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MICROBIOLOGIA DOS ALIMENTOS Ivonilce Venturi Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever os principais microrganismos patogênicos. � Identificar métodos de pesquisa de microrganismos em alimentos. � Interpretar laudos de pesquisa de microrganismos. Introdução Existe uma ampla gama de microrganismos que podem causar danos ao organismo humano, podendo inclusive ser letal. Apesar dos notáveis avanços no desenvolvimento dos procedimentos de tratamento e pre- venção, as doenças infecciosas continuam sendo a principal causa de morte no mundo, principalmente nos países em desenvolvimento. Os agentes patogênicos que já estão presentes no meio ambiente causam a maioria das infecções emergentes, trazidas de forma inconsciente para o ser humano. As doenças transmitidas por alimentos (DTAs) são um dos problemas mais sérios de saúde pública e uma das principais causas de morte. Estima-se que aproximadamente 600 milhões de casos de gastroenterites ocorram a cada ano. Atualmente, são conhecidas mais de 200 doenças transmitidas por alimentos, que podem causar desde gastroenterites leves até síndromes com desfecho fatal, ou com complicações crônicas. Atualmente, são descritos mais de 40 agentes que podem causar algum tipo de doença transmitida por alimentos. Neste capítulo, você vai conhecer os principais microrganismos pa- togênicos e quais os métodos usados para a identificação deles, além de conseguir interpretar um laudo de pesquisa. Microrganismos patogênicos As DTAs são causadas pela ingestão de alimentos contaminados por bactérias, parasitas, fungos e vírus, ou suas toxinas, e são uma constante preocupação para a saúde pública mundial. São conhecidos cerca de 200 patógenos responsáveis pelas DTAs. A capacidade de um microrganismo de causar doenças é chamada de patogenicidade, e o microrganismo que causa a doença é conhecido como patógeno (SHARIF; JAVED; NASIR, 2018). Vamos ver nesta seção a classificação, as causas e as características clínicas das bactérias que causam doenças no ser humano, dando atenção especial aos microrganismos emergentes e reemergentes. Doença emergente significa a identificação de um problema novo para a saúde pública, como um novo agente infeccioso. Como exemplo, pode-se citar o vírus Ebola, a encefalite espongiforme conhecida como doença da vaca louca, o vírus da influenza aviária (A/H5N1), etc. Doença reemergente indica a mudança no comporta- mento epidemiológico de uma doença já conhecida pela ciência e que era tida como controlada, mas que volta a ser uma ameaça à saúde pública. Aeromonas hydrophila (A. hydrophila) Aeromonas é um termo derivado das palavras gregas aer, que significa “ar”, e monas, que significa unidade. A. hydrophila é uma espécie do gênero das Aeromonas, são bacilos Gram-negativos com comprimentos médios de 1,0 a 4,4 mm, não esporulados, positivos para oxidase, fermentadores de glicose, frutose, maltose e trealose a ácidos ou gás e com metabolismo anaeróbico facultativo. São considerados como oportunistas para animais aquáticos e terrestres. Encontrados na água, em habitantes marinhos como peixes, moluscos, aves e carne crua, e também nos animais domésticos. Pode ser encontrado também em água doce, como em tanques de peixes. Tem capacidade de propagar-se em ambientes em constante mudança, incluindo ampla faixa de temperatura (4 a 40 °C). Crescem em um pH de 5,5 a 9,0. As colônias são formadas após 24 horas em ágar nutriente, possuindo de 1,0 a 3,0 mm de diâmetro, liso, Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos2 esbranquiçado e translúcido. A bactéria pode ser resistente aos processos de cloração (AWAN et al., 2018; DASKALOV, 2006). Ao encontrar uma superfície adequada, a A. hydrophila pode formar biofilmes. Tem sistema regulatório que permite a adaptação em diferentes condições ambientais, como estresse pelo calor e frio, choque ácido e privação de nutrientes, sendo que todas essas condições podem levar a adaptações fisiológicas em nível genético das bactérias, tornando-a cada vez mais resis- tente às variações do meio, gerando mutações no ácido desoxirribonucleico (DNA). Existem atualmente 62 genomas sequenciados da A. hydrophila. Essas mutações gênicas são resultantes da compensação às adaptações ao meio ambiente. Como efeitos de compensação ambiental ocorre mudança no metabolismo, motilidade, formação de biofilmes, reparo de DNA e resistência a antibióticos e estresse ambiental (AWAN et al., 2018). O microrganismo tem o potencial de ser um patógeno de origem alimentar, especialmente cepas do grupo de hibridização, como a HG1, estando associadas diretamente às doenças. O patógeno produz diferentes virulências, incluindo exotoxinas, citotoxinas, entre outros. É um microrganismo psicotrófico, por isso cresce durante o período de refrigeração dos alimentos. O espectro da doença associado a esse microrganismo inclui gastroenterite, septicemia, infecções de pele (feridas) e bacteremia em indivíduos imunocomprometidos. Também há relatos de ser causador de peritonite, meningite, artrite séptica, osteomelite, infecções oculares e do trato urinário, pneumonia e síndrome hemolítico-urêmica (AWAN et al., 2018). A. hydrophila foi classificada como um patógeno de origem alimentar