Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Práticas Aplicadas em Bioquímica e Imunologia Clínica AVALIAÇÃO DA GLICEMIA E DIABETES MELITO Caio Cesar Richter Nogueira PRATICAR PARA APRENDER Os testes utilizados para a avaliação da glicose no sangue de pacientes são os principais exames solicitados pelos médicos nos quais o analista clínico vai atuar dentro do laboratório de análises clínicas, com destaque àqueles que envolvem o diagnóstico de diabetes mellitus. Também é função do Biomédico conhecer as vantagens e desvantagens de cada método e escolher aquele que melhor atenda às necessidades do seu laboratório. Entretanto, você sabe o tempo de jejum necessário para a realização desses exames? Sabe se o paciente pode realizar atividade física ou fazer consumo de café nos minutos que antecedem esses testes? Portanto, nesta seção você vai aprender sobre os principais testes utilizados para quantificação da glicose; parâmetros para coleta da amostra; processamento e armazenamento da amostra; indicações dadas ao paciente; os principais métodos colorimétricos e enzimáticos para utilizar na dosagem da glicose sérica e correlacionar a acidose metabólica gerada pelo quadro de diabetes mellitus e os resultados da gasometria arterial. Diferentes métodos são utilizados para a dosagem de glicose em laboratórios de análises clínicas e as variáveis pré-analíticas podem influenciar no resultado desses métodos. As principais variáveis pré-analíticas são: o horário de coleta da amostra, o gênero e a idade do paciente, o jejum adequado e o fumo. Um Biomédico responsável técnico foi chamado na recepção do seu laboratório de análises clínicas para elucidar uma dúvida de um paciente. Ao chegar ao local, um homem que estava no segundo período de jejum do teste oral de tolerância à glicose explicou que gostaria de sair para fumar. No lugar do biomédico, qual seria sua indicação para o paciente? CONCEITO-CHAVE Os diversos distúrbios do metabolismo de carboidratos resultam em alterações na concentração de glicose no sangue. Essas desordens podem aumentar a concentração de glicose, que é denominada hiperglicemia, ou podem resultar na diminuição da concentração de glicose, denominada hipoglicemia. Em ambos os casos, os exames realizados nas análises clínicas auxiliam o médico no diagnóstico de doenças. O exame de Glicemia Casual consiste na dosagem da glicose sérica realizada em qualquer horário do dia, portanto o paciente não se encontra em jejum. Segundo as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2019-2020), pacientes com glicemia ≥ 200 e com sintomas inequívocos de hiperglicemia podem ser considerados portadores de diabetes. VOCABULÁRIO Glicemia: concentração de glicose no sangue. Jejum: sem consumir nenhum tipo de alimento ou bebida, com exceção de água, durante um período determinado. O exame de glicemia em jejum consiste na dosagem laboratorial da concentração de glicose na circulação sanguínea do paciente em jejum de 8 horas. No teste de glicemia em jejum, a amostra deve ser preferencialmente coletada em tubos contendo Fluoreto de Sódio, Cloreto de Sódio e Ácido Etilenodiaminotetracético (EDTA). Segundo as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2019-2020), são considerados níveis normais de glicemia valores inferiores a 100 mg/dL. O teste de glicemia pós-prandial é um exame que avalia a capacidade do paciente em metabolizar a glicose sanguínea após a ingestão de uma refeição, por exemplo, após o almoço. A metodologia utilizada consiste na dosagem da glicose sérica do paciente 1 a 2 horas após a refeição. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, são considerados valores desejados para a glicemia capilar, no máximo, 180 mg/dL para pacientes diabéticos e até 140mg/dL para pacientes saudáveis. O teste oral de tolerância à glicose (TOTG) é um exame que avalia a capacidade do paciente em metabolizar a glicose sanguínea após a ingestão de uma solução glicosada. Esse exame também é conhecido como teste de sobrecarga de glicose, glicemia após sobrecarga oral de glicose, entre outros, com pequenas variações na metodologia. A metodologia mais utilizada, consiste em uma primeira coleta da amostra após 8 horas de jejum do paciente; depois da coleta, o paciente deve realizar a ingestão de 75g de glicose diluída em água, permanecer 2 horas em jejum e, posteriormente, ser encaminhado para a segunda coleta da amostra. Visando a construção de uma curva glicêmica, o médico solicitante também pode prescrever a coleta de 6 amostras, jejum, mais 5 a cada 30 minutos após o estímulo com a solução glicosada. REFLITA O teste oral de tolerância à glicose (TOTG) utiliza em sua metodologia o consumo de 75 g de glicose e é amplamente utilizado para o diagnóstico de diabetes mellitus (DM). Entretanto, portadores dessa doença podem apresentar altas concentrações de glicose em seu sangue durante períodos do dia. O consumo da glicose por pacientes portadores de DM poderia resultar em complicações agudas durante a realização do exame? O teste de O’Sullivan é um exame que avalia a capacidade da gestante em metabolizar a glicose sanguínea após a ingestão de uma solução glicosada. Alguns autores consideram esse exame uma variação metodológica do teste oral de tolerância à glicose, mudando apenas a concentração da glicose ingerida e o tempo de jejum. A metodologia utilizada consiste em uma primeira coleta da amostra após 8 horas de jejum. Depois da coleta, a gestante deve realizar a ingestão de 50g de glicose diluída em água, permanecer 1 hora em jejum e, posteriormente, ser encaminhada para uma segunda coleta da amostra. Esse exame deve ser realizado entre a 24ª e a 28ª semana de gravidez visando o diagnóstico de diabetes gestacional. Segundo as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes, são considerados níveis normais de glicemia valores inferiores a 140 mg/dL. O teste de hemoglobina glicada também pode ser conhecido como hemoglobina glicosilada, glico-hemoglobina ou HbA1C. A metodologia do exame consiste em avaliar a porcentagem da fração HbA1c que se encontra ligada à molécula de glicose, portanto, o resultado do teste está intimamente relacionado à concentração média de glicose sérica do paciente. Além disso, como as hemácias possuem uma vida média de aproximadamente 3 meses, isso permite que o médico faça uma avaliação da glicemia do seu paciente em um período prolongado e não de forma pontual, como acontece com os outros exames que realizam apenas a dosagem da glicose. Para a coleta da amostra, o paciente não necessita de jejum obrigatório, entretanto é recomendado um jejum de 4 horas, pois amostras ricas em lipídios podem interferir no resultado do exame. O sangue do paciente pode ser obtido por punção venosa ou punção capilar, o tubo para coleta deve conter o anticoagulante EDTA ou Heparina. Segundo as Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2019-2020), são considerados níveis normais de HbA1c valores inferiores a 5,7 %. Os primeiros métodos utilizados para a dosagem de glicose no sangue de pacientes foram baseados em reações químicas que geram cor. Com o passar dos anos, enzimas foram adicionadas na reação química para aumentar a especificidade do método, passando a ser chamados de testes enzimáticos-colorimétricos. Vamos estudar os principais métodos usados na dosagem de glicose. A glicose oxidase (GOD) é uma enzima que possui como seu substrato