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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ A infecção de trato urinário (ITU) constitui uma das infecções bacterianas mais frequentes em Pediatria. É, provavelmente, a infecção bacteriana mais prevalente no lactente (BRESOLIN et al., 2016). A importância do diagnóstico precoce da ITU é prevenir e minimizar a formação e progressão da cicatriz renal, principalmente no neonato e lactente mais suscetíveis à formação de cicatrizes que como consequência numa fase mais tardia poderão levar à hipertensão e/ou insuficiência renal crônica (BRESOLIN et al., 2016). DEFINIÇÃO ↠ A ITU consiste na multiplicação de um único germe patogênico em qualquer segmento do trato urinário, identificado por urocultura coletada por método confiável (BRESOLIN et al., 2016). ↠ Infecção urinária compreende a fixação e a multiplicação bacteriana no trato urinário. A infecção pode ser localizada ou acometer todo o trato urinário. Chama- se de infecção urinária baixa quando o acometimento está localizado na bexiga, e de pielonefrite quando há fixação bacteriana no parênquima renal (TRATADO, 2017). O aparelho urinário é estéril, exceto no terço terminal da uretra. O principal mecanismo de proteção contra a infecção é o fluxo livre da urina do parênquima até a micção. As uropatias e as disfunções miccionais (disfunção do trato urinário inferior –DTUI) são os fatores mais importantes na predisposição a ITU na criança. Cerca de 50% das crianças com ITU têm uropatia, obstrutiva ou não, a maioria embriogenética como o refluxo vesicoureteral (RVU), a válvula de uretra posterior (VUP), as obstruções ureterais altas e baixas, as duplicações com implantações anômalas dos ureteres e as ureteroceles (SILVA, 2017). EPIDEMIOLOGIA ↠ É uma doença que acomete principalmente o sexo feminino podendo chegar a 20:1 casos, embora, do período neonatal até os seis meses de idade pode haver predominância no sexo masculino (BRESOLIN et al., 2016). ↠ A ITU é doença de grande incidência na infância, e pelo menos 1 episódio sintomático de ITU ocorre até os 11 anos de idade em 3% das meninas e 1,1% dos meninos. Há uma maior incidência de ITU no primeiro ano de vida. Após essa idade há redução acentuada da incidência nos meninos, mantendo-se relativamente alta nas meninas até os seis anos (SILVA, 2017). O aumento da incidência ocorre entre três e cinco anos de idade, havendo outro pico na adolescência, muito provavelmente devido às alterações hormonais (que favorecem a colonização bacteriana) e, em alguns casos, início precoce de atividade sexual. A recorrência é mais rara no sexo masculino (BRESOLIN et al., 2016). ↠ A recorrência é elevada, cerca de 30% das meninas recidivam no primeiro ano após o episódio inicial, 50% em 5 anos e nos meninos isto ocorre em torno de 15 a 20%, sendo raras após o 1º ano de vida (SILVA, 2017). Estudos mostram que, em serviço de urgência, lactentes com febre acima de 38,5°C de origem não determinada apresentam uma prevalência global de ITU de cerca de 3,5%. Alguns fatores elevam esse percentual diagnóstico: (TRATADO, 2017). • dor à palpação da região abdominal ou suprapúbica (13%); • cor branca (10%); • história prévia de ITU (9%); • urina com mau cheiro (9%); • meninos não circuncisados (8%); • lactente toxemiado (6%); • sexo feminino (4%); • febre acima de 39°C (4%). FISIOPATOGENIA ↠ A urina e o trato urinário são normalmente estéreis. O períneo e a zona uretral de neonatos e lactentes estão colonizados por: Escherichia coli, Enterobacteriaceae e Enterococus sp além de que o prepúcio de meninos não circuncidados é um reservatório para várias espécies de Proteus. Esta colonização diminui após o primeiro ano de vida sendo rara após os cinco anos (BRESOLIN et al., 2016). ↠ A ITU ocorre quando estas bactérias ascendem à zona periuretral. Oitenta por cento das infecções urinárias adquiridas na comunidade são causadas pela E. coli uropatogênica (UPEC). Outros agentes estão listados no quadro abaixo (BRESOLIN et al., 2016). ↠ AS UPEC isoladas de pacientes com ITU febril (pielonefrite) apresentam fatores de virulência que aumentam sua sobrevivência no hospedeiro. São as Pili ou fimbrias (S, P e a tipo 1) que facilitam a sua ascensão ao trato urinário por mecanismo de contra-corrente por aderirem ao epitélio tanto da bexiga como do trato urinário superior, e podem ficar quiescentes não se sabendo qual o estímulo que as reativam (BRESOLIN et al., 2016). 