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Geovana Sanches, TXXIV DOENÇA CELÍACA DEFINIÇÃO A doença celíaca é caracterizada por: • Má absorção de nutrientes no intestino delgado após ingestão de glúten • Presença não exclusiva de atrofia vilositária da mucosa o Nem toda atrofia vilositária da mucosa é ocasionada pela doença celíaca – há outras causas • Pronto restabelecimento clínico e histológico após dieta livre de glúten o O restabelecimento histológico é mais demorado do que o clínico • Recaída clínica e histológica quando o glúten é reintroduzido EPIDEMIOLOGIA • A doença celíaca silenciosa é 7x mais frequente do que doença sintomática • Importante variação geográfica o Maiores incidência na Europa Ocidental o Brasil: cerca de 1% da população • Predomínio da doença em mulheres o M 1,3 a 2:1 H • HLA predominante • Relação com o tempo de introdução do glúten na dieta e com a concentração de gliadina (proteína do glúten) na dieta de crianças o Quanto mais precoce a introdução do glúten na dieta da criança, mais provável o desenvolvimento da doença em pacientes predispostos Classificação x Prevalência • Doença sintomática o Menor quantidade de casos • Doença silenciosa: paciente apresenta inflamação da mucosa, porém não tem sintomas • Doença latente: paciente apresenta predisposição genética, porém não tem alterações da mucosa PATOGÊNESE Fatores genéticos • Influência genética é indicada pela ocorrência familiar • Não há doença celíaca se não houver alelos para o HLA DQ2 (95%) ou HLA DQ-8 o A identificação desses alelos é uma boa opção para afastar a presença da doença, mas não faz o diagnóstico – paciente pode apresentar apenas o gene, sem manifestação alguma • Parentes de 1° grau: concordância de 8 a 18% • Gêmeos monozigotos: concordância de 70% Fatores ambientais • Aumentam a probabilidade de que os indivíduos com predisposição genética desenvolvam a doença • Introdução de glúten até os 4 meses de idade aumenta o risco de desenvolvimento da doença; após os 7 meses, o risco é mínimo • A sobreposição da introdução do glúten com o aleitamento materno é o fator protetor mais importante • Infecções do TGI (rotavírus) aumenta o risco de desenvolvimento da doença na infância Proteínas presentes no trigo • Globulinas: solúveis em NaCl 10% • Albuminas menores: solúveis em água • Prolaminas: solúveis em etanol o As prolaminas do trigo são chamadas gliadinas • Glutaminas: solúveis em ácidos ou bases Glúten O glúten consiste no conjunto das prolaminas e glutaminas. Ele é encontrado principalmente no trigo, centeio e cevada. Há discussões acerca da presença na aveia, mas ela pertence a outra família e tem quantidades Geovana Sanches, TXXIV menores de prolaminas do que os demais cerais - ainda assim, não há uma certeza, de forma que alguns médicos sugerem a retirada desse alimento da dieta dos pacientes celíacos. !"#$%&'(%) + +$,-%&'(%) = +$ú-0( Gliadinas A gliadina pode ser separada eletroforicamente em 4 partículas: α, β, γ e ω- gliadinas. Dentre elas, a porção α-gliadina é a mais imunogênica. Trata-se de uma proteína resistente à degradação por proteases gástricas, pancreáticas e da borda em escova da mucosa do intestino. Assim, é capaz de atravessar a barreira epitelial do intestino e interagir com células apresentadoras de antígeno na lâmina própria. Quando ela passa pelo intestino de um indivíduo predisposto geneticamente e tem essa interação, há ativação de uma cascata inflamatória intensa, a qual fará com que o indivíduo desenvolva a doença. As partículas de gliadina apresentam similaridade com as partículas de patógenos entéricos, especialmente com o envelope proteína do adenovírus. Devido a essa familiaridade, crianças que apresentam predisposição genética tem maior chance de desenvolver a doença celíaca após uma infecção por esse vírus. Fatores