a molécula de β-D-Glicose, cuja função é catalisar a reação de oxidação dessa molécula, resultando na formação de D-Glucona-delta-lactona e Peróxido de hidrogênio (H2O2), que posteriormente é hidrolisado em ácido glucônico. Após a reação mediada pela GOD, a enzima peroxidase (POD) inicia uma nova reação química. As peroxidases são enzimas que oxidam substratos orgânicos, tendo o peróxido de hidrogênio como molécula aceitadora de elétrons. Nesse método, o peróxido de hidrogênio na presença da POD reage com a 4-Aminoantipirina e Fenol, formando um complexo denominado Quinoneimina, um cromógeno decoloração vermelho cereja, cuja intensidade de cor é proporcional à concentração de Glicose no Soro/Plasma do paciente e pode ser lida por espectrofotometria utilizando a faixa de comprimento de onda entre 490 e 550 nm e absorção máxima em 500 nm. O método da hexoquinase (HK) consiste em duas reações. A primeira etapa inicia na reação de conversão da molécula de glicose em glicose-6-fosfato através da hidrólise de ATP. Posteriormente, a enzima Glicose-6-fosfato-desidrogenase (G6PD) catalisa a conversão da glicose-6-fosfato e NADP+ em 6-fosfogliconolactona e NADPH. O aumento da absorbância do NADPH é medido utilizando o comprimento de onda em 340 nm, sendo, assim, a absorbância proporcional à concentração da glicose no soro/plasma do paciente. ASSIMILE A enzima hexoquinase utilizada no método para dosagem de glicose é a mesma que participa da via glicolítica presente no citoplasma das células, fosforilando a molécula de glicose e formando a glicose-6-fosfato. A glicose desidrogenase (GD) é uma enzima que catalisa a redução de NAD formando gluconolactona e NADH. O aumento da absorbância do NADH é medido utilizando o comprimento de onda em 340 nm, sendo, assim, a absorbância proporcional à concentração da glicose no soro/plasma do paciente. O diabetes mellitus (DM) é uma síndrome do metabolismo defeituoso de carboidratos, lipídeos e proteínas de etiologia múltipla, decorrente da ausência de secreção de insulina e diminuição da sensibilidade dos tecidos à insulina. Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, a DM pode ser classificada em diferentes tipos: O diabetes mellitus tipo 1 é uma doença metabólica na qual ocorre destruição das células beta pancreáticas produtoras de insulina, resultando na insulinopenia. Dentre os casos totais de DM, o diabetes do tipo 1 representa 5 a 10% e inicia antes dos 30 anos de idade, mas pode acometer indivíduos em qualquer faixa etária. Devido à destruição das células beta pancreáticas, seu tratamento exige a utilização de insulina. Subdivide-se em DM tipo 1A e DM tipo 1B, a depender da presença ou ausência de autoanticorpos no sangue do paciente. O diabetes mellitus tipo 1A é caracterizado pela destruição autoimune das células β pancreáticas com a presença de um ou mais anticorpos. Os princípios da resposta imune contra as ilhotas pancreáticas foram descritos no ano de 1965, entretanto a existência de anticorpos contra as ilhotas pancreáticas foi descrita apenas em 1974. O processo de destruição das células β pancreáticas, denominado insulite, ocorre pela agressão imunológica mediada por células linfocitárias, macrófagos e células "natural killer”. A incidência da doença é variável entre a população e áreas geográficas, entretanto existe uma predominância em indivíduos de raça branca e maior taxa de incidência mundial na Finlândia e na Itália. Fatores genéticos e ambientais desencadeiam a resposta autoimune, tendo múltiplos genes associados ao desenvolvimento da doença. Foram descritos mais de vinte loci que conferem suscetibilidade ao DM1A, estando os mais importantes localizados nos cromossomos 1, 2, 6 e 11 e associados a mutações no antígeno leucocitário humano. Dentre os fatores ambientais, as infecções virais, componentes dietéticos e certas composições da microbiota intestinal estão mais associados ao desenvolvimento da doença. Os marcadores imunológicos utilizados no diagnóstico laboratorial da DM1A são: anticorpo anti-ilhota (ICA), autoanticorpo anti-insulina (IAA), anticorpo antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD65), anticorpo antitirosina-fosfatase IA-2 e anticorpo antitransportador de zinco (Znt8), sendo esses anticorpos presentes no sangue dos pacientes anteriormente ao quadro clínico da hiperglicemia. a. Anticorpo Anti-ilhota (ICA): são anticorpos produzidos contra antígenos não-específicos presentes nas ilhotas pancreáticas. As células produtoras de glucagon, somatostatina e polipeptídeo pancreático, presentes nas ilhotas pancreáticas são poupadas, entretanto as células β produtoras de insulina sofrem atrofia durante a progressão da doença. b. Anticorpo Anti-Insulina (IAA): São anticorpos produzidos contra a insulina. c. Anticorpo antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti-GAD65): são anticorpos produzidos contra a enzima descarboxilase do ácido glutâmico (DAG). Também conhecida como glutamato descarboxilase, a DAG tem como função catalisar a reação de descarboxilação do glutamato em GABA. Está presente principalmente no cérebro, mas também no pâncreas. d. Anticorpo antitirosina-fosfatase IA-2 (anti-IA2): são anticorpos produzidos contra o antígeno do Insulinoma-2 presente no pâncreas. Também conhecido como antiproteína de membrana com homologia às tirosino-fosfatases. e. Anticorpo antitransportador de zinco (anti-Znt8): são anticorpos produzidos contra o transportador de zinco 8 (Znt8). O Znt8 é uma proteína encontrada na membrana dos grânulos secretores de insulina das células β pancreáticas. Para a dosagem laboratorial desses anticorpos, o jejum prévio não é necessário e deve-se utilizar como amostra o soro do paciente. A hemólise, lipemia e bilirrubina aumentada podem interferir nos métodos utilizados para quantificar esses anticorpos. A diabetes mellitus tipo 2 (DM2) é um distúrbio metabólico caracterizado pela resistência à insulina (RI) e alta concentração de glicose sérica. A RI é definida pela diminuição do efeito da insulina endógena em tecidos-alvo, principalmente no tecido muscular e nos adipócitos. Como mecanismo compensatório à resistência ocorre a liberação aumentada de insulina pelo pâncreas, resultando em uma alta concentração de insulina no sangue, também denominado hiperinsulinemia. Com a progressão da doença, ocorre a exaustão da capacidade secretora das células β pancreáticas, gerando a incapacidade da regulação da concentração de glicose sérica, podendo acontecer a hiperglicemia. Dentre os casos totais de DM, o diabetes do tipo 2 representa 90 a 95% dos casos e se inicia depois dos 40 anos de idade, mas pode acometer indivíduos em qualquer faixa etária. O diagnóstico laboratorial da DM pode ser realizado através de três principais testes: glicose em jejum, teste oral de tolerância à glicose (TOTG) e hemoglobina glicada. Caso o exame laboratorial resulte em confirmação do diagnóstico de DM2, é necessária a repetição dos exames alterados, idealmente o mesmo exame alterado em segunda amostra de sangue do paciente. EXEMPLIFICANDO Um indivíduo portador de diabetes mellitus tipo 2 também pode apresentar outras alterações laboratoriais, como, por exemplo, níveis de triglicerídeos e LDL aumentados e alta concentração de fibrinogênio e proteína C reativa. O diabetes mellitus gestacional (DMG) é definido como qualquer grau de intolerância aos carboidratos, com início ou primeiro