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FÁRMACOS ANSIOLÍT ICOS E H IPNÓTICOS 10 mV Con Diazepam Con 1 s Glu G A B A Glu G A B A Gly G A B A Gly G A B A Controle Clordiazepóxido Fig. 36.1 Efeito potencializador dos benzodiazepínicos e do clordiazepóxido sobre a ação do ácido gama-aminobut ír ico (GABA). Os fármacos foram aplicados por ionoforese a neurônios da medula espinal de camundongo, em cultura de tecido, com micropipetas junto às células. A membrana foi hiperpolarizada para - 9 0 m V e as células foram saturadas com Cl " do microeletródio de registro, assim aminoácidos inibitórios (GABA e glicina) bem como um excitatório (glutamato) causaram respostas despolarizntes. O efeito potencializador do diazepam restringiu às respostas do G A B A , não sendo afetadas as respostas ao glutamato e à glicina. te.* Se dados ao membro dominante de um par de ani- mais (p. ex.; camundongo ou macacos) colocado na mes- ma gaiola, os benzodiazepínicos reduzem o número de ataques pelo indivíduo dominante e aumentam o núme- ro de ataques a ele. C o m a possível exceção do alprazo- lam (Tabela 36.1), os benzodiazepínicos não têm efeitos antidepressivos. Os benzodiazepínicos podem, de modo paradoxal, produzir aumento na irritabilidade e na agres- são em alguns indivíduos. Isto parece ser particularmen- te pronunciado com substâncias de ação ultracurta, tria- zolam (e levou a sua retirada do Reino Unido e de alguns outros países) e é geralmente mais comum com substân- cias de ação ultracurta. É provavelmente uma manifesta- ção da síndrome de abstinência benzodiazepínica, que ocorre com todos estes fármacos (ver adiante), mas é mais aguda com os fármacos que têm uma ação que desapare- ce rapidamente. Os benzodiazepínicos são principalmente usados para tratar os estados de ansiedade aguda, mas seu uso está de- clinando em favor dos antidepressivos (Cap. 38), acopla- dos com terapias comportamentais em casos mais severos. O uso dos benzodiazepínicos como agentes ansiolíti- cos é revisado por Shader & Grenblatt (1993). *Isto depende da espécie. Os gatos realmente tornam-se mais exci- táveis, como o colega de um dos autores descobriu, à sua custa, quando tentou sedar um tigre no zoológico de Baltimore. Sedcição e i n d u ç ã o do sono Os benzodiazepínicos d iminuem o tempo para começar a dormir e aumentam a duração total do sono, embora este último efeito ocorra somente em pessoas que nor- malmente dormem menos de seis horas a cada noite. Ambos os efeitos tendem a declinar quando os benzodi- zepínicos são tomados regularmente por 1-2 semanas. Tendo como base os registros eletroencefalográficos, po- dem ser reconhecidos vários níveis do sono. De part icu- lar importância psicológica é o sono " d o movimento ocular rápido" ( R E M ) , que é associado com os sonhos e o sono "de onda lenta" (SW), que corresponde ao nível mais profundo do sono, quando a taxa metabólica e a secreção de esteróides adrenais estão em seus níveis mais baixos e a secreção do hormônio do crescimento, em níveis mais altos (ver C a p . 27). Todos os fármacos h i p - nóticos reduzem a proporção do sono R E M , embora os benzodiazepínicos afetem o mesmo, menos do que ou- tros hipnóticos. A interrupção artif icial do sono R E M causa irritabilidade e ansiedade, mesmo se a quantidade total de sono não for reduzida, a perda do sono R E M é compensada ao final de tal experiência, por um aumen- to de rebote. O mesmo rebote no sono R E M é visto ao final de um período de administração dos benzodiaze- pínicos ou de outros hipnóticos. Portanto, supõe-se que o sono R E M tenha uma função benéfica, e que a redu- ção relativamente pequena do sono R E M , pelos benzo- diazepínicos, é um ponto a seu favor. A proporção do sono SW é significativamente reduzi- da pelas benzodiazepínicos, embora a secreção do hor- mônio do crescimento não seja afetada. A Fig. 36.2 mostra a melhora das avaliações subjeti- vas da qualidade do sono produzida por um benzodiaze- pínico, e o rebote diminuído ao final de um período de tratamento por 32 semanas com o fármaco. É notável que, embora a tolerância aos efeitos objetivos, tais como a latência reduzida para o sono, ocorra dentro de poucos dias, isto não é óbvio nas avaliações subjetivas. A sedação parece ser uma função da atividade sobre os receptores G A B A A contendo as subunidades a 2 (ver anteriormente), de modo que na teoria pode ser possível desenvolver benzodiazepínicos não-sedativos que retêm os efeitos ansiolíticos e/ou anticonvulsivantes, mas isto ainda não foi obtido. Embora o uso a longo prazo dos benzodiazepínicos como hipnóticos seja desagradável devido à tolerância, à dependência e aos efeitos de ressaca, o uso ocasional (p. ex., por trabalhadores por turnos, viajantes de avião etc.) é eficaz. R e d u ç ã o do t ô n u s muscular e da c o o r d e n a ç ã o Os benzodiazepínicos reduzem o tônus muscular por uma ação central, que é independente do seu efeito sedativo. Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O Lormetazepam Placebo Tratamento (32 semanas) Fig. 36.2 Efeitos do tratamento a longo prazo com benzodiazepínicos sobre a qualidade do sono. Foram dados a um grupo de 100 insones, sob condições duplo- cegas, lormetazepam 5 mg, nitrazepam 2 mg ou placebo à noite por 24 semanas, o período de teste sendo precedido e seguido por quatro semanas de tratamento com placebo. A eles foram perguntados para avaliar, em uma escala de avaliação subjetiva, a qual idade de sono durante cada noite e os resultados expressos como uma média de cinco dias subseqüentes desses pontos. A melhoria da qual idade do sono foi mantida durante o período de teste de 24 semanas e seguiu-se por uma piora do sono "rebote", quando terminou o período de teste (A partir de: Oswa ld et ai, 1982 Br M e d J 284:860-864) . Os gatos são particularmente sensíveis a esta ação e al- guns benzodiazepínicos (p. ex., clonazepam, flunitraze- pam) reduzem a rigidez de descerebração em doses que são muito menores do que as necessárias para produzi- rem os efeitos comportamentais. Em outras espécies, o efeito é menos claro. A coordenação pode ser testada pela determinação do espaço de tempo para o qual os camun- dongos podem permanecer em um bastão plástico hori - zontal, que gira lentamente, ou pelo tempo gasto por eles para escapar do confinamento pela subida dentro de uma chaminé tubular. O desempenho nestes truques acrobáti- cos é prejudicado pelos benzodiazepínicos e outros seda- tivos, mas não é claro que fármacos, em particular, mos- tram seletividade neste aspecto em outras espécies, além do gato. Os estudos em seres humanos falharam em mos- trar diferenças entre os benzodiazepínicos. O tônus muscular aumentado é característica comum dos estados de ansiedade em seres humanos e pode contri- buir para as dores, incluindo cefaléia que freqüentemente incomoda os pacientes ansiosos. O efeito relaxante dos benzodiazepínicos pode, portanto, ser útil clinicamente. Uma redução do tônus muscular parece ser possível, sem a perda apreciável da coordenação. Outros usos clínicos dos relaxantes musculares são abordados no Cap. 39. Efeitos ant iconvuls ivantes Todos os benzodiazepínicos têm atividade ant iconvul- sivante em testes com animais de experimentação. São muito eficazes contra as convulsões induzidas q u i m i - camente causadas pelo leptazol , b i c u c u l i n a e fármacos semelhantes (ver Caps. 39 e 41) , mas menos do que contra as convulsões induzidas eletricamente. Os ben- zodiazepínicos não afetam as convulsões induzidas pela estricnina, em animais de experiência. Acredita-se que, a b icucul ina e a estricnina, atuem bloqueando a ação dos transmissores inibitórios no S N C ; a estricnina exer- ce o seu efeito sobre os receptores de gl ic ina (ver Cap. 38), enquanto que a b icucul ina e vários outros agentes químicos convulsivantes atuam sobre os receptores GA- B A A (Cap. 29). C o m o os benzodiazepínicos potencia- l izam a ação do G A B A , mas não da g l icina , é explicá- vel a seletividade de sua ação anticonvulsivante. Clo- nazepam (ver anteriormente) dev ido sua ação anti- convulsivante seletiva, é usado para tratar a epilepsia (Cap. 39), como o diazepan que é dado intravenosa- mente para controlar as convulsões comprometedoras da v ida no status epilepticus. A m n é s i a a n t e r ó g r a d a Os benzodiazepínicos bloqueiam a memória de eventos experimentados enquanto sob sua influência, um efeito não obtido com outros depressores do S N C . Pequenos procedimentos cirúrgicos podem assim ser executados sem deixar memórias desagradáveis. EXISTE UM MEDIADOR ENDÓGENO SEMELHANTE A O S BENZODIAZEPÍNICOS? T E ainda incerto se existe um ligante endógeno para os receptores benzodiazepínicos, cuja função é regular a ação do GABA. O principal candidato é um peptídeo de lOkDa, o inibidor da ligação ao diazepam (DBI), isolado do cérebro de rato. Este peptídeo liga-se fortemente ao sítio ligante ben- zodiazepínico do receptor do G A B A A , tem efeito oposto aos benzodiazepínicos, isto é, inibe a abertura do canal de clore- to pelo GABA e, quando injetado no cérebro, tem efeito ansiogênico e pró-convulsivante. Outros possíveis modula- dores endógenos dos receptores G A B A A incluem os metabó- litos esteróides (ver Cap. 32). Há também evidência de que os próprios benzodiazepínicos podem ocorrer naturalmente no cérebro. Atualmente, não há concordância geral sobre a identidade e a função de um ligante endógeno. AGONISTAS INVERSOS E ANTAGONISTAS BENZODIAZEPÍNICOS • O termo "agonista inverso" (Cap. 2) é aplicado a fárma- cos que se ligam aos receptores benzodiazepínicos e exer- cem o efeito oposto ao dos benzodiazepínicos convencio- nais, produzindo sinais de ansiedade aumentada e convul- sões. DBI é um exemplo e alguns análogos benzodiazepíni- cos atuam de modo semelhante. E possível (ver Fig. 36.3) explicar estas complexidades, em termos do modelo, em