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S Objetivos: • Rever mecanismos imunológicos das respostas alérgicas; • Epidemiologia, etiologia, fatores de risco, fisiopatologia, manifestações clínicas e diagnóstico da intolerância/alergia alimentar; *principais alimentos que causam. Reações de Hipersensibilidade Em determinadas circunstâncias, a resposta imunológica produz danos e algumas vezes resultados fatais. Estas reações deletérias são coletivamente conhecidas como hipersensibilidade (COICO, SUNSHINE, 2010) Elas causam danos imunologicamente mediados ao hospedeiro pelo fato de serem reações exageradas a antígenos estranhos ou por serem reações inadequadas aos antígenos próprios. (COICO, SUNSHINE, 2010) Classificação da hipersensibilidade Hipersensibilidade imediata (Tipo I) As reações mediadas pela IgE (comumente designadas reações alérgicas ou alergia) são estimuladas pela ligação da IgE, via sua região Fc, a receptores Fc IgE específicos de alta afinidade denominados FceRI. (COICO, SUNSHINE, 2010) Os receptores FceRI são expressos em mastócitos e basófilos. Devido a sua alta afinidade pela IgE, esses receptores se ligam à IgE mesmo na ausência de antígeno. (COICO, SUNSHINE, 2010) Quando as moléculas de IgE se encontram com o antígeno, iniciase uma cascata de acontecimentos que acarreta a desestabilização e liberação de mediadores inflamatórios e citocinas dos mastócitos e basófilos. (COICO, SUNSHINE, 2010) Todo este processo resulta nas manifestações clínicas da hipersensibilidade do tipo I, que inclui rinite, asma e, nos casos graves, anafilaxia (das palavras gregas ana, que significa “contra” e phylaxis, que significa “proteção”). (COICO, SUNSHINE, 2010) As reações de hipersensibilidade do tipo I são rápidas, ocorrendo minutos após o desafio (reexposição ao antígeno). Consequentemente, as reações alérgicas são também denominadas hipersensibilidade imediata. (COICO, SUNSHINE, 2010) Hipersensibilidade mediada por anticorpos (tipo II) As reações citolíticas ou citotóxicas ocorrem quando os anticorpos IgM ou IgG se ligam de maneira inapropriada ao antígeno localizado na superfície de células próprias e ativam a cascata do complemento. O resultado é a destruição da célula (COICO, SUNSHINE, 2010) Os granulócitos são atraídos ao local da ativação resultando dano em consequência da liberação de enzimas líticas de seus grânulos. As reações ocorrem horas após o desafio com o antígeno. (COICO, SUNSHINE, 2010) Hipersensibilidade mediada por células (tipo IV) Reações mediadas por células — comumente denominadas hipersensibilidade do tipo tardio (DTH) são mediadas por mecanismos efetores dependentes de célula T envolvendo tanto células TH1 CD4+ células T citotóxicas CD8+ quanto. (COICO, SUNSHINE, 2010) Os anticorpos não participam das reações de hipersensibilidade do tipo IV. (COICO, SUNSHINE, 2010) As células TH1 ativadas liberam citocinas que promovem acúmulo e ativação de macrófagos que, por sua vez, causam dano local. (COICO, SUNSHINE, 2010) Este tipo de reação tem início tardio, que pode ocorrer dias ou semanas após o desafio com o antígeno. (COICO, SUNSHINE, 2010) Características gerais das reações alérgicas Todas as reações alérgicas compartilham características comuns, embora sejam muito diferentes quanto aos tipos de antígenos que deflagram essas reações, bem como em relação as suas manifestações clínicas e patológicas (ABBAS, 2019) Fase de sensibilização A imunoglobulina responsável pelas reações alérgicas é a IgE. Todo indivíduo normal pode formar anticorpos IgE específicos para inúmeros antígenos quando este antígeno é aplicado de maneira apropriada por via parenteral (penetrando no corpo por via subcutânea, intramuscular ou endovenosa, mas não através do trato alimentar). Entretanto, como será discutido adiante, alguns indivíduos são geralmente predispostos a certas alergias. (COICO, SUNSHINE, 2010) Intolerância e Alergia Alimentar Julia Soares • 4 período de medicina • Tutoria 3 A sensibilização a alérgenos pode ocorrer através de inúmeras maneiras, incluindo o contato com a pele, ingestão, injeção e inalação. Aproximadamente 50% da população gera resposta de IgE para os antígenos transportados pelo ar que são encontrados apenas nas superfícies mucosas, como as que revestem as narinas e pulmões, bem como a conjuntiva dos olhos. (COICO, SUNSHINE, 2010) A habilidade de um antígeno de deflagrar reações alérgicas também pode estar relacionada a sua natureza química. Embora nenhuma característica estrutural proteica possa prever definitivamente se uma proteína será alergênica, algumas características são típicas de muitos alérgenos comuns. Entre estes, estão o peso molecular baixo a mediano (5-70 kDa), a estabilidade, a glicosilação e a solubilidade nos fluidos corporais. As respostas anafiláticas aos alimentos tipicamente são induzidas por pequenas proteínas altamente glicosiladas. Essas características estruturais provavelmente protegem os antígenos contra a desnaturação e degradação no trato gastrintestinal, além de permitir que sejam absorvidos intactos. (ABBAS, 2019) O termo atopia (da palavra grega atopos, que significa “fora do lugar”) é frequentemente utilizado para definir a hipersensibilidade mediada por IgE, e o adjetivo atópico para descrever pacientes afetados. (COICO, SUNSHINE, 2010) Filhos de indivíduos atópicos com frequência sofrem das mesmas alergias, indicando, que são comuns, tendências familiares. Evidências sugerem que as respostas por IgE são geneticamente controladas por genes ligados ao MHC, localizado no cromossomo 6. (COICO, SUNSHINE, 2010) Várias evidências têm demonstrado que a produção do anticorpo IgE é dependente da célula TH2. O mecanismo pelo qual estas células promovem a troca de isotipo da célula B ainda não foi totalmente esclarecido, embora esteja evidente que algumas citocinas produzidas pelas células Th2, principalmente IL-4 e Il-13, desempenham um papel importante (COICO, SUNSHINE, 2010) Compatível com esta observação, constatou-se que os níveis de IgE são aproximadamente 10 vezes mais elevados nos indivíduos alérgicos. Nos indivíduos normais, a concentração de IgE sérica é a mais baixa de todas as imunoglobulinas. (COICO, SUNSHINE, 2010) Foi sugerido que os baixos níveis de anticorpos IgE em indivíduos não alérgicos são mantidos pelos efeitos supressores mediados pelo IFN-y produzido pelas células TH1, que reprimem a produção de IgE (COICO, SUNSHINE, 2010) Acontecimentos naturais como infecções com certos patógenos podem alterar este equilíbrio e estimular a produção de IgE pelas células B. Consequentemente, a sensibilização alérgica pode resultar de falha de mecanismos de controle, levando à superprodução de IL-4 pelas células TH2 e, finalmente, à produção aumentada de IgE pelas células B. (COICO, SUNSHINE, 2010) Quando é alcançada uma adequada exposição ao alérgeno, através de repetidos contatos com a mucosa, ingestão ou injeção parenteral, que resulte na produção de anticorpos IgE, o indivíduo é considerado sensibilizado. (COICO, SUNSHINE, 2010) Tendo ocorrido a produção e secreção do anticorpo IgE pelas células B estimuladas pelo alérgeno, ele rapidamente se liga aos mastócitos e basófilos à medida que circula próximo a essas células. (COICO, SUNSHINE, 2010) Uma das mais importantes características que os mastócitos e basófilos compartilham são os receptores (FceRI) em suas membranas, os quais se ligam à porção Fc da IgE com alta afinidade. Uma vez ligadas, as moléculas de IgE persistem na superfície celular por semanas. A célula