reconhecimento durante a gestação, sem ter previamente preenchido os critérios diagnósticos de DM. As primeiras alterações do metabolismo materno são geradas para suprir a necessidade energética do feto. Durante o 3°e 4° trimestre de gestação, hormônios placentários anti-insulínicos são liberados para prover um aporte ideal de carboidratos para o feto, gerando resistência à insulina. Algumas mulheres que engravidam e possuem fatores de risco ou doenças com algum grau de resistência à insulina, como, por exemplo, na obesidade ou na síndrome dos ovários policísticos, dependem de uma maior produção de insulina, resultando na incapacidade do pâncreas em suprir essa necessidade. Esse quadro favorece a hiperglicemia, caracterizando o diabetes mellitus gestacional. O protocolo para diagnóstico laboratorial de DMG baseia-se no período de início do pré-natal. Pacientes portadores dos diferentes tipos de diabetes mellitus não controlados, em decorrência da falta de insulina ou da resistência tecidual à insulina, não conseguem utilizar a molécula de glicose como fonte para formação de ATP em determinados tecidos. Isso ocorre, devido ao transportadorde glicose (GLUT4) nas células do músculo esquelético, músculo cardíaco e tecido adiposo que encontram-se armazenados em vesículas intracelulares que se fundem com a membrana plasmática em resposta ao sinal da insulina. Isso faz com que o fígado utilize moléculas de ácido graxo para a produção de acetil-CoA que pode entrar no ciclo do ácido cítrico ou ser convertido em acetona, acetoacetato e β-hidroxibutirato (corpos cetônicos) para ser utilizado em outros tecidos. No diabetes existe uma superprodução desses corpos cetônicos que geram um distúrbio ácido-base do sangue, denominado acidose metabólica ou cetoacidose diabética. Nos casos em que a doença progride para alterações ácido-base, o plasma sanguíneo possui um mecanismo fisiológico e químico para tentar parar essas alterações. O principal mecanismo químico presente no sangue dos seres humanos é o sistema tampão bicarbonato, formado pelo Ácido carbônico (H2CO3), que funciona como doador de prótons, e o Bicarbonato (HCO3-), que funciona como aceptor de prótons. O ácido carbônico é formado a partir do dióxido de carbono dissolvido, portanto um dos principais mecanismos fisiológicos de controle do pH sanguíneo é o pulmão, uma vez que esse órgão pode aumentar a eliminação de CO2 através da hiperventilação ou reter CO2 no sangue através da hipoventilação. A análise dos gases arteriais e do pH é realizada rotineiramente na clínica médica para avaliar os distúrbios ácido-base. Esses distúrbios podem ser classificados em quatro tipos: acidose metabólica, acidose respiratória, alcalose metabólica e alcalose respiratória. O exame utilizado para diferenciar os distúrbios ácido-base do sangue é denominado gasometria arterial. É um exame no qual é coletado sangue oriundo da artéria, que tem por objetivo avaliar os valores do pH sanguíneo, pressão parcial de gás carbônico (pCO2) e oxigênio (PaO2) e a concentração do íon Bicarbonato (HCO3). Para a coleta da amostra deve-se dar preferência à artéria radial, braquial ou femoral, em ordem de prioridade. O sangue arterial possui coloração vermelho intenso se comparado ao sangue venoso, que possui coloração vermelho escuro. Essa característica do sangue arterial pode ser utilizada para confirmação da coleta de forma correta. O tubo para a coleta deve preferencialmente conter Heparina. Os valores de referência encontrados nos principais parâmetros avaliados na gasometria arterial podem ser observados na tabela. FAÇA A VALER A PENA Questão 1 O corpo humano é capaz de utilizar reações químicas enzimáticas para transformar diferentes tipos de macromoléculas em glicose, aumentando, assim, a glicemia. A glicemia é o termo utilizado para definir a concentração de glicose no sangue. No laboratório de análises clínicas podem ser realizados diversos testes para avaliação da glicemia. Dentre os testes utilizados na dosagem da glicemia, assinale a alternativa que apresenta o exame que NÃO REQUER a necessidade de jejum em todas as etapas do teste. a. Teste de glicemia em jejum. b. Teste de glicemia pós-prandial. c. Teste de O’Sullivan. d. Teste oral de tolerância à glicose. e. Teste de hemoglobina glicada. Questão 2 O teste oral de tolerância à glicose é um exame que avalia a concentração de glicose no sangue do paciente após o consumo de uma quantidade conhecida de glicose. Para realização do exame, o setor da recepção deve informar ao paciente as medidas que devem ser seguidas antes e durante o exame. Assinale a alternativa que apresenta uma indicação a ser dada ao paciente para realização do teste oral de tolerância à glicose. a. Durante os dias que antecedem o exame, o paciente deve evitar o consumo de carboidratos. b. Durante os dias que antecedem o exame, o paciente não pode realizar atividade física. c. O uso de medicamentos não precisa ser informado pelo paciente. d. Durante as duas horas de jejum do exame, o paciente não deve caminhar. e. O uso de drogas ilícitas não impede que o paciente realize o exame. Questão 3 O diabetes mellitus (DM) é um grupo de distúrbios do metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas que resultam em níveis elevados de glicose no sangue. Para realizar o diagnóstico dessa doença podem ser utilizados os testes de glicemia de jejum, teste oral de tolerância à glicose (TOTG) e hemoglobina glicada e seus respectivos resultados de glicemia. Tomando como base as informações apresentadas, avalie as informações a seguir. I. De acordo com a tabela, valores de glicemia de jejum inferiores a 100 mg/dL podem indicar DM. II. O teste oral de tolerância à glicose não pode ser utilizado para o diagnóstico de DM. III. Pacientes com valores de hemoglobina glicada inferiores à 5,7 não apresentam DM. IV. Um paciente que apresentou TOTG com valor igual a 250 mg/dL pode ser considerado um paciente portador de DM. Considerando o contexto apresentado, é correto APENAS o que se afirma em: a. I e II b. III e IV c. I, II e III. d. I, III e IV. e. II, III e IV. REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, R. Os (Des)encontros das solicitações e das interpretações dos exames relacionados ao metabolismo glicídico. Sociedade Brasileira de Diabetes, São Paulo, ano 2011, n. 42664, 19 jan. 2021. BALDA, C. A.; PACHECO-SILVA, A. Aspectos imunológicos do diabetes melito tipo 1. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 45, n. 2, p. 175-180, 1999. BOLOGNANI, C. V.; SOUZA, S. S.; CALDERON, I. M. P. Diabetes mellitus gestacional: enfoque nos novos critérios diagnósticos. Comunicação em Ciências da Saúde, v. 22, sup. 1, p. 31-42, 2011. BRASIL. Ministério da Saúde. Rastreamento e diagnóstico de diabetes mellitus gestacional no Brasil. Brasília, p.1-36 2016 . HAN, S.; DONELAN, W; WANG, H.; REEVES, W.; YANG, L.; J. Novel autoantigens in type 1 diabetes. American Journal of Translational Research, v. 5, n. 4, p. 379-392, 2013. MARASCHIN, J. F.; MURUSSI, N.; WITTER, V.; SILVEIRO, S. P. Classificação do diabetes melito. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 95, n. 2, p. 40-46, 2010. MCLELLAN, K.; PORTERO, C.; BARBALHO, S. M.; CATTALINI, M.; LERARIO, A. C. Diabetes mellitus do tipo 2, síndrome metabólica e modificação no estilo de vida. Revista de Nutrição, v. 20, n. 5, p. 515-524, 2007. MOTTA, Valter T. Diabetes e Outras Desordens dos Carboidratos. In: Bioquímica clínica para o laboratório: princípios e interpretações. 