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Thaynara Parente-Medicina No Brasil, as hepatites virais mais comuns são causadas pelos vírus A, B e C. Existem ainda, com menor frequência, o vírus da hepatite D (mais comum na região Norte do país) e o vírus da hepatite E, que é menos frequente no Brasil, sendo encontrado com maior facilidade na África e na Ásia. As infecções causadas pelos vírus das hepatites B ou C frequentemente se tornam crônicas. Contudo, por nem sempre apresentarem sintomas, grande parte das pessoas desconhecem ter a infecção. Isso faz com que a doença possa evoluir por décadas sem o devido diagnóstico. O avanço da infecção compromete o fígado sendo causa de fibrose avançada ou de cirrose, que podem levar ao desenvolvimento de câncer e necessidade de transplante do órgão. Hepatite A A HA é uma doença infecciosa causada por um enterovírus (HAV) do gênero hepatovírus, da família Picornaviridae. Altamente contagiosa, sua transmissão é do tipo fecal oral, ou seja, ocorre contaminação direta de pessoa para pessoa ou através do contato com alimentos e água contaminados. Transmissão A transmissão parenteral é extremamente rara, podendo ocorrer se o indivíduo estiver na fase de viremia do período de incubação, já que a hepatite A não cronifica. Raramente é transmitida por via sexual e por contato com secreções anais e, apesar do vírus ser encontrado na saliva, não há relatos de transmissão por essa via. O período de incubação da hepatite A é de 15 a 45 dias (média de 4 semanas). É nessa fase que temos maior viremia e maior eliminação do vírus nas fezes. O paciente excreta nas fezes o vírus da hepatite A (HAV) 1 a 2 semanas antes do início dos sintomas e essa excreção permanece por 1 a 2 semanas (geralmente 1 semana) após o início das manifestações clínicas. Manifestações Clínicas Os pacientes com hepatite A podem apresentar-se sem sintomas (assintomáticos), com sintomas inespecíficos que simulam um quadro respiratório viral e/ou gastroenterite ou com os sintomas típicos de uma hepatite aguda (icterícia, prurido, colúria e acolia fecal). Os sintomas são de início súbito, com febre baixa, fadiga, mal estar, perda do apetite, sensação de desconforto no abdome, náuseas e vômitos. Pode ocorrer diarreia. Na fase prodrômica, os pacientes podem apresentar um quadro viral inespecífico, que tem duração de 1 semana, em média. A febre é mais comum nas hepatites A e E e menos frequente nas hepatites B e C. Após essa primeira fase, tem início a fase ictérica, em que o paciente apresenta icterícia, com ou sem prurido, acolia fecal e colúria e, geralmente, há melhora dos sintomas da fase prodrômica. Os pacientes também podem apresentar rash cutâneo, hepatomegalia, hipersensibilidade hepática, esplenomegalia e linfadenopatia cervical. É importante frisar que, dentre as hepatites virais, a hepatite A é a que mais tem características colestáticas, justificando o aparecimento de icterícia, colúria, acolia fecal e prurido intenso. Diagnóstico As transaminases começam a aumentar no período de incubação, geralmente 3 a 4 semanas antes do início dos sintomas, e permanecem aumentadas por 30 dias após a exposição ao vírus. • Transaminases: > 10x o limite superior da normalidade (TGP>TGO). • Bilirrubinas: < 10x o limite da normalidade( bilirrubina direta de preferencia) • Fosfatase alcalina: < 400 U/L • Hemograma: Neutropenia e linfocitose Marcadores Sorológicos O anti-HAV IgM já pode ser encontrado antes do início das manifestações clínicas. Ele representa infecção aguda e permanece positivo por cerca de 3 meses (raramente persiste por 6 a 12 meses). O Anti-HAVIgG também já pode ser encontrado antes do início dos sintomas e permanece positivo por tempo indeterminado. A presença do anti-HAV IgG positivo indica que o indivíduo já teve hepatite A ou foi vacinado. Esse anticorpo pode permanecer positivo permanentemente e confere imunidade definitiva. • Anti-HAV IgM positivo: Hepatite A aguda • Anti-HAV IgM positivo com Anti-HAV IgG positivo: Hepatite A aguda • Anti-HAV IgM negativo com Anti-HAV IgG positivo: Já teve hepatite A ou foi vacinado Thaynara Parente-Medicina Tratamento A infecção pelo HAV, na maioria das vezes, é autolimitada e o tratamento consiste no suporte sintomático. Assim, não há medicação específica para o tratamento da hepatite A e a maioria dos pacientes evolui com