apresentando resistência múltipla da bactéria a muitos antibióticos, como quinolonas, aminoglicosídeos, beta-lactâmicos, tetraciclina, cloranfenicol, trimetoprim e sulfonamindas. É, ainda, de alta significância para a saúde pública (LI et al., 2018; HOCHEDEZ et al., 2010). Em razão do fato de a A. hydrophila estar em constante mutação e estar relacionada à resistência a antibióticos, é considerada um agente patogênico bacteriano emergente. Bacillus cereus (B. cereus): o termo bacilo significa “pequena vareta” e cereus, do latim, significa “cera”. Pode ser observado facilmente em mi- croscópios e macroscopicamente pode ser visualizado quando em cultivo em meio ágar sangue. É um patógeno em forma de bastonete móvel Gram- -positivo, anaeróbico facultativo, geralmente mesófilo, formador de esporos e pode produzir toxinas que causam intoxicações eméticas ou diarreicas. B. cereus não é apenas uma bactéria, mas, sim, um grupo de oito espécies de 3Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos bactérias, que incluem B. cereus (sensu stricto), B. anthracis, B. mycoides, B. pseudomycoides, B. thuringiensis, B. weihenstephanensis, B. cytotoxicus e B. toyonensis. Destes, o B. anthracis é um dos que causa muita preocupação em todo o mundo. Atualmente, ele é conhecido como antraz, uma arma biológica letal para animais e humanos. O B. thuringiensis tem propriedades inseticidas, sendo usado comercialmente como agente microbiano para o biocontrole com potencial para enfrentar insetos durante o período de colheita. B. cereus é causador de infecções e intoxicações alimentares podendo, em alguns casos, ser letal. As intoxicações alimentares causadas por B. cereus são uma constante preocupação dos governos em todo o mundo, pois está frequentemente associada ao consumo de produtos alimentares à base de amido, incluindo o arroz, alimentos estes consumidos em todo o mundo (HWANG; HUANG, 2018; ÜNÜVAR, 2018; MARROLLO, 2016). B. cereus produz duas toxinas, a diarreica e a emética. A diarreica causa diarreia aguda, náuseas e dor abdominal e é causada por células vegetativas, ingeridas na forma de esporos de células viáveis, que produzem enterotoxinas proteicas no intestino delgado. A patogênese da doença diarreica depende de três citotoxinas formadoras de esporos, que são a enterotoxina não he- molítica (Nhe), hemolisinaBL (Hbl) e citotoxina K. As toxinas Nhe e Hbl são toxinas homólogas de três componentes relacionados à toxina citolisina A de Escherichia coli. Já a emética (cereulida) leva à síndrome emética ca- racterizada por náusea aguda, vomito, dor abdominale raramente diarreia. Os esporos sobrevivem a condições ambientais extremas, incluindo calor, secagem, congelamento e radiação. Cepas de B. cereus estão associadas à resistência a penicilina, eritromicina, tetraciclina e carbapenem (ÜNÜVAR, 2018; MARROLLO, 2016). Clostridium botulinum (C. botolinum) é uma bactéria em forma de bastonetes móveis Gram-positivos, anaeróbica formadora de esporos e produz potente neurotoxina. As espécies C. butyricum e B baratii raramente produzem toxinas. A espécie C. botulinum produz oito neurotoxinas botulinais (BoNTs) sendo tipo A – G. O botulismo humano está associado geralmente aos tipos A, B e E, e raramente ao tipo F. Já nos animais, o botulismo é associado aos tipos C e D. O tipo G é encontrado no C. argentinense, está associado à morte súbita e não foi encontrado em animais. Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos4 C. botulinum pode ser dividido em quatro subgrupos I a IV, que são di- ferenciados por suas atividades químicas. O grupo I é proteolítico e cresce em temperaturas entre 10 a 45 °C, podendo produzir toxinas dos tipos A, B e F. O grupo II é não proteolítico e cresce em temperaturas entre 3 e 45 °C, produzindo toxinas dos tipos B, E e F. O grupo II também é conhecido pela sua capacidade de crescer em temperaturas abaixo de 5 °C. Os grupos I e II estão associados às doenças humanas, sendo que quase todas as toxinas do grupo I estão relacionadas a casos de botulismo infantil. O grupo III é não proteolítico e produz toxinas dos tipos C e D. Já o grupo IV pode ser fracamente proteolítico e produz apenas a toxina do grupo G. C. botulinum é responsável por quatro síndromes: botulismo nos alimentos (ingestão de alimentos contaminados com toxinas), botulismo infantil (infec- ção, colonização e produção de toxinas), botulismo de feridas (infecção de ferida com a bactéria) e botulismo da toxemia intestinal do adulto (colonização intestinal e produção de toxinas em adultos). O botulismo alimentar é causado pela ingestão de alimentos, como vegetais, condimentos, peixe e produtos à base de peixe e carne e produtos à base de carne contaminados com a toxina botulínica. O consumo de mel é um veículo comum de transmissão do botulismo infantil, não sendo recomendado o con- sumo deste em crianças menores de 12 meses de idade. O botulismo ocorre por exposição acidental ou intencional às toxinas botulínicas. Vômito, dor abdominal, fadiga, fraqueza muscular, dor de cabeça, tontura, perturbação visual, obstipação, boca seca, dificuldade em engolir e falar e, por fim, para- lisia e insuficiência respiratória ou cardíaca ocorrem no botulismo alimentar. Toxinas são potencialmente letais em doses muito pequenas, ligando-se à junção neuromuscular, bloqueando a transmissão da acetilcolina, causando bloqueio neuromuscular e paralisia flácida. Pessoas com suspeita clínica de botulismo devem ser admitidas em um ambiente de terapia intensiva, com monitoramento frequente da capacidade vital e instituição de ventilação mecânica, se necessário. A paralisia do botulismo é prolongada, durando semanas a meses, e cuidados intensivos são necessários durante esse período de debilitação (ÜNÜVAR, 2018; HARRIS, 2016). Na Figura 1 é possível observar imagens das bactérias Aeromonas hidro- phyla, Bacillus cereus e Clostridium botulinum. 5Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos Figura 1. (a)Aeromonas hidrophyla, (b) Bacillus cereus e (c) Clostridium botulinum. Fonte: Adaptada de a) Vivas et al. (2004); b) Kateryna Kon/ Shutterstock.com; c) Dannr (2013, documento on-line). Campylobacter jejuni (C. jejuni) e Campylobacter coli (C. coli) Essas bactérias são gram-negativas, não formadoras de esporos, e encontradas frequentemente em animais domésticos e selvagens, animais de pecuária como bovinos, suínos e ovinos, além de aves e água contaminada (YI; AN- DERSON, 2018). A C. jejuni é outro importante patógeno de origem alimentar, causando uma carga substancial de doenças em todo o mundo, sendo uma das causas mais comuns de gastroenterite bacteriana comprovada em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Atualmente, a doença ocupa o terceiro lugar nas mais importantes doenças bacterianas transmitidas por alimentos nos Estados Unidos, a doença causada pelo C. jejuni é chamada de campilobacteriose. Embora a diarreia seja a manifestação clínica mais comum, é provável que haja um número muito grande de infecções que são assintomáticas (TEUNIS et al., 2018). As infecções bacterianas também podem resultar em manifes- tações inflamatórias e doenças autoimunes, como artrite reativa e síndrome de Guillain-Barré (condição neurológica de paralisia ascendente que pode levar ao comprometimento da musculatura respiratória e à morte). A C. jejuni também está associada à síndrome de Reiter (artropatia aguda ou crônica e artrite reativa que afeta múltiplas articulações do joelho em particular). A transmissão humana pode ocorrer pela ingestão de carne contaminada e leite cru, aves e perus também são considerados importantes veículos para campilobacteriose alimentar. A doença se desenvolve de 2 a 5 dias após a exposição e caracteriza-se por febre, dor abdominal intensa, náuseas e rara- mente diarreia sanguinolenta. Em crianças, é causa de diarreia, já em adultos pode levar ao desenvolvimento de pancreatite, colecistite, endocardite e artrite Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos6 reativa, que ocorrem em 2 a 10% dos casos. Normalmente, a infecção é diag- nosticada erroneamente como apendicite (YI; ANDERSON, 2018). C. jejuni é uma das espécies formadoras de biofilmes, e sobrevive em ambientes aeróbicos, coexistindo em um biofilme oito cepas da espécie (TEH; LEE; DYKES, 2017). Outra questão importante é o surgimento de cepas de C. jejuni resistentes ao uso de antibióticos para a alimentação animal. C. jejuni e C. coli apresentaram-se resistentes a penicilinas, cefalosporinas de 1ª e 2ª geração, vancomicina, entre outros, isto se deve a prática disseminada do uso de antibióticos na ração dos animais para prevenir doenças e controlar infecções (USHANOV, 2018). Listeria monocytogenes (L. monocytogenes) A listeria é um patógeno de origem alimentar que causa listeriose, doença gastrintestinal relativamente rara, mas potencialmente fatal. É uma bactéria Gram-positiva, não formadora de esporos e anaeróbica facultativa. Os sinto- mas clínicos da doença são febre, dor de cabeça e ocasionalmente sintomas gastrointestinais. A taxa de mortalidade por listeriose vem aumentando em todo o mundo, chegando a aproximadamente 25%. A L. monocytogenes é encontrada no solo, na água, no material vegetal, nos esgotos, nos vegetais em decomposição e nas fezes de animais e humanos. Podem sobreviver por longos períodos de tempo em ambientes aparentemente hostis, pois suportam diversas situações de estresse, como sanitizantes, pH e temperatura, além da capacidade em formar biofilmes. A contaminação por L. monocytogenes pode ocorrer em ambientes onde há o processamento de alimentos, podendo se tornar um importante agente causador de doenças alimentares, inclusive por contami- nação cruzada, ou em locais onde há deficiência de higiene (ÜNÜVAR, 2018). A bactéria é considerada como um perigo para a saúde pública, considerando que a incidência de listeriose vem aumentando tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento. Por essa razão a L. monocytogenes vem sendo tratada como uma doença emergente e que precisa atenção para evitar a con- taminação de alimentos. A contaminação é comum em produtos derivados do leite, quando o leite não é pasteurizado, carne suína e bovina e seus derivados, aves, salsichas, frutos do mar, legumes e verduras. Em gestantes, a listeriose pode atravessar a barreira feto-placentária e levar ao aborto espontâneo ou natimorto e causar meningoencefalite e septicemia em recém-nascidos. Gestantes, recém-nascidos, idosos e in- divíduos imunocomprometidos são considerados comode alto risco