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ Em relação aos fatores de resistência do hospedeiro estão o hábito miccional normal evitando a estase, urina de composição e osmolaridade adequadas apresentando efeito inibitório sobre a multiplicação bacteriana e, na presença destas bactérias patogênicas, o estímulo à reação inflamatória com consequente produção de citocinas tais como as interleucinas 6 e 8 em resposta à agressão (BRESOLIN et al., 2016). QUADRO CLÍNICO ↠ Os sinais e sintomas na criança dependem principalmente da idade do paciente. Crianças menores apresentam sinais e sintomas mais inespecíficos (BRESOLIN et al., 2016). ↠ Outros fatores influenciam as manifestações clínicas, como estado nutricional, presença de alterações anatômicas do trato urinário, número de infecções anteriores e o intervalo de tempo do último episódio infeccioso. O quadro clínico pode variar de febre isolada ou alterações do hábito miccional até pielonefrite aguda, podendo culminar com quadro de urossepse (especialmente em lactentes) (TRATADO, 2017). • Recém-nascidos: geralmente um quadro séptico (dificuldade de sucção, vômitos, pele acinzentada, palidez, cianose, icterícia, choro, irritabilidade, hipoatividade, convulsões). Alguns exibem um quadro menos agudo com recusa alimentar, ganho de peso insuficiente, vômitos e palidez cutânea. Há alto risco de bacteremia com possibilidade de óbito (SILVA, 2017). • Lactentes: a febre é a principal manifestação. Raramente ocorrem sintomatologias específicas (polaciúria, gotejamento urinário, disúria, urina com odor fétido, dor lombar). Podem apresentar manifestações inespecíficas como baixo ganho de peso hiporexia, vômitos, dor abdominal. Em serviços de urgência a prevalência está em torno de 3% de ITU nos lactentes com febre acima de 38,5°C de origem inexplicada (SILVA, 2017). • Pré-escolares e escolares: a febre é muito frequente, geralmente apresentam sinais e sintomas relacionados ao trato urinário. A presença de adinamia, febre alta, calafrios, dor abdominal e nos flancos sugere pielonefrite aguda. Polaciúria, disúria, enurese, urgência, incontinência e/ou retenção urinária, com urina fétida e turva são muito sugestivos de cistite. A presença de disúria nem sempre corresponde à presença de ITU, podendo ser por balanopostites, vulvovaginites, irritação perineal e uretral (SILVA, 2017). • Adolescentes: Geralmente apresenta-se com disúria, polaciúria, dor à micção ou urgência miccional, hematúria e febre. O início da atividade sexual nas adolescentes pode ser acompanhado de surtos de ITU (SILVA, 2017). Uma importante característica da ITU em crianças e adolescentes, em qualquer idade, é a recidiva (SILVA, 2017). A incidência de pielonefrite é maior em crianças menores de um ano e diminui gradativamente quando se aproxima da idade escolar podendo, porém, ocorrer em qualquer idade (BRESOLIN et al., 2016). DIAGNÓSTICO CLÍNICO Anamnese • Verificar a ocorrência de disúria, polaciúria, alteração na aparência e no odor da urina, jato urinário; • Alterações sugestivas de DTUI: padrão miccional anormal para a idade, perdas urinárias involuntárias (molhar a roupa com pequenas perdas sem perceber) segurar muito a urina (passar longos períodos sem urinar) fazer manobras de contenção, incontinência, enurese noturna secundária e associação com constipação intestinal. • Avaliarfebre, vômitos, dor abdominal, diarreia e inapetência que podem influenciar na opção terapêutica. • Investigar surtos prévios de ITU e seu tratamento. • Verificar os resultados das ultrassonografias realizadas na gravidez. 