melhora espontânea. O paciente é orientado a manter repouso e usar sintomáticos (antitérmicos e antieméticos). Não há recomendação de dieta específica, que deve ser ofertada de acordo com o apetite e a aceitação do paciente. Ele não deve usar drogas hepatotóxicas, nem ingerir bebidas alcoólicas por 6 meses a 1 ano. A hepatite A não cronifica e tem ótimo prognóstico. Cerca de 85% dos pacientes com HA têm recuperação completa em 2 a 3 meses. Os outros pacientes recuperam-se completamente em 6 meses. Prevenção A vacina contra o HAV é disponibilizada pelo PNI no Brasil e deve ser aplicada em todas as crianças, em dose única, aos 15 meses de vida, podendo ser indicada até os 5 anos incompletos (4 anos 11 meses e 29 dias). Profilaxia Pós-exposição Para a profilaxia da hepatite A, estão disponíveis a imunoglobulina (IG) e a vacina inativa. Para a profilaxia pós-exposição dos contatos íntimos (domiciliares, contatos sexuais e institucionais), a IG deve ser usada até no máximo duas semanas desse contato. Não há necessidade de fazer profilaxia nos indivíduos já vacinados e nos contatos casuais (escritório, fábrica, escola ou hospital). As vacinas inativadas são seguras, imunogênicas e efetivas na prevenção da hepatite A. São aprovadas para uso em indivíduos com mais de 1 ano de idade e parecem proporcionar proteção a partir de 4 semanas da aplicação. Hepatite B A hepatite B é uma infecção causada por um vírus de DNA, com transmissão parenteral, ou seja, através de sangue ou fluidos corporais contaminados. Transmissão A principal via de transmissão atualmente é através de relações sexuais desprotegidas. O vírus da hepatite B (HBV) é muito contagioso e apresenta maior infectividade quando comparado ao vírus da hepatite C (HCV) e ao HIV, ou seja, quando em contato com um instrumento contaminado, por exemplo, é maior o risco de contaminação pelo HBV. A transmissão através da transfusão de sangue e hemoderivados já foi a principal via, pois às testagens nos bancos de sangue, indivíduos antiHBc positivos não podem ser doadores de sangue. A via vertical é uma importante via de transmissão especialmente pelo seu impacto no risco de evolução para doença crônica. Aqui vamos ter mais um conceito importante: o risco de cronificar a hepatite B é maior quanto mais jovem é o indivíduo infectado e, quando a contaminação ocorre no recém-nascido, até 90-95% dos pacientes vão evoluir com hepatite B crônica! Lembre- se de que, no adulto, apenas 5-10% dos casos vão cronificar. Importante: O HBV é um vírus oncogênico, com risco de desenvolvimento de carcinoma hepatocelular (CHC) ou hepatocarcinoma (são sinônimos), mesmo sem a presença de fibrose avançada e cirrose. Manifestação Clínica Fase prodrômica: ocorre após o período de incubação. No caso da hepatite B, em 4 a 6 semanas após a exposição ao vírus; marcada por sintomas inespecíficos, como mal-estar, astenia, febre baixa, mialgia, dor abdominal, náuseas e vômitos; Fase ictérica: pode ou não ocorrer após a fase prodrômica; caracterizada pela melhora dos sintomas inespecíficos e piora dos sintomas gastrointestinais, associada ao aparecimento de icterícia, com ou sem os outros achados da síndrome colestática (prurido, colúria e acolia fecal); Fase de convalescença: ocorre melhora dos sintomas e entende-se que a hepatite aguda chegou ao fim; o paciente pode evoluir com clareamentoviral espontâneo e cura ou com cronificação da hepatite B. Thaynara Parente-Medicina É importante sabermos que a hepatite B é a hepatite viral com maior risco de evoluir para a forma grave, com hepatite fulminante ou subfulminante. Até 5% dos pacientes com hepatite B aguda podem apresentar quadro de fulminação e esse risco é maior naqueles indivíduos com coinfecção com hepatite D (ou delta), HIV e/ou hepatite C. Manifestações extra-hepáticas da hepatite B ➢ Glomerulonefrite É mais comum em crianças, com predomínio da forma membranosa. Em crianças, tem curso benigno, com doença hepática leve e resolução espontânea em 6 meses a 2 anos. Quando surge em adultos, pode ser progressiva e evoluir para insuficiência renal. ➢ Poliarterite nodosa (PAN)-mais importante Manifestação típica da hepatite B, com HBsAg positivo em 30% dos pacientes. É uma vasculite necrosante sistêmica, principalmente de médios e grandes vasos, caracterizada por sintomas inespecíficos, incluindo livedo reticular, mialgia