para infecções por Listeria. A taxa de mortalidade pode subir de 20 a 30% para 7Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos até 70% em pacientes sem tratamento adequado. A presença de L. mo- nocytogenes em ambientes onde ocorre o processamento de alimentos pode influenciar a resistência a antimicrobianos, como ampicilina, penicilina e trimetoprim-sulfametoxazol. A preservação de alimentos, a correta higienização dos ambientes e os cuidados com a água contribuem para a inibição do desenvolvimento de microrganismos em alimentos e ajudam a reduzir a transmissão pela cadeia alimentar (JORDAN; MCAULIFFE, 2018). Vibrio Este gênero é composto por espécies como parahaemolyticus, vulnificus, cholerae, furnissii, metschnikovii, mimicus, alginolyticus e fluvialis. Estes são causadores de doenças em seres humanos. São bactérias tipicamente de ambientes marinhos e estuários, comuns em peixes e crustáceos. Destes, o V. parahaemolyticus é um dos patógenos importantes desse grupo, é uma bactéria em forma de bastonete curvo, Gram-negativa, aeróbia facultativa, não produtora de esporos e que tem um único flagelo. Causa gastroenterite de 4 a 96 horas após a ingestão de alimentos contaminados, como peixes crus ou malcozidos, além de outros produtos de pesca. Os sintomas clínicos incluem diarreia aquosa e abundante, náuseas, cólicas abdominais, dor de cabeça, vômito e febre. Em alguns casos raros, pode atravessar a barreira intestinal chegando à corrente sanguínea, podendo causar septicemia. O V. cholerae é outra espécie do gênero Vibrio, sendo um organismo aeróbio, Gram-negativo, fermentador de sacarose, encontrado frequentemente no meio ambiente. O V. cholerae é dividido em quatro sorogrupos, como O1, O139, não O1 e não O139. V. cholerae O1 e O139 podem levar à desidratação grave como consequência de diarreia aquosa profusa. Os outros dois sorogrupos (não O1 e não O139) estão associados a quadros não epidêmicos, leves e menos frequentes de diarreia. As infecções por cólera são geralmente observadas a partir da ingestão de frutos do mar, vegetais, arroz cozido e gelo contaminado com V. cholerae. A transmissão via fecal-oral é um dos modos mais importantes do processo de contaminação. Vibrio vulnificus é uma espécie virulenta, Gram-negativa, halofílica, não formadora de esporos, encontrada em frutos do mar, particularmente ostras cruas. Os sintomas clínicos da infecção são geralmente leves e incomuns, mas podem ser fatais. Incluem diarreia profusa com sangue nas fezes. Pessoas com doença hepática crônica ou esteatose hepática e imunodeprimidos são de alto risco para septicemia induzida por V. vulnificus. A proporção entre Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos8 casos e letalidade é de 40% a 60%, chegando a 90% em pacientes hipotensos (SILVEIRA et al., 2016). Na Figura 2 é possível observar imagens das bactérias Campylobacter jejuni, Listeria monocytogenes e Vibrio cholera. Figura 2. (a) Campylobacter jejuni, (b) Listeria monocytogenes e (c) Vibrio cholerae. Fonte: Adaptada de Crevis/Shutterstock.com, Kateryna Kon/Shutterstock.com e Giovanni Cancemi/ Shutterstock.com. Escherichia coli (E. coli) Essa bactéria pertencente à família Enterobacteriaceae, é gram-negativa, anaeróbia facultativa, não produtora de esporos, tem cápsulas e microcápsulas e crescem em temperaturas ótimas de 37°C. Fazem parte da flora intestinal normal do ser humano. Comumente encontrada no meio ambiente exposto por fezes de animais e humanos, sendo que a transmissão alimentar inclui carne e água contaminada (GORDON, 2013). Existem seis cepas de E. coli: enteropatogênica (EPEC) é o principal agente causador de diarreia aquosa em bebês e crianças pequenas; enterohemorragica (EHEC) causa colite hemorrágica e síndrome hemolítico-urêmico; enteroxigê- nica (ETEC) é responsável pela diarreia do viajante; enteroagregativa (EAEC) é causadora de diarreia prolongada em crianças; enteroinvasiva (EIEC) tem propriedades bioquímicas e genéticas que se assemelham às da Shigella, re- sultando em sintomas clínicos semelhantes; e que adere difusamente (DAEC) causa diarreia e aderência a células de mamíferos. As infecções por EHEC causam diarreia não sanguinolenta, cólicas estomacais graves e diarreia aquosa e podem desenvolver febre e vômitos sanguinolentos e afetar o sistema nervoso. As infecções podem resultar em complicações com risco de vida, como hemolíticos, síndrome urêmica, que é um tipo de insuficiência renal, e também anemia hemolítica e trombocitopenia em lactentes, crianças e pacientes idosos. Outras sequelas incluem erythema nodosum e púrpura trombocitopênica trombótica. 9Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos As toxinas produzidas pela ETEC levam à diarreia aquosa e à dor ab- dominal. Os sintomas da infecção são caracterizados por tremor, vômito, cefaleia, anorexia, mialgia e inchaço. Populações-alvo dessa intoxicação são bebês e crianças pequenas, especialmente em países de baixa renda. A taxa de mortalidade pode aumentar entre as crianças infectadas com ETEC em razão de desidratação grave e subalimentação. A diarreia do viajante também causada pela ETEC geralmente dura de 1 a 5 dias em adultos. Geralmente, os antibióticos não são necessários para o tratamento da diarreia. O uso de antibióticos pode levar à resistência ao trimetoprim-sulfametoxazol e à am- picilina (PUENTES; DUNSTAN, 2018). A EPEC adere à mucosa e, em seguida, provoca deformação significativa e mudanças na capacidade de absorção, causando, juntamente com vômitos, diarreia, dor abdominal e febre. As infecções por EPEC causam, além da diarreia, desidratação grave e desnutrição, A diarreia persistente relacionada à EAEC é comumente observada entre crianças em países em desenvolvimento, por outro lado, a diarreia induzida por EAEC é subnotificada e subdiagnosticada em crianças de países indus- trializados. A CEEC liga-se à mucosa intestinal causando diarreia aquosa sem febre. Geralmente, as infecções por EAEC têm um caráter não invasivo. EIEC causa doença inflamatória da mucosa e submucosa ao invadir e multiplicar nas células epiteliais do cólon. Essa síndrome é idêntica à shigelose, com diarreia profusa e febre alta. Em alguns casos, o muco e o sangue podem ser observados nas fezes. DAEC causa febre e vômitos e as fezes podem ser aquosas e mucoides, sendo capazes de invadir células epiteliais intestinais e replicar intracelularmente. Os sintomas incluem diarreia, cólicas abdominais e vômitos, às vezes levando à desidratação e ao choque (ÜNÜVAR, 2018). Salmonella spp. Outra bactéria pertencente à família Enterobacteriaceae. São bactérias gram- -negativas, em forma de bastonetes, móveis, com flagelos, não esporuladas e não capsuladas. A salmonelose, doença causada pela Salmonella, é uma das doenças transmitidas por alimentos mais comuns, sendo a principal causa de morte em todo o mundo. São relatados a cada ano aproximadamente 93,8 mi- lhões de casos em humanos com 155.000 mortes por infecções por Salmonella (ÜNÜVAR, 2018). O gênero Salmonella inclui várias espécies, sendo as mais comuns a Sal- monella entérica e a Salmonella bongori. A S. entérica é a que causa com mais frequência infecção no ser humano. A forma da doença está associada aos Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos10 diferentes sorotipos (LEIVA et al., 2018). A bactéria tem ampla distribuição em animais, incluindo aves. No ser humano é contraída por meio da ingestão de alimentos de origem animal contaminados, incluindo leite, carne, ovos, aves, entre outros, além de vegetais e água potável. Os sintomas da salmone- lose incluem febre aguda, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia, náusea e, às vezes, vômito, sendo que manifestações sistêmicas, incluindo septicemia, também podem acontecer. Os sintomas podem aparecer de 6 a 72 horas após a ingestão do alimento contaminado e a doença dura de 2 a 7 dias. Salmonella typhi e S. paratyphi causam febreentérica (febre tifoide e febre paratifoide), sendo caracterizada por febre alta, dores abdominais, dor de cabeça, vômitos e diarreia, ou por constipação e erupções que duram várias semanas ou meses. Os seres humanos são os únicos reservatórios para esses organismos e podem ser ao mesmo tempo o veículo transmissor e o agente doente. Fontes de infecção podem ser alimentos e água contaminados, ou contato com fezes de pessoas infectadas. Essas bactérias estão em muitos alimentos, incluindo alimentos preparados, produtos lácteos, produtos de carne, moluscos, vegetais e saladas (ÜNÜVAR, 2018). Shigella spp. Espécie pertencente à família Enterobacteriaceae, Gram-negativa tipo bas- tonete, não móvel e não formadora de esporos. Inclui espécies como Shigella sonnei, S. boydii, S. flexneri e S. dysenteriae, sendo estes altamente infecciosos e causadores da doença chamada shigelose. Os sintomas clínicos incluem diarreia aquosa, disenteria com fezes sanguinolentas mucoides, dor, vômito, febre e tenesmo e podem causar também ulceração da mucosa, inflamação, sangramento e, em 2% a 3% dos casos, síndrome hemolítico-uremica ou eri- tema nodoso. A prevalência de shigelose foi de 55,6% em pacientes com idade entre 2 e 5 anos. Mais de 1 milhão de mortes foram estimadas anualmente em razão da shigelose em todo o mundo. A transmissão de Shigella ocorre via fecal-oral, mas os manipuladores de alimentos contaminados e a falta de higiene pessoal são outros fatores importantes de contaminação. Alimentos podem ser contaminados no processo de manipulação, cocção e higienização inadequada contribuem para a transmissão da doença. Shigella spp. é resistente a antibióticos, como ampicilina, cloranfenicol, te- traciclina e trimetoprim-sulfametoxazol. A escolha de agentes antimicrobianos para o tratamento da shigelose é limitado. Geralmente, o cotrimoxazol é um medicamento de primeira escolha para a terapia, no entanto, o uso extensivo de cotrimoxazol causou resistência em cepas de Shigella. A ampicilina e a 11Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos tetraciclina são de baixo custo, de amplo espectro e amplamente utilizado para profilaxia e tratamento de infecções bacterianas. Contaminações por Salmonella ou Shighella é um tema que já foi abordado por um programa de TV. Acesse o link e conheça mais sobre o assunto. https://goo.gl/6BivLz Yersínia Gênero que pertence à família Enterobacteriaceae, tem três espécies, sendo a Yersinia pestis, a Yersinia enterocolitica e a Yersinia pseudotuberculosis. Os porcos são o maior reservatório desse gênero, podendo existir em outros animais como