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck • Investigar a história familiar de uropatias e outras enfermidades relacionadas ao trato urinário. Exame físico ↠ O exame físico deve ser completo, incluindo: (TRATADO, 2017). • O crescimento ponderoestatural e o desenvolvimento neuropsicomotor. • A percussão lombar (punho-percussão) pode evidenciar forte reação dolorosa (Giordano positivo). • A palpação abdominal das lojas renais pode demonstrar aumento do volume renal (hidronefrose). • A persistência de bexiga palpável após a micção sugere processo obstrutivo ou disfunção do trato urinário inferior. • É importante a observação do jato urinário para avaliar a continuidade, o volume e a força de expulsão. • O exame da genitália externa avalia a aparência e a localização do meato da uretra, o hímen e a sinéquia de pequenos lábios nas meninas, e estreitamentos do prepúcio que dificultam ou impedem a exposição do meato uretral nos meninos. É importante destacar que a presença de vulvovaginite ou de balano-postite pode alterar os exames de urina levando a um quadro laboratorial falso-positivo de ITU. A perda constante de urina, observada durante o exame físico, sugere ureter ectópico (TRATADO, 2017). LABORATORIAL Análise de urina A adequada coleta de urina é essencial para se evitar resultados falso- positivos e deve ser feita após limpeza da genitália com água e sabão, sendo contraindicados os antissépticos. Nos pacientes com controle miccional, o jato médio é o modo ideal de coleta de urina para ambos os sexos. Naqueles sem controle miccional, a urina pode ser coletada de três maneiras: (TRATADO, 2017). • saco coletor: deve haver os cuidados de higiene e perfeita adaptação do adesivo no contorno da genitália e com trocas a cada 30 minutos, até que amostra de urina seja obtida; • punção suprapúbica (PSP): método invasivo, embora seja uma prática segura especialmente quando guiada por ultrassonografia. A PSP está indicada nos casos em que a coleta por via natural suscita dúvidas (diarreia aguda, dermatite perineal, vulvovaginites e balanopostites); • cateterismo vesical: método invasivo que pode provocar ITU no caso de falha técnica no procedimento, além de ser desconfortável para o paciente. Não deve ser usado de rotina para coleta de material que é eliminado espontaneamente, como a urina. ↠ O exame de urina não substitui a urocultura no diagnóstico de ITU, mas pode apresentar alterações permitindo iniciar precocemente o tratamento, já que resultados da cultura demoram 24 a 72 horas para serem obtidos. Alguns centros fazem inicialmente coleta de urina através de saco coletor e, na presença de alterações, fazem uma nova coleta através de método adequado para se realizar urocultura. No quadro abaixo são apresentados os dados de sensibilidade e especificidade em exame de urina que podem sugerir na ITU: (BRESOLIN et al., 2016). ↠ Achados são também importantes, como: (TRATADO, 2017). • baixa densidade urinária, podendo significar um distúrbio da concentração urinária; • pH alcalino, em decorrência de uma infecção pelo Proteus; • albuminúria transitória, que pode ocorrer na fase febril do processo ou nos casos de pielonefrite; • hematúria microscópica, que é frequente; • conversão do nitrato urinário em nitrito, denunciando a presença de bactérias Gram- negativas na urina. ↠ Piúria: Considera-se piúria a presença de 5 ou mais piócitos por campo microscópico sob grande aumento (4003), ou mais de 10.000 piócitos/mL. O valor preditivo de piúria varia entre 40 e 80%. A piúria pode estar ausente em cerca de 23 a 50% dos pacientes com bacteriúria e ITU. A presença de cilindros piocitários sugere fortemente um processo pielonefrítico. Outras condições podem apresentar piúria ou leucocitúria sem significar ITU: desidratação grave, inflamação de estruturas contíguas (como na apendicite), injúria química do trato urinário e glomerulonefrites. A tuberculose renal também apresenta frequentemente piúria, porém com cultura negativa nos meios tradicionais de cultivo (TRATADO, 2017). 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ Bacteriúria A presença de uma ou mais bactérias (bastonetes Gram-negativos) em gota de urina não centrifugada corada pelo Gram correlaciona-se fortemente com bacteriúria significativa demonstrada pela urocultura. Sua sensibilidade é de 94%, e sua especificidade, 92%, com valor preditivo de 85% quando associado à piúria. É um exame de pronta e fácil realização e baixo custo (TRATADO, 2017). Urocultura ↠ Colhida por método adequado é padrão ouro para confirmação de ITU (BRESOLIN et al., 2016). O diagnóstico de ITU é confirmado pela bacteriúria significativa, que é a presença na urina de um número igual ou