e polineuropatia, mediada pela formação de imunocomplexos e anticorpos. ➢ Crioglobulinemia mista Vasculite de pequenos e médios vasos, muito associada à hepatite C, podendo ter relação também com o HBV. Apresenta-se com púrpuras palpáveis e petéquias em membros inferiores, artrite, glomerulonefrite e neuropatia periférica. Diagnóstico ✓ HBsAg é o primeiro marcador a positivar; ✓ A definição de hepatite B crônica é a persistência do HBsAg por mais de 6 meses; ✓ Anti-HBc IgM é o primeiro anticorpo e indica infecção aguda; sua persistência indica gravidade; ✓ Anti-HBc IgG ou total marca contato prévio com o vírus selvagem; ✓ HBeAg indica replicação viral e sua persistência indica maior risco de cronificar; ✓ Anti-HBs indica imunidade após contato com o vírus e cura, ou por vacinação. Tratamento Os pacientes que evoluem com gravidade, aqueles com coagulopatia e/ou icterícia por mais de 14 dias, ou evidências de encefalopatia, caracterizando a hepatite fulminante ou subfulminante, dependendo do tempo de instalação, devem receber tratamento específico, além de internação e monitorização. As medicações disponíveis são o interferon peguilado, o tenofovir e o entecavir. O interferon está indicado para aqueles casos de hepatite B crônica replicativa, HBeAg positivo, sem evidências de cirrose hepática ou contraindicações à droga. As outras situações devem ser tratadas com tenofovir, prioritariamente, ou entecavir, em caso de contraindicações à primeira opção. Essas drogas são equivalentes em eficácia, com excelente barreira genética e, portanto, baixo risco de resistência viral. O transplante pode ser indicado em casos mais graves de insuficiência hepática. Uma parcela pequena dos pacientes vai cronificar a infecção, caracterizada pela persistência do HBsAg por mais de 6 meses. Critérios de inclusão para tratamento da hepatite B sem agente delta: ✓ HBeAg positivo e TGP > 2 vezes o limite superior da normalidade; ✓ Adulto maior de 30 anos com HBeAg positivo; ✓ Paciente com HBeAg negativo, HBV-DNA > 2.000UI/ml e TGP > 2 vezes o limite superior da normalidade; Outros critérios de inclusão para o tratamento ✓ História familiar de hepatocarcinoma; ✓ Manifestações extra-hepáticas: artrite, vasculites, glomerulonefrite e poliarterite nodosa; ✓ Coinfecção HIV/HBV ou HCV/HBV; ✓ Hepatite aguda grave (coagulopatia ou icterícia por mais de 14 dias); ✓ Reativação da hepatite B crônica; ✓ Cirrose/insuficiência hepática; ✓ Biópsia hepática METAVIR ≥ A2F2 ou elastografia hepática > 7,0kPa; ✓ Prevenção de reativação viral em pacientes que receberão terapia imunossupressora ou quimioterapia. OBS: A coinfecção HIV/HBV aumenta o risco de cronificar a hepatite B e evoluir para cirrose! Prevenção: Existe vacina para hepatite B que é dada em 3 doses intramusculares e deve ser repetida a cada 10 anos. O período de incubação do vírus é 90dias. Thaynara Parente-Medicina Hepatite C O vírus da Hepatite C (HCV) é um vírus de RNA, pertencente à família Flaviviridae, com transmissão parenteral, ou seja, a partir de sangue e fluidos corporais contaminados. Nos últimos 20 anos, a principal causa de transmissão do HCV é pelo uso de drogas injetáveis e inalatórias. É perigosa porque pode cronificar e provocar a cirrose hepática e hepatocarcinoma, neoplasia maligna do fígado. Transmissão O vírus da hepatite C fica viável por algumas horas a poucos dias em superfícies não esterilizadas e a transmissão pode ocorrer a partir de instrumentos contaminados, como alicates de cutícula ou lâminas de barbear. O HCV apresenta maior infectividade quando comparado ao HIV, mas é menos contagioso que o vírus da hepatite B. Não existe qualquer medida profilática para evitar a transmissão vertical e a via de parto deve seguir indicações obstétricas. As medicações usadas no tratamento da hepatite C são potencialmente teratogênicas e contraindicadas durante a gestação. Uma vez em contato com o vírus da hepatite C, a maioria dos pacientes vai evoluir com doença crônica, até 80% dos casos. Essa é a hepatite viral que mais cronifica! É incomum a ocorrência de sintomas na fase aguda e, muitas vezes, o diagnóstico é feito apenas na fase crônica. A evolução para hepatite aguda grave ou hepatite fulminante é rara e pode ocorrer excepcionalmente em casos de coinfecção com hepatite B e/ou HIV. OBS: São 7 genótipos da hepatite C, mas saiba que o genótipo 