dois estados abordados no Cap. 2, por postular que o receptor benzodiazepínico existe em duas conformações distintas, Aesculapius FÁRMACOS ANSIOLÍT ICOS E H IPNÓTICOS somente uma delas (A) pode ligar uma molécula de G A B A e abrir o canal de cloreto. A outra conformação (B) não pode ligar G A B A . Normalmente , sem o ligante presente no recep- tor benzodiazepínico, há um equilíbrio entre essas duas con- formações; a sensibilidade ao G A B A está presente mas é sub- máxima. Acredita-se que os agonistas benzodiazepínicos (p. ex., diazepam) ligam-se preferencialmente à conformação A, assim desviando o equilíbrio em favor de A e potencia- lizando a sensibilidade ao G A B A . Agonistas inversos l igam- se seletivamente à B e têm efeito oposto. Antagonistas com- petitivos, como o flumazenil (ver adiante) ligam-se igual- mente a A e a B e conseqüentemente não prejudicam o equi- líbrio conformacional , mas antagonizam o efeito dos ago- nistas e dos agonistas inversos. Algumas das variantes mole- culares do receptor G A B A A (ver anteriormente) parecem mostrar afinidades relativas diferentes para agonistas, anta- gonistas e agonistas inversos e é possível que isso reflita dife- renças no equilíbrio entre os estados A e B, como uma fun- ção da composição das subunidades do receptor. Equilíbrio conformacional (3- Carbolinas (agonista inverso) Fig. 36.3 Modelo da interação benzodiazepín ico/ receptor do ácido gama-aminobut í r ico (GABA). Acredita-se que os agonistas (p. ex., o diazepam) e os antagonistas (p. ex., f lumazenil) benzodiazepínicos l igam-se a um sítio no receptor G A B A , diferente do sítio ligante do G A B A . Existe um equilíbrio conformacional entre os estados nos quais existe o receptor benzodiazepínico, em sua conformação de ligação ao agonista (acima) e em sua conformação ligante ao antagonista (abaixo). No últ imo estado, o receptor G A B A tem uma af inidade muito reduzida para o G A B A ; em conseqüência, o canal de cloreto permanece fechado. ASPECTOS FARMACOCINÉTICOS Os benzodiazepínicos são bem absorvidos quando admi- nistrados por via oral , geralmente atingem pico de con- centração plasmática em aproximadamente uma hora. Algumas (p. ex., oxazepam, lorazepam) são absorvidas muito lentamente. Elas se ligam fortemente à proteína plasmática e, devido sua alta lipossolubilidade, são acu- muladas gradualmente nos lipídios corpóreos. Estes dois fatores resultam em volumes de distribuição não-distan- tes de 1 l/kg peso corpóreo para a maioria dos benzodia- zepínicos. Eles são normalmente administrados por via oral , mas podem ser administrados por via intravenosa (p. ex., diazepam no status epilepticus, midazolam, em anestesia). Freqüentemente, a injeção intramuscular re- sulta em absorção lenta. Todos os benzodiazepínicos são metabolizados e, a seguir, excretados como conjugados de glicuronídio na ur ina . Eles var iam muito na duração de ação e p o d e m ser de m o d o geral d ivididos em compostos de ação cur- ta, média ou longa (Tabela 36.1) . Vários são convert i - dos em metabólitos ativos, como N-desmet i ld iazepam (nordazepam), que têm uma meia-vida de a p r o x i m a - damente 60 horas, e que são responsáveis pela tendên- cia de muitos benzodiazepínicos p r o d u z i r e m efeitos acumulativos e ressaca longa, quando são dados a i n - tervalos regulares. Os compostos de ação curta são os que são diretamente metabolizados em compostos c o n - jugados com glucoronídios. As principais vias são mos- tradas na F ig . 36.4. A F ig . 36.5 mostra a formação gra- dual e o desaparecimento lento do nordazepam no plas- ma de um ser humano tomando diazepam diariamente por 15 dias. A idade avançada afeta a velocidade das reações o x i - dativas mais do que as das reações de conjugação. Ass im o efeito dos benzodiazepínicos de ação longa, que po- dem ser usados regularmente como hipnóticos ou agen- tes ansiolíticos por muitos anos, tende a aumentar com a idade e é comum por esta razão desenvolverem-se, insi- diosamente, sonolência e confusão.* EFEITOS INDESEJÁVEIS Os efeitos indesejáveis podem ser divididos em: • efeitos tóxicos agudos resultantes das doses ex- cessivas; • efeitos indesejáveis ocorrendo durante o uso tera- pêutico normal ; • tolerância e dependência. *Aos 91 anos, a avó de um dos autores aumentou muito o esqueci- mento e tornou-se um pouco caduca, tomando nitrazepam para a insônia regularmente, por anos. Para vergonha permanente do au- tor, procurou um clínico geral perspicaz para diagnosticar o proble- ma. A suspensão da prescrição do nitrazepam produziu uma melho- ra dramática. Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O MEDAZEPAM DIAZEPAM MEDAZEPAM DIAZEPAM CLORDIAZEPOXIDO CLORAZEPATO LORAZEPAM TRIAZOLAM ALPRAZOLAM MIDAZOLAM CLONAZEPAM NORDAZEPAM TEMAZEPAM OXAZEPAM - Glicuronideo 11 Metabólitos hidroxilados Fig. 36.4 O metabolismo dos benzodiazepínicos. O metaból i to N-desmetilado, nordazepam, forma-se de uma gama de benzodiazepínicos e é importante devido a ser biologicamente ativo e ter uma meia-v ida mais longa. Compostos com atividades farmacológicas são mostrados em azul . Fármacos disponíveis para uso clínico são mostrados em quadros sombreados. * Triazolam retirado do Reino Unido Fig. 36.5 Farmacocinética do diazepam em seres humanos. A Concentrações de d iazepam e nordazepam, a seguir a uma dose oral ou intravenosa única. Observe o desaparecimento muito lento de ambas as substâncias, após as primeiras 20 horas. B Acúmulo de nordazepam durante a administração diária por duas semanas de d iazepam e o declínio lento (meia-vida cerca de três dias), após o término da administração de diazepam (Dados a partir de: Kaplan S A et al, 1973 J Pharmacol Tempo (horas) Tempo (dia) Sci 62 : 1789.) Toxicidade a g u d a Os benzodiazepínicos em doses excessivas agudas são consideravelmente menos perigosos do que a maioria dos outros fármacos ansiolíticos/hipnóticos. C o m o tais agen- tes são com freqüência usados na tentativade suicídio, isto é uma vantagem importante. Em dose excessiva, ben- zodiazepínicos causam sono prolongado, sem depressão séria da respiração ou da função cardiovascular. C o n t u - do, na presença de outros depressores do S N C , particu- larmente o álcool, os benzodiazepínicos podem causar depressão respiratória severa, comprometedora da vida. A disponibilidade de um antagonista eficaz, o flumaze- n i l , possibilita que os efeitos de uma dose excessiva agu- da pode ser antagonizada*, o que não é possível para a maioria dos depressores do S N C . * N a prática, os pacientes são geralmente deixados a dormir, pois há um risco de convulsões com o flumazenil; contudo este pode ser usado de modo diagnóstico para excluir o coma de outras causas. Efeitos colaterais duran te o uso t e r a p ê u t i c o Os principais efeitos colaterais dos benzodiazepínicos são sonolência, confusão mental, amnésia e coordenação mo- tora prejudicada, o que consideravelmente afeta as habili- dades manuais como o desempenho de dirigir. Os benzo- diazepínicos potencializam o efeito depressor de outras substâncias, incluindo o álcool, mais dos que um efeito aditivo. A longa e imprevisível duração da ação de muitos benzodiazepínicos é importante em relação aos seus efei- tos colaterais. As substâncias de longa duração, como o nitrazepam, não são mais usadas como hipnóticos, e mes- mo compostos de ação muito curta, como o lorazepam, podem produzir um prejuízo substancial no dia seguinte, no desempenho do trabalho e na habilidade de dirigir. T o l e r â n c i a e d e p e n d ê n c i a A tolerância (isto é, um gradual aumento da dose neces- sária para produzir o efeito necessário) ocorre com todos Aesculapius FÁRMACOS ANSIOLÍT ICOS E H IPNÓTICOS os benzodiazepínicos, assim como a dependência, que é a sua principal desvantagem. Elas exibem estas proprieda- des com outros hipnóticos e sedativos. A tolerância é menos marcante do que a dos barbituratos, que produ- zem tolerância farmacocinética devido à indução das en- zimas hepáticas metabolizantes - isto não ocorre com os benzodiazepínicos. Tal tolerância parece representar uma alteração ao nível do receptor, mas o mecanismo não é bem entendido. Os efeitos indutores do sono mostram relativamente pouca tolerância (Fig. 36.2). Em um estudo com diaze- pam administrado IV a indivíduos normais, seu efeito eufórico não estava presente naqueles que tomam diaria- mente diazepam por via oral . Não é claro se a tolerância ao efeito ansiolítico é significativa. Os benzodiazepínicos produzem dependência e isto é um problema importante. A interrupção do tratamento benzodiazepínico em seres humanos, após semanas ou meses, causa aumento dos sintomas de ansiedade, junta- mente com tremor e tonteira. Embora, em animais, mos- tre somente uma fraca tendência à própria administração dos benzodiazepínicos, a retirada após a administração crônica causa sintomas físicos semelhantes aos que se se- guem após a retirada dos opiáceos (ver Cap. 42), princi- palmente nervosismo, tremor, perda do apetite e convul- sões."' A síndrome de retirada em animais e em seres hu- manos é mais lenta no início do que com os barbituratos, provavelmente devido à longa meia-vida plasmática da maioria dos benzodiazepínicos. Os benzodiazepínicos de ação curta causam efeitos de retiradas mais abruptos. C o m o triazolam, um fármaco de ação muito curta e não mais em uso, o efeito da retirada ocorreu dentro de poucas horas, mesmo após uma dose única, produzindo insônia no início da manhã e ansiedade por todo o dia, quando o fármaco era usado como hipnótico. Os sintomas físicos e psicológicos da retirada dif icul- tam os pacientes de desistirem de tomar os benzodiazepí- nicos, mas o vício (isto é, a dependência psicológica seve- ra que excede em duração a síndrome da retirada) que ocorre com muitos fármacos de abuso (Cap.42) não é um problema maior. ANTAGONISTAS BENZODIAZEPÍNICOS Os