permanece sensibilizada enquanto suficientes anticorpos IgE permanecerem ligados; as moléculas de IgE irão desencadear a ativação da célula quanto ela entrar em contato com o antígeno. (COICO, SUNSHINE, 2010) Fase de ativação A fase de ativaçãodas reações alérgicas começa quando o mastócito é estimulado a liberar seus grânulos e seus mediadores inflamatórios. Pelo menos dois dos receptores para a porção Fc das moléculas de IgE devem estar associados em uma configuração estável para que ocorra a fase de ativação. (COICO, SUNSHINE, 2010) De forma mais simples e mais relevante, do ponto de vista imunológico, esta ligação é realizada por um antígeno multivalente que possa se ligar a uma molécula de IgE diferente para cada um dos vários epítopos de sua superfície, ligando-as cruzadamente e ativando efetivamente a célula para responder liberando seus grânulos (desgranulação). (COICO, SUNSHINE, 2010) Os mastócitos que se desgranulam no interior do trato gastrointestinal induzem aumento da secreção líquida e peristalse que, por sua vez, resulta em diarreia e vômito. (COICO, SUNSHINE, 2010) Em contrapartida, a desgranulação dos mastócitos no pulmão provoca a diminuição do diâmetro das vias respiratórias e aumento da secreção de muco. Estes fatos acarretam congestão e bloqueio das vias respiratórias (tosse, espirro, fleuma) e edema, além de secreção de muco nas vias nasais. (COICO, SUNSHINE, 2010) Por fim, a desgranulação dos mastócitos presentes nos vasos sanguíneos causa aumento do fluxo sanguíneo e da permeabilidade vascular, resultando em aumento de líquidos nos tecidos. Isto acarreta fluxo aumentado de linfa a partir dos linfonodos locais, o que, por sua vez, provoca aumento do número de células e proteínas no tecido, com todos estes acontecimentos contribuindo para a resposta inflamatória. (COICO, SUNSHINE, 2010) Finalmente, a ativação dos mastócitos pode também ser alcançada utilizando-se ionóforos de cálcio, que causam um rápido influxo de íons cálcio para o interior da célula, desencadeando a cascata de sinalização que acarreta a desgranulação. (COICO, SUNSHINE, 2010) Os mastócitos também podem ser ativados através de outros mecanismos diferentes da ligação cruzada dos receptores Fc de IgE. As reações anafilactoides são produzidas pelas anafilatoxinas C3a e C5a, assim como por vários fármacos como a codeína, morfina e corantes para contraste, marcados com iodo radioativo. (COICO, SUNSHINE, 2010) Fatores físicos como calor, frio ou pressão, também podem ativar mastócitos; a urticária induzida pelo frio, por exemplo, constitui uma reação cutânea anafilática provocada em certos indivíduos pelo resfriamento de uma área da pele. (COICO, SUNSHINE, 2010) Finalmente, como foi comentado antes, certas lectinas (moléculas que ligam açúcares) podem se ligar de maneira cruzada a receptores Fc de IgE Altas con- centrações de lectina são encontradas em certos alimentos, tal como o morango, o que pode explicar a urticária em alguns indivíduos após a ingestão desta fruta. (COICO, SUNSHINE, 2010) Devido à facilidade com que o resultado pode ser medido, o mastócito tem servido como modelo para o estudo da ativação das células em geral. Entre os acontecimentos conhecidos, por ocorrerem rapidamente, estão a agregação de receptores e as alterações na fluidez da membrana, fatos estes que resultam da metilação de fosfolipídios, os quais acarretam aumento temporário dos níveis intracelulares de adenosina monofosfato cíclica (cAMP) seguido por um influxo de íons Ca2+ (COICO, SUNSHINE, 2010) Em geral, um aumento sustentado de cAMP intracelular, neste estágio, diminuirá, ou mesmo interromperá, o processo de desgranulação. Desta forma, a ativação de adenilato ciclase, a enzima que converte a adenosina trifosfato (ATP) em cAMP, produz um importante mecanismo para o controle dos acontecimentos anafiláticos (COICO, SUNSHINE, 2010) As células desgranuladas regeneram-se; uma vez que os conteúdos dos grânulos sejam novamente sintetizados, as células estarão prontas para reassumir suas funções. (COICO, SUNSHINE, 2010) Fase efetora Os sintomas das reações alérgicas são inteiramente atribuídos aos mediadores inflamatórios liberados pelos mastócitos ativados. É útil classificar estes mediadores em duas categorias principais. (COICO, SUNSHINE, 2010) • A primeira categoria consiste de mediadores pré-formados básicos, que são armazenados nos grânulos por atração eletrostática a uma matriz proteica e liberados como resultado do influxo de íons, principalmente Na+ As citocinas liberadas dos mastócitos em desgranulação, incluin-do IL-3, IL-4, IL-5, IL-8, IL9, TNF-alfa e GM-CSF, também funcionam atraindo e ativando células inflamatórias no local. • A segunda categoria consiste em mediadores secundários dos mastócitos — aqueles sintetizados de novo. Esta segunda categoria de mediadores, a seguir formada pelos mastócitos, é constituída de substâncias sintetizadas, em parte, a partir de lipídios da membrana Mediadores Mediadores pré-formados Histamina Formada na célula pela descarboxilação do aminoácido histidina; ela é estocada na célula pela ligação, via interação eletrostática, a uma matriz proteica ácida denominada heparina. (COICO, SUNSHINE, 2010) Quanto liberada, a histamina liga-se rapidamente a inúmeras células via dois tipos principais de receptores, H1 e H2. Quando a histamina se liga aos receptores H1 no músculo liso, ela causa constrição; quando se liga aos receptores H1 nas células endoteliais causa a separação de suas junções, resultando em permeabilidade vascular. Os receptores H2 estão envolvidos na secreção de muco, permeabilidade vascular aumentada e liberação de ácido a partir da mucosa estomacal. (COICO, SUNSHINE, 2010) Todos estes efeitos são responsáveis por alguns dos principais sinais da anafilaxia sistêmica: a dificuldade em respirar (asma) ou asfixia resulta da constrição do músculo liso ao redor dos brônquios no pulmão, enquanto a queda da pressão sanguínea é consequência do extravasamento de líquido nos espaços teciduais, à medida que a permeabilidade dos vasos sanguíneos aumenta. (COICO, SUNSHINE, 2010) Serotonina A serotonina está presente nos mastócitos de um número limitado de espécies, como os roedores. Seus efeitos são semelhantes aos da histamina, provocando constrição do músculo liso e aumentando a permeabilidade vascular.(COICO, SUNSHINE, 2010) Fatores quimiotáticos Peptídios de baixo peso molecular denominados fatores quimiotáticos eosinofílicos (ECF) também são liberados na desgranulação. Eles produzem um gradiente quimiotático capaz de atrair eosinófilos para o local. (COICO, SUNSHINE, 2010) Outra importante célula inflamatória atraída para o local é o neutrófilo. A quimiotaxia destes granulócitos polimorfonucleares ocorre em resposta à IL-8 liberada pelos mastócitos ativados. (COICO, SUNSHINE, 2010) Outras células atraídas para o local, em respos-ta aos fatores quimiotáticos derivados dos mastócitos, incluem basófilos, macrófagos, plaquetas e linfócitos. (COICO, SUNSHINE, 2010) Heparina A heparina é uma proteoglicana ácida que constitui a matriz do grânulo com a qual estão ligados mediadores básicos como a histamina e a serotonina. (COICO, SUNSHINE, 2010) A liberação da heparina causa a inibição da coagulação, o que pode ser de alguma forma útil na recuperação subsequente do mastócito ou na introdução posterior de um antígeno na área da reação; entretanto, ela não está envolvida diretamente nos sintomas da anafilaxia. (COICO, SUNSHINE, 2010) Mediadores recentemente sintetizados Leucotrienos