superior a 100.000 UFC de uma única bactéria. Achado inferior a 10.000 UFC é considerado negativo, e entre 10.000 e 100.000 UFC, um exame duvidoso, devendo ser repetido (TRATADO, 2017). ↠ Nas crianças, ainda sem controle esfincteriano, realiza- se punção suprapúbica (PSP) ou sondagem vesical (SV). Sendo a bexiga estéril, o crescimento de qualquer patógeno, independentemente do número de colônias, confirma o diagnóstico quando a coleta é realizada por PSP. A obtenção de urina por cateterização vesical é uma opção segura e simples, e a presença de crescimento bacteriano maior ou igual a 1000ufc/ml, caracteriza a presença de ITU. Em relação à coleta de urina por saco coletor, vários estudos mostram resultados falsos positivos em até 80% dos casos e, portanto, os resultados só devem ser valorizados quando a cultura resultar negativa (BRESOLIN et al., 2016). Na criança que já apresenta controle esfincteriano deve-se coletar urina de jato médio, após assepsia prévia, sendo considerada positiva a contagem bacteriana maior ou igual a 100.000ufc/ml ou mais de 50.000ufc/ml associada com a análise de urina demonstrando evidência de piúria (BRESOLIN et al., 2016). A identificação de duas ou mais cepas de bactérias diferentes em uma mesma amostra sugere contaminação durante a coleta ou no processamento do exame. A cultura de urina é um procedimento facilmente sujeito à contaminação (TRATADO, 2017). A sensibilidade do método da urocultura é superior a 95% na presença do mesmo microrganismo em 3 culturas de urina obtidas por jato médio (TRATADO, 2017). Outros exames laboratoriais, como hemograma e PCR, podem estar normais ou com alterações indicativas de uma infecção bacteriana aguda, principalmente em crianças de idade mais baixa. A presença de leucocitose e PCR elevada sugere pielonefrite aguda (TRATADO, 2017). Bacteriúria assintomática Uma situação peculiar é a presença de bacteriúria significativa em crianças sem nenhuma sintomatologia relacionada à infecção urinária. O seu achado é ocasional ou em controles de crianças com história de ITU prévia. A bacteriúria assintomática é caracterizada por três uroculturas consecutivas com bacteriúria significativa em um período de 3 dias a 2 semanas, podendo ser transitória ou persistente (TRATADO, 2017). • Em meninas com bacteriúria assintomática transitória, 95% apresentam normalização dos exames em 12 meses, sem qualquer tratamento. Geralmente, a bacteriúria desaparece em dias ou semanas e dificilmente recidiva. • Já a bacteriúria assintomática persistente tende a permanecer por anos seguidos. É comumente encontrada em crianças portadoras de meningomielocele, bexiga neurogênica e que necessitem de cateterismo vesical de repetição. As crianças com bacteriúria assintomáticas não devem ser tratadas, pois podem desenvolver ITU sintomática e, muitas vezes,com germes de virulência maior (TRATADO, 2017). TRATAMENTO O pediatra deve reconhecer os pacientes de alto risco de lesão renal, aliviar os sintomas, erradicar o agente infeccioso, prevenir recorrências e identificar anomalias funcionais e anatômicas do trato urinário (TRATADO, 2017). Alívio dos sintomas ↠ A dor e a febre são tratadas com analgésicos e antitérmicos em doses usuais. Caso haja disúria intensa, pode-se empregar antiespasmódico. Quanto mais nova for a criança, maior deve ser a preocupação em se detectar precocemente os sinais ou sintomas de choque séptico ou hipovolêmico, secundários à disseminação do processo infeccioso. Podem-se observar manifestações sistêmicas, como vômitos associados com 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck distúrbios hidreletrolíticos ou acidobásicos. A reidratação deve ser prontamente instituída, por via oral ou, se necessário, parenteral (TRATADO, 2017). Tratamento erradicador A antibioticoterapia deve ser iniciada imediatamente após a coleta da urina, pois a demora para começar o tratamento é fator de risco para o aparecimento de lesão renal. A decisão por internação para utilização da via endovenosa ou tratamento ambulatorial depende da idade da criança e da gravidade da infecção (TRATADO, 2017). ↠ O tratamento inicial com antibióticos é empírico observando-se a idade e o estado geral do paciente (BRESOLIN et al., 2016). ↠ O tratamento