antagonistas competitivos dos benzodiazepínicos fo- ram descobertos em 1981. O composto mais bem conhe- cido é o f lumazenil . Este composto originalmente relata- do não possui efeitos sobre a conduta ou sobre as con- vulsões induzidas por fármacos, quando administrado so- zinho, embora fosse encontrada posteriormente alguma *Os sintomas de retirada podem ser mais severos. Um parente de um dos autores, aconselhado a parar de tomar benzodiazepinas após 20 anos, sofreu alucinações e um dia arrancou todas as cortinas, convencido que estavam pegando fogo. Benzodiazepínicos • A t u a m por se l i ga rem a um sítio regu la tó r io específ ico no receptor G A B A A , ass im po tenc ia l i zando o efei to in ib i tó r io do G A B A . Existem subt ipos do receptor G A B A A em di ferentes regiões do cérebro , e d i fe rem na sua sens ib i l i dade das benzodiazepínicos. • Benzodiazepínicos ansiolí t icas são agon is tas nesse sítio regu la tó r io . Ou t ros benzodiazepín icos (p. ex. , f lumazeni l ) são antagon is tas e i m p e d e m as ações dos benzodiazepínicos ansiol í t icos. E reconhec ida u m a c lasse ad ic iona l de agon is tas inversos, que reduzem a eficácia do G A B A e são ans iogên icos ; e les não são usados c l i n i camente . • Ac red i ta -se exist i rem l igantes endógenos pa ra o sítio l igante dos benzodiazepín icos. Eles i nc luem moléculas peptídicas e ester io ida is . M a s sua função f is io lógica não é a i n d a c o m p r e e n d i d a . • Os Benzodiazepínicos c a u s a m : - redução da a n s i e d a d e e da agressão; - sedação, l evando à me lho r i a da insôn ia ; - re laxamento muscu la r e perda da coordenação m o t o r a ; - supressão das convulsões (efeito ant iep i lé t ico) ; - amnés ia an te róg rada . • Di ferenças no perfi l f a rmaco lóg ico dos d i ferentes benzodiazepínicos são p e q u e n a s ; c l o n a z e p a m parece ter mais ação ant iconvu ls ivante em re lação aos seus out ros efei tos. As d i ferentes i so fo rmas do receptor G A B A A são acred i tadas m e d i a r e m os efeitos sedat ivos e ansiol í t icos. • Benzodiazepínicos são at ivas o ra lmen te e d i fe rem pr inc ipa lmente em re lação à sua du ração de ação. Agen tes de ação curta (por e x e m p l o , l o r a z e p a m e t e m a z e p a m , me ias -v idas 8 -12 horas) são metabo l i zados em compos tos inat ivos e são usados p r inc ipa lmente c o m o hipnót icos. A l g u n s agen tes de l onga ação (p. ex., d i a z e p a m e c lord iazepóxido) são conver t idos em um metabó l i t o at ivo de ação mais l onga (nordazepam) . • A l g u n s são usados por v ia in t ravenosa , por exemp lo , d i a z e p a m no status epilepticus; m i d a z o l a m e m anes tes ia . • Z o l p i d e m é um f á r m a c o de ação curta que não é um benzodiazepín ico, mas a tua de m o d o seme lhan te . • Os Benzodiazepínicos são re la t ivamente seguros em dose excess iva. Suas pr inc ipa is desvan tagens são a in teração c o m o á lcoo l , efei tos de ressaca de l onga du ração , s in tomas de ret i rada e o desenvo lv imento de dependênc ia . atividade "ansiogênica" e pró-convulsivante. O flumaze- ni l pode ser usado para reverter o efeito da dose excessi- va dos benzodiazepínicos (normalmente usado somente se a respiração for severamente deprimida) ou para re- verter o efeito dos benzodiazepínicos, como o midazo- lam usado para pequenos procedimentos cirúrgicos. O flumazenil atua rápida e efetivamente quando ministra- do por injeção, mas como sua ação dura apenas duas horas Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O a sonolência tende a retornar. É com freqüência usado no tratamento de pacientes comatosos, suspeitos de te- rem uti l izado doses excessivas de benzodiazepínicos, mesmo antes do diagnóstico ser confirmado com base em amostra de sangue. Raramente podem ocorrer con- vulsões em pacientes tratados com o flumazenil e isso é mais comum em pacientes recebendo antidepressivos tr i - cíclicos (Cap. 38). Relatos de queo flumazenil melhora o estado mental de pacientes com doença hepática severa (encefalopatia hepática) e intoxicação pelo álcool não foram confirmados em testes controlados. BUSPIRONA A buspirona é um agonista parcial dos receptores 5 - H T 1 A (Cap. 12) usado para tratar vários distúrbios de ansieda- de. Também se liga a receptores de dopamina, mas é pro- vável que suas ações relacionadas com a 5 - H T sejam i m - portantes em relação à supressão da ansiedade, pois com- postos ansiolíticos correlatos (p. ex., ipsapirona e gepi- rona; veja Traber & Glaser, 1987) mostram alta especifi- cidade pelos receptores 5 - H T 1 A que são auto-receptores inibitórios que reduzem a liberação de 5 - H T e outros mediadores. Também inibem a atividade de neurônios noradrenérgicos do locus ceruleus (Cap. 33) e assim in - terferem com as reações de despertar. Contudo, a buspi- rona demora dias ou semanas para produzir seus efeitos em seres humanos, sugerindo um mecanismo de ação in- direto mais complexo. A buspirona é ineficaz no contro- le dos ataques de pânico. A buspirona, ipsapirona e gepirona têm efeitos cola- terais bem diferentes dos benzodiazepínicos. Elas não causam sedação ou incoordenação motora nem têm sido relatados efeitos da retirada. Seus principais efeitos cola- terais são náusea, tonteira, cefaléia e agitação, que geral- mente parecem ser bem menos incômodos do que os efei- tos colaterais dos benzodiazepínicos. BARBITURICOS As propriedades indutoras do sono dos barbitúricos fo- ram descobertas no início do século XX e centenas de Barbitúricos Agonistas 5-HT 1 A como fármacos ansiolíticos • Busp i rona é um potente (embora não-selet ivo) agon is ta de receptores 5 - H T 1 A . • Ipsapi rona e gep i rona são semelhan tes . • Efeitos ansiolí t icos t o m a m dias ou horas pa ra se desenvo l ve rem. • Efeitos colatera is pa recem menos incômodos do que c o m os benzodiazepínicos; e les inc luem tonte i ra , náusea, cefa lé ia , mas não sedação ou perda da coordenação. • Barbitúr icos são depressores não-selet ivos d o S N C que p r o d u z e m efei tos que vão d a sedação e redução da a n s i e d a d e à inconsciência e mor te por fa lênc ia respi ratór ia e card iovascular . Portanto, e les são per igosos em dose excess iva. • Eles a t u a m parc ia lmente por po tenc ia l i za r a ação do G A B A , mas são menos específicos do que os benzodiazepín icos. • Os barbi túr icos são p r inc ipa lmente usados em anestes ia e no t ra tamento da ep i l eps i a ; não é mais r e c o m e n d a d o o uso c o m o agentes sedat ivos /h ipnót icos . • Eles são indutores potentes das e n z i m a s hepáticas me tabo l i zado ras de fá rmacos , espec ia lmen te o s is tema c i tocromo P-450 , de m o d o que e les são responsáveis por c a u s a r e m interações de fármacos. Eles t a m b é m prec ip i tam a taques de porf i r ia a g u d a em indivíduos susceptíveis. • O c o r r e to lerânc ia e dependênc ia . compostos foram produzidos e testados. Até o início dos anos 60, eles formaram o maior grupo de hipnóti- cos e sedativos de uso clínico. Todos os barbitúricos têm atividade depressora sobre o S N C , produzindo efeitos semelhantes aos dos anestésicos inalatórios. Eles cau- sam a morte por depressão respiratória e cardiovascu- lar se administrados em grandes doses, o que é uma das principais razões para que tenham agora menor uso como agentes ansiolíticos e hipnóticos. O pentobarbi- tal e os barbitúricos típicos semelhantes com uma dura- ção de ação de 6-12 horas são ainda ocasionalmente usados como hipnótico e fármacos ansiolíticos, mas têm menor segurança do que os benzodiazepínicos. O pen- tobarbital é com freqüência usado como anestésico em animais de laboratório. Os barbitúricos que permanecem em uso amplo são os que têm propriedades específicas como o fenobarbital usado por sua atividade anticonvulsivante (ver C a p . 39) e o tiopental que é muito usado como agente anestésico intravenoso (ver Cap. 35). Os barbitúricos exibem, juntamente com os benzodi- azepínicos, a capacidade de aumentar a ação do G A B A , mas se ligam a um sítio diferente no receptor G A B A A / canal de cloreto e sua ação é menos específica. Além do risco da dose excessiva perigosa, as principais desvantagens dos barbitúricos são que induzem um alto grau de tolerância e dependência e que influenciam forte- mente a síntese do citocromo P-450 hepático e das enzi- mas de conjugação, assim aumentando a velocidade de de- gradação metabólica de muitos outros fármacos e dando surgimento a uma gama de interações de fármacos poten- cialmente incômodas (Cap. 51). Devido à indução enzi- mática, os barbituratos também são perigosos em pacien- tes que sofrem de porfiria metabólica. Aesculapius FÁRMACOS ANSIOLÍT ICOS E H IPNÓTICOS OUTROS FÁRMACOS ANSIOLÍTICOS POTENCIAIS T Juntamente com os mecanismos dos receptores G A B A A e 5 - H T l A abordados anteriormente, muitos outros transmis- sores e receptores foram implicados na ansiedade e nos dis- túrbios do pânico (ver Sandford et al.., 2000), particular- mente a noradrenalina e neuropeptídeos como a colecistoci- nina (CCK) e a substância P. Fármacos ansiolíticos aponta- dos para esses alvos estão em desenvolvimento, mas nenhum está ainda disponível para uso clínico. Os antagonistas do receptor 5 -HT 3 , como o ondansetron (Cap. 15), mostram atividade ansiolítica em modelos de ani- mais, mas não têm eficácia comprovada em testes humanos controlados. Como antes mencionado, os inibidores da cap- tação de 5-HT, como a fluoxetina e inibidores de captação mistos 5-HT/noradrenalina, que são usados como fármacos antidepressivos (Cap. 38), também mostram eficácia nos dis- túrbios da ansiedade. Antagonistas do neuropeptídeo C C K (ver Cap. 13) foram testados como fármacos ansiolíticos. A C C K que é expressa em muitas áreas do tronco encefálico e do mesencéfalo que estão envolvidas no despertar, no humor e na