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RESENHA DO ARTIGO “LÁCTEOS: A BELEZA E A RIQUEZA DOS SISTEMAS COLOIDAIS” Autores: Rafaela Teixeira Rodrigues do Vale Ana Clarissa dos Santos Pires O leite é um sistema extremamente rico do ponto de vista nutricional, bem como um sistema muito rico e elaborado do ponto de vista físico-químico. Embora macroscopicamente pareça ser homogêneo, o leite contém diferentes constituintes que juntos formam um sistema complexo formado pela presença de diversas fases. Sendo assim, o leite pode ser definido físico-quimicamente como um sistema coloidal composto por uma fase contínua (formada por uma solução de água, lactose, sais minerais solúveis e vitaminas hidrossolúveis) e várias fases dispersas como os glóbulos de gordura, as micelas de caseína e as proteínas do soro. A composição média do leite varia de espécie para espécie, de acordo com as necessidades dos filhotes. Entre animais da mesma espécie alguns fatores como raça, fisiologia (idade, alimentação, período de lactação e saúde do animal) e condições ambientais (estação do ano e temperatura) são determinantes para a variação da composição e consequentemente, das propriedades físico-químicas do leite. Geralmente, a quantidade de água no leite é superior a dos demais constituintes. Porém, a quantidade de cada constituinte e, principalmente, suas interações intermoleculares com a água variam e são os pontos-chaves para definir se o sólido (gorduroso ou não gorduroso) estará em solução ou em forma de coloide, formando fases dispersas. Desestabilizações coloidais neste sistema, bem como, nos de seus derivados, resultam em alterações que podem ser desejáveis ou indesejáveis. Por exemplo, para o consumo do leite fluido, a separação macroscópica da fase gordurosa é indesejável. Porém, as produções da manteiga e do queijo resultam da desestabilização das fases gordura e proteína, respectivamente. A seguir serão detalhadas características de alguns sistemas coloidais provenientes do leite ou de seus derivados. O creme de leite é um sistema coloidal que apresenta a fase contínua e as fases dispersas similares as do leite, diferenciando-se quanto à proporção de fase dispersa (principalmente a gordura) e, consequentemente, viscosidade. Trata-se de um produto concentrado em gordura, mas, que também apresenta todos os constituintes da fase contínua do leite. O creme é a matéria-prima para a produção de produtos como chantilly, manteiga e sorvete e para isso, deve ser criteriosamente padronizado em relação ao teor de gordura, além de, apresentar características favoráveis ao processo de coalescência parcial, que é o principal fenômeno de desestabilização coloidal para a obtenção dos produtos aqui citados. Anteriormente à fabricação destes produtos, o creme deve apresentar: teor de gordura específico para cada derivado, glóbulo de gordura parcialmente cristalizado (a obtenção destes derivados só é possível quando se tem glóbulos de gordura na forma líquida e sólida; para a formação de glóbulos de gordura parcialmente cristalizados, o creme deve ser refrigerado) e glóbulos de gordura com membrana nativa (a utilização de cremes homogeneizados não é recomendada, pois, as proteínas do leite passam a formar a nova membrana do glóbulo de gordura pós-homogeneização e a favorecer a ocorrência de repulsão eletrostática e estérica, aumentando o tempo para a obtenção da manteiga o que é economicamente inviável). A manteiga é caracterizada como sistema coloidal formado principalmente pelo processo de coalescência parcial e inversão de fase da emulsão do óleo em água (creme) para água em óleo (manteiga). A fase contínua é predominantemente gordura (em torno de 80% m/m), tanto na forma líquida quanto na forma cristalina. As gotículas de água, lactose, sais minerais solúveis e proteínas do soro, formam as fases dispersas. Ressalta-se que a manteiga, por ser um sistema coloidal, durante a sua estocagem está sujeita às alterações provenientes da desestabilização coloidal. Por exemplo, é possível que as gotículas de água sofram processos de maturação de Ostwald e/ou coalescência aumentando o diâmetro ao longo do tempo, especialmente quando a manteiga é submetida a variações de temperatura. O sorvete trata-se de um dos sistemas coloidais alimentícios mais complexos que existem e, portanto, erros no cálculo e no balanço dos ingredientes, assim como nas etapas do processamento podem resultar em diversos defeitos (presença de cristais de gelo, pouca cremosidade, alta taxa de derretimento, defeitos de sabor, dentre outros). As ricotas e os queijos representam a classe dos sistemas coloidais obtidos pela coagulação das proteínas do soro do leite e caseínas, respectivamente. Para o caso em específico da ricota, a redução do pH contribui para o decréscimo da repulsão eletrostática e consequente precipitação das proteínas do soro. Outro fator que também é importante na precipitação é o aquecimento, onde a cadeia proteica é aberta, os grupos hidrofóbicos expostos, sendo as moléculas de água expulsas e os agregados formados. Desta forma, a ricota pode ser considerada um queijo formado pela agregação das proteínas do soro em função, principalmente, das interações hidrofóbicas (induzidas pela desnaturação térmica) e pela diminuição da repulsão eletrostática (promovida pela adição de ácido). Em relação à coagulação de caseínas, temos a produção dos queijos mais conhecidos e comercializados mundialmente. Se esta coagulação estiver diretamente relacionada com a repulsão eletrostática, obtém-se o chamado queijo de coagulação ácida, enquanto quando se utiliza a enzima quimosina com atuação específica na ligação peptídica entre os aminoácidos 105-106 da k-caseína, obtêm-se queijos de coagulação enzimática. Em ambos os casos, os queijos podem ser entendidos como grandes agregados proteicos (caseínas), contendo sais minerais e gordura. Como os queijos são sistemas coloidais dinâmicos, ao longo do seu armazenamento alterações de natureza biológica (chamada de maturação) e físico-química normalmente acontecem. Portanto, diante das informações expostas anteriormente, compreender a natureza coloidal do leite e de seus derivados é essencial para a manutenção da qualidade desses sistemas coloidais ao longo da cadeia produtiva e para o desenvolvimento de produtos cada vez mais nutritivos e que atendam às demandas dos consumidores.
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