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Definição: Intolerância permanente induzida pelo glúten, principal fração proteica presente nos cereais (trigo, cevada, centeio e aveia), que leva a uma enteropatia mediada por linfócitos T em indivíduos com predisposição genética. Fisiopatologia A doença é multifatorial, de natureza genética e ambiental. Em relação a fatores genéticos, a maioria dos pacientes portadores da doença apresenta HLA-DQ. O glúten é o principal fator externo. O glúten e suas frações (especialmente a gliadina presente no trigo, extensamente estudada na fisiopatogenia da doença) chegam à lâmina própria intestinal, sendo desaminadas por uma enzima chamada transglutaminase tecidual. Dessa forma são apresentadas para linfócitos T CD4 gliadina específicos. Esses linfócitos iniciam uma reação inflamatória baseada nas respostas celulares Th1 e Th2. A resposta Th1 estaria relacionada à liberação de TNF-alfa, com indução de fibroblastos e produção de metaloproteinases, que são responsáveis pela atrofia vilositária e hiperplasia de criptas intestinais. Já a resposta Th2 relaciona-se à formação de imunidade humoral, sendo responsável pela produção de anticorpos específicos (anticorpo antigliadina, anticorpo antiendomísio e anticorpo antitransglutaminase tecidual) associados a doença. Apresentação Clínica Forma clássica: Sintomas iniciam-se em geral entre o 6o-24o mês de vida, quando se inicia a introdução do glúten na dieta. Presença de diarreia crônica, com fezes volumosas de aspecto pálido e gorduroso, associada à distensão abdominal e perda de peso. Podem ocorrer diminuição do tecido subcutâneo, atrofia da musculatura glútea, falta de apetite, alterações de humor (irritabilidade ou apatia), vômitos e anemia. Doença celíaca não gastroinestinal (forma atípica): Quadro mono ou oligossintomático, com poucos ou nenhum sintoma digestivo. Pode ocorrer baixa estatura, anemia por deficiência de ferro refratária à reposição oral, anemia por deficiência de folato ou vitamina B12, osteoporose, hipoplasia do esmalte dentário, artralgias ou artrite e constipação intestinal refratária ao tratamento, atraso puberal, irregularidade do ciclo menstrual, esterilidade, abortos de repetição, ataxia, epilepsia com ou sem calcificações cerebrais, neuropatia periférica, miopatia, manifestações psiquiátricas (depressão, autismo, esquizofrenia), úlceras a�osas recorrentes, elevação de enzimas hepáticas sem causa aparente, fraqueza, perda de peso sem causa aparente, edema de aparecimento súbito após infecção ou cirurgia. Forma assintomática ou silenciosa: Caracterizada por alterações sorológicas e histológicas da mucosa intestinal, porém sem sintomas associados. Forma latente: Presença de anticorpos positivos ou HLA compatível com DC, mas sem lesões histológicas da mucosa intestinal ou sintomas. Também inclui indivíduos com lesões intestinais prévias, mas que foram resolvidas com uso de dieta isenta de glúten, e não reapareceram após o retorno da dieta com glúten. Sensibilidade ao glúten (não celíaco): Pacientes que apresentam sintomas com uso de glúten, como dor abdominal, distensão abdominal e mudanças no hábito intestinal, mas que não apresentam sorologia e histologia compatíveis com doença celíaca. Crise celíaca: Evolução grave da forma clássica da DC, caracterizada por diarreia com desidratação hipotônica grave, distensão abdominal importante por hipocalemia, desnutrição grave, hemorragias cutâneas, gastrointestinais ou de outras localizações, tetania hipocalcêmica e edema generalizado por hipoalbuminemia. Grupos de risco aumentado para DC: Familiares de primeiro e segundo grau de pessoas com DC, pacientes com síndrome de Down, diabetes mellitus tipo 1, deficiência seletiva de IgA, tireoidite autoimune, síndrome de Turner, síndrome de Williams e artrite juvenil crônica. Abordagem Diagnóstica Exames de rotina: Marcadores sorológicos (anticorpo antigliadina IgA e IgG, anticorpo antiendomísio IgA e anticorpo antitransglutaminase IgA), biópsia do intestino delgado. Biópsia do intestino delgado: É o exame confirmatório da doença. Pode ser realizado mediante cápsula perioral ou pinça de biópsia de endoscopia gastrointestinal. Lesão histopatológica clássica: Mucosa intestinal plana ou quase plana, com criptas alongadas e aumento de mitoses, epitélio superficial cuboide, com vacuolizações, borda estriada borrada, aumento do número de linfócitos intraepiteliais e lâmina própria com denso infiltrado de linfócitos e plasmócitos. Marcadores sorológicos: São considerados testes de rastreio para a doença, mas não confirmam a mesma. Úteis principalmente para pacientes com ausência de sintomas gastrointestinais, com doenças associadas e rastreamento de grupos de risco. Os anticorpos antiendomísio e antitransglutaminase da classe IgA são superiores em termos de sensibilidade e especificidade quando comparados com o anticorpo antigliadina; portanto, devem ser preferidos (principalmente o antitransglutaminase por ser mais barato). Lembrar que, em pacientes com deficiência de IgA, os marcadores sorológicos podem ser falso-negativos. Nesses casos, solicitar os marcadores sorológicos IgG ou realizar diretamente a biópsia de intestino delgado, na dependência da suspeita clínica. Quando solicitar sorologia IgA para doença celíaca, solicitar também IgA total para descartar uma deficiência seletiva de IgA. Pacientes em grupo de risco para doença celíaca devem realizar rastreio para a doença, mesmo assintomáticos. Iniciar o rastreio com 3 anos (com pelo menos um ano de dieta com glúten), repetindo a cada 3-5 anos, ou assim que apresentar sintomas sugestivos da doença. Lembrar que para o diagnóstico definitivo da doença, o paciente deve ter normalização da sorologia e da biópsia de intestino após realização de dieta isenta de glúten. Diagnóstico Diferencial ● Desnutrição primária; ● Infecções; ● Parasitoses; ● Intolerância aos dissacarídeos; ● Alergia alimentar; ● Fibrose cística; ● Doença de Hirschsprung; ● Tumores abdominais. Acompanhamento Acompanhamento ambulatorial: Os pacientes com diagnóstico de DC devem ser acompanhados ambulatorialmente com equipe multidisciplinar contendo minimamente pediatra, gastropediatra e nutricionista. Internação hospitalar: Pacientes com crise celíaca devem ser hospitalizados para tratamento do quadro. Abordagem Terapêutica O único tratamento disponível para a doença celíaca é a exclusão total e permanente do glúten da dieta. Lembrando que o glúten está presente no trigo, cevada, centeio e aveia. Em pacientes que apresentam diarreia importante como parte do quadro clínico, deve-se excluir a lactose e a sacarose no início do tratamento (mais que 30 dias para lactose e 15-30 dias para sacarose). Excluir também fibras vegetais nos primeiros oito dias de tratamento. Orientar a reposição de vitaminas através de complexo multivitamínico, principalmente no início do tratamento. - Última atualização: 16/12/2020
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