↠ Deve-se suspeitar de maus tratos nas seguintes 
situações: (CORRÊA et. al., 2019). 
➢ lesões em áreas não comuns de acidentes e, 
quase sempre cobertas, tais como genitália, 
couro cabeludo e nádegas; 
➢ equimoses; 
➢ hematomas; 
➢ mordeduras; 
➢ lacerações; 
➢ lesões que lembram a arma utilizada pelo 
agressor; 
➢ lesões que não se justificam pelo tipo de 
acidente relatado; 
➢ lesões em vários estágios de cicatrização; 
➢ sinais de negligência tais como higiene precária, 
demoram em procurar atendimento médico, 
atraso no calendário vacinal e intoxicações por 
medicamentos e materiais de limpeza 
AVALIAÇÃO RADIOLÓGICA 
↠ Frente à suspeita de maus-tratos, a investigação 
radiológica completa de esqueleto é obrigatória até os 2 
anos de idade, visando à detecção de fraturas antigas e 
associadas; acima dessa faixa etária, desde que a criança 
consiga informar sobre traumas anteriores, as radiografias 
podem ser seletivas (BURNS et. al., 2017). 
↠ As indicações de exames laboratoriais, pesquisa 
toxicológica, exames de imagem como ultrassonografia, 
tomografia computadorizada (TC) e ressonância 
magnética (RM) devem ser direcionadas pela suspeita e 
quadro clínico (BURNS et. al., 2017). 
Atendimento 
↠ É fundamental que todo pediatra esteja apto para 
identificar a suspeita e assegurar o diagnóstico correto, o 
tratamento e os meios de proteção adequados para toda 
criança e adolescente em situação de risco para violência 
(BURNS et. al., 2017). 
↠ Dependendo do tipo e da extensão das lesões e da 
avaliação geral de cada caso, devem ser definidos os 
níveis de gravidade, as necessidades e os fluxos de 
atendimento (BURNS et. al., 2017). 
↠ Deve-se sempre acolher e escutar a vítima que, nos 
casos agudos, se encontra em situação de grande 
ansiedade e medo. Os agressores, ou a família conivente,3 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
por medo de serem incriminados ou de sofrer alguma 
restrição legal pelos seus atos, podem assumir atitudes 
agressivas com os profissionais que estão atendendo a 
criança, por meio de ameaças, tentativas de imposições 
de alta ou impedimentos aos tratamentos e 
encaminhamentos indicados. Essas atitudes só reforçam a 
suspeita de violência e não devem intimidar o pediatra, 
nem qualquer outro profissional que se disponha a prestar 
assistência à vítima (BURNS et. al., 2017). 
NOTIFICAÇÃO 
↠ A notificação do diagnóstico ou suspeita de violência 
ainda não está estabelecida em todos os municípios 
brasileiros, embora seja obrigatória desde 1990, pela Lei n. 
8.069, do Estatuto da Criança e do Adolescente (BURNS 
et. al., 2017). 
↠ É compulsória pelo decreto n.104/2011 do Ministério da 
Saúde, embora esse tema e seus critérios diagnósticos 
não estejam incluídos na grade curricular da graduação 
médica, tampouco na pós-graduação em nosso país 
(BURNS et. al., 2017). 
É preciso ressaltar que todo ato sexual com adolescente ou criança 
menor de 14 anos é considerado crime de estupro pelo Código Penal 
Brasileiro, e outras medidas de notificação e denúncia serão 
necessárias no atendimento a uma criança ou adolescente em 
situação de risco para violência sexual, como a comunicação ao 
Conselho Tutelar e também aos órgãos de segurança (delegacia) e 
Justiça (Vara de Crimes ou da Infância e Adolescência ou ainda ao 
Ministério Público), para que medidas efetivas de proteção à vítima e 
apuração do crime sejam efetuadas (BURNS et. al., 2017). 
↠ Para todas as apresentações da violência, ou a suspeita, 
existem, no mínimo, 2 notificações a fazer: (BURNS et. al., 
2017). 
➢ Conselho Tutelar, para o desencadeamento de 
medidas protetoras à suposta vítima de violência. 
➢ Sistema de Informação de Agravos de 
Notificação (Sinan): A notificação ao Sinan tem 
como finalidade manter um banco de dados 
nacional para estabelecer o perfil epidemiológico 
da violência, possibilitar o planejamento dos 
serviços que prestam assistência às vítimas (da 
emergência ao acompanha ambulatorial), obter 
dados para subsidiar intervenções intersetoriais 
voltadas à prevenção e ao combate à violência 
e divulgar estatísticas e dados para sensibilizar o 
Estado e a sociedade. 
 