5. ed. Porto Alegre: Médica Missau, 2003. cap.7, p. 47-49. NATHAN, D. M.; KUENEN, J.; BORG, R.; ZHENG, H.; SCHOENFELD, D.; HEINE, R. J. Translating the A1C assay into estimated average glucose values. Diabetes care, v. 31, n. 8, p. 1473-1478, 2008. NETTO, A. P.; ANDRIOLO, A.; FILHO, F. F.; TAMBASCIA, M.; GOMES, M. B.; MELO, M.; SUMITA, N. M.; LYRA, R.; CAVALCANTI, S. Atualização sobre hemoglobina glicada (HbA1C) para avaliação do controle glicêmico e para o diagnóstico do diabetes: aspectos clínicos e laboratoriais. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, v. 45, n. 1, p. 31-48, 2009. OLIVEIRA, C. S.V.; FURUZAWA, G. K.; REIS, A. F. Diabetes Mellitus do Tipo MODY. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia, v. 46, n. 2, p. 186-192, 2002. ROESE, R.BICCA, D. F.; RISSO, N. H.; PEREIRA, A. T.; NORO, M. Sensibilidade analítica da mensuração da glicosúria mediante o método da glicose oxidase. Anais... Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão, v. 11, n. 2, p. 28, 2020. SILVA, D. P.; PONTES, M. Z. R.; SOUZA, M. A.; VITOLO, M.; SILVA, J. B. A.; PESSOA-JUNIOR, A. Influence of pH on the partition of glucose-6-phosphate dehydrogenase and hexokinase in aqueous two-phase system. Brazilian Journal of Microbiology, v. 33, n. 3, p. 196-201, 2002. SILVA, M. E. R; MORY, D.; DAVINI, E. Marcadores genéticos e auto-imunes do diabetes melito tipo 1: da teoria para a prática. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia & Metabologia, v. 52, n. 2, p. 166-180, 2008. SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES (SBD). Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes (2019-2020). São Paulo: AC Farmacêutica,2019. AVALIAÇÃO DA GLICEMIA E DIABETES MELITO Caio Cesar Richter Nogueira SEM MEDO DE ERRAR O biomédico sabe que algumas indicações devem ser seguidas pelo paciente para evitar erros no teste oral de tolerância à glicose, como, por exemplo, durante os 3 dias que antecedem as 8 horas de jejum do exame, o paciente deve realizar a ingestão de, pelo menos, 150 g de carboidratos por dia; o paciente deve realizar atividade física como de costume; deve informar o uso de medicações e interferentes e durante o período de duas horas de jejum; e não deve fumar ou caminhar. O fumo diminui a digestão/absorção de carboidratos, consequentemente, na concentração de glicose sanguínea, diminuindo o aporte energético ingerido. Portanto, o biomédico não deve autorizar que seu paciente fume durante o segundo período de jejum. Além disso, o biomédico, como um excelente analista da qualidade de seu laboratório, também deve realizar treinamento da equipe de recepcionistas para evitar futuros erros. AVANÇANDO NA PRÁTICA SALVE A ESTAGIÁRIA! A escolha do tipo de anticoagulante utilizado para coleta da amostra do paciente é de extrema importância, pois essa etapa pode diminuir os erros causados durante a fase analítica dos exames laboratoriais. Marcele é uma estagiária do curso de biomedicina contratada para o setor de coleta de um laboratório de análises clínicas. Durante sua rotina, um paciente foi encaminhado para realizar o exame de hemoglobina glicada. Para essa coleta, ela precisa escolher o tubo contendo o anticoagulante correto para a análise. Você, no local de Marcele, que anticoagulante utilizaria para a coleta da amostra para o exame de hemoglobina glicada? Aplicando os conhecimentos das aulas da disciplina de Práticas em Bioquímica e Imunologia Clínica, deve-se utilizar o tubo de coloração roxa que contém o anticoagulante EDTA. Entretanto, se esse tubo acabar em seu estoque, deve-se optar pelo tubo de coloração verde que contém o anticoagulante heparina e encaminhar a amostra do paciente para o setor de análise. AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RENAL Caio Cesar Richter Nogueira PRATICAR PARA APRENDER Estima-se que, atualmente no mundo, 850 milhões de pessoas possuem diferentes tipos de doenças renais. Portanto, os laboratórios de análises clínicas devem estar atentos às novas metodologias utilizadas para verificar a função renal visando o diagnóstico precoce da doença. Nesta seção, você vai aprender quais marcadores são utilizados para avaliação da função renal; quais os métodos utilizados para a dosagem desses analitos no sangue do paciente e as indicações para a coleta da amostra. A insuficiência renal aguda (IRA) é um distúrbio em que os rins deixam de filtrar os resíduos do sangue de forma súbita e rápida. Gabriel é um aluno do sexto período de Biomedicina que está cursando a disciplina de Práticas Aplicadas em Bioquímica e Imunologia Clínica. Em sua segunda aula prática, o professor da disciplina levou o sangue e a urina de um paciente com IRA. Ao final da aula prática, o professor solicitou um relatório com os valores obtidos na dosagem da ureia, creatinina e ácido úrico, além dos resultados do exame de Elementos Anormais e Sedimentos (EAS).Sabendo que a IRA altera a função renal, quais possíveis resultados bioquímicos e de EAS você adicionaria ao relatório? CONCEITO-CHAVE Os biomarcadores utilizados para avaliar a função renal são de extrema importância para a prática clínica, uma vez que os rins exercem funções essenciais para o corpo humano como, por exemplo, a liberação de hormônios endócrinos e a regulação e excreção de analitos no sangue. Diversos analitos podem ser utilizados para avaliação do dano renal, entretanto os principais marcadores são conhecidos como compostos nitrogenados não protéicos, pois são formados por um conjunto de substâncias que possuem o átomo de nitrogênio em sua estrutura, com exceção das proteínas. Essas substâncias são formadas através do catabolismo de proteínas e ácidos nucleicos, sendo as principais: a ureia, a creatinina e o ácido úrico. A ureia é uma substância produzida pelo fígado através da oxidação das proteínas. Os aminoácidos sofrem degradação oxidativa em três circunstâncias metabólicas diferentes: a. Durante a síntese e degradação de proteínas da renovação tecidual. b. Quando a concentração de proteína ingerida excede a necessidade do organismo. c. Quando as concentrações de carboidratos estão reduzidas, como, por exemplo, no jejum e no diabetes mellitus, casos em que as proteínas são utilizadas para a formação de energia. Durante o catabolismo dos aminoácidos, o grupo amina das proteínas é removido enzimaticamente da estrutura e convertido em amônia. Visto que a amônia é tóxica ao organismo dos seres humanos, essa molécula é convertida em ureia, filtrada pelo glomérulo. Apesar de ser facilmente filtrada pelos rins, 40 a 70% da ureia é reabsorvida de forma passiva para o plasma, tornando a ureia um analito ineficiente na avaliação da taxa de filtração glomerular. Embora apresente essas limitações, alterações na concentração de ureia sérica devido à insuficiência renal aparecem primeiro se comparada a alterações na concentração de creatinina. A concentração de ureia com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperuremia e as baixas concentrações são denominadas hipouremia. As doenças que geram a hiperuremia são mais frequentemente verificadas nas análises clínicas, podendo ser divididas em pré-renal, renal e pós-renal. A hiperuremia pré-renal está correlacionada ao aumento da concentração de ureia sem aumento de creatinina sérica e ausência de dano renal. Esse quadro pode ser gerado pelo decréscimo do fluxo sanguíneo causado na insuficiência cardíaca, hemorragias e desidratação. A hiperuremia renal está relacionada à diminuição da filtração renal e ao aumento da concentração de ureia sérica gerada na insuficiência renal aguda ou crônica. A hiperuremia pós-renal está correlacionada à obstrução do trato urinário, resultando no aumento da reabsorção de ureia causado pela obstrução ureteral e da saída da bexiga. A hipouremia pode ser causada por lesões no fígado que o tornam incapaz de produzir ureia a partir da oxidação das proteínas e por desnutrição. Para a dosagem laboratorial da ureia no sangue não são necessárias orientações prévias ao paciente. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (colhido em EDTA, heparina ou citrato). É importante manter a amostra sob refrigeração para impedir a decomposição bacteriana. A ureia também pode ser dosada na urina, visando comparar sua concentração sérica. Os métodos utilizados para a dosagem de ureia em líquidos biológicos baseiam-se na reação química da ureia com outra substância, formando cor, ou com a quebra da ureia no íon amônio que é posteriormente quantificado. No método Urease, essa enzima quebra a ureia em íon Amônio e CO2. A segunda reação química ocorre em uma solução de pH alcalino, na qual o Amônio reage com o Salicilato e Hipoclorito de Sódio formando Monocloramina. A Monocloramina na presença de nitroprussiato de sódio forma o Indofenol apresenta uma molécula levemente esverdeada. Essa cor pode ser lida utilizando espectrofotômetro, no comprimento de onda entre 570 a 610 nm. No método Urease/Glutamato-desidrogenase, a quebra da ureia em íon Amônio e CO2 também ocorre. A enzima Glutamato-desidrogenase é adicionada junto ao NH3 e α-Cetoglutarato, oxidando NADH para NAD+. A oxidação de NADH a NAD+ pode ser medida pela diminuição da absorbância, que é proporcional à concentração de Ureia na amostra. Esse método diminui as interferências causadas por desidrogenases e amônia na amostra. A creatinina é formada por uma reação de desidratação não enzimática da molécula de creatina. A creatina é formada por duas reações enzimáticas. A primeira reação ocorre nos rins e é mediada pela enzima arginina: glicina amidinotransferase que catalisa a reação de transaminação dos aminoácidos argininae glicina em ácido guanidinoacético (GAA). O GAA é enviado para o sangue e chega ao fígado, onde ocorre a segunda reação mediada pela enzima guanidinoacetato N-metiltransferase, formando a creatina. Uma quantidade similar de creatina é obtida através da alimentação. A creatina endógena e exógena é fosforilada pela enzima creatina quinase, formando, assim, fosfocreatina que pode ser usada no músculo esquelético. Cerca de 1% a 2% da creatina livre no músculo é convertida de forma espontânea e irreversivelmente em creatinina diariamente. A creatinina é filtrada pelos rins, não sofre metabolização e não é reabsorvida nos túbulos renais, entretanto 25% da creatinina é proveniente da secreção. A quantidade de creatinina excretada é proporcional à massa muscular do indivíduo, portanto é proporcional ao sexo e idade do paciente. ASSIMILE A fosfocreatina é formada pela creatina que recebeu um grupo fosfato. Essa molécula é clivada no músculo para reconstituir a molécula de ATP durante a atividade física. A concentração de creatinina com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hipercreatinemia e as baixas concentrações são denominadas hipocreatinemia. As doenças que geram a hipercreatinemia são mais frequentes nas análises clínicas, podendo ser divididas em pré-renal, renal e pós-renal. A hipercreatinemia pré-renal está correlacionada ao aumento da concentração de creatinina sem aumento de ureia sérica e ausência de dano renal. Esse quadro pode ser gerado por atrofia/necrose muscular esquelética, insuficiência cardíaca congestiva, diabetes mellitus não controlada e uso excessivo de diuréticos. A hipercreatinemia renal está correlacionada à diminuição da filtração renal e ao aumento da concentração de creatinina sérica gerada na insuficiência renal aguda ou crônica. A hipercreatinemia pós-renal está correlacionada à hipertrofia prostática e a cálculos renais. A hipocreatinemia não desperta interesse clínico. Para a dosagem laboratorial da creatinina no sangue não é necessário jejum prévio. O paciente deve evitar exercício excessivo durante as 8 horas que antecedem o exame e deve evitar a ingestão de carne vermelha em excesso durante 24 horas. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (colhido em Heparina, Oxalato, Fluoreto, Citrato ou EDTA). O método de Jaffé modificado baseia-se na reação da creatinina com o Ácido Pícrico em meio alcalino formando um complexo de coloração amarelo-avermelhado denominado Creatinina-Picrato. Posteriormente, é adicionado um reagente ácido, desfazendo o complexo Creatinina-Picrato, permanecendo apenas a cor referente a outros cromogênicos presentes no sangue do paciente, como a glicose e o ascorbato, entretanto níveis de acetoacetato, acetona e bilirrubinas podem interferir com a reação. Por diferença entre as leituras obtidas nos distintos pHs, obtém-se a concentração da creatinina. O método Creatinina Amidohidrolase é baseado através da ação dessa enzima que catalisa a reação na qual a creatinina é convertida em creatina. A enzima Creatina Amidinohidrolase é adicionada para catalisar a reação de hidrólise da creatina em Sarcosina e Uréia. A molécula de Sarcosina sofre ação da enzima Sarcosina Oxidase, produzindo Glicina, Formaldeído e Peróxido de Hidrogênio (H2O2). A enzima peroxidase catalisa a reação entre o H2O2, TOPS e 4-aminoantipirina, produzindo Quinoneimina. A absorbância da amostra pode ser determinada através de espectrofotometria utilizando o comprimento de onda de 546 nm. A dosagem de creatinina é amplamente utilizada para a avaliação da função renal, entretanto pacientes podem ter uma taxa de filtração glomerular (TFG) significativamente reduzida com valores normais de creatinina sérica. Isso ocorre devido à influência de fatores como composição muscular, atividade física, dieta e estado de saúde na concentração sérica de creatinina. Portanto, a depuração da creatinina endógena (DCE) é mais utilizada para avaliação da função renal. A depuração pode ser definida como o volume mínimo de plasma sanguíneo que contém a quantidade total de determinada substância excretada na urina em 1 minuto. A depuração renal consiste na passagem de uma substância pela filtração glomerular e sua posterior eliminação na urina. A depuração de uma substância que não é reabsorvida nem secretada pelos túbulos e cuja concentração plasmática é idêntica à do filtrado glomerular pode ser usada para avaliação da TFG, sendo a creatinina uma excelente substância para essa função. Para avaliação da depuração de creatinina endógena (DCE) deve-se utilizar o volume de urina coletado durante 24 horas e pode ser calculado através da fórmula: DCE não corrigida = (creatinina urinária x volume urinário de 24h) / creatinina sérica X 1440 minutos. A excreção diária de creatinina diminui com a progressão da idade devido a uma redução progressiva na massa muscular. Além disso, condições como obesidade, em que um aumento do tecido adiposo determina uma redução na porcentagem da massa muscular relacionada ao peso corporal, levam a uma menor excreção diária de creatinina por kg