parenteral deve ser reservado principalmente aos lactentes muito jovens e àqueles com acometimento do estado geral e com vômitos (BRESOLIN et al., 2016). Independentemente da sintomatologia, os recém-nascidos e os lactentes jovens são considerados portadores de ITU complicada ou potencialmente grave (TRATADO, 2017). ↠ O fármaco deve ter sempre propriedades bactericidas e o tratamento nunca deve ser inferior a sete dias, e preferentemente por 10 dias contínuos. Quando a opção inicial é de tratamento parenteral não há obrigatoriedade em manter-se esta via por 10 dias. Sugere-se reavaliar o paciente em 48 a 72 horas e, havendo melhora, pode-se optar por completar o tratamento por via oral com antibiótico de espectro semelhante ao parenteral e/ou sabidamente sensível ao teste de sensibilidade antimicrobiana (BRESOLIN et al., 2016). Para as crianças com grave acometimento do estado geral, lactentes, com vômitos, desidratados e com distúrbios metabólicos, é necessário iniciar o tratamento parenteral até as condições clínicas possibilitarem a troca para a medicação oral. Nesse caso, as opções são as cefalosporinas de 3a geração (ceftriaxona ou ceftazidima) ou os aminoglicosídeos (gentamicina ou amicacina) (TRATADO, 2017). Deve ser escolhido antibiótico de espectro adequado, não nefrotóxico, de boa eliminação renal e administrado por via oral. As cefalosporinas de 1a geração, a associação sulfametoxazol + trimetoprim e a nitrofurantoína são medicamentos que geralmente preenchem esses requisitos (TRATADO, 2017). ATENÇÃO: A melhora do estado geral e o desaparecimento da febre em 48 a 72 horas são indicativos de uma boa resposta ao tratamento instituído. Caso não haja resposta clínica nesse período, deve-se avaliar a urocultura para modificação terapêutica (TRATADO, 2017). ↠ Naquelas crianças que, concomitantemente, apresentem sintomas de disfunção das eliminações (vide tabela abaixo) deve-se fazer as orientações quanto ao hábito urinário adequado (urinar ao acordar, urinar a cada três horas, urinar com pés apoiados), importância da ingesta hídrica e correção da obstipação (BRESOLIN et al., 2016). Tratamento profilático Em crianças com trato urinário normal, a profilaxia deve ser avaliada com cautela devido à possibilidade de aparecimento de cepas mais resistentes aumentando o risco de infecção. No entanto, as crianças que têm infecção urinária de repetição com trato urinário normal e disfunção miccional são candidatas à quimioprofilaxia, por período de 3 a 6 meses, até que estas disfunções sejam corrigidas (BRESOLIN et al., 2016). ↠ Depois de completado o tratamento e no decorrer da investigação de possíveis alterações do trato urinário, a criança deve ser mantida em profilaxia com baixas doses de antibiótico ou quimioterápico, iniciada imediatamente após o término do tratamento erradicador (TRATADO, 2017). ↠ A finalidade é prevenir recidivas de ITU, eliminando-se um dos principais fatores associados à gênese das lesões adquiridas do parênquima renal. A profilaxia está indicada nas seguintes situações: (TRATADO, 2017). • durante a investigação do trato urinário após o primeiro episódio de ITU; • quando há diagnóstico de anomalias obstrutivas do trato urinário até a realização da correção cirúrgica; • na presença de refluxo vesicoureteral (RVU) de graus III a V; • nas crianças que apresentem recidivas frequentes da ITU, mesmo com estudo morfofuncional do trato urinário dentro da normalidade; nesses casos, deve 6 Júlia Morbeck – @med.morbeck ser utilizada por período de 6 a 12 meses, podendo, quando necessário prolongar-se o tempo de uso. INVESTIGAÇÃO POR IMAGEM ↠ Toda criança, independentemente de idade e sexo, que tenha diagnóstico de certeza de ITU merece uma investigação por imagem. No entanto, não há definição de quais procedimentos diagnósticos devem ser realizados e também não há definição de qual seria o melhor momento para sua realização (BRESOLIN et al., 2016). ↠ O consenso vigente é de que deve-se administrar a menor quantidade de radiação possível devido aos possíveis efeitos deletérios os quais podem persistir por muitos anos. Alergia e/ou nefrotoxicidade aos meios de contraste podem ocorrer e, portanto, medidas preventivas devem ser empregadas paralelamente à avaliação