emoção, foi considerada como um mediador possível nos ataques de pâ- nico, mas nenhum antagonista não-peptídico do C C K com- provou eficácia em testes clínicos. REFERÊNCIAS E LEITURA ADICIONAL Argyropoulos S V, Sandford J J, Nutt D J 2000 The psycho- biology of anxiolytic drugs. Part 2: pharmacological tre- atments of anxiety. Pharmacol Therapeu 88: 213-227 (Artigo de revisão geral sobre fármacos ansiolíticos usa- dos clinicamente) Rudolph U, Crestani F, Mõhler H 2001 G A B A A receptor subtypes: dissecting their pharmacological functions. Trends Pharmacol Sci 22: 188-194 (Descreve trabalhos recentes com camundongos transgênicos que expressam receptores GABAA, sugerindo que as ações ansiolíticas e sedativas dos benzodiazepínicos podem ser separáveis) Sandford J J, Argyropoulos S V, Nutt D J 2000 The psycho- biology of anxiolytic drugs. Part 1: basic neurobiology. Pharmacol Ther 88: 197-212 (Explica os mecanismos cerebrais supostos de serem a base das ações dos fármacos ansiolíticos) Shader R I, Greenblatt D J 1993 Use of benzodiazepines in anxiety disorders. N Engl J M e d 328: 1398-1405 Traber J, Glaser T 1987 5 - H T 1 A receptor-related anxioly- tics. Trends Pharmacol Sci 8: 432-437 Aesculapius 17 Substâncias antipsicóticas Considerações gerais 598 A natureza da esquizofrenia 598 - Etiologia e patogênese da esquizofrenia 599 Substâncias antipsicóticas 601 - Classificação das substâncias antipsicóticas 601 - Propriedades gerais 602 - Mecanismos de ação 602 - Efeitos farmacológicos 604 - Aspectos farmacocinéticos 606 - Uso e eficácia clínica 607 CONSIDERAÇÕES GERAIS Neste capítulo, enfocamos a esquizofrenia e as substâncias usadas para t ra tá - la . Nós começamos descrevendo a doença e o que se conhece sobre a sua patogênese, incluindo as várias hipóteses neu- roquímicas e sua relação com as ações dos princi- pais tipos de substâncias antipsicóticas que estão em uso ou em desenvolvimento. As doenças psicóticas incluem vários distúrbios, mas otermo substâncias antipsicóticas - t a m b é m conhecidas como substâncias neurolépticas, anti- esquizofrênicas ou tranqüil izantes maiores - refe- re-se àquelas usadas para tratar a esquizofrenia, uma das formas mais comuns e debilitantes de doença mental. Farmacologicamente, tais substân- cias caracterizam-se com© antagonistas do recep- tor de dopamina, embora muitas delas t a m b é m atuem em outros alvos, particularmente os recep- tores da 5-hidroxitriptamina (5-HT), o que pode contribuir para a eficácia clínica. As substâncias existentes apresentam desvantagem na relação eficácia e efeitos colaterais. Melhorias graduais estão sendo alcançadas, pois novas substâncias estão sendo desenvolvidos, mas novas abordagens radicais provavelmente terão de esperar até que nós tenhamos um entendimento melhor da natu- reza biológica da doença, que é ainda muito mal compreendida.* A NATUREZA DA ESQUIZOFRENIA A esquizofrenia (veja Lewis & Lieberman, 2000) afeta aproximadamente 1% da população. E uma das formas mais importantes de doença psiquiátrica, porque afeta pessoas jovens, é com freqüência crônica e geralmente muito incapacitante. Há um forte fator hereditário na sua etiologia e evidência sugestiva de distúrbio biológico fundamental (ver a seguir). As principais características clínicas da doença são: • sintomas positivos: - delírios (com freqüência de natureza paranóide); - alucinações, geralmente na forma de vozes e com freqüência admoestação em sua mensagem; - distúrbio do pensamento, compreendendo se- qüência extravagante de pensamento, frases de- turpadas, e conclusões irracionais, algumas ve- zes associadas com o sentimento de que os pen- samentos são inseridos ou retirados por uma ação exterior; - comportamentos anormais, como condutas este- reotipadas ou ocasionalmente agressivas. • sintomas negativos: - retirada de contatos sociais; - abrandamento das respostas emocionais. Além disso, estão presentes, com freqüência, deficits da fun- ção cognitiva (p. ex. atenção, memória), juntamente com ansiedade e depressão, levando ao suicídio em cerca de 10% dos casos. O fenótipo clínico varia muito, particularmente em relação ao equilíbrio entre os sintomas negativos e posi- tivos e isto pode ter um significado sobre a eficácia das subs- tâncias antipsicóticas em casos individuais. * A esse respeito, ressalta-se que o estudo da esquizofrenia atrasou-se alguns anos em comparação com a doença de Alzheimer (Cap. 34), em que o entendimento da patogênese progrediu rapidamente ao ponto que novos alvos promissores de fármacos podem ser identificados. Apesar disso, os pragmáticos podem argumentar que os fármacos contra a doença de Alzheimer são até agora pouco efetivos, enquanto os fár- macos antipsicóticos de uso comum fornecem grandes benefícios, mes- mo não se sabendo muito bem como eles funcionam. Aesculapius SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS T Um quadro característico da esquizofrenia é um defeito na "atenção seletiva". Enquanto um indivíduo normal rapi- damente se acomoda a estímulos de natureza familiar ou inconseqüente e responde somente aos estímulos que são inesperados ou significativos, a capacidade dos pacientes es- quizofrênicos para discriminar entre estímulos significativos e não significativos parece estar prejudicada. Por exemplo, o tiquetaque de um relógio pode merecer muito mais atenção do que as palavras de um colega; um pensamento alterado, que uma pessoa normal pode rejeitar como incoerente, pode tornar-se um imperativo irresistível. "A inibição latente" é uma forma de teste de conduta em animais que pode ser uti l izado como modelo para este t ipo de hábito sensorial. Se um rato é exposto a estímulo " c o n d i c i o n a d o " (tal como um sino), seguido por um estímulo "não condic ionado" (p. ex.: choque nas patas) que ele pode evitar (p. ex. por pressionar uma alavanca), ele rapidamente aprende a pressionar a ala- vanca tão logo ouça o sino - a resposta condicionada. C o n - tudo, se ele previamente escutou o sino várias vezes sem que resulte qualquer choque nas patas, ele aprende a resposta condicionada menos rapidamente, tendo aprendido a fazer pouco caso do sino. A inibição latente é a determinação do efeito inibitório da pré-exposição ao estímulo condicionado sobre a aquisição da resposta condicionada. E com freqüên- cia prejudicada em pessoas esquizofrênicas e em animais tra- tados com anfetamina ou substâncias psicomiméticas, como a dieti lamida do ácido lisérgico (LSD) e é restaurada por muitas substâncias antipsicóticas. A esquizofrenia com freqüência começa na adolescência ou na vida adulta jovem; ela pode seguir um curso de recidivas e de abrandamentos ou torna-se crônica e pro- gressiva, particularmente nos casos em que o início é tar- dio. A esquizofrenia crônica é usada para justificar a per- manência de muitos pacientes em hospitais psiquiátricos por longo tempo; permanecendo muito deles em clausu- ra no Reino U n i d o , ela é no momento responsável por muitos proscritos da sociedade. ETIOLOGIA E PATOGÊNESE DA ESQUIZOFRENIA FATORES GENÉTICOS E AMBIENTAIS A causa da esquizofrenia permanece obscura, mas envol- ve combinação de fatores genéticos e ambientais (veja Lewis & Lieberman, 2000). A doença mostra uma ten- dência hereditária forte, mas incompleta. Em parentes de primeiro grau, o risco é cerca de 10%; mesmo em gêmeos monozigóticos, um deles com esquizofrenia, a probalidade de o outro ser afetado é só de aproximada- mente 50%. Os estudos de ligação genética, que concen- traram esforços para identificar os genes susceptíveis à esquizofrenia, identificaram cromossomos prováveis, mas não ainda quaisquer genes específicos. Algumas influên- cias precoces ambientais no desenvolvimento foram iden- tificadas como possíveis fatores predisponentes, incluin- do infecções virais maternas e pressão sangüínea elevada durante a gravidez. Esta e outra evidência sugerem que a esquizofrenia está associada com um distúrbio do desen- volvimento neural, que afeta principalmente o córtex cerebral e ocorre nos primeiros meses do desenvolvimento pré-natal (veja Harr i son , 1997). Esta visão é sustentada por estudos de imagem cerebral que mostram atrofia do córtex e aumento dos ventrículos cerebrais. Estas m u - danças estruturais estão presentes em pacientes esquizo- frênicos apresentados pela primeira vez e provavelmente não são progressivas, sugerindo que elas representam uma aberração precoce irreversível no desenvolvimento cere- bral, e não uma degeneração neural gradual. Estudos de cérebros de esquizofrênicos postmortem mostram evidên- cia de neurônios corticais fora da posição, com morfolo- gia anormal. Fatores psicológicos, como o estresse, po- dem precipitar episódios agudos, mas não são a causa fundamental. TEORIAS NEUROQUÍMICAS As idéias atuais acerca dos mecanismos neuroquímicos na esquizofrenia provêm da análise dos efeitos das subs- tâncias antipsicóticas e pró-psicóticas - da farmacologia e não da neuroquímica. Em vez de a teoria neuroquímica fornecer a base para o tratamento racional pela substân- cia, ocorreu o oposto: fármacos encontrados ao acaso foram eficazes, fornecendo os principais indícios acerca da natureza do distúrbio. De fato, intensas pesquisas para as anormalidades neuroquímicas na esquizofrenia torna- ram-se frustrantes por muitos anos, não sendo encontra- dos marcadores bioquímicos em material cerebral post- mortem ou em outras amostras a partir de pacientes v i - vos. Só recentemente (ver a seguir) estudos de imagem forneceram mais sucesso na detecção das anormalidades neuroquímicas. As principais teorias neuroquímicas centralizam-se na dopamina e no glutamato, embora outros mediadores, particularmente a 5 - H T , também recebam atenção. Teoria dopaminérgica A teoria dopaminérgica foi proposta por Carlsson - agra- ciado com o Prêmio N o b e l em 2000 - com base na evi- dência farmacológica indireta