imunológicos A resposta imune as frações de gliadina desencadeia uma ação inflamatória, a qual se inicia mucosa do intestino delgado alta e é caracterizada por infiltração da lâmina própria por células inflamatórias e atrofia vilositária. Essa resposta contempla mecanismos adaptativos (humorais – presença de anticorpos) e inatos (celulares – presença de células citotóxicas). QUADRO CLÍNICO O quadro clínico da doença celíaca sofre grande variação de acordo com a idade do paciente: • Infância o Diarreia § Também pode ocorrer constipação o Distensão abdominal o Distúrbios do desenvolvimento o Vômito o Irritabilidade o Anorexia • Adolescência o Baixa estatura o Sintomas neurológicos o Anemia • Fase adulta o Apresentação por volta dos 45 anos. Até 25% dos casos são diagnosticados após os 60 anos o Diarreia com dor ou desconforto abdominal § A diarreia está presente em menos de 50% dos casos, sendo um sintoma mais comum na infância Um estudo norte americano realizou rastreio durante 2 anos nos seguintes pacientes: • Distensão abdominal • SII • Doenças da tireoide • Diarreia crônica não explicada • Fadiga crônica • Constipação Resultado: houve aumento em 43x no diagnóstico de doença celíaca durante o estudo Sintomas do trato gastrointestinal • Diarreia: frequentemente episódica, sendo comum ocorrer à noite ou pela manhã • Esteatose: pode estar ausente se a doença estiver limitada ao intestino delgado proximal • Desconforto e distensão abdominal são comuns • Dor abdominal severa, náuseas e vômitos são incomuns Mecanismo da diarreia • ↑ volume e osmolaridade fecal devido à má absorção • Gordura fecal no cólon → ácidos graxos hidroxilados pela flora (catártico) • ↓ de secretina e CCK → ↓ da secreção de bile e suco pancreático Geovana Sanches, TXXIV • Doença no íleo terminal → efeito catártico dos sais biliares • Alteração de outros peptídeos intestinais • Secreção de eletrólitos pelo intestino doente Sintomas extraintestinais Os sintomas extraintestinais são, em geral, decorrentes das deficiências nutricionais que o paciente terá devido a doença ativa. • Anemia o Baixa do ferro, folato, vitamina B12 e piridoxina • Hemorragia o Deficiência de vitamina K e folato (trombocitopenia) • Osteopenia ou osteoporose o Deficiência de cálcio e vitamina D, que leva a hiperparatireoidismo • Atrofia muscular o Redução da absorção proteica • Aumento das enzimas hepáticas o Pacientes tem aumento das aminotrasnferases sem etiologia definida – possível agressão do anticorpo transglutaminase sobre o fígado • Neuropatia periférica o Hipovitaminose de tiamina e vitamina B12 • Ataxia, lesões desmielinizantes do SNC, convulsões • Amenorreia, infertilidade, impotência • Dermatite e hiperqueratose folicular o Hipovitaminose A e B • Edema o Hipoproteinemia severa • Dermatite herpetiforme o Lesões geralmente em áreas extensoras o Podem estar isoladas ou associadas à doença celíaca o Mesmo que o paciente apresente apenas essas lesões, indica-se a retirada do glúten da dieta DIAGNÓSTICO Sorologias Para realização da sorologia, é importante dosar preferencialmente os anticorpos da classe IgA, os quais são os mais sensíveis. Todavia, a deficiência de IgA é mais frequente nesses pacientes (1:40), de forma que devemos solicitar também os anticorpos totais. Nos casos de deficiência confirmada de IgA, a segunda opção é realizar a sorologia através do IgG. Isso pois, com a deficiência de IgA os níveis desse anticorpo serão baixos, resultando em um falso negativo para a doença. • tTG: anti-transglutaminase IgA o É o exame de escolha o Excelente especificidade e sensibilidade o Realizado por ELISA, não sendo examinador dependente • DGP: anticorpo anti-gliadina peptídeo deaminada IgG o Segunda opção o Deve ser realizado em pacientes que apresentam deficiênciade IgA o Sensibilidade e especificidade