de peso corporal. Portanto, foi criado um cálculo para depuração de creatinina de acordo com a superfície corporal: DCE ajustada = (Depuração não corrigida X 1,73) / Superfície corporal REFLITA Como visto anteriormente, a massa muscular e a obesidade podem alterar a depuração da creatinina endógena. Sabendo disso, é possível que outros fatores alterem a DCE? Se a resposta for afirmativa, como essas alterações podem interferir no diagnóstico médico? O Ácido Úrico é formado pelo catabolismo dos nucleotídeos púricos, sendo eles a adenina e a guanina. Esses nucleotídeos sofrem ação da enzima 5’-nucleotidase que remove seus grupos fosfato formando Guanosina e Adenosina. A enzima Adenosina-desaminase remove o grupo amina da Adenosina, formando Inosina. Guanosina e Inosina sofrem ação da enzima Nucleosidade para remoção da ribose e formam Guanina e Hipoxantina, respectivamente. A molécula de Guanina perde seu grupo amina através da catálise da enzima Guanina-desaminase e a molécula de Hipoxantina sofre oxidação da enzima Xantina-oxidase, para que ambas formem a molécula de Xantina. Na última reação química, a enzima Xantina-oxidase adiciona uma hidroxila à molécula de Xantina, formando o Ácido Úrico. Como o corpo mantém a renovação celular continuamente, quantidades constantes de ácido úrico são excretadas. O ácido úrico é um ácido fraco e a sua forma ionizada, o urato monossódico, é a forma encontrada no plasma humano. A concentração de ácido úrico com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperuricemia e as baixas concentrações são denominadas hipouricemia. As doenças que geram hiperuricemia estão correlacionadas com o acúmulo de urato sérico, podendo ser devido ao aumento da sua síntese ou a defeitos em sua eliminação. A solubilidade de urato de sódio nos líquidos corporais é de cerca de 6,4 mg/100 ml, portanto, quando essa concentração é ultrapassada, cristais são formados e se depositam nas articulações gerando um processo inflamatório denominado Gota ou Artrite Gotosa. A hipouricemia está correlacionada aos níveis reduzidos de ácido úrico (<2 mg/dL) e são encontrados nas doenças hepatocelulares severas. Para a dosagem laboratorial do ácido úrico no sangue não são necessárias indicações prévias ao paciente. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (colhido em EDTA ou heparina). É recomendada a separação do soro/plasma o mais rápido possível das células. Métodos exclusivamente químicos foram utilizados durante anos para a dosagem de ácido úrico no sangue do paciente, entretanto a necessidade do uso de substâncias tóxicas e que geram instabilidade nas soluções fizeram com que esses métodos fossem abandonados. Atualmente, o método mais utilizado emprega a enzima Uricase. A utilização da enzima confere maior especificidade na reação química, na qual a uricase catalisa a oxidação do ácido úricoà alantoína, liberando peróxido de hidrogênio. O peróxido de hidrogênio reage com diclorohidroxibenzeno sulfonato e 4-aminoantipirina em uma reação catalisada pela enzima peroxidase, formando um cromógeno de coloração cereja. A intensidade da cor cereja formada é diretamente proporcional à concentração de Ácido Úrico na amostra. Os níveis séricos de alguns eletrólitos podem auxiliar no diagnóstico de doenças renais, sendo os principais a dosagem de sódio e potássio. A obtenção do íon Sódio está intimamente relacionada à dieta. A absorção desse eletrólito no intestino delgado é dependente da proteína de transporte sódio-glicose (SGLT1) e da bomba de Sódio-Potássio. Uma vez absorvido, o sódio se encaminha para o líquido extracelular, onde participa de mecanismos de controle osmótico e potencial de ação. Sua concentração sérica pode ser alterada através do consumo excessivo do Cloreto de Sódio ou pela excreção renal. Após a filtração renal do sódio, cerca de 2/3 é reabsorvido no túbulo proximal por via paracelular. Outra parte desse sódio utiliza de transportadores Sódio/Glicose, Sódio/Aminoácidos, Sódio/Fosfato na membrana luminal e, posteriormente, encaminhado para o sangue via bomba de sódio-potássio presente na membrana basolateral. A reabsorção do sódio também pode ser influenciada pela liberação do hormônio aldosterona. A concentração de sódio com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hipernatremia e as baixas concentrações são denominadas hiponatremia. As doenças renais estão mais correlacionadas à hiponatremia, uma vez que os rins lesados são incapazes de eliminar água do corpo e o excesso de água ingerida produz uma diluição do sódio sérico. A hipernatremia está relacionada à insuficiência renal. Para a dosagem laboratorial do sódio no sangue não são necessárias orientações prévias ao paciente. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (somente heparina). É recomendada a separação do soro/plasma em até três horas após a coleta. O método β-Galactosidase é amplamente utilizado para a dosagem de sódio sérico. Para essa metodologia, o substrato Nitrofenil -ß-D-Galactopiranose é adicionado junto à enzima β-Galactosidase que utiliza o sódio da amostra como cofator enzimático, formando Nitrofenil. A absorbância a 405nm do produto Nitrofenil é proporcional à concentração de sódio sérico. A obtenção do íon Potássio também está intimamente relacionada à dieta. O principal mecanismo de absorção do potássio é a difusão passiva paracelular, que ocorre em função do gradiente de concentração no lúmen intestinal. Uma vez absorvido, o potássio se encaminha para o meio intracelular, onde participa de mecanismos de controle osmótico e potencial de ação. Sua concentração sérica pode ser alterada através do consumo excessivo do Cloreto de Potássio ou pela excreção renal. Após a filtração renal do potássio, cerca de 70% são reabsorvidos no túbulo proximal junto à água e ao sódio. Parte do potássio ainda é reabsorvido na alça de Henle e no túbulo distal. Na membrana luminal do túbulo distal ocorre o transporte dos íons sódio, cloro e potássio via um cotransportador Na+/K+/Cl-. Quando esses íons chegam ao meio intracelular, o sódio é reabsorvido de forma ativa pela bomba de Na+/K + presente na membrana basal. O cloro também é reabsorvido na membrana basal por canais de cloreto dependentes de voltagem. Já o potássio retorna ao lúmen tubular através de canais de potássio retificadores de entrada (Kir). Essa recirculação local do potássio é necessária para que haja substrato para o cotransportador Na+/K+/Cl-. A concentração de potássio com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperpotassemia e as baixas concentrações são denominadas hipopotassemia ou hipocalemia. Para a dosagem laboratorial do potássio no sangue não são necessárias orientações prévias ao paciente. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma. A amostra deve ser totalmente isenta de hemólise, devido à alta concentração de potássio no meio intracelular. Não deve ser utilizada a técnica de abrir e fechar a mão para evidenciação das veias durante a coleta. O método para dosagem de potássio é semelhante ao usado para a dosagem de sódio, com exceção da substituição da enzima β-Galactosidase pela enzima piruvatoquinase. EXEMPLIFICANDO Outros biomarcadores podem ser utilizados para avaliação da função renal, como, por exemplo, a proteinúria, a albuminúria, o dismorfismo eritrocitário, a Cistatina C, a Molécula-1 de lesão renal e a Interleucina-18. FAÇA A VALER A PENA Questão 1 A ureia foi descoberta pelo químico Hilaire Marin Rouelle, em 1773, e foi a primeira substância orgânica sintetizada artificialmente, em 1828, por Friedrich Woehler, obtida a partir do aquecimento do cianato de amônio. Esta síntese derrubou a teoria de que substâncias orgânicas só poderiam ser sintetizadas pelos organismos vivos. No corpo humano a ureia é sintetizada no __________ através da degradação dos aminoácidos. Dentre as situações em que ocorre a degradação dos aminoácidos estão: durante a síntese e __________ de proteínas da renovação tecidual; quando a concentração de __________ ingerida excede a necessidade do organismo; durante períodos de jejum prolongados e diabetes mellitus não controlada. Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas. a) cérebro / degradação / carboidratos. b) fígado / degradação / carboidratos. c) cérebro / degradação / proteínas. d) fígado / produção / proteínas. e) fígado / degradação / proteínas. Questão 2 A escolha do método utilizado para análise de ureia no sangue do paciente é um passo muito importante para o laboratório de análises clínicas, pois requer avaliação de alguns parâmetros, como a repetibilidade, a reprodutibilidade, sensibilidade, especificidade, custo e praticidade dos métodos. A avaliação da repetibilidade de dois métodos foi calculada a partir de 40 determinações sucessivas, utilizando 3 amostras com concentrações diferentes, obtendo-se os seguintes resultados: Considerando os dados apresentados nas tabelas, assinale a alternativa correta. a. O desvio padrão da amostra 1 no método de Urease foi maior que no método Urease/Glutamato-desidrogenase. b. A concentração média da amostra 2 no método de Urease foi maior que no método Urease/Glutamato-desidrogenase. c. O desvio padrão da amostra 3 no método de Urease/Glutamato-desidrogenase foi menor que no método Urease. d. A concentração média da amostra 1 no método de Urease/Glutamato-desidrogenase foi menor que no método Urease. e. Ambos os métodos possuem repetibilidade iguais. Questão 3 Um homem de 70 anos de idade chega ao setor de urgência do hospital apresentando fadiga, diminuição do apetite, náuseas, vômitos, dificuldade respiratória e micção frequente. Após a avaliação por exames de imagem, o paciente foi diagnosticado com Nefrite túbulo-intersticial. Para acompanhamento do caso, o médico solicitou algumas dosagens laboratoriais, como descritas na tabela: Outras informações do paciente: Volume da urina coletada em 24 horas= 1875 mL Peso = 70 Kg Altura = 170 cm Tomando como base as informações apresentadas na Tabela 1, avalie as informações a seguir. I. A depuração de creatinina não corrigida desse paciente é de aproximadamente 23,98 mL/min. II. A creatinina sérica desse paciente está dentro dos valores de referência. III. A depuração de creatinina corrigida desse paciente é de aproximadamente 23,04 mL/min. IV. A creatinina urinária desse paciente está dentro dos valores de referência. Considerando o contexto apresentado, é correto APENAS o que se afirma em: a. I e II. b. III e IV. c. I, II e III. d. I, III e IV. e. II, III e IV. REFERÊNCIAS CAVANAUGH, C.; PERAZELLA, M. A. Urine Sediment Examination in the Diagnosis and Management of Kidney Disease: Core Curriculum 2019. The American Journal of Kidney Diseases, v. 73, n. 2, p. 258-272, 2019. DUSSE, L. M. S.; RIOS, D. R. A.; SOUSA, L. P. N.; MORAES,R. M. M. S.; DOMINGUETI, C. P.; GOMES, K. B. Biomarcadores da função renal: do que dispomos atualmente? Revista Brasileira de Análises Clínicas, v. 49, n. 1, p. 41, 2017. LEHNINGER, A.; NELSON, D. L. Biossíntese de aminoácidos, nucleotídeos e moléculas relacionadas. In: Princípios de Bioquímica de Lehninger. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2019. cap. 22, p. 884. LUFT, F. C. Biomarkers and predicting acute kidney injury. Acta physiol Oxford, v. 231, n. 1, p. 1-12, 2021. MOTTA, Valter T. Diabetes e outras desordens dos carboidratos. In: Bioquímica clínica para o laboratório: princípios e interpretações. 5. ed. Porto Alegre: Médica Missau, 2003. cap.15, p. 227-240. OSTOJIC, S. M.; NIESS, B.; STOJANOVIC, M.; OBRENOVIC, M. Metabolismo da creatina e perfis de segurança após administração oral de ácido guanidinoacético de seis semanas em humanos saudáveis. International Journal of Medical Sciences, v. 10, n. 2, p. 141-147, 2013. AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RENAL Caio Cesar Richter Nogueira SEM MEDO DE ERRAR O desenvolvimento da IRA está relacionado a uma resposta inflamatória renal causada por diferentes tipos de lesão. Essa lesão induz que as células endoteliais e tubulares renais liberem mediadores químicos, induzindo a migração de leucócitos para o local. Durante a migração, os neutrófilos liberam citocinas pró-inflamatórias que podem agravar a lesão tubular, gerando descamação de células viáveis e apoptose. A obstrução tubular pelas células descamadas, a vasoconstrição renal devido à liberação de mediadores vasoativos e o efeito direto no glomérulo caracteriza a IRA. Para o diagnóstico laboratorial, a dosagem da concentração sérica de ureia e de creatinina são os padrões-ouro. Na ausência de filtração glomerular, a ureia aumenta de 10 a 15 mg/dL/dia e a creatinina aumenta de 1,0 a 1,5 mg/dL/dia no sangue do paciente. Na Nefrite intersticial, é possível observar no EAS a presença de leucócitos, hemácias, células epiteliais, cilindros leucocitários e proteinúria leve. AVANÇANDO NA PRÁTICA UM LABORATÓRIO NOVO PARA CHAMAR DE MEU!!! Diferentes métodos são utilizados para a dosagem de ureia em laboratórios de análises clínicas. Cada método possui variações em sua especificidade, sensibilidade e precisão. Um biomédico foi contratado para implementar o setor de bioquímica do laboratório. Depois da análise de custos, o biomédico pode escolher entre o método de Urease ou o método Urease/Glutamato-desidrogenase, sendo seu objetivo diminuir a probabilidade de interferências no método. No lugar do biomédico, qual método você escolheria para ser utilizado no laboratório? O biomédico sabe que, em ambos os métodos, existe a enzima Urease que tem como função quebrar a ureia em íon Amônio e CO2. No método Urease o amônio reage com o Salicilato e Hipoclorito de Sódio, formando Monocloramina, que posteriormente forma o Indofenol. Já no método Urease/Glutamato-desidrogenase, a enzima Glutamato-desidrogenase é adicionada junto ao NH3 e α-Cetoglutarato, oxidando NADH para NAD+. A adição da enzima confere maior especificidade ao método diminuindo interferências causadas por outras desidrogenases e amônia na amostra. AVALIAÇÃO DA LESÃO E FUNÇÃO HEPÁTICA Caio Cesar Richter Nogueira PRATICAR PARA APRENDER O fígado é um dos órgãos mais importantes do corpo humano, possuindo inúmeras funções, tais como a regulação do metabolismo das macromoléculas, síntese de proteínas, síntese e degradação de hormônios, armazenamento de glicogênio e excreção de substâncias tóxicas. Portanto, nesta seção você vai aprender os marcadores utilizados para avaliação da função hepática; métodos utilizados para a dosagem desses analitos no sangue e orientações para a coleta da amostra. Em inúmeras doenças hepatobiliares os níveis séricos das enzimas alanina aminotransferase e aspartato aminotransferase podem estar aumentadas, como, por exemplo, nas hepatites virais e na cirrose. Um biomédico, responsável pelo setor de bioquímica recebe em seu laboratório uma amostra de