bovinos, gatos, cachorros e roedores. Encontrada frequente- mente em fezes desses animais, feridas e escarros de humanos. Apenas a Y. enterocolitica foi encontrada no meio ambiente e em alimentos. A Y. pestis é o agente etiológico da “peste”, doença que causou três pan- demias e que dizimou populações do mundo todo. Atualmente é enquadrado na categoria de “agente de bioterrorismo”. Y. enterocolitica e Y. pseudotuberculosis são bactérias em forma de bas- tonetes, Gram-negativas. A Y. enterocolitica causa a doença yersiniose, que é uma gastrenterite veiculada pelos alimentos e apresenta sintomas clínicos, como enterite, dor abdominal e diarreia. Em alguns casos pode ocorrer diarreia sanguinolenta, além de manifestações extraintestinais, que podem incluir linfadenite, artrite reativa, eritema nodoso e septicemia. Os sintomas são muito semelhantes à infecção causada pela Y. pseudotuberculosis. É comum maior incidência em países de clima frio. Encontrada em carnes suínas, bovinas e de carneiro, além de peixes e ostras e leite cru, especialmente em locais onde há deficiência de higiene e uso inadequado de técnicas de preparo de alimentos (FREDRIKSSON-AHOMAA, 2017; LEIVA et al., 2018; MARSICANO et al., 2018). Na Figura 3 é possível observar imagens das bactérias Escherichia coli, Salmonella, Shigella e Yersinia enterolocolítica. Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos12 Figura 3. (a) Escherichia coli, (b) Salmonella, (c) Shigella e (d) Yersinia enterocolitica. Fonte: Adaptada de maxcreatnz/Shutterstock.com, Kateryna Kon/Shutterstock.com e Giovanni Cancemi/ Shutterstock.com. Em relação ao grupo dos protozoários, o Cyclospora e o Criptospori- dium sp., são considerados como emergentes. Cyclospora Protozoário unicelular antroponótipo de origem alimentar, predominante em todo o mundo, mas com distribuições focais. É transmitido ao ser humano por meio de ingestão de alimentos ou água contaminada. As infecções podem durar de 1 a 2 semanas, pois o oocisto penetra na mucosa intestinal e permanece incubado. Após esse período de incubação é que os sintomas aparecem, e são gastrintestinais, incluindo diarreia aquosa e intensa, mal-estar geral, perda de peso, aumento da produção de gases intestinais, febre, náuseas, vômito e dores musculares. A infecção está associada ao consumo de produtos frescos mal higienizados e água contaminada. As medidas preventivas estão baseadas em práticas de higiene no processo produtivo e também práticas seguras na agricultura (CAMA; ORTEGA, 2014). Cryptosporidium sp. É um gênero de protozoário com importância na medicina humana e tam- bém na veterinária. É responsável por aproximadamente 60% dos surtos alimentares causados por protozoários. Pelo menos 30 espécies reconhecidas de Cryptosporidium foram identificadas, mas Criptosporidium parvum é considerado o único agente etiológico das infecções humanas. C. parvum é um protozoário parasita que causa criptosporidiose, que é caracterizada por diarreia persistente, náusea, vômito e dor abdominal, às vezes acompanhada de doença semelhante à gripe com febre. A infecção pode ser grave principalmente em indivíduos imunocompro- metidos, particularmente pacientes com AIDS, e crianças menores de 5 anos 13Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos de idade também estão no grupo de maior risco de infecção. A infecção é transmitida para seres humanos via consumo de alimentos frescos e água contaminados e também contato com solo contaminado ou hospedeiros infec- tados. Esse parasita já foi identificado em biofilmes em ambientes aquáticos. Os oocistos de Cryptosporidium spp. são muito resistentes à cloração, mas os procedimentos de cozimento convencionais, além do processo de filtragem da água, são eficazes para a remoção de oocistos do protozoário (FENG; RYAN; XIAO, 2018). O Ministério da Saúde (MS) disponibiliza à comunidade uma relação de informações sobre diversas doenças, sendo muitas delas causadas por microrganismos que cau- sam doenças alimentares, como o botulismo e brucelose. O MS descreve como são transmitidos, sintomas e como pode ser realizada a prevenção dessas doenças. Acesse o link a seguir e conheça mais detalhes. https://goo.gl/ouwJx2 Métodos de pesquisa de microrganismos patogênicos Os ensaios microbiológicos para identificação de microrganismos patogênicos em alimentos sempre integraram a produção da cadeia alimentar, no entanto, sua ênfase sempre foi com o produto acabado, pronto para ser vendido/dis- tribuído ao consumidor. Esse método era ruim porque, caso houvesse uma contaminação em alguma etapa do processo, era mais difícil de identificar e realizar ações corretivas. O sistema APPCC mudou esse conceito implantando os testes microbiológicos em diferentes etapas do processo (BATT, 2016). A análise microbiológica continua sendo uma importante ferramenta para garantir a segurança do alimento, prevenindo que este vá para a mesa do consumidor e cause doenças. Os ensaios microbiológicos são divididos em convencionais ou tradicionais e alternativos ou rápidos. Os métodos convencionais ou tradicionais de identificação de microrganis- mos patogênicos foram desenvolvidos há mais de um século e são utilizados todos os dias na rotina dos laboratórios de microbiologia, enquanto os