em seres humanos e em animais de experimentação.A anfetamina l ibera dopa- mina no cérebro e pode produzir em seres humanos uma síndrome comportamental indistinguível de um episódio esquizofrênico agudo - muito familiar para os médicos que tratam usuários de drogas. Em animais, a liberação de dopamina causa um padrão específico de comporta- mento estereotipado, que lembra os comportamentos repetitivos, algumas vezes vistos em pacientes esquizo- frênicos. Agonistas potentes do receptor D 2 (p. ex., apo- morfina e bromocriptina; Cap. 33) produzem efeitos se- melhantes em animais, e estes fármacos, como a anfeta- mina, exacerbam os sintomas dos pacientes esquizofrêni- Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O cos. Além do mais, os antagonistas dopaminérgicos e as substâncias que bloqueiam o armazenamento neuronal de dopamina (p. ex.; reserpina) são eficazes no controle dos sintomas positivos da esquizofrenia e na prevenção das alterações de comportamento induzidas pela anfeta- mina. Há uma forte correlação entre potência clínica an- tipsicótica e atividade em bloquear os receptores D 2 (Fig. 37.1) e estudos de imagem de receptor mostraram que a eficácia clínica das substâncias antipsicóticas é consisten- temente alcançada quando a ocupação do receptor D 2 alcança aproximadamente 80%. T Não há evidência bioquímica consistente para a síntese ou liberação excessiva de dopamina na esquizofrenia. Além do mais, a produção de prolactina, que se pode esperar ser anor- malmente baixa se a produção dopaminérgica for facilitada, é normal em pacientes esquizofrênicos. U m a dificuldade em interpretar tais estudos é que quase todos os pacientes esqui- zofrênicos são tratados c o m fármacos que são conhecidos por afetarem o metabolismo da dopamina, enquanto o gru- po de controle de não-esquizofrênicos, não o são. C o n t u d o , mesmo quando fo i possível reconhecer este fator, geralmen- te os resultados ainda assim são negativos. Um estudo bem controlado de Reynolds (1983) mostrou um conteúdo ele- vado postmortem de dopamina na amígdala dos indivíduos esquizofrênicos, sendo normal o conteúdo de noradrenali- na. A melhor evidência da liberação aumentada da dopami- na em pacientes esquizofrênicos provém dos estudos de ima- gem (Laruelle et al, 1999). U m a técnica de imagem de radi- oligantes foi usada para determinar a ligação de um antago- nista específico (racloprida) aos receptores D 2 no striatum. A injeção de anfetamina causou a liberação de dopamina e assim o deslocamento da racloprida, avaliada pela redução da intensidade do sinal. Esta redução foi maior por um fator de dois ou mais no esquizofrênico, comparado c o m os indi- víduos-controle, impl icando maior liberação de dopamina induzida pela anfetamina. O efeito era maior em esquizofrê- nicos durante os ataques agudos e ausente durante as remis- sões espontâneas e o u ; há evidência clara da ligação entre a liberação de dopamina e a sintomatologia. Foi relatado em alguns estudos um aumento da densidade do receptor dopaminérgico em esquizofrênicos, não de modo consistente, e a interpretação é complicada pelo fato de o tratamento c o m substância antipsicótica aumentar a expres- são do receptor dopaminérgico. O receptor D 4 também tem atraído a atenção em virtude do alto grau de pol imorf i smo genético que ele apresenta em seres humanos e porque algumas das substâncias antipsicóti- cas mais novas (p. ex.: c lozapina, veja a seguir) têm uma alta afinidade para este subtipo de receptor. C o n t u d o , estudos genéticos falharam em mostrar qualquer relação entre es- quizofrenia e pol imorf i smo do receptor D 4 . Além do mais, um antagonista específico do receptor D 4 provou ser inefi- caz em testes clínicos. Teoria glutaminérgica Um outro transmissor implicado na fisiopatologia da es- quizofrenia é - você não ficará surpreso ao saber - o glu- tamato (ver Gof f & Coyle , 2001). Os antagonistas do receptor glutamato N M D A (N-metil-D-aspartato), como a fenciclidina, quetamina e dizoci lpina (Cap. 32), produ- zem sintomas psicóticos (p.ex. alucinações, distúrbio do 6 0 0 1 0 - 7 - 10 o 10 10- 0,1 Trazodona Promazina Clorpromazina Clozapina Molindona Moperona Tioridazina Proclorperazina Trifluperazina Tiotixeno Haloperidol Droperidol Flufenazina Pimozida Trifluperidol Benperidol Espiroperidol 10 100 Dose clínica média (mg/dia) 1.000 Fig. 37.1 Correlação entre a potência clínica e a afinidade para os receptores dopaminérgicos D 2 entre substâncias neurolépticos. A potência clínica é expressa como dose diária usada no tratamento da esquizofrenia e a atividade ligante é expressa como a concentração necessária para produzir 50% da inibição da ligação do haloper idol . (A partir de: Seeman et al., 1976 Nature 3 6 1 : 717). Aesculapius SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS pensamento) em seres humanos, e concentrações reduzi- das de glutamato e de densidades do receptor de gluta- mato foram relatadas em cérebros postmortem de esqui- zofrênicos - um dos poucos achados razoavelmente con- sistentes. T E m b o r a a esquizofrenia seja difícil de diagnosticar em um c a m u n d o n g o , camundongos transgênicos nos quais a expressão d o receptor N M D A está reduzida (não abol ida , pois isto é fatal) mos t ram comportamentos estereotipa- dos e interação social reduzida , que são sugestivas de es- quizofren ia , e que respondem às substâncias antipsicóticas - evidência que sustenta a hipótese glutaminérgica. De acordo c o m esta visão, o glutamato e a d o p a m i n a exer- cem efeitos exci tatórios e inibitórios, respect ivamente, sobre os neurônios estriados GABAérgicos, que se proje- tam para o tálamo e const i tuem um " p o r t ã o " sensorial (ver a seguir). M u i t o pouco glutamato ou mui ta d o p a m i - na incapaci tam o portão, p e r m i t i n d o à aferência sensorial não i n i b i d a alcançar o córtex . Outras teorias Outros transmissores que podem ser importantes inclu- em a 5 - H T e a noradrenalina. A idéia de que a disfunção da 5 - H T pudesse estar envolvida na esquizofrenia basea- va-se no fato de que o L S D (veja Cap. 41) produz sinto- mas semelhantes à esquizofrenia, e esta idéia muitas ve- zes foi aceita ou não (ver Busatto & K e r w i n , 1997). M u i t a s substâncias antipsicóticas eficazes além de bloquearem os receptores dopaminérgicos (ver a seguir), também atuam como antagonistas do receptor 5 - H T . A 5 - H T tem efeito modulador sobre as vias dopaminérgi- cas, de modo que as duas teorias não são incompatíveis. A afinidade pelos receptores 5 - H T 2 A é uma característi- ca de muitas das substâncias antipsicóticas "atípicas" re- centemente desenvolvidas (ver adiante), que produzem menos efeitos colaterais extrapiramidais que os com- postos seletivos dopaminérgicos mais antigos. Existe controvérsia quanto ao bloqueio do receptor 5 - H T 2 con- tribuir para o efeito antipsicótico ou meramente redu- zir os efeitos colaterais desagradáveis associados com os antagonistas do receptor D 2 Resumo Concluindo, a teoria da hiperatividade dopaminérgica da esquizofrenia é sustentada por evidência considerável. Embora ela seja indubitavelmente de grande simplifica- ção e relacione-se somente com os sintomas positivos, fornece a melhor sustentação para entender a ação das substâncias antipsicóticas, ainda que os efeitos sobre os receptores 5 - H T e outros possam contribuir de modo significativo para o perfil clínico de alguma das substân- cias mais novas. (Ver Jones & Pi lowski (2002) e Strange (1999) para a posição atual). A natureza da esquizofrenia ^ • A doença psicótica esquizofrênica carac ter iza-se por del í r ios, a luc inações e distúrbios do p e n s a m e n t o (s intomas positivos) jun tamente c o m a re t i rada soc ia l , a b r a n d a m e n t o das respostas e m o c i o n a i s e prejuízo cogni t ivo (sintomas negativos) • Os episódios a g u d o s (pr inc ipa lmente os s in tomas positivos) f r eqüen temente oco r rem per iod i camen te e desenvo l vem-se em esqu izo f ren ia crôn ica, c o m p redominânc ia dos s in tomas negat ivos. • A incidência é cerca de 1% da popu lação , c o m c o m p o n e n t e hered i tá r io forte mas não invar iáve l . • A evidência fa rmaco lóg ica é ge ra lmen te consistente c o m a h ipótese da a t iv idade excessiva dopam iné rg i ca , sus tentada por ac hados b ioquímicos e estudos de i m a g e m . • Há t a m b é m evidência do envo lv imen to do g lu tamato e da 5-HT. SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS M a i s de 20 substâncias antipsicóticas diferentes estão dis- poníveis para uso clínico, mas com certas exceções, as diferenças entre eles são pequenas. U m a distinção é retratada entre as substâncias que foram originalmente desenvolvidas (p. ex. : c l o r p r o m a - zina, haloper idol e muitas substâncias semelhantes) c o m freqüência referidas como substâncias antipsicóticas clássicas ou típicas e mais recentemente agentes de- senvolvidos (p. ex. : c lozapina , r isper idona) , que são chamadas de substâncias antipsicóticos atípicos. Estes termos são amplamente usados, mas não claramente def in idos , e especialistas d iscutem incessantemente acerca do que significa realmente "at ípica" . C o m fre- qüência, refere-se à tendência diminuída de algumas substâncias mais novas de causarem efeitos colaterais motores indesejáveis (ver a seguir), mas é também usa- do para descrever substâncias c o m per f i l farmacológi- co de algum m o d o diferente das substâncias "clássi- cas" ou para descrever substâncias que m e l h o r a m os sintomas negativos, assim como os posit ivos. Na práti- ca, eles servem meramente - não muito habitualmente - para dist inguir o grande grupo das substâncias antes de 1980 ("clássicas", fenotiazinas, t ioxantenos e but i - rofenonas), que são mui to semelhantes em suas pro- priedades, de um grupo mais diverso de substâncias mais novas descritas a seguir. A Tabela 37.1 resume as principais substâncias que estão em uso clínico. Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O Classificação das substâncias antipsicóticos 6 0 2 • As pr inc ipais ca tegor ias são - antipsicóticos "típicos" clássicos (p. ex. ; c l o rp romaz ina , ha lope r ido l , f l u fenaz ina , t i o r idaz ina , f lupent ixo l , c lopent ixol ) ; - ant ipsicót icos atípicos recentes (p. ex. ; c l o z a p i n a , r i sper idona , ser t indo l , quet iapina) • A dist inção entre os g rupos típicos e atípicos não é c la ramente de f i n ida , mas repousa sobre : - perfi l do receptor ; - incidência dos efeitos colatera is ex t rap i ramida is (menos no g rupo at íp ico); - ef icácia no g rupo de pac ientes resistente ao t ra tamen to ; - ef icácia contra os s in tomas negat ivos. PROPRIEDADES GERAIS A atividade terapêutica da substância protótipa, a clor- promazina em pacientes esquizofrênicos foi descoberta através das observações argutas de um cirurgião francês, Laborit , em 1947. Ele testou várias substâncias, incluin- do a prometazina, por sua capacidade de aliviar os sinto- mas de estresse em pacientes que se submetiam a cirurgia e concluiu que a prometazina tinha um efeito calmante, que era diferente de uma mera sedação. A elaboração da estrutura da fenotiazina produziu a clorpromazina, cujo efeito antipsicótico foi aventado graça à investigação de Laborit , e demonstrado por Delay e Deniker em 1953. Esta substância era ímpar no controle dos sintomas dos pacientes psicóticos, sem sedá-los excessivamente. A efi- cácia clínica das fenotiazinas foi descoberta muito antes do seu mecanismo de ação ser entendido. A investigação farmacológica mostrou que as fenotia- zinas bloqueavam as ações de muitos mediadores dife- rentes, incluindo a histamina, as catecolaminas, a acetil- colina e a 5 - H T e esta gama de ações levou ao nome comercial Largactil para a clorpromazina. Sabe-se, hoje, (ver F ig . 37.1) que o antagonismo nos receptores dopa- minérgicos é o principal determinante da ação antipsicó- tica desta substância. MECANISMOS DE AÇÃO RECEPTORES E NEURÔNIOS DOPAMINÉRGICOS A classificação dos receptores dopaminérgicos no siste- ma nervoso central (SNC) é abordada no Cap. 33 (ver Tabela 33.1). Há cinco subtipos que caem em duas clas- ses funcionais: o tipo D x , compreendendo D j e D 5 e o tipo D 2 , compreendendo D 2 , D 3 e D 4 A s substâncias an- tipsicóticas possuem seus efeitos terapêuticos principal- mente em virtude do bloqueio dos receptores D 2 . C o m o anteriormente afirmado, os efeitos antipsicóticos neces- sitam bloquear 8 0 % dos receptores D 2 . O antagonismo nos receptores D 2 pode ser determinado em animais de experimentação por vários testes, como a inibição do com- portamento estereotipado induzido pela anfetamina ou do comportamento de girar, induzido pela apomorfina em animais com lesões estriais unilaterais (ver Cap. 33) e in vitro pela capacidade de inibir a ligação de um antago- nista D 2 r a d i o a t i v o (p. ex.: espiroperidol) em fragmentos de membranas de tecido cerebral. As substâncias mais antigas, fenotiazinas, tioxantenos e butirofenonas, mos- tram alguma preferência para receptores D 2 sobre D p alguns dos agentes mais novos (p. ex.: sulpirida, remoxi- prida) são altamente seletivos para os receptores D 2 , en- quanto a clozapina é relativamente não-seletiva entre Dj e D 2 , mas tem alta afinidade para D 4 N o s testes em animais, todas as substâncias antipsicó- ticas inicialmente aumentam e posteriormente diminuem a atividade elétrica dos neurônios dopaminérgicos do mesencéfalo na substância nigra e no tegumento ventral e também a liberação de dopamina em regiões contendo terminações nervosas dopaminérgicas (ver O ' D o n n e l l & Grace, 1996). Estas alterações estão possivelmente asso- ciadas com alterações na expressão do receptor dopami- nérgico (ver adiante). Acredita-se que os efeitos sobre as vias dopaminérgicas mesolímbicas/mesocorticais correla- cionam-se com os efeitos antipsicóticos, enquanto os efei- tos sobre as vias nigroestriadas são responsáveis pelos efei- tos motores indesejáveis produzidos pelas substâncias antipsicóticas (ver a seguir). Por exemplo, o haloperidol, uma substância clássica com efeitos motores pronuncia- dos, age sobre ambos os conjuntos de neurônios dopami- nérgicos, enquanto a clozapina, uma substância atípica que não possui efeitos motores, afeta somente os neurô- nios tegumentares ventrais. As substâncias antipsicóticas, como muitos fárma- cos neuroativos, levam várias semanas para produzirem efeito, ainda que sua ação bloqueadora do receptor seja imediata.* Quando as substâncias antipsicóticas são administra- das cronicamente, o aumento da atividade dos neurônios dopaminérgicos é transitório e d iminui após 3 semanas de inibição (Fig. 37.2), ocasião na qual declinam ambos os marcadores, bioquímico e eletrofisiológico. Um outro efeito retardado, visto com a administra- ção crônica de substâncias antipsicóticas, é a proliferação de receptores dopaminérgicos, detectável com o aumen- to de ligação do haloperidol (ver Seeman, 1987); há tam- bém uma supersensibilidade farmacológica à dopamina, de algum modo parecida com o fenômeno de supersensi- bilidade de desnervação. No momento, nem o mecanis- mo dos efeitos retardados, nem a sua relação c o m a res- posta clínica, estão bem entendidos. As substâncias antipsicóticas mostram padrões varia- dos de seletividade em seus efeitos bloqueantes de recep- * 0 efeito sedativo é também imediato, permitindo a eles serem usa- dos nas emergências comportamentais agudas. Aesculapius Tabela 37.1 Características das substâncias antipsicóticas Substâncias Af in idade pelo receptoi Efeitos colaterais principais Comentários D, D 2 a-adr H, mACh 5-HT, EPS Sed. Hipo. Outros Clássicos Clorpromazina ++ +++ +++ + + + + + + + + + + + + Prolactina aumentada (ginecomastia) Hipotermia Efeitos anticolinérgicosReações de hipersensibilidade Icterícia obstrutiva Classe das fenotiazinas F lu fenaz ina, t r i f iuperaz ina são semelhantes, mas: • não causa icterícia; • menos hipotensão; • mais EPS. Flufenazina disponível como preparação de depósito Tioridazina + ++ +++ + + + + + + + + + + Como a clorpromazina, mas não causa icterícia Classe das fenotiazinas Primeiro substância com tendência EPS mais baixa Haloper idol + +++ ++ ± + + + + — + + Como a clorpromazina, mas não causa icterícia Muito poucos efeitos colaterais anticolinérgicos Classe das butirofenonas Substância antipsicótica amplamente usada Forte tendência de EPS Flupentixol + + + + + + + + + + + + + + + + Prolactina aumentada (ginecomastia) Agitação Clopent ixo l é semelhante Disponível como preparações de depósito Atípicos Sulpirida — + + + — + + Prolactina aumentada (ginecomastia) Classe das benzamidas Antagonista seletivo D 2 / D 3 Menos EPS do que o haloperidol Muito pouco absorvido Remox ip r ida e p i m o z i d a (de longa ação) são semelhantes C lozap ina ++ ++ ++ + + + + + + + — + + + Risco de agranulocitose (—1%); contagem sangüínea regular necessária Convulsões Sedação Salivação Efeitos colaterais anticolinérgicos Ganho de peso Classe das dibenzodiazepinas Potente antagonista em receptores D 4 Sem EPS Mostra eficácia em pacientes "resistentes ao tratamento" Eficaz contra sintomas negativos e positivos O l a n z a p i n a é semelhante, sem o risco de agranulocitose Risperidona — ++ + + + + + + + + + + + + + Ganho de peso EPS em altas doses Hipotensão Risco significativo de EPS ? Eficaz contra os sintomas negativos Potente sobre receptores D 4 Sertindol — ++ + + — + + + + + + + Arritmias ventriculares (Controle ECG aconselhável) Ganho de peso Congestão nasal Me ia-v ida plasmática longa (~3 dias) ? Eficaz contra os sintomas negativos Quet iap ina — + . +++ + + + + + + + Taquicardia Agitação Boca seca Ganho de peso Tipo novo, agindo principalmente sobre os receptores a-adrenérgicos Ainda não amplamente avaliado D 1 / 2 , tipos de receptores dopaminérgicos; EPS, efeitos colaterais extrapiramidais; Sed., sedação; Hipo., hipotensão; adr, receptor adrenérgico; mACh, acetilcolina muscarínica; ECG, eletrocardiógrafo. o- o Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O tor (Tabela 37.1), algumas tendo alta afinidade para os receptores 5 - H T e/ou D 4 . A conexão entre suas especifi- cidades pelo receptor e seus efeitos funcional e terapêuti- co, apesar da riqueza de argumentos corretos, permane- ce obscura. Até onde se entende, não podemos perder a orientação e lançar mão de palavras como "atípica" para ocultar nossa incerteza. Mecanismo de ação das substâncias _ antipsicóticas <Ç • Todas as substâncias ant ipsicót icas são antagon is tas dos receptores dopaminérg icos D 2 , mas a ma io r ia t a m b é m b loque ia outros receptores de m o n o a m i n a s , espec ia lmente 5 -HT 2 . A c lozap ina t a m b é m b loque ia os receptores D 4 • A potência ant ipsicót ica ge ra lmen te corre para le la à a t iv idade nos receptores D 2 , mas outras a t iv idades p o d e m de te rminar o perfi l do efei to co la te ra l . • Os ant ipsicót icos d e m o r a m dias ou meses pa ra e m p r e e n d e r e m a sua ação, suger indo que os efeitos secundár ios (p. ex. ; a u m e n t o no n ú m e r o de receptores D 2 na estrutura límbica) p o d e m ser mais impor tantes do que o efei to direto do b loque io do receptor D 2 . EFEITOS FARMACOLÓGICOS EFEITOS COMPORTAMENTAIS As substâncias antipsicóticas produzem muitos efeitos comportamentais em animais de experimentação (veja Ogren , 1996), mas nenhum teste simples é conhecido para distingui-las claramente de outros tipos de subs- tâncias psicotrópicas. As substâncias antipsicóticas re- duzem a atividade motora espontânea e em grandes doses causam catalepsia, um estado no qual o animal permanece imóvel, mesmo quando colocado em uma posição diferente. A inibição da hiperatividade