Sabe-se atualmente que a SRS-A consiste de um conjunto de peptídios que estão ligados a um metabólito do ácido araquidônico. Coletivamente, estes peptídios agrupados são conhecidos como leucotrienos (LTs). (COICO, SUNSHINE, 2010) Os leucotrienos, denominados LTB4, LTC4, LTD4 e LTE4, causam constrição prolongada do músculo liso mesmo quando presentes em pequenas quantidades. Eles são considerados a causa primária da asma anti- histamínica resistenteem seres humano (COICO, SUNSHINE, 2010) Tromboxanos e prostaglandinas O ácido araquidônico é um hidrocarbonato poli-insaturado de cadeia longa que pode ser oxigenado por duas vias diferentes (COICO, SUNSHINE, 2010) • Por lipo-oxigenase para produzir os leucotrienos mencionados anterior-mente • Por ciclo-oxigenase para produzir prostaglandinas e tromboxanos. Muitos dos tromboxanos são vasoativos, causando broncoconstrição e quimiotaxia para inúmeros leucócitos como neutrófilos, eosinófilos, basófilos e monócitos. (COICO, SUNSHINE, 2010) Fator de Ativação de Plaquetas. O fator de ativação de plaquetas (PAF) faz com que as plaquetas se agreguem e liberem seus conteúdos, que incluem o mediador histamina e, em algumas espécies, a serotonina. (COICO, SUNSHINE, 2010) A ativação das plaquetas pode também induzir a liberação de metabólitos do ácido araquidônico, desta forma aumentado os efeitos da ativação dos mastócitos. (COICO, SUNSHINE, 2010) O PAF, por si só, é uma das mais potentes e conhecidas causas de broncoconstrição e vasodilatação, rapidamente produzindo sintomas semelhantes ao choque, mesmo quando presente em quantidades muito pequenas (COICO, SUNSHINE, 2010) Reação de fase tardia Como mencionado anteriormente, muitas das substâncias liberadas durante a ativação e desgranulação do mastócito são responsáveis pelo início de uma intensa resposta inflamatória, que se manifesta por infiltração e acúmulo de eosinófilos, neutrófilos, basófilos, linfócitos e macrófagos. (COICO, SUNSHINE, 2010) Esta resposta, denominada reação de fase tardia ocorre frequentemente dentro de 48 horas e pode persistir por vários dias (COICO, SUNSHINE, 2010) O mastócito desgranulado por ligação cruzada de IgE ligada ao antígeno em sua superfície, libera ECF-A, que recruta eosinófilos para a área de reação. A passagem de eosinófilos e outros leucócitos da circulação para o tecido é facilitada pela permeabilidade vascular aumentada causada pela histamina e outros mediadores. (COICO, SUNSHINE, 2010) Várias citocinas, incluindo GM-CSF, IL-3, IL-4, IL-5 e IL-13, desempenham papéis importantes no crescimento e diferenciação do eosinófilo e na adesão celular de certos tipos celulares. Em conjunto, estes mediadores inflamatórios geram uma segunda onda mais suave de contração do músculo liso do que a resposta imediata, junto com a permanência do edema. (COICO, SUNSHINE, 2010) Os eosinófilos podem também se ligar à IgE através da expressão de receptores Fc de IgE (FceRII ou CD23) de baixa afinidade. Eles também expressam receptores Fc para a porção Fc de IgG. Desta forma, tanto a IgE quanto a IgG ligada ao antígeno irão ligar-se a seus respectivos receptores Fc causando a ativação de eosinófilos. (COICO, SUNSHINE, 2010) Semelhantes aos mastócitos, uma vez que seus receptores são acionados, eles desgranulam-se liberando leucotrienos que causam a contração muscular. Eles também liberam o PAF e a proteína básica principal. A proteína básica principal tem a capacidade de destruir vários parasitas (como os esquistossomas) afetando sua mobilidade e danificando sua superfície. (COICO, SUNSHINE, 2010) Finalmente, a desgranulação de eosinófilos libera a proteína catiônica eosinofílica (ECP), uma neurotoxina e helmintotoxina potente. Embora as suas atividades estejam direcionadas para os invasores estranhos, todas essas substâncias biologicamente ativas podem causar dano aos tecidos circundantes (COICO, SUNSHINE, 2010) Os neutrófilos recrutados para o local em resposta aos fato-res quimiotáticos ficam em íntimo contato com o antígeno revestido pelo anticorpo via receptores de Fc de IgG que são normalmente expressos nessas células. Consequentemente, estas células ficam ativadas para fagocitar os complexos imunológicos antígenoanticorpo que, além disso, liberam suas poderosas enzimas lisossômicas, que causam grande dano ao tecido. (COICO, SUNSHINE, 2010) Semelhantes aos produtos da desgranulação dos eosinófilos, os produtos da desgranulação dos neutrófilos também incluem os leucotrienos e o PAF. (COICO, SUNSHINE, 2010) Os linfócitos T e B e os macrófagos também penetram na área sensibilizando ou imunizando o hospedeiro contra o antígeno agressor ou microrganismo. (COICO, SUNSHINE, 2010) Conceitos Assim, as reações adversas a alimentos podem ser divididas em reações tóxicas e reações não tóxicas ou reações de hipersensibilidade. (RODRIGUES, 2011) • As reações tóxicas podem ocorrer em qualquer indivíduo, independentemente da sua sensibilidade individual e ocorrem por ingestão de alimentos contaminados com substâncias tóxicas. As toxinas podem estar presentes nos alimentos de forma natural, ser induzidas pelo processamento dos alimentos ou serem incorporadas como contaminantes ou aditivos. (RODRIGUES, 2011) • As reações adversas não tóxicas, por outro lado, integram as reações mediadas por um mecanismo imune (alergias alimentares) e por um mecanismo não-imune (intolerâncias alimentares) (RODRIGUES, 2011) Alergia Alimentar A alergia alimentar é definida como uma doença consequente a uma resposta imunológica anômala, que ocorre após a ingestão e/ou contato com determinado(s) alimento(s). (SOLÉ et al., 2018) "Alergia alimentar" é um termo utilizado para descrever as reaçoes adversas a alimentos, dependentes de mecanismos imunológicos, mediados por anticorpos IgE ou não. Classificação As reaçoes de hipersensibilidade aos alimentos podem ser classificadas de acordo com o mecanismo imunológico envolvido em: (SOLÉ et al., 2018) Mediadas por IgE Decorrem de sensibilizaçao a alérgenos alimentares com formaçao de anticorpos específicos da classe IgE, que se fixam a receptores de mastócitos e basófilos. (SOLÉ et al., 2018) Contatos subsequentes com este mesmo alimento e sua ligaçao a duas moléculas de IgE próximas determinam a liberaçao de mediadores vasoativos e citocinas Th2, que induzem às manifestaçoes clínicas de hipersensibilidade imediata. (SOLÉ et al., 2018) Reaçoes mistas (mediadas por IgE e hipersensibilidade celular) Neste grupo estao incluídas as manifestaçoes decorrentes de mecanismos mediados por IgE associados à participaçao de linfócitos T e de citocinas pró-inflamatórias. (SOLÉ et al., 2018) Reaçoes nao mediadas por IgE As manifestaçoes nao mediadas por IgE nao sao de apresentaçao imediata e caracterizam-se basicamente pela hipersensibilidade mediada por células. Embora pareçam ser mediadas por linfócitos T, há muitos pontos que necessitam ser mais estudados nesse tipo de reaçoes. Aqui estao representados os quadros de proctite, enteropatia induzida por proteína alimentar e enterocolite induzida por proteína alimentar. (SOLÉ et al., 2018) • As reaçoes nao-imunológicas dependem principalmente da substância ingerida (p. ex: toxinas bacterianas presentes em alimentos contaminados) ou das propriedades farmacológicas de determinadas substâncias presentes em alimentos (p. ex: cafeína no café, tiramina em queijos maturados). As reaçoes adversas nao munológicas podem ser desencadeadas também pela fermentaçao e efeito osmótico de carboidratos ingeridos e nao absorvidos. O exemplo clássico é a