1 é o mais prevalente no Brasil e no mundo, seguido pelo genótipo 3. Manifestação Clínica A infecção pelo HCV pode cursar com infecção assintomática, infecção aguda sintomática, ictérica ou anictérica, e evoluir para a forma crônica, com risco de progressão para cirrose e carcinoma hepatocelular quando há fibrose avançada e cirrose. O período de incubação da hepatite C varia entre 15 e 160 dias, com média de 7 semanas para o início dos sintomas. As transaminases costumam elevar em 2 a 8 semanas após a exposição, antes mesmo do aparecimento de sintomas. O HCV-RNA é o primeiro marcador a positivar e já pode ser detectado em 2 semanas após a contaminação. Em até 20% dos casos, na fase aguda, o anti-HCV estará negativo e, nesses casos, o HCV-RNA é o único marcador capaz de fazer o diagnóstico. Os níveis do HCV-RNA aumentam rapidamente após a infecção e seu pico ocorre imediatamente antes do pico das transaminases, podendo coincidir com o início dos sintomas. O surgimento do anti-HCV, ou seja, a soroconversão, em geral, ocorre em 30 a 60 dias, podendo acontecer em até 6 meses, SEMPRE após o aparecimento do HCV- RNA. Fatores relacionados à maior chance de cronificação: ✓ Sexo masculino; ✓ Idade > 40 anos; ✓ Ausência de icterícia; ✓ Coinfecção com HIV e/ou hepatite B; ✓ Genótipo não 3; ✓ Imunossupressão; ✓ Fatores genéticos A definição de hepatite C crônica é a persistência do anti-HCV por mais de 6 meses, associado a HCV-RNA positivo por, pelo menos, 6 meses, confirmando a infecção ativa. Estima-se que o risco seja de 1-5% ao ano; os pacientes devem manter vigilância com ultrassonografia de abdome e dosagem de alfafetoproteína a cada 6 meses. Manifestações extra-hepáticas da hepatite C ➢ Crioglobulinemia mista É uma vasculite de pequenos e médios vasos, com aparecimento de púrpuras palpáveis e petéquias em membros inferiores, artralgia, doença renal, geralmente glomerulonefrite membranoproliferativa, e neuropatia periférica. ➢ Glomerulonefrite Pode estar associada a vasculites, como a crioglobulinemia, ou depósito de imunocomplexos. A forma mais comum é a membranoproliferativa. Thaynara Parente-Medicina ➢ Porfiria cutânea tarda Distúrbio enzimático na via de produção do grupo heme. Geralmente apresenta-se com lesões bolhosas crônicas na pele, prurido, fragilidade da pelee hiper ou hipopigmentação, principalmente nas áreas expostas ao sol, em indivíduos com Hipertricose. O comprometimento hepático é comum e os pacientes apresentam risco maior de evolução para cirrose e carcinoma hepatocelular. Diagnóstico Em relação à sorologia da hepatite C, existe apenas um anticorpo: o anti-HCV. Esse anticorpo surge quando o indivíduo entra em contato com o vírus da hepatite C e não confere imunidade, ou seja, uma vez curado da hepatite C, após tratamento ou espontaneamente, o paciente pode ser novamente contaminado, mesmo com anti-HCV positivo. O ANTI-HCV NÃO CONFERE PROTEÇÃO CONTRA A HEPATITE C! O diagnóstico da hepatite C deve ser feito com a dosagem da carga viral (HCV-RNA). Anti-HCV negativo/ HCV-RNA negativo - Nunca teve contato com o HCV Anti-HCV negativo/ HCV-RNA positivo- Hepatite C aguda ou incapacidade de produzir anticorpos* Anti-HCV positivo/ HCV-RNA positivo- Hepatite C aguda ou crônica Anti-HCV positivo/ HCV-RNA negativo- Hepatite C curada ou falso positivo Tratamento TODO paciente com diagnóstico de hepatite C tem indicação de tratamento, independentemente do grau de fibrose,inflamação ou qualquer outro fator. Está indicado o tratamento com os antivirais de ação direta, em esquema duplo, por 8 a 24 semanas. São drogas orais muito eficazes e bem toleradas. São: daclatasvir com sofosbuvir, ledipasvir/sofosbuvir, elbasvir/grazoprevir, glecaprevir/pibrentasvir e velpatasvir/sofosbuvir. Esquemas de tratamento da hepatite C • Interferon peguilado + ribavirina (apenas para a população pediátrica entre 3 e 11 anos) • Daclatasvir com sofosbuvir • Ledipasvir/sofosbuvir • Elbasvir/grazoprevir (indicado para pacientes com disfunção renal) • Glecaprevir/pibrentasvir (indicado para pacientes com disfunção renal) • Velpatasvir/sofosbuvir Prevenção: Não existe vacina para hepatite C e é considerada pela OMS como o maior problema de saúde pública, e a maior causa de transplante hepático e transmite-se pelo sangue mais facilmente do que a AIDS.
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