 
Anamnese 
➢ Discrepância entre a história e o grau de lesões físicas. 
➢ Omissão total ou parcial da história de trauma. 
➢ História que mudam conforme o desenrolar do 
atendimento, que diferem quando relatadas pelos 
responsáveis (juntos ou separados). 
➢ Intervalo prolongado entre o tempo de lesão e a consulta 
médica. 
➢ História de acidentes repetidos, tratados em locais 
diferentes. 
➢ Pais que respondem inapropriadamente, ou que não 
seguem recomendações médicas. 
➢ Crianças maiores que não querem relatar o que 
aconteceu com medo de represálias, em especial quando 
os agentes agressores são os pais. 
➢ Famílias desestruturadas: mãos solteiras, mães muito 
jovens, pais separados, pais alcoólatras ou usuários de 
drogas ilícitas. 
➢ História de violência com a mãe, idosos ou outra pessoa 
da família. 
➢ Pacientes com doença mental, principalmente retardo do 
DNPM. 
EXAME FÍSICO 
➢ Queimadura circular; 
➢ Queimadura no dorso da mão; 
➢ Queimadura dos membros inferiores por imersão; 
Não intencional: queimadura por igual –> criança estende a perna 
para sair da água 
Intencional: criança flete a perna para não entrar na água (poupa 
fossa poplítea) 
➢ Lesão de partes moles na nádega, tronco, face e porção 
proximal dos membros 
➢ TCE e fratura de coluna: raro por traumatismo não-
acidental 
➢ TCE: causa mais comum de morte 
➢ RX AP e perfil do crânio obrigatório no trauma de crânio 
➢ Suspeita de lesão intra-craniana: TC ou RNM 
➢ Síndrome da criança chacoalhada: hemorragia intracraniana 
e edema cerebral (hemorragia retiniana e lesões do SNC – 
ruptura das veias pontes do espaço subdural – “shaken 
baby syndrome”) 
➢ Múltiplos hematomas (com diferentes colorações e 
localizações). Evolução dos hematomas: 
Roxo < 3 dias; 
Pardo esverdeado – entre 3 e 7 dias; 
Amarelo e amarelo-amarronzado entre 8 e 30 dias. 
➢ Lacerações, eritemas, hematomas ou queimaduras que 
reproduzem o instrumento agressor (marcas de fios, cinto, 
mãos, cigarro). 
➢ Lesões circulares, como em pulseira, tornozeleira ou colar, 
indicando possíveis amarras. 
➢ Lesões em olhos, periorais, em região dorsal, cervical, 
genital ou perianal. 
➢ Ruptura de víscera interna sem antecedente de trauma 
contuso. 
https://traumatologiaeortopedia.com.br/conhecimentos/queimaduras/
4 
 
 
Júlia Morbeck – @med.morbeck 
 
➢ Presença de cicatrizes antigas incompatíveis com a idade e 
desenvolvimento da criança. 
➢ Marcas de lesões de mordeduras. 
➢ Hemorragia de conduto auditivo, sem sinais de corpo 
estranho ou otites perfuradas, indicando 
barotrauma por socos ou fortes pancadas, com possível 
fratura de osso esfenoide. 
➢ Lesões de orelha, por torções ou grandes puxões, levando 
desde lacerações até arrancamentos e fraturas 
da cartilagem (orelha em couve-flor). 
➢ Lesões dentárias, como quebras ou arranchamentos. 
➢ Lesão abdominal: 2ª causa mais comum de óbito. 
 
 
Referências 
PESSO, J. H. Os pediatras e os maus-tratos na infância e 
na adolescência. Revista Paulista de Pediatria, v. 29, n. 2, p. 
136-137, 2011. 
CORRÊA et. al. Uma revisão sobre maus tratos contra 
crianças e adolescentes: como diagnosticas e conduzir? 
Estácio Saúde, v. 8, n. 1, 2019. 
BURNS et. al. Tratado de pediatria: Sociedade Brasileira de 
Pediatria, 4ª edição. Barueri, SP: Manole, 2017.

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