intolerância por má absorçao de lactose. (SOLÉ et al., 2018) • As reaçoes imunológicas dependem de susceptibilidade individual e podem ser classificadas segundo o mecanismo imunológico envolvido. (SOLÉ et al., 2018) Epidemiologia É mais comum em crianças e a sua prevalência parece ter aumentado nas últimas décadas em todo o mundo. Estima-se que a prevalência seja aproximadamente de 6% em menores de três anos, e de 3,5% em adultos. (FERREIRA., 2012) As alergias alimentares, normalmente, surgem nas idades mais precoces, nos primeiros anos de vida, no entanto, a maioria destas alergias tende a desaparecer na adolescência e na idade adulta,embora uma minoria destas persista Os alimentos que mais frequentemente causam alergia alimentar são: leite, ovo, soja, peixe, trigo e amendoim. Estes alimentos são responsáveis por 90% de todas as reações de alergia alimentar em crianças em países desenvolvidos. Em adultos, os alimentos mais frequentemente envolvidos são amendoim, nozes, castanhas, peixe e frutos do mar. (FERREIRA, 2012) Vários estudos têm sugerido que amamentação exclusiva pode produzir tolerância oral, prevenindo alergia alimentar e dermatite atópica. Baixas concentrações de anticorpos específicos IgM, IgA e imunoglobulina G (IgG) são detectadas nessas crianças tolerantes. A alergia alimentar na fase infantil tem sido relacionada até mesmo com o desenvolvimento de colite ulcerativa e doença de Crohn na fase adulta. (FERREIRA., 2012) No Brasil, os casos de alergia alimentar também aumentam, mas não há estimativa dos afetados, pois os dados são escassos e de obtenção muito difícil, uma vez que as manifestações clínicas são variadas e se confundem com outras reações adversas a alimentos. (FERREIRA., 2012) Qualquer alimento é potencialmente alergênico, mas alguns causam mais reações alérgicas que outros. (FERREIRA., 2012) As alergias alimentares tornaram-se um grande problema mundial de saúde nas duas últimas décadas e estão associadas a um impacto negativo significativo na qualidade de vida da população. Os riscos ao bem-estar aumentam à medida que os alimentos consumidos em uma população são cada vez mais processados e complexos, além de conter rótulos inadequados. (FERREIRA., 2012) Fatores de Risco Apesar de vários fatores de risco para alergia alimentar terem sido identificados, ainda nao está claro quais destes fatores sao importantes para a elevaçao da prevalência de alergia alimentar, seja nas formas IgE mediadas como nas nao IgE mediadas. (SOLÉ et al., 2018) Os fatores de risco, quando estao presentes no início da vida, inclusive na gravidez, sao de fundamental importância. O ideal seria a avaliaçao da predisposiçao genética, antes ou pelo menos ao nascimento, e a partir da identificaçao dos vários fatores de risco efetuar a aplicaçao imediata de métodos preventivos. (SOLÉ et al., 2018) Herança genética Estima-se que os fatores genéticos exerçam papel fundamental na expressao da doença alérgica, especialmente nas formas mediadas pela IgE. Embora nao haja, no momento, testes genéticos diagnósticos disponíveis para identificar indivíduos com risco de alergia alimentar, a história familiar de atopia ainda é o melhor indicativo de risco para o seu aparecimento. Em estudo com lactentes comprovadamente diagnosticados com alergia alimentar, o risco de alergia alimentar foi aumentado para 40% se um membro da família nuclear apresentasse qualquer doença alérgica, e em 80% quando isto aconteceu em dois familiares próximos. Assim, a expressao da herança genética é mais intensa quando há antecedentes bilateralmente (pai e mae), determinando sintomas mais precoces e frequentes. (SOLÉ et al., 2018) As mutaçoes que acarretam perda de funçao no gene da filagrina foram associadas à alergia ao amendoim, independente da presença da dermatite atópica, e levantou a possibilidade da pele funcionar como uma via potencial de sensibilizaçao. Na Dinamarca, as mutaçoes do gene da filagrina também foram associadas ao aumento de alergia referida a ovo, leite de vaca, trigo e peixes, bem como à presença de níveis elevados de IgE específicos à proteína do leite de vaca, todavia, ainda é controversa a participaçao determinante da filagrina na alergia alimentar, especialmente em pacientes com história familiar de doenças alérgicas. Os polimorfismos no gene STAT6 foram associados à sensibilizaçao e retardo na tolerância em alergia ao leite de vaca(SOLÉ et al., 2018) Fatores dietéticos Alimentação da gestante e da nutriz: A alimentaçao bem balanceada ajuda a modular o perfil imunológico do bebê. O papel da dieta na gestante sobre o desenvolvimento de alergia alimentar ainda permanece controverso. A maioria das sociedades científicas internacionais, consistentemente, orientam todas as maes a consumirem dietas normais, balanceadas e equilibradas sem restriçoes durante a gestaçao e a lactaçao. (SOLÉ et al., 2018) No entanto, ainda há controvérsias na comunidade científica, uma vez que outros estudos indicam que tanto a sensibilizaçao quanto a tolerância imunológica, principalmente ao amendoim, leite de vaca e ovo, pode acontecer através da amamentaçao. Apesar disso, a recomendaçao atual é de nao se prescrever dieta de exclusao durante a gravidez e a lactação. (SOLÉ et al., 2018) Privaçao do aleitamento materno: O aleitamento materno exclusivo, sem a introduçao de leite de vaca, de fórmulas infantis à base de leite de vaca e de alimentos complementares até os seis meses tem sido ressaltado como eficaz na prevençao do aparecimento de sintomas alérgicos. Estudo de revisao de trabalhos que avaliaram o efeito protetor do leite materno entre lactentes com risco familiar de alergia alimentar ao serem amamentados exclusivamente até os quatro meses de vida, demonstrou reduçao na incidência cumulativa de alergia às proteínas do leite de vaca até os 18 meses, e de dermatite atópica até os três anos de idade. (SOLÉ et al., 2018) Uso de fórmulas lácteas: Receber fórmulas de leite de vaca, ainda no berçário, pode ser indutor de disbiose intestinal, e fator de risco importante de alergia alimentar. Da mesma forma, em crianças de alto risco, vários estudos avaliaram o uso de fórmulas de soja ou hidrolisados proteicos na reduçao do risco de alergia às proteínas do leite de vaca. (SOLÉ et al., 2018) Introduçao precoce de alimentos sólidos: A introduçao precoce de leite de vaca, ovo, amendoim, castanhas, peixe e frutos do mar poderia ser fator de risco e induzir o desenvolvimento de alergia alimentar. (SOLÉ et al., 2018) Contudo, na atualidade a noçao é oposta, de que a exclusao por tempo prolongado de alimentos com potencial alergênico pode ser fator de risco porque a induçao da tolerância oral poderia ser alcançada por outras rotas de exposiçao, particularmente através da pele, em especial quando inflamada em pacientes com dermatite atópica. A maior diversidade de alimentos na infância pode ter efeito protetor sobre a sensibilizaçao alimentar, bem como prevenir a alergia alimentar clínica, mais tarde na infância. (SOLÉ et al., 2018) Recomenda-se entao manter a norma da OMS, em funçao dos inúmeros benefícios para a saúde materna e infantil (em curto e longo prazo): "aleitamento materno exclusivo até o sexto mês e complementado (alimentaçao complementar saudável, balanceada e equilibrada) até dois anos ou mais". (SOLÉ et al., 2018) Disbiose intestinal Logo após o nascimento, inicia-se a colonizaçao do recém-nascido. Alguns fatores que interferem nesse processo sao: parto cesariano, uso materno de antibiótico, condiçoes excessivas de higiene