loco- motora induzida pela anfetamina é usada como i n d i - cador da ação antipsicótica exigida destes fármacos, en- quanto a capacidade para causar catalepsia é usada como indicador de sua tendência para causar sintomas extrapiramidais indesejáveis no uso clínico (ver a se- guir) . Estes efeitos provavelmente refletem o antago- nismo do receptor D 2 nas vias mesocorticais/mesolím- bicas e nas nigroestriatrais, respectivamente. Outros testes revelam efeitos que não estão associados c o m a inibição motora . Por exemplo, em modelo de reflexo condic ionado, um rato pode ser treinado para respon- der a um estímulo condic ionado, como uma campai- nha permanecendo imóvel e, portanto, evitando um cho- que do loroso ; a c lorpromazina prejudica o desempe- nho neste teste, assim como em testes que demandam respostas motoras ativas. Em doses mui to pequenas para reduzir a atividade motora espontânea, a c lorpro- mazina reduz as interações sociais (arrumar-se, casar- se, brigar etc.), e também prejudica o desempenho em testes discriminativos (p. ex. : exigir que o animal res- ponda de m o d o diferente às luzes vermelha e verde). A inibição das alterações comportamentais induzidas pela anfetamina ocorre com todas as substâncias antipsi- cóticas "clássicas", refletindo a sua ação sobre os recep- tores D 2 . Algumas das substâncias atípicas, que têm me- nos atividade sobre os receptores D 2 , são menos ativas em tais modelos e também no modelo da catalepsia, mas são igualmente eficazes no teste do reflexo condiciona- do. Além disso, as substâncias clássicas e atípicas redu- zem a hiperatividade causada pela fenciclidina (um anta- gonista glutaminérgico; Cap. 32), o que reduz a síndro- me semelhante à esquizofrenia em seres humanos. Por- tanto, os testes do reflexo condicionado e da fenciclidina em animais são usados como guias para a atividade an- tipsicótica em seres humanos. Em seres humanos, o efeito das substâncias antipsi- cóticas é p r o d u z i r estado de apatia e de iniciat iva re- duzida . O indivíduo mostra poucas emoções, é lento para responder a estímulos externos e tende a estar sonolento. C o n t u d o , o paciente é facilmente desperta- do e pode responder a perguntas de m o d o acurado, sem perda marcante da função intelectual . As tendên- cias agressivas são fortemente inibidas . Os efeitos em seres humanos d i ferem das substâncias hipnóticas e ansiolíticas, que causam sonolência e confusão com euforia , e não c o m apatia. Muitas substâncias antipsicóticas mostram atividades antieméticas (ver Cap. 24), refletindo antagonismo nos receptores dopaminérgicos. E também importante a ati- vidade anti-histamínica de muitas fenotiazinas. 140 Z 0 —i 1 1 1 1 1 1 1 1— C 0 1 2 3 4 5 6 7 8 Semanas de tratamento com haloperidol Fig. 37.2 Efeito do tratamento crônico com haloperidol sobre a atividade dos neurônios dopaminérgicos no cérebro de rato. Em ambas as regiões, a at ividade dos neurônios dopaminérgicos, registrada com microeletródios de animais anestesiados, inicialmente aumenta e a seguir decl ina, alcançando um nível estacionário após 3 semanas. (A partir de: White F J, Wang R Y 1983 Life Sci 32 : 983). Aesculapius SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS EFEITOS INDESEJÁVEIS Distúrbios motores extrapiramidais e discinesia tardia As substâncias antipsicóticas produzem dois principais tipos de distúrbios motores em seres humanos, distonias agudas e discinesia tardia, coletivamente chamados de efeitos colaterais extrapiramidais, que resultam direta ou indiretamente do bloqueio de receptor D 2 . Estes efeitos constituem uma das principais desvantagens de todas as substâncias antipsicóticas "clássicas". O termo "atípico" foi originalmente aplicado a algumas das substâncias mais novas, que mostram menos tendência a produzir os efei- tos extrapiramidais. Distonias agudas As distonias agudas são movimentos involuntários (es- pasmos musculares, língua protrusa, torc icoloetc.) e com freqüência uma síndrome do t ipo parkinsoniana (Cap. 34). O c o r r e m , comumente, nas primeiras sema- nas e, com freqüência, decl inam com o passar do tem- p o ; são reversíveis com a interrupção do tratamento. A ocorrência de distonias agudas é consistente com o bloqueio da via nigroestriada dopaminérgica e há evi- dência de que a seletividade relativa das substâncias antipsicóticas atípicas para a via mesolímbica/mesocor- tical é responsável pelo risco diminuído das distonias agudas. O bloqueio concomitante dos receptores mus- carínicos da aceti lcolina pode também mitigar os efei- tos motores do bloqueio do receptor dopaminérgico, pois os dois sistemas de receptores atuam de modos opostos (Cap. 34). Discinesia tardia A discinesia tardia (ver Klawans et ai., 1988) desenvolve- se após meses ou anos (daí "tardia") em 20-40% dos pa- cientes tratados com as substâncias antipsicóticas clás- sicas e é o principal problema da terapia antipsicótica. Sua gravidade reside no fato de que é uma condição inca- pacitante e irreversível, que com freqüência piora quan- do a terapia é interrompida, e é resistente ao tratamento. A síndrome consiste em movimentos involuntários, com freqüência, da face e da língua, mas também do tronco e dos membros, que podem ser severamente incapacitan- tes. Ela lembra a síndrome vista após o tratamento pro- longado da doença de Parkinson, com levodopa. A inci- dência depende muito da dosagem da substância, da ida- de do paciente (mais comum em pacientes acima de 50 anos, e da substância usada). Há várias teorias acerca do mecanismo da discinesia tardia (veja Casey, 1995). U m a está associada com o au- mento gradual no número de sítios no receptor D 2 no striatum, que é menos marcante com as substâncias an- tipsicóticas atípicas. Uma outra possibilidade é que o blo- queio crônico dos receptores dopaminérgicos inibitórios potencial iza a liberação no striatum de catecolamina e/ou glutamato, levando à neurodegeneração excitotóxi- ca (Cap. 34). Não está clara a razão pela qual as substân- cias antipsicóticas atípicas (p. ex.: clozapina, olanzapina, sertindol) são melhores a este respeito. U m a possível ex- plicação (ver Kapur & Seeman, 2001) reside nas diferen- ças na velocidade na qual as substâncias se dissociam dos receptores D 2 . C o m um fármaco que rapidamente se dis- socie, um rápido aumento de dopamina pode efetivamente sobrepujar o bloqueio por competição (Cap. 2), enquan- to um fármaco que lentamente se dissocie, o nível do bloqueio demora mais tempo para responder na presen- ça da dopamina endógena, sendo na prática um bloqueio não-competitivo. Portanto, os efeitos motores poderiam ser evitados, se o nível do bloqueio do receptor pudesse diminuir prontamente, em relação à competição, a partir dos aumentos abruptos fisiológicos da dopamina, enquan- to isto não fosse um fator de importância para os efeitos psicotrópicos. Permanece para ser visto, se esta explica- ção cinética compravará ser mais sustentável do que mui - tas tentativas para relacionar a tendência de causar efei- tos colaterais motores ao perfil do receptor das diferen- tes substâncias. A clozapina tem relativamente alta afini- dade para os receptores D j e D 4 , comparados aos recep- tores D 2 , e também tem atividade antimuscarínica mar- cante, como algumas outras substâncias antipsicóticas, como a tioridazina, que pode contrabalançar seus efeitos sobre o sistema motor. Distúrbios motores induzidos pelos antipsicóticos • Pr inc ipal p r o b l e m a do t ra tamento c o m substância ant ips icót ico. • Do is pr inc ipa is t ipos de d is túrb io o c o r r e m : - a g u d o , d is tonias reversíveis e s in tomas seme lhan tes a Pa rk inson ; - desenvo lv imento lento da d isc ines ia ta rd ia , c o m f reqüênc ia irreversível. • S in tomas a g u d o s c o m p r e e n d e m mov imen tos invo luntár ios , de t remor e r ig idez, e são p rovave lmente a conseqüência d i reta do b l oque io dos receptores dopaminérg icos n igroest r iados. • D isc ines ia tard ia c o m p r e e n d e p r inc ipa lmen te mov imentos invo luntár ios da face e dos m e m b r o s , a p a r e c e n d o após meses ou a n o s de t ra tamento ant ipsicót ico. Ela pode estar assoc iada c o m a pro l i fe ração de receptores dopaminérg icos (possivelmente pré-sinápt icos) no striatum. O t ra tamento ge ra lmen te não tem sucesso. • Incidência de d is ton ias a g u d a s e d isc ines ia ta rd ia é m e n o r c o m os ant ipsicót icos atípicos e par t i cu la rmente ba ixa c o m a c l o z a p i n a . Isto pode refletir o b loque io re la t ivamente forte do receptor muscarínico c o m estas substâncias ou um grau de se le t iv idade pa ra as v ias mesol ímbicas dopaminérg icas , em opos ição às n igroest r iadas. Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O Efeitos e n d ó c r i n o s A dopamina, liberada da eminência média pelos neurô- nios da via túbero-hipofisária (ver Caps. 27 e 33), atua fisiologicamente por meio dos receptores D 2 , como um inibidor da secreção de prolactina. Assim, o resultado do bloqueio destes receptores D 2 pelas substâncias antipsi- cóticas é aumentar a concentração plasmática de prolac- tina (Fig. 37.3), resultando na turgescência das mamas, dor e lactação, que podem ocorrer em homens e mulhe- res. C o m o pode ser visto na Fig. 37.3, o efeito é mantido durante a administração antipsicótica crônica, sem qual- quer hábito. Outras alterações endócrinas menos pronun- ciadas foram também relatadas, incluindo uma diminui - ção na secreção de hormônio do crescimento, mas estas, diferentemente da resposta da prolactina, não têm im- portância clínica. Outros efeitos i n d e s e j á v e i s A sedação, que tende a diminuir com o uso continuado, ocorre com muitas substâncias antipsicóticas. A ativida- de anti-histamínica (Hj) é uma propriedade das fenotia- zinas e contribui para as propriedades sedativa e antie- mética (Cap. 24), mas não para a sua ação antipsicótica. As fenotiazinas e, em extensão variável, outras subs- tâncias antipsicóticas, bloqueiam uma gama de recepto- res, particularmente, da acetilcolina (muscarínico), da histamina (Hj) , noradrenalina (a) e da 5 - H T (Tabela 37.1). O bloqueio dos receptores muscarínicos produz uma variedade de efeitos periféricos, inc lu indo visão turva e pressão intra-ocular aumentada, boca e olhos secos, cons- tipação e retenção urinaria (ver C a p . 