razoáveis • EmA: anticorpo anti-endomísio IgA o Alta especificidade o Realizado por imunofluorescência, sendo examinador-dependente • Anticorpo anti-gliadina o Foi o primeiro anticorpo a ser descoberto, porém apresenta baixa especificidade o Não é mais utilizado Indicações para o teste sorológico • Pacientes com suspeita de doença celíaca • Diarreia crônica inexplicada com e sem má absorção • Síndrome do intestino irritável, inchaço e distensão abdominal inexplicáveis o Exclusão de doença celíaca em pacientes com suspeita de síndrome do intestino irritável (SII) • Perda de peso inexplicada • Anemia por deficiência de ferro • Deficiência de folato • Deficiência de vitamina E ou K • Osteoporose Geovana Sanches, TXXIV o Especialmente em homens ou mulheres pré-menopausadas • Hipocalcemia, deficiência de vitamina D ou hiperparatireoidismo secundário • Elevação inexplicada de transaminases • Familiares de 1° grau com doença celíaca o Pai, mãe, irmãos e filhos • Associação com outras doenças autoimunes, tais como: o DM1 o Síndrome de Sjogren o Cirrose biliar primária o Doença tireoidiana – associação importante com tireoidite de Hashimoto • Síndrome de Turner e Síndrome de Down • Doenças neurológicas inexplicadas o Neuropatia periférica o Epilepsia na infância o Ataxia Histologia O anátomo-patológico é o diagnóstico padrão-ouro na doença celíaca. Ele deve ser realizado quando a suspeita para doença celíaca for alta, independente da sorologia. Deve-se fazer ao menos 4 a 6 biópsias, mesmo nos casos sem atrofia aparente. Para que o exame apresente as alterações, são necessárias ao menos quatro a seis semanas com glúten na dieta. Isso pode ser um problema em alguns casos, tendo em vista que os pacientes sintomáticos geralmente cessam a ingestão do glúten antes de procurar auxílio médico e não querem retorná-lo por apresentarem sintomas. Achados Os achados variam conforme à progressão da doença, indo desde uma arquitetura vilositária normal com intenso infiltrado linfocitário, até atrofia das vilosidades. TRATAMENTO A dieta livre de glúten é o único tratamento até o momento. Assim, são proibidos alimentos que contenham em sua composição: trigo, centeio e cevada. Como já mencionado, há questionamentos acerca da inclusão ou não da aveia nessa lista. Deve-se ter atenção para a contaminação cruzada do glúten, sempre orientando o paciente a ter cuidado com os utensílios domésticos, não comer em locais em que há manipulação de alimentos com glúten, entre outros. É de extrema importância se atentar para as deficiências que esse paciente pode apresentar, principalmente das vitaminas do complexo B e após 10 anos do diagnóstico e instituição da dieta sem glúten. Corticoides O uso de corticoides diminui a resposta inflamatória e atua no transporte de água e sódio pela mucosa. Com isso, os sintomas melhoram rapidamente, mas retornam logo após a interrupção do uso da medicação. A prescrição, portanto, deve ser reservada para pacientes graves, com diarreia severa, desidratação, perda de peso, acidose, hipocalcemia e hipoproteinemia. Demais orientações • Rastreamento obrigatório para osteoporose • Acompanhamento com nutricionista COMPLICAÇÕES Adenocarcinoma de intestino delgado • Risco muito maior do que na população em geral • Relaciona-se com o tempo que o paciente permaneceu com a mucosa inflamada • Localizado no jejuno • Segue a sequência adenoma-carcinoma • Investigação com cápsula endoscópica se paciente apresentar quadro de dor abdominal ou sangramento oculto Linfoma de células T associado a enteropatia • Pico de incidência na sexta década de vida • Sintomas: mal-estar, anorexia, perda de peso, diarreia, dor abdominal e febre inexplicada • Recaída dos sintomas após um longo período de boa resposta à retirada do glúten
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