e o uso de fórmula complementar oferecida à criança que pode resultar em disbiose. (SOLÉ et al., 2018) As crianças que recebem fórmulas infantis ou leite de vaca integral desenvolvem uma microbiota intestinal com predomínio de enterobactérias e bacteroides, tornando o sistema imunológico mais vulnerável à quebra de tolerância. (SOLÉ et al., 2018) Insuficiência de vitamina D A insuficiência de vitamina D (abaixo de 15 ng/mL) foi associada a risco aumentado para a sensibilizaçao ao amendoim. (SOLÉ et al., 2018) Fatores comportamentais e emocionais Estes fatores também estao associados ao risco de alergia alimentar, e podem ser modificáveis. (SOLÉ et al., 2018) Os filhos de gestantes que fumaram na gravidez apresentam níveis elevados de IgE e eosinofilia no sangue do cordao umbilical, sugerindo que este irritante respiratório pode ser indutor de desvio Th2 e consequentemente,de doença alérgica. (SOLÉ et al., 2018) Do mesmo modo, o consumo de álcool durante a gestaçao encontra-se documentado como um fator de risco importante, com elevaçao da IgE específica para antígenos alimentares e aeroalérgenos. (SOLÉ et al., 2018) Crianças expostas no início da vida a irmaos mais velhos e animais de estimaçao em casa podem apresentar menor risco de alergia ao ovo aos 12 meses, em decorrência da estimulaçao do microbioma, o que pode ter efeito protetor em termos de desenvolvimento de alergia. (SOLÉ et al., 2018) Comorbidades alérgicas Comorbidades alérgicas sao fatores de risco para o desenvolvimento de alergia alimentar. Estudos indicam que a alergia alimentar pode predispor à asma, e, da mesma forma, a asma pode predispor à alergia alimentar. (SOLÉ et al., 2018) Etiologia Os alérgenos alimentares são na sua maior parte representados por glicoproteínas hidrossolúveis com peso molecular entre 10 e 70 kDa41. Podem sofrer modificações conforme o processamento do alimento ou durante a digestão, resultando em aumento ou diminuição da alergenicidade (SOLÉ et al., 2018). Certos alimentos são citados mais frequentemente, sendo responsáveis por cerca de 80 a 90% das reações verificadas na alergia alimentar, tais como ovo, leite, amendoim, soja, nozes, castanhas, trigo, peixe e crustáceos. (SOLÉ et al., 2018) A alergia aos aditivos e conservantes geralmente é rara. Todavia, a acessibilidade aumentada às frutas frescas e vegetais de toda parte do mundo e o apetite insaciável para uma dieta mais diversificada e natural têm resultado em aumento de reações alérgicas a frutas, como kiwi e mamão papaya, e grãos, como gergelim, papoula e canola (SOLÉ et al., 2018) O conceito clássico de alérgeno envolve proteínas que suscitam uma resposta de hipersensibilidade; entretanto há, em alergia alimentar, importante exceção que precisa ser destacada: alérgenos compostos por carboidratos. O mecanismo pelo qual estes compostos conseguem estimular a produção de IgE específica ainda não é muito conhecido, mas estima-se que ao conjugar-se com uma proteína do organismo seria capaz de estimular a síntese de IgE específica via receptores presentes na superfície de linfócitos B. (SOLÉ et al., 2018 Mecanismos de defesa do trato gastrointestinal Dos componentes de uma dieta balanceada (carboidratos, lipídios e proteínas), o determinante de alergia alimentar é a proteína.) Se os antígenos são proteínas intactas, sempre presentes nos alimentos, por que não seriam eles sistematicamente absorvidos? Porque o trato gastrintestinal possui mecanismos de defesa (imunológicos) que protegem contra a sua absorção. (DANI, PASSOS, 2011) Mecanismos imunológicos de defesa A hidrólise proteolítica, que ocorre no tubo digestivo, promove a quebra das proteínas intactas, transformando- as em oligopeptídios e, principalmente, tri, di e monopeptídios, tericamente sem propriedades antigênicas. É, pois, um dos mecanismos naturais de defesa contra a alergia alimentar. (DANI, PASSOS, 2011) O conceito popular de que a superfície da mucosa intestinal é impermeável a antígenos não encontra apoio na literatura. As macromoléculas atravessam essa barreira em quantidade e qualidade variáveis. O significado nutricional desse fato pode ser mínimo, mas suficiente para induzir resposta imune. (DANI, PASSOS, 2011) O transporte antigênico (proteínas intactas) é mais comum em recém-nascidos, especialmente nos prematuros, por imaturidade do trato gastrintestinal, com deficiência relativa de secreção de IgA. Entretanto, em adultos normais, encontram-se, após refeições copiosas, pequenas quantidades de antígenos circulantes, assim como desenvolvimento de anticorpos, mostrando que é normal, no sistema digestivo, a absorção de alguns antígenos sem que se verifique a alergia alimentar. (DANI, PASSOS, 2011) Quando essas macromoléculas, em número suficiente, entram em contato com as microvilosidades intestinais, são captadas para dentro das células por processo de pinocitose. Hoje se sabe que as células M (microfold), interpostas no epitélio colunar, têm papel importante na captação de antígenos. Essas células são destituídas de microvilosidades e possuem glicocálix diminuto, características que facilitam a entrada de macromoléculas. (DANI, PASSOS, 2011) Uma vez dentro da célula, formam fagossomos, estimulando a liberação de enzimas lisossômicas, que tendem a degradar a proteína fagocitada. (DANI, PASSOS, 2011) Apenas pequena quantidade de proteínas alergênicas escapam à digestão (proteólise intraluminal e intracelular por enzimas lisosso ̂micas) e correm o risco de serem absorvidas como macromoléculas. (DANI, PASSOS, 2011) Após a absorção, as proteínas alergênicas penetram os espaços intercelulares, ganhando os linfáticos e a corrente circulatória. Além disso, as células M estão em contato íntimo com células do tecido linfoide, que podem captar o antígeno. É o primeiro evento para a sensibilização. (DANI, PASSOS, 2011) Ao captar o antígeno, o linfócito sensibilizado passa por processos de diferenciação, transformando-se em plasmócitos, que iniciam a produção de anticorpos específicos, principalmente de IgA, secretados no trato gastrintestinal. Os anticorpos específicos formam complexos com os seus respectivos antígenos no lúmen intestinal, evitando sua absorção subsequente. (DANI, PASSOS, 2011) Mecanismos não imunológicos Além da hidrólise proteolítica e da produção de imunoglobulinas específicas, o tubo digestivo detém outros mecanismos naturais, não imunológicos, que dificultam a absorção do antígeno (DANI, PASSOS, 2011) Na atividade gástrica, os efeitos digestivos do ácido clorídrico e da pepsina ajudam a iniciar o processo de degradação de macromoléculas e previnem supercrescimento de bactérias patogênicas. (DANI, PASSOS, 2011) A flora bacteriana normal do intestino, através de inibição competitiva, previne o crescimento de microrganismos patogênicos, impedindo lesões da barreira mucosa secundárias a infecções. A interrupção da barreira mucosa e a imaturidade do epitélio de revestimento, durante a infecção ou na fase de recuperação, são fatores importantes no aumento de absorção do antígeno após gastrenterite aguda, possibilitando o aparecimento de alergia alimentar no paciente suscetível. (DANI, PASSOS, 2011) A secreção intestinal de muco que recobre a superfície mucosa tem função de defesa, pois previne a fixação do antígeno. (DANI, PASSOS, 2011) A renovação celular normal do epitélio digestivo mantém intacta a barreira de defesa, que pode ser interrompida por drogas, como álcool e citotóxicos, ou por alterações patológicas, como uremia e isquemia. (DANI, PASSOS, 20111) A