10). C o n t u d o , eles podem também ser benéficos em relação aos efeitos co- laterais extrapiramidais. A acetilcolina atua em oposi- ção à dopamina nos gânglios da base (ver C a p . 31) e é possível que a falta relativa de efeitos colaterais extrapi- ramidais com a clozapina e a t ior idazina seja uma con- seqüência de sua alta potência antimuscarínica (ver an- teriormente). O bloqueio dos receptores oc-adrenérgicos resulta em efeito colateral importante nos seres humanos, a hipo- tensão ortostática (Cap. 18), mas não parece importante para a ação antipsicótica. Ganho de peso é efeito colateral c o m u m e incômo- do, particularmente associado com algumas substâncias 'atípicas' e provavelmente relacionado com o antago- nismo da 5 - H T . Várias reações idiossincrásicas e de hipersensibilida- de podem ocorrer, sendo as mais importantes: o O . (D " D CD O c o ü E 5 O O ) Q. E . o o 400 320 240 — 160 80 2000 Injeção de decanoato de flufenazina (225 mg) 30 60 90 120 Dias 150 180 606 Fig. 37.3 Efeitos das substâncias antipsicóticas sobre a produção de prolactina em um paciente esquizofrênico. Quando a dose diária com clorpromazina foi substituída por uma injeção de depósito de f lufenazina, a prolactina plasmática inicialmente caiu, por causa do retardo na absorção e a seguir retornou ao nível elevado. (A partir de: Meltzer H Y et al 1 978 In: Lipton et al. (eds) Psychopharmacology. A generation in progress. Raven Press, New York). Icterícia, que ocorre com asfenotiazinas mais anti- gas, como a clorpromazina. A icterícia é geralmente branda e obstrutiva e desaparece rapidamente quan- do a substância é interrompida ou substituída por uma substância antipsicótica de classe diferente. Leucopenia e agranulocitose são raras, mas potenci- almente fatais, e ocorrem nas primeiras semanas de tratamento. A incidência de leucopenia (geralmente reversível) é menos de 1 em 10.000 para a maioria dos antipsicóticos, mas muito maior (1-2%) com a clozapina; portanto, seu uso requer monitoramento regular da contagem das células sangüíneas. Desde que a substância seja interrompida ao primeiro sinal de leucopenia ou anemia, o efeito é reversível. A Olan- zapina parece não apresentar esta desvantagem. Reações cutâneas do tipo urticaria são comuns, mas geralmente brandas. Pode também ocorrer sensi- bilidade excessiva à luz ultravioleta. Síndrome maligna antipsicótica é uma complicação rara, mas séria, é semelhante à síndrome de hiperter- mia maligna, vista c o m certos anestésicos (ver C a p . 35). A rigidez muscular é acompanhada por rápida elevação na temperatura corpórea e confusão mental. Geralmente é reversível, mas pode ocorrer mor- te em 10-20% por falência renal e cardiovascular. ASPECTOS FARMACOCINÉTICOS A clorpromazina, que é o protótipo das fenotiazinas, é absorvida de forma irregular para a corrente sangüínea Aesculapius SUBSTÂNCIAS ANTIPSICÓTICAS Efeitos indesejáveis das substâncias antipsicóticas • Importantes efeitos co la tera is para a ma io r ia dos substâncias são os distúrbios motores ex t rap i ramida is (ver quad ro separado) e distúrbios endócr inos ( l iberação a u m e n t a d a de pro lact ina) ; estas são secundár ias ao b loque io do receptor dopaminérg i co . São t a m b é m comuns sedação, h ipotensão e g a n h o de peso. • Ou t ros efeitos colatera is (boca seca , visão turva, h ipotensão etc.) resul tam do b loque io de outros receptores, par t icu larmente receptores a-adrenérg icos e muscarínicos. • A icterícia obstrut iva a l g u m a s vezes ocor re c o m as fenot iaz inas . • A lguns ant ipsicót icos c a u s a m agranu loc i tose c o m o u m a reação idiossincrásica rara e sér ia. C o m a c l ozap ina , é c o m u m leucopen ia e é necessário mon i to ramen to de rot ina. • A s índrome ma l i gna ant ipsicót ico é reação idiossincrásica ra ra , mas po tenc ia lmente per igosa . após a administração oral. A Fig. 34.4 mostra a ampla fai- xa de variação do pico de concentração plasmática como função da dose em 14 pacientes. Entre 4 pacientes trata- dos com doses elevadas de 6-8 mg/kg, a variação no pico de concentração plasmática era perto de 90 vezes; dois mostraram efeitos colaterais marcantes, um foi correta- mente controlado e um não mostrou resposta clínica. A relação entre a concentração plasmática e o efeito clínico das substâncias antipsicóticas é também muito variável e a dose tem de ser ajustada na base do teste-e- erro. Isto é ainda mais difícil pelo fato de que pelo menos 4 0 % dos pacientes esquizofrênicos deixam de tomar as substâncias prescritas. É admirável que a toxicidade agu- 1.000 800 -g 600 - B 400 200 o o Efeitos colaterais •• • Sem resposta / 5 10 Dose (mg/kg duas vezes ao dia) Fig. 37.4 Var iação individual na relação entre dose e concentração plasmática de clorpromazina em um grupo de pacientes esquizofrênicos. (Dados: Curry S H et a l . 1970 Arch G e n P Psychiat 22 : 289). da das substâncias antipsicóticas seja pequena, dada a i m - previsibilidade da resposta clínica. A meia-vida plasmática da maioria das substâncias antipsicóticas é de 15-30 horas, e o clearance depende inteiramente da biotransformação hepática, por uma com- binação de reações de oxidação e de conjugação. A maioria das substâncias antipsicóticas pode ser ad- ministrada oralmente ou por injeção intramuscular, uma a duas vezes ao dia. Muitas são disponíveis em prepara- ções de liberação lenta/depósito), nas quais a substância ativa é esterificada com ácido heptanóico ou decanóico e dissolvida em óleo. Dada como injeção intramuscular, a substância atua por 2-4 semanas, mas inicialmente pode produzir efeitos colaterais agudos. Essas preparações são amplamente usadas como um meio de sobrepujar os pro- blemas de adesão do paciente ao tratamento. Eficácia clínica das substâncias antipsicóticas • As substâncias ant ipsicót icas são ef icazes no cont ro le dos s in tomas da esqu izo f ren ia a g u d a , q u a n d o p o d e m ser necessárias g randes doses . • O t ra tamento ant ipsicót ico a l ongo prazo é c o m f reqüênc ia ef icaz em preveni r a recorrência dos a taques esquizofrênicos e é o pr inc ipa l fa tor em permit i r aos pac ientes esquizofrênicos leva rem v idas norma is . • As preparações de depósi to são, c o m f reqüênc ia , usadas pa ra a te rap ia de manu tenção . • As substâncias ant ipsicót icas não são ge ra lmen te ef icazes na me lho r i a dos s in tomas esquizofrênicos negat ivos, e m b o r a as substâncias mais novas t e n h a m por objet ivo a l iv iar estes s in tomas. • A p r o x i m a d a m e n t e 4 0 % dos pac ientes esquizofrênicos são pob remen te con t ro lados pe las substâncias ant ipsicót icas; a c l ozap ina p o d e ser e f icaz em a lguns destes pac ientes "resistentes a o s ant ips icót icos". • Há p e q u e n a s , se não n e n h u m a , d i ferenças g loba is na ef icácia entre as d i ferentes substâncias ant ipsicót icas, e m b o r a t e n h a m di ferenças signi f icat ivas nos efei tos co la tera is . USO E EFICÁCIA CLINICA O principal uso das substâncias antipsicóticas é no trata- mento da esquizofrenia e nas emergências agudas de com- portamento, mas são amplamente usadas como terapia adjunta no tratamento de outras doenças, como a depres- são psicótica e a mania. Alguns dos mais novos antipsicó- ticos (p. ex., sulpirida) foram apontados como tendo ações antidepressivas específicas. As fenotiazinas também são úteis como antieméticos (ver Cap. 30). Os usos secundá- rios incluem o tratamento da coréia de Hunt ington (prin- cipalmente o haloperidol ; ver Cap. 34). A eficácia clínica das substâncias antipsicóticas em permitir aos pacientes esquizofrênicos levarem vidas mais Aesculapius SEÇÃO 4: O SISTEMA N E R V O S O normais foi demonstrada em muitos testes controlados. A população de pacientes internados (principalmente esquizofrênicos crônicos) de hospitais mentais declinou de modo nítido, nos anos 50 e 60. A eficácia das substân- cias antipsicóticas desenvolvidas recentemente foi um fator capacitante significativo, assim como as mudanças de atitudes pública e profissional com respeito à hospita- lização do doente mental. As substâncias antipsicóticas, não considerando os seus efeitos colaterais, têm dois principais defeitos: • Elas são eficazes somente em cerca de 7 0 % dos pacientes esquizofrênicos; para qualquer substân- cia isolada, a taxa de sucesso é mais baixa. Os 3 0 % restantes são classificados como "resistentes ao tra- tamento" e apresentam um importante problema terapêutico. A razão para esta diferença entre os pacientes que respondem e os que não respondem ao tratamento é no momento desconhecida.* • Enquanto elas controlam os sintomas positivos (dis- túrbio do pensamento, alucinações, delírios, etc.) de modo eficaz, são ineficazes em relação aos sin- tomas negativos (abrandamento emocional, isola- mento social). As substâncias antipsicóticas atípicas mais novas, par- ticularmente a clozapina, podem sobrepujar esses defei- tos em algum grau, mostrando eficácia nos pacientes re- sistentes ao tratamento e melhorando os sintomas nega- tivos, assim como os positivos. Contudo, uma metanálise recente (Geddes et al., 2000) sugere que estas substân- cias mais novas, enquanto claramente reduzem o risco de efeitos colaterais motores, não são de modo significativo melhores em termos de eficácia ou de outros efeitos co- laterais. As substâncias
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