da função renal (anterior e, em alguns casos, posterior ao exame) (BRESOLIN et al., 2016). ↠ Os principais objetivos da avaliação morfofuncional do trato urinário são: detectar condições predisponentes da infecção e das recidivas, avaliar a presença de lesão renal e estabelecer conduta que possa prevenir o surgimento da lesão renal ou o seu agravamento, visando ao melhor prognóstico para o paciente (TRATADO, 2017). ↠ Utilizam-se os exames ultrassonográficos, radiológicos, cintilográficos, urodinâmicos e urológicos (TRATADO, 2017). Ultrassonografia (USG) do aparelho urinário e bexiga ↠ Por ser exame não invasivo e não expor o paciente à radiação deve ser realizado em todos os que apresentaram ITU com o intuito de confirmar e/ou detectar má formações. No entanto, USG normal não exclui a existência de alterações e é necessário lembrar que este é um exame operador dependente, cujos resultados podem ser afetados pelo grau de expertise do profissional (BRESOLIN et al., 2016). Cintilografia renal com DMSA ↠ É exame padrão ouro na detecção da cicatriz renal e deve ser realizado em todos os lactentes com ITU febril, crianças que apresentaram quadro clínico de pielonefrite (mesmo naquelas crianças com USG normal de rins e vias urinárias) e pacientes com RVU. Deverá ser realizado após quatro a seis meses do episódio inicial de ITU (BRESOLIN et al., 2016). Uretrocistografia miccional (UCM) ↠ Exame radiológico realizado com administração de contraste iodado intravesical, portanto, sem possibilidade de alergia e ou nefrotoxidade. Nele procura-se observar alterações da coluna, visualização da uretra, alteração da bexiga como, por exemplo, a presença de divertículo e a demonstração de RVU. A princípio, a UCM está reservada àqueles pacientes que apresentam USG de rins e vias urinárias e/ou cintilografia com DMSA alterada e/ou quadros repetitivos de infecção urinária associados à disfunção miccional (BRESOLIN et al., 2016). REFLUXO VESICOURETRAL ↠ O RVU primário, alteração mediada por expressão genética, é causado por uma anormalidade estrutural da junçãouretero-vesical (curto segmento submucoso do ureter), permitindo ascensão da urina da bexiga até os ureteres e os rins. Classifica--se o RVU em 5 graus: leve (I e II), moderado (III) e grave (IV e V) (TRATADO, 2017). ↠ Estima-se a incidência do RVU em 1% da população pediátrica e em 30 a 40% das crianças com infecção 7 Júlia Morbeck – @med.morbeck urinária. Apresenta resolução espontânea na maioria dos casos, justificando-se a maior incidência na infância em relação aos adultos (TRATADO, 2017). ↠ Os pacientes com RVU podem ser classificados em três grupos (baixo, médio e alto risco) quanto às chances de pior evolução, ou seja, o surgimento de cicatrizes renais, persistência do refluxo, surgimento de hipertensão arterial ou evolução para perda progressiva da função renal (TRATADO, 2017). 1. Baixo risco: graus de refluxo I e II uni ou bilateral, sem cicatrizes e sem síndrome de disfunção de eliminação. 2. Médio risco: grau III uni ou bilateral, grau IV unilateral e presença de lesão definitiva, sintomatologia de disfunção das eliminações leve. 3. Alto risco: graus IV bilateral e V uni ou bilateral, lesão renal moderada ou grave, rim único, síndrome de disfunção das eliminações. Também os lactentes, pois, nessa época, é maior o risco de pielonefrites com lesões do parênquima que evoluem com cicatrização. As crianças com RVU devem ser acompanhadas até a idade adulta, especialmente aquelas com nefropatia do refluxo (TRATADO, 2017). PROGNÓSTICO ↠ O prognóstico está relacionado a uma série de fatores como: idade de apresentação, presença ou não de cicatrizes renais, malformações e atraso no diagnóstico e na instituição de terapêutica (BRESOLIN et al., 2016). ↠ O diagnóstico e a instituição precoce da terapêutica além de correção de malformações associadas melhoraram em muito o prognóstico destas crianças (BRESOLIN et al., 2016). Referências PEDIATRIA, Sociedade Brasileira de. Tratado de Pediatria, Volume 1. Editora Manole, 2017. BRESOLIN et al. Infecção do Trato urinário. Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016. SILVA, J. M. P. Infecção do Trato Urinário na Criança, 2017.
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