motilidade intestinal permite limpeza mecânica de organismos patogênicos e dificulta a fixação de alergênios à superfície intestinal. (DANI, PASSOS, 2011) O sistema reticuloendotelial hepático (células de Kupffer) ataca substâncias biologicamente ativas que ultrapassaram a barreira intestinal e entraram no sistema porta (DANI, PASSOS, 2011) Reatividade cruzada entre alérgenos As reações cruzadas ocorrem quando duas proteínas alimentares compartilham parte de uma sequência de aminoácidos que contêm um determinado epítopo alergênico. Alguns alérgenos estão amplamente distribuídos entre diversas espécies e são, por esta razão, denominados pan-alérgenos. (DANI, PASSOS, 2011) Tropomiosina do camarão ou profilinas de plantas são exemplos de alérgenos com ampla distribuição, facilitando a reatividade cruzada. (DANI, PASSOS, 2011) Dois clássicos exemplos são: • A positividade da IgE especifica para soja em pacientes com alergia a amendoim – ambos são leguminosas, mas a reatividade clínica e bastantereduzida; • A eatividade a carne em pacientes com alergia ao leite de vaca, muito menos frequente do que os resultados de teste cutâneo Fisiopatologia As respostas de hipersensibilidade induzidas por antígenos alimentares mediadas por IgE podem ser o resultado de falta da indução ou quebra dos mecanismos de tolerância oral no trato gastrintestinal, que ocorrem em indivíduos geneticamente predispostos. Tanto na falta de indução, como na quebra dos mecanismos de tolerância, ocorre produção excessiva de IgE especifica ao alimento envolvido. (SOLÉ et al., 2018) Uma vez sensibilizados, os linfócitos B se diferenciam e iniciam a produção de moléculas de IgE, que se ligam aos mastócitos presentes na parede do tubo digestivo, especialmente na submucosa e na lâmina própria da mucosa. Em exposição subsequente ao mesmo alergênio da dieta, este pode ligar-se a duas moléculas contíguas de IgE na parede do mastócito e ativá-las. (DANI, PASSOS, 2011) A ativação dos mastócitos resulta na degranulação e liberação de mediadores químicos pré-formados e na geração de mediadores secundários (DANI, PASSOS, 2011) • As consequências imediatas no trato alimentar são (DANI, PASSOS, 2011) • Aumento da permeabilidade vascular • Produção aumentada de muco • Contração da musculatura lisa • Edema das vilosidades • Estimulação de fibras nervosas de dor e recrutamento de células inflamatórias. A anafilaxia local, ao aumentar a permeabilidade da barreira mucosa, facilita a passagem à circulação de novas macromoléculas antigênicas. Quando atingem outros órgãos- alvo, elas disparam novamente os mecanismos de reação anafilática (hipersensibilidade imediata) e levam às manifestações extraintestinais de alergia alimentar. (DANI, PASSOS, 2011) Manifestações Clínicas Os sintomas de alergia alimentar geralmente desenvolvem-se imediatamente após a ingestão do alimento implicado e estes podem ser cutâneos, gastro- intestinais, respiratórios ou sistémicos. (RODRIGUES, 2011) Cutâneas A urticária aguda e o angioedema constituem as manifestações cutâneas mais frequentes de alergia alimentar, que raramente causa urticária crónica. As alergias alimentares desempenham também um importante papel na patogénese da dermatite atópica, sendo responsáveis por 35 a 80% dos casos de crianças com patologia moderada a grave. (RODRIGUES, 2011) Gastro-intestinais Os distúrbios gastro-intestinais apresentam geralmente um mecanismo misto, mediado e não-mediado por IgE, como ocorre na esofagite e/ou gastroenterite eosinofílica alérgica. (RODRIGUES, 2011) A esofagite eosinofílica alérgica constitui a síndrome mais comummente associada à alergia alimentar e é definida por sintomas esofágicos (disfagia, impactação alimentar e perda ponderal em adolescentes; irritabilidade, diminuição do rendimento e distúrbios do sono em crianças), associados a eosinofilia esofágica isolada grave e ausência de refluxo gastroesofágico patológico (documentado por pH normal do esófago distal ou ausência de resposta a elevadas doses de inibidores da bomba de protões). Pode ainda ocorrer anafilaxia gastrointestinal (mediada por IgE), que se manifesta geralmente por náuseas, vómitos, diarreia e dor abdominal tipo cólica. (RODRIGUES, 2011) Caso o mecanismo desencadeante da alergia alimentar seja não-mediado por IgE, as manifestações clínicas podem incluir proctocolite ou enterocolite induzidas por proteínas alimentares, distúrbios que ocorrem mais frequentemente em latentes, após ingestão de proteínas do leite ou da soja. (RODRIGUES, 2011) A proctocolite induzida por proteínas alimentares manifesta-se por diarreia, com sangue nas fezes, anemia e perda ponderal. A enterocolite induzida por proteínas alimentares causa vómitos, diarreia, desidratação grave, podendo provocar choque cardiogénico. A enteropatia induzida por proteínas alimentares caracteriza-se por atrofia das vilosidades intestinais e um infiltrado inflamatório da mucosa, com consequente síndrome de má-absorção. (RODRIGUES, 2011) Manifestações respiratórias As manifestações respiratórias de alergia alimentar podem incluir asma, edema laríngeo ou rinoconjuntivite (RODRIGUES, 2011) Manifestações Sistêmicas As manifestações sistémicas são as mais graves, embora não ocorram com tanta frequência e são as que mais trazem preocupações para os médicos, pois pode ocorrer morte se não houver uma ação rápida. A anafilaxia pode surgir com outras manifestações clínicas: cutâneas (80%), respiratórias (70%) e ainda gastrointestinais e cardiovasculares. (RODRIGUES, 2011) Diagnóstico Exame clínico Uma anamnese detalhada é a melhor ferramenta para o diagnóstico de uma AA. Na história clínica é necessário ter em atenção o possível alimento suspeito da alergia e, deste modo, tentar determinar a quantidade de alimento ingerido que leva à reação, o tempo entre a ingestão e a reação, o número de vezes que já aconteceram episódios semelhantes e outros detalhes relevantes. (MONTE, 2016) Não existem, até ao momento, critérios de diagnóstico específicos para alergias alimentares. São muitos os testes subsidiários que é possível realizar como complemento à história clínica e que podem validar a suspeita. De entre eles destacam-se: os testes cutâneos, IgE sérico específico, teste de contacto atópico e testes de provocação oral. (MONTE, 2016) Testes cutâneos (Skin Prick Test): Os testes cutâneos pretendem avaliar a sensibilização a determinados alergéneos. (MONTE, 2016) Utilizam-se extratos padronizados de certos alergéneos e injetam-se habitualmente no antebraço ou no dorso. A reação desencadeada é medida após 15 minutos. (MONTE, 2016) É necessário utilizar uma solução salina para controlo negativo e uma solução com histamina para controlo positivo da reação. (MONTE, 2016) São considerados testes positivos aqueles em que há formação de uma pápula com pelo menos 3mm de diâmetro. Quanto maior a reação, mais provável será a presença de uma reação alérgica. (MONTE, 2016) Um resultado negativo é útil para excluir o quadro de alergia alimentar, mas um resultado positivo não nos permite concluir com certeza que existe um quadro alérgico. (MONTE, 2016) Estes testes têm valores preditivos negativos de cerca de 95% quando existem reações mediadas por IgE. (MONTE, 2016) Diversas variáveis precisam de ser tidas em conta de forma a interpretar corretamente o resultado de um teste cutâneo, tais como: modo de leitura do diâmetro da pápula, tempo, idade, sexo e local do teste(MONTE, 2016) IgE sérico específico: A determinação da IgE específica auxilia apenas na identificação de