métodos Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos14rápidos começaram a surgir a partir da década de 70 em função de uma neces- sidade de simplificar e/ou automatizar os métodos convencionais, melhorando, assim, a produtividade e reduzindo o tempo para a obtenção dos resultados. Os métodos convencionais geralmente são mais demorados e trabalhosos, exigindo profissionais bem capacitados, além de equipamentos e reagentes, já os métodos rápidos oferecem laudos de forma rápida e de fácil uso. Os métodos convencionais são considerados como referências e são inter- nacionalmente aceitos e recomendados pela Food and Drug Administration (FDA), American Public Health Association (APHA) e também pela Inter- national Commission on Microbiological Specification for Foods (ICMSF). O objetivo dos testes microbiológicos é detectar contaminações nos ali- mentos, sejam elas fecais ou por práticas de manipulação deficientes. Os testes microbiológicos podem ser realizados por tipo de técnica, por exemplo: Técnica do Número Mais Provável (NMP): conhecida também como técnica dos múltiplos tubos coliformes totais, nesta análise estão incluídos os microrganismos da família Enterobacteriaceae, sendo as espécies analisadas a Escherichia coli, a Enterobacter e a Klebsiella. Esse grupo de bactérias fermentam a lactose produzindo gás em uma temperatura de 35 a 37°C em um período de 48 horas. O método é constituído por três etapas, sendo os testes presuntivo, confirmativo e completo. Para a identificação da presença de coliformes termotolerantes, usa-se a temperatura de 44,5°C. Termotole- rantes são basicamente compostos pela espécie E. coli. Esse teste, quando confirmativo, indica contaminação fecal no alimento, assim como condições higiênico-sanitárias inadequadas. Técnica de plaqueamento com diferentes meios de cultura: os meios de cultura são produzidos em laboratórios e tem como finalidade fornecer os nutrientes ideais para o crescimento e o desenvolvimento de microrganismos que se encontram fora do seu hábitat natural. Tem como vantagens a identi- ficação e o isolamento de microrganismos. Os meios de cultura podem ser sólidos, semissólidos ou líquidos. Também podem ser enriquecidos, e este meio é indicado para avaliar o crescimento de microrganismos em geral. Os meios de cultura seletivos têm nutrientes e pH específicos para determinados microrganismos, e são mantidos em temperaturas ideias para cada grupo de bactérias, como o meio Agar Salmonella Shigella, que é um meio que possibilita o crescimento dessas duas espécies apenas. Esses métodos convencionais consistem basicamente em técnicas de plaque- amento de uma amostra do alimento (alíquotas) já homogeneizado em placas ou tubos contendo meios sólidos, semissólidos ou líquidos, enriquecidos ou 15Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos seletivos, mantidos a temperaturas definidas para cada espécie a ser analisada e após um determinado tempo é realizada a leitura para avaliar o crescimento microbiano, caso haja na amostra. Os métodos alternativos ou rápidos vêm ganhando espaço na indústria em razão do curto tempo em que os resultados são obtidos, no entanto, ainda têm custo elevado, o que dificulta a muitas pequenas empresas a optarem por esses métodos. As técnicas mais recentes são baseadas no sequenciamento de DNA. Sequenciamento de DNA é um método de identificação microbiológica in vitro que faz uso de uma determinada região do DNA. É utilizado para identificar bactérias, fungos e leveduras. Envolve algumas etapas, sendo reação em cadeia da polimerase (PCR), reação de sequenciamento, eletroforese em gel e digitação dos dados para comparar com banco de dados de referência. A PCR amplifica o DNA de uma molécula, fazendo várias cópias de uma determinada região do DNA que se deseja estudar ou avaliar, usando altera- ções de temperatura. Esta técnica é realizada quando há necessidade de fazer clonagem de DNA, sequenciamento genético, detecção de microrganismos causadores de doenças. Essa técnica é realizada fazendo-se a extração do material genético, normalmente utiliza-se o DNA, e não o ácido ribonucleico (RNA). Após a extração do DNA ou um fragmento dele, adiciona-se uma mistura (pré-mix) contendo desoxirribonucleotídeos trifosfatos (dNTOs), sendo levada a um termociclador a 94-96 °C para desnaturar a cadeia de DNA. Na segunda etapa, é reduzida a temperatura, que deverá ficar entre 50 e 60 °C até que os C e G do DNA se anelem à fita molde e, por fim, a temperatura é elevada novamente a 72 °C, para que a enzima possa sintetizar a nova molécula. Esse ciclo é repetido de 25 a 40 vezes, com uma taxa de replicação exponen- cial de 2ciclo. O resultado é analisado por meio de uma eletroforese em gel e então os dados são lidos comparando-se com bancos de dados de referência. O processo leva em média três horas para ser concluído (DORADO et al., 2017; RAGHAVENDRA; PULLAIAH, 2018; POWELL; BABADY, 2018). Existem sistemas automatizados de PCR- real-time, nos quais todo o pro- cesso é informatizado e com tempo reduzido. Alguns equipamentos chegam a realizar todo o processo de identificação em menos de 2 horas. Método de ribotipagem é um método totalmente automatizado, no qual as bactérias são identificadas em nível de espécie. Esse método se baseia na análise e na comparação de DNA/RNA, o que permite um alto poder de dife- renciação de espécies em nível genético. Nesse método é possível identificar, além da espécie, a fonte causadora da contaminação, o que facilita muito o desenvolvimento de formas de prevenção (AUSTIN; PAGOTTO, 2003). Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos16 Outros métodos têm sido propostos para a identificação de microrganismos, mas ainda precisam de validações para que possam ser usados com níveis de sensibilidade e especificidade que garantam a segurança nos resultados obtidos. Interpretação de laudos microbiológicos A adequada interpretação de um laudo microbiológico de alimentos é reali- zada após um bom conhecimento da RDC no 12 de 2001, a qual dispõe sobre padrões microbiológicos para alimentos. Essa RDC estabelece “os Padrões Microbiológicos Sanitários para Alimentos especificados no Anexo I e de- terminar os critérios para a Conclusão e Interpretação dos Resultados das Análises Microbiológicas de Alimentos Destinados ao Consumo Humano” (AGÊNCIA..., 2001, documento on-line). Um laudo microbiológico pode fornecer o resultado como satisfatório, quando a amostra atende aos padrões mínimos de quantidade de microrganismos ou ausência, e insatisfatório, quando a quantidade de microrganismos presente na amostra extrapola o que a RDC considera como permitido e que irá interferir na saúde do consumidor final. Um laudo microbiológico contém alguns dados que devem estar presentes no relatório final, conforme se vê no Quadro 1 a seguir. No da análise: específico de cada laboratório, alguns podem colocar como número de Ordem de Serviço (OS). Data: deve ser inserida a data em que a amostra foi recebida pelo laboratório. Solicitante: nome do indivíduo que faz a solicitação de análise, pode ser empresa ou pessoa física. Endereço: referente ao endereço do solicitante. Telefone: do solicitante, alguns laboratórios pedem e-mail. DADOS REFERENTES À AMOSTRA Amostra/produto: nome do produto ou alimento. Dados da amostra: devem ser incluídos dados como marca (somente quando aplicável), lote, data de fabricação e validade, fabricante e tipo de embalagem. Quadro 1. Itens que devem constar em um laudo microbiológico de alimentos (Continua) 17Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos Descrição das características: quando aplicável, descrever as condições da amostra, se tinham aparência de deterioração ou embalagem violada; cor, odor e textura também podem ser incluídos. DADOS REFERENTES À COLETA/COHEITA DA AMOSTRA Responsável pela coleta: identificação do coletor da amostra, informação importante para saber se o indivíduo é um técnico ou não. Número de unidades amostrais:de acordo com a RDC no 12, são necessários diferentes números de amostras conforme a finalidade da análise. Peso/volume de cada unidade: descrever o peso/volume de cada unidade amostral. RESULTADOS MICROBIOLÓGICOS Ensaio Referência conforme RDC nº 12 Resultados da amostra Deve constar aqui o tipo de ensaio que foi utilizado para determinar a presença ou a ausência de um microrganismo. Deve ser utilizado aqui os valores de tolerância para a amostra, seja ela indicativa ou representativa. Descrever quais os valores encontrados na amostra analisada. *Ao final, deve estar descrita metodologia utilizada para a análise da amostra e a legislação usada como referência para emitir o laudo. CONCLUSÕES Deve estar descrito se a amostra atende aos padrões definidos pela legislação para a amostra pesquisada, indicando a amostra como satisfatória ou insatisfatória. OBSERVAÇÕES Caso haja alguma consideração em relação ao processo amostral ou à amostra em si, deve ser indicada neste item. Assinatura dos responsáveis pela análise Local e data. Quadro 1. Itens que devem constar em um laudo microbiológico de alimentos (Continuação) Pesquisa de microrganismos patogênicos em alimentos18 A RDC no 12 dispõe os alimentos em 28 grandes grupos, conforme a característica nutricional destes, e faz recomendações a respeito dos tipos de análises que são indicadas para cada grupo alimentar, que, com resultados, o nutricionista possa avaliar o alimento como produtos em condição sanitária satisfatória ou produtos em condição sanitária insatisfatória(AGÊNCIA..., 2001). O nutricionista, de posse desses dados, deve aplicar métodos de melhoria na unidade de alimentação e nutrição (UAN), caso seja necessário, visando a identificar o fator de risco ou o ponto crítico de controle que possa estar causando contaminação nos alimentos. AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Resolução RDC nº 12, de 02 de janeiro de 2001. Regulamento Técnico Sobre Padrões Microbiológicos Para Alimentos. Brasília, DF, 2001. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/ RDC_12_2001.pdf/15ffddf6-3767-4527-bfac-740a0400829b>. Acesso em: 13 nov. 2018. AUSTIN, J. W.; PAGOTTO, F. J. Microbiology: Detection of Foodborne Pathogens and their Toxins. In: CABALLERO, B. (Ed.). Encyclopedia of food sciences and nutrition. 2. ed. Amsterdam: Elsevier, 2003. p. 3886-3892. AWAN, F. et al. The fight for invincibility: Environmental stress response mechanisms and Aeromonas hydrophila. Microbial Pathogenesis, v. 116, p. 135-145, mar. 2018. BATT, C. A. 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