AA mediadas por IgE ou nas reações mistas. (MONTE, 2016) O teste comercial mais amplamente disponível é o ImmunoCap®, que permite medir a IgE específica no sangue. O valor de corte utilizado é de 0,35kU/L para excluir uma alergia alimentar, mas não é útil para afirmar o diagnóstico de AA. Na maioria das vezes este teste precisa de ser confirmado com um teste de provocação oral subsequente. (MONTE, 2016) Além disso, é essencial que a interpretação deste teste seja feita de acordo com a história clínica. Mesmo que o teste seja negativo e o nível de suspeição muito elevado, não deve ser descartada a possibilidade de existir alergias alimentares. Os níveis de IgE específico não se correlacionam com a gravidade da reação. (MONTE, 2016) Teste de contacto atópico: A utilização deste método não é recomendada como teste diagnóstico pelo facto de não haver padronização para a sua realização e interpretação e também por não se ter encontrado vantagem sobre os testes cutâneos e IgE específico. (MONTE, 2016) Dieta de eliminação: Pretende-se que o paciente suspenda o(s) alimento(s) suspeitos durante cerca de 2-6 semanas. A dieta deve ser cuidadosamente monitorizada e osresultados avaliados, de forma a estabelecer o diagnóstico. Assim, evita-se que sejam excluídos alimentos desnecessários da dieta. (MONTE, 2016) Se os sintomas apresentados pelo paciente não melhorarem com a eliminação de certos alimentos é muito pouco provável que se trate de uma reação alérgica. Este teste serve para diagnóstico, mas também terapêutico, quando se descobre qual o alimento que provoca a reação e se suspende da dieta. (MONTE, 2016) Testes de Provocação Oral: Estes testes são considerados os únicos fidedignos para estabelecer o diagnóstico de AA. (MONTE, 2016) Consistem na administração de alimentos e/ou placebo, em doses sucessivamente maiores a intervalos regulares, sob supervisão de pessoal especializado. (MONTE, 2016) Devem ser realizados com monitorização de possíveis reações adversas e num local com capacidade de resposta perante uma emergência. (MONTE, 2016) Os testes de provocação oral podem ser realizados de diferentes formas. Se realizados com o conhecimento da natureza da substância ingerida (alimentos vs. placebo) pelo médico e paciente são designados por abertos. Quando apenas o médico sabe a natureza da substância ingerida designam-se por simples cegos. Caso nenhuma das partes tenha o conhecimento da natureza da substância são designados duplamente cegos. (MONTE, 2016) Os testes duplamente cegos para provocação oral são considerados os gold standard. Estes testes necessitam, no entanto, de ser realizados por pessoal especializado, a sua execução é demorada, são dispendiosos e tem risco de anafilaxia. Outra desvantagem destes testes é que não existem critérios definidos para o que é considerado uma reação alimentar alérgica positiva. Por todos estes pontos negativos, os testes de provocação oral não se encontram ainda muito disseminados nos meios clínicos. (MONTE, 2016) Intolerância Alimentar A intolerância alimentar, ou reação de hipersensibilidade a alimentos não-alérgica, constitui um tipo de reação adversa em que não está implicado um mecanismo imunológico. (RODRIGUES, 2011) Este tipo de reações é dose dependente e tende a provocar um efeito retardado (horas a dias), o que torna difícil identificar a causa subjacente (RODRIGUES, 2011) Epidemiologia As IA são uma patologia muito frequente a nível mundial. (MONTE, 2016) Os dados estatísticos não são muito precisos, e variam de acordo com as definições e métodos utilizados. (MONTE, 2016) Estima-se que cerca de 15-20% da população mundial seja afetada por alguma IA. (MONTE, 2016) Etiologia e fisiopatologia As deficiências enzimáticas podem provocar profunda intolerância a certos carboidratos, aminoácidos e lipídios – como na galactosemia, fenilcetonúria, intolerância à lactose e insuficiência pancreática. (DANI, PASSOS, 2011) Os erros inatos do metabolismo devidos a defeitos enzimáticos podem afetar a digestão e absorção de hidratos de carbono, límpidos ou proteínas. O defeito enzimático pode ser primariamente gastrointestinal, causando alterações da digestão ou absorção (ex: deficiência de lactase), ou sistémico, como ocorre na intolerância hereditária à frutose (RODRIGUES, 2011). Em sociedades industrializadas, uma variedade de aditivos (conservantes e corantes), além de contaminantes, é encontrada nos alimentos. Essas substâncias deveriam ser mencionadas pelos fabricantes nos rótulos das embalagens (como é obrigatório nos alimentos que contêm glúten, para evitar o consumo por quem é detentor de doença celíaca), o que facilitaria o diagnóstico e a prevenção de reações aos aditivos implicados. (DANI, PASSOS, 2011) A ingestão de aflatoxina, contaminante encontrado no amendoim, pode induzir à intolerância não imunológica; por outro lado, o amendoim é alergênio importante em indivíduos suscetíveis. (DANI, PASSOS, 20110) Entre os agentes farmacológicos naturais de alguns alimentos, a cafeína é talvez o mais consumido. Sua ingestão, em grandes quantidades, associa-se a ansiedade, inquietação, insônia, taquicardia, cefaleia e sintomas gastrintestinais, muitas vezes equivocadamente atribuídos à alergia. (DANI, PASSOS, 2011) Pacientes em uso de inibidores da monoamina oxidase (antidepressivos, isoniazida) não raro entram em crise hipertensiva ao ingerir nutrientes que contêm tiramina. (DANI, PASSOS, 2011) A aversão psicológica aos alimentos é tão marcante, em alguns casos, que tem ocasionado sintomatologia clínica de distinção bastante difícil da intolerância verdadeira. O paciente, decididamente, sente medo de ingerir determinados alimentos, não o faz e não se encontra uma razão fisiopatológica plausível. Embora, em certas ocasiões (tomando-se por base a história clínica e os eventos temporais), a associação entre ingestão do alimento e manifestações clínicas possa estabelecer-se, os mecanismos patogenéticos nem sempre estão evidentes, o que dificulta a distinção entre alergia e intolerância. (DANI, PASSOS, 2011) Tipos de intolerância alimentar Intolerância a frutose A frutose é um monossacarídeo presente na fruta e no mel, e tem sido amplamente utilizado na indústria alimentar. A capacidade de absorção da frutose no intestino é, no entanto, limitada. A frutose e glucose são cotransportadas (1:1) pelo GLUT-2 presente na superfície apical da mucosa intestinal. O transportador GLUT-5 permite a difusão facilitada da frutose isoladamente. Existem outros transportadores de frutose no intestino mas ainda não se sabe a sua importância na absorção da mesma. Por isso, alimentos com excesso de frutose em relação à glucose podem conduzir à mal absorção da primeira (MONTE, 2015). O processo de absorção é incompleto em alguns indivíduos, podendo estar sobrecarregado se houver excesso de frutose luminal intestinal, principalmente se houver pouca glicose luminal intestinal. Qualquer frutose não absorvida atingirá o cólon, onde a fermentação colônica leva à produção de gases e sintomas semelhantes aos encontrados na má absorção de lactose e na síndrome do intestino irritável (TURNBULL; ADAMS; GORARD, 2015) Intolerância aos frutanos Os frutanos são hidratos de carbono de cadeia curta formados por polímeros de frutose. A sua absorção é inferior a 5% devido à ausência de enzimas que quebrem as ligações glicosídicas entre as cadeias. Isto leva a que os frutanos sejam acumulados no intestino e os microrganismos presentes fermentem estes compostos. Os frutanos podem estar presentes numa variedade de cereais, vegetais e adicionados a alguns alimentos pelas propriedades prébióticas (MONTE, 2015) Intolerância aos galactanos Os galactanos são hidratos de carbono de cadeia curta formados por polímeros de galactose com um terminal de glucose. Estes alimentos não são hidrolisados no trato digestivo humano devido à ausência de α-galactosidade, tornando-os disponíveis para a fermentação pelos microrganismos presentes no cólon. Estão presentes no leite, legumes, leguminosas, grãos e frutos secos (MONTE, 2015) Intolerância aos pólipos Os polióis são álcoois com um terminal de açúcar (sorbitol, manitol, xilitol). Eles são absorvidos de forma passiva pelo intestino delgado, mas a sua absorção depende do tamanho da molécula, do poro intestinal, do tempo de trânsito no intestino delgado e de patologia gastrointestinal que afecte a absorção. Os polióis estão naturalmente presentes na fruta (pêssegos, damascos, cerejas, maçãs, pêras) e vegetais (cogumelos, couve- flor). Estes alimentos estão associados a um efeito laxante (MONTE, 2015) Intolerância à lactose A lactose é um dissacarídeo secretado pelas glândulas mamárias de fêmeas de mamíferos, que quando ingerida, sofre reações de hidrólise através do intestino delgado, apresentando como produtos dois monossacarídeos, glicose e galactose. A hidrólise é catalisada pela enzimaβ-galactosidase, conhecida como lactase (FERRARI et al., 2022) A má absorção da lactose está relacionada com a diminuição, inatividade ou ineficiência de atividade da enzima lactase, responsável por hidrolisar a lactose. Indivíduos acometidos com a IL podem desencadear sintomas como diarreias, dores abdominais e flatulências e podem melhorar quando há a interrupção do consumo do leite e seus derivados. De forma resumida, a IL é caracterizada pelo aparecimento de sintomas abdominais advindos da má absorção da lactose (ALVES; LIMA; MARTINS, 2021) A falta da hidrólise da lactose faz com que ela não seja absorvida no intestino delgado, passando diretamente para o cólon. No cólon, a lactose é fermentada pela flora intestinal, que a converte em ácidos graxos de cadeia curta e gases, tais como o gás hidrogênio (H2) e o gás carbônico (CO2). Os gases formados podem causar dores abdominais, assim como sensação de inchaço no abdome, levando o indivíduo a um quadro de flatulência. Ainda, a fermentação da lactose no intestino pode ocasionar a acidificação do conteúdo colônico e aumento da carga osmótica, levando a uma maior secreção de eletrólitos e fluidos, o que, por sua vez, pode ocasionar fezes pastosas e diarreia (ALVES; LIMA; MARTINS, 2021) A IL pode ser um fator genético, causado por mutações recessivas na enzima lactase intestinal (FERRARI; MEIRA; SOARES, 2022). Segundo Alves, Lima e Martins (2021), IL pode ser classificada como primária, secundária e congênita • A primária, também chamada hipolactasia primária adulta, é a forma mais comum e prevalente na população. É caracterizada pela redução fisiológica (total ou parcial) da produção da lactase nas células intestinais. • A IL secundária caracteriza-se pela existência de situação fisiológica – perda de células epiteliais, que produzem a lactase - , levando à intolerância devido à má absorção ou digestão da lactose. Alguns fatores podem ocasionar as lesões na mucosa do intestino que interferem na produção da lactase como, por exemplo, a quimioterapia, diarreias, gastroenterites, radioterapia, infecções virais, parasitoses e infecções pelo HIV. Pode ser reversível quando o paciente inicia o tratamento da doença base, recuperando a lesão da mucosa. • A IL congênita é uma herança genética que acomete recém- nascidos nos seus primeiros dias de vida. Essa IL, se não diagnosticada rapidamente, pode levar a óbito. É uma condição rara, mas extremamente grave. Consiste em uma doença autossômica recessiva e caracteriza-se pela mutação no gene da lactase, ocorrendo ausência total ou parcial da enzima. Essa condição leva a um quadro clínico que pode desenvolver desidratação, acidose metabólica, diarreia ácida, acidose renal e vômito predominante. Manifestações Clínicas A sintomatologia de IA é muito variável. Alguns dos sintomas apresentados por estes doentes são: dor e distensão abdominal, diarreia, obstipação, cefaleias, eczema, rash, urticária, fadiga, dores musculares, dificuldades de concentração, ansiedade ou depressão, entre outros. (MONTE, 2016) Cerca de 50-84% dos pacientes diagnosticados com distúrbios gastrointestinais funcionais associam o aparecimento dos sintomas com IA. Os alimentos mais vezes associados são o leite, trigo, feijão, café, cebola, couve e alimentos muito picantes ou fritos (MONTE, 2016) Diagnóstico Exame Clínico Para o diagnóstico clínico de uma IA é necessário um alto índice de suspeição. É de grande importância a recolha de uma anamnese bastante detalhada, incluindo os hábitos dietéticos e estilo de vida. (MONTE, 2016) De acordo com os sinais e sintomas apresentados pelo paciente é necessário realizar exames complementares de modo a suportar o diagnóstico. (MONTE, 2016) Dentro dos exames possíveis de se realizar encontram- se as análises sanguíneas e fecais, EDA ou EDB e também métodos de imagiologia para excluir alguma patologia orgânica. Sem presença comprovada de doença orgânica ou AA, o paciente será diagnosticado com um distúrbio funcional, como por exemplo, o SII ou dispepsia funcional. Atualmente, existe uma disponibilidade limitada de testes úteis para identificar IA específica (MONTE, 2016) Exclusão alimentar, melhoria sintomática e desafios alimentares A utilização de dietas restritivas tornou-se o gold standard do diagnóstico das IA. Nestas dietas excluem-se, inicialmente, os alimentos mais prováveis de desencadearem sintomas durante 2-4 semanas e assim que todos os sintomas tiverem desaparecido fazem-se os desafios de reintrodução dos alimentos. (MONTE, 2016) Quando há indução dos sintomas com um dado grupo de alimentos, é necessário testar a tolerância dos mesmos, de modo a avaliar a quantidade de alimento necessária para desencadear os sintomas. (MONTE, 2016) Testes Respiratórios Este teste é extremamente útil para avaliar a absorção dos hidratos de carbono pelo trato gastrointestinal. (MONTE, 2016) Existem alguns critérios para a realização deste teste, dos quais se pode destacar a necessidade de dieta pobre em hidratos de carbono fermentados nas 24-48h prévias à realização do exame, bem como a necessidade de a noite prévia ser passada em jejum, escovagem dos dentes prévia e, finalmente, não terem sido utilizados antibióticos, laxantes e probióticos nos 14 dias prévios. (MONTE, 2016) Os níveis basais de hidrogénio e/ou metano devem ser medidos previamente ao teste para haver um valor de controlo. Administram-se 25-50g de hidratos de carbono dissolvidos em água, sendo que no caso de crianças o valor deve ser mais baixo. (MONTE, 2016) É considerado um resultado positivo quando há aumentos de pelo menos 10-20 ppm de hidrogénio ou metano em comparação com o nível basal, em dois testes consecutivos com colheitas a cada 15-30 minutos durante de 2-5h. (MONTE, 2016) Endomicroscopia Laser Confocal Esta é uma técnica inovadora da endoscopia que facilita a visualização de alterações da mucosa gastrointestinal. São administrados antigéneos alimentares diluídos na mucosa duodenal, através do endoscópio, e ficam expostos à mucosa pelo menos durante 5 minutos. Isto leva a que haja um aumento intraepitelial de linfócitos, fendas epiteliais e alargamento dos espaços intervilositários (MONTE, 2016)