um paciente com suspeita de lesão hepática para dosagem das transaminases e do cálculo do coeficiente de ritis. Após avaliação das transaminases, os valores das concentrações de Alanina aminotransferase e Aspartato aminotransferase encontrados foram de 69 U/L e 121 U/L, respectivamente. Entretanto, o biomédico não lembra da fórmula utilizada para determinar o coeficiente de ritis. No lugar do biomédico, utilizando os resultados encontrados de ALT e AST, qual seria o valor obtido do coeficiente de ritis? O valor do coeficiente indica uma doença aguda ou crônica? Reflita: você já ouviu alguém dizer que se arrependeu de ter estudado? Certamente não. Portanto, estude sempre. CONCEITO-CHAVE O perfil hepático, também conhecido como teste de função hepática, é utilizado para avaliar e acompanhar a funcionalidade do fígado e das doenças hepáticas. Os exames realizados nesse grupo podem variar de acordo com a solicitação médica, entretanto geralmente é composto pelos seguintes testes: Bilirrubinas totais, direta e indireta; Alanina aminotransferase; Aspartato aminotransferase; Gama-glutamiltransferase, Fosfatase Alcalina e Albumina. A bilirrubina é o produto final do catabolismo do grupo prostético Heme. Aproximadamente 250-400 mg de bilirrubina são produzidos diariamente pelo corpo humano. Cerca de 75% da concentração de bilirrubina tem origem na renovação de hemácias senescentes e 25% vêm da eritropoiese ineficaz e de outras hemeproteínas. O ferro da molécula heme retorna ao plasma, liga-se à transferrina e é transportado até o fígado. Já a protoporfirina IX é clivada no sistema retículo endotelial em biliverdina mediado pela enzima heme oxigenase. A biliverdina sofre ação da enzima biliverdina redutase para formar a bilirrubina não conjugada ou bilirrubina indireta (BI). A bilirrubina indireta é insolúvel em água, portanto possui dificuldade de ser transportada pela corrente sanguínea. Para isso, a BI precisa ser ligada à proteína plasmática albumina que a transporta pelo sangue até o fígado. Os hepatócitos possuem um sistema seletivo e altamente eficiente para a remoção da bilirrubina não conjugada do plasma, denominado transportador de ânions orgânicos. No interior do hepatócito, a bilirrubina liga-se à ligandina, uma proteína citosólica que auxilia o transporte para o retículo endoplasmático, onde a enzima glicuroniltransferase catalisa a conjugação da bilirrubina com o ácido UDP-glicurônico formando monoglicuronídeo e, posteriormente, em diglicuronídeo de bilirrubina, também chamada bilirrubina conjugada ou bilirrubina direta (BD). A bilirrubina direta é excretada através do polo biliar dos hepatócitos que está em íntimo contato com os canalículos biliares e, posteriormente, no intestino. No cólon intestinal, a bilirrubina direta sofre ação da enzima glicuronidase bacteriana para formar urobilinogênio, que é eliminado nas fezes, na forma de estercobilina. Uma parte da bilirrubina é reabsorvida através da mucosa intestinal e volta ao fígado pelo sistema porta, constituindo o sistema entero-hepático. A concentração de bilirrubina com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperbilirrubinemia e as baixas concentrações são denominadas hipobilirrubinemia. As doenças que geram a hiperbilirrubinemia são mais frequentes nas análises clínicas, podendo ser divididas em hiperbilirrubinemia indireta e direta. Em ambas as formas, quando as concentrações de bilirrubina excedem 3 mg/dL no sangue, torna-se evidente o aparecimento do sintoma denominado icterícia, caracterizado pela coloração amarelada da pele, olhos e mucosas. Na hiperbilirrubinemia indireta existe o aumento sérico de bilirrubina não conjugada, impossibilitando que o hepatócito absorva toda essa concentração. Esse quadro pode ocorrer principalmente no recém-nascido pela pouca atividade da enzima glicuroniltransferase e por doenças hemolíticas. Já na hiperbilirrubinemia direta existe o aumento sérico de bilirrubina conjugada,indicando comprometimento na captação, armazenamento ou excreção da bilirrubina, que pode ser gerada por complicações em vários órgãos, principalmente por lesões hepatocelulares e infecções virais. REFLITA Como acabamos de estudar, a hiperbilirrubinemia indireta está principalmente relacionada a doenças hemolíticas. Você consegue pensar em alguma doença desse tipo? Além disso, quais exames imunohematológicos podem ser realizados para auxiliar no diagnóstico dessas doenças? Para a dosagem laboratorial da bilirrubina no sangue, atualmente, não são necessárias orientações prévias ao paciente. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (coletada em EDTA ou Heparina) livres de hemólise. É importante manter a amostra no escuro até a realização do exame. ASSIMILE A ação da luz pode alterar a estrutura da molécula de bilirrubina produzindo fotoprodutos, como a lumirrubina. Esses fotoprodutos não são dosados nos métodos utilizados para avaliação da bilirrubina. A incidência da luz pode destruir, em uma hora, até 50% da bilirrubina presente na amostra. O principal método utilizado para a dosagem de bilirrubina baseia-se na reação com o Ácido Sulfanílico Diazotado, formando um complexo denominado Azobilirrubina, de coloração vermelha. Essa cor pode ser lida através de espectrofotometria utilizando o comprimento de onda entre 500 e 550 nm. A Bilirrubina Direta é dosada em meio aquoso, já para a dosagem da Bilirrubina total (Bilirrubina Direta + Bilirrubina Indireta), deve-se adicionar álcool para permitir a solubilidade da bilirrubina indireta. As transaminases são enzimas que catalisam a transferência do grupo amino de um aminoácido para um α- cetoácido. Essas enzimas são denominadas a partir da molécula que doa o grupo amino. O fígado produz mais de 60 transaminases, entretanto apenas duas possuem importância clínica, sendo elas a alanina aminotransferase e a aspartato aminotransferase. No citoplasma do hepatócito, a enzima alanina aminotransferase (ALT), também conhecida como transaminase glutâmico pirúvica (TGP), catalisa a reação de doação do grupo amino da molécula de alanina para o α-cetoglutarato, formando piruvato e glutamato. Já a enzima aspartato aminotransferase (AST), também conhecida como transaminase glutâmico-oxalacética (TGO), catalisa a reação de doação do grupo amino da molécula de glutamato para o Oxaloacetato, formando α-cetoglutarato e aspartato no interior da mitocôndria. A concentração de transaminases com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hipertransaminasemia e as baixas concentrações são denominadas hipotransaminasemia. O aumento dos níveis séricos das aminotransferases estão relacionados a hepatopatias. Uma vez que as concentrações de ALT no citoplasma do hepatócito são maiores do que os níveis de AST (80% no interior da mitocôndria) seus níveis séricos podem ser utilizados para avaliação da gravidade da lesão. A razão das atividades séricas de AST e ALT foi descrita por Fernando De Ritis, em 1957, e é conhecida como coeficiente de Ritis. O coeficiente consiste na divisão da concentração plasmática de AST pela concentração plasmática de ALT. Coeficiente de Ritis = Concentração de AST ___________________________ Concentração de ALT Se o valor da divisão for maior que 1, isso pode indicar lesões crônicas, como a cirrose crônica e hepatites crônicas. Caso o valor da divisão for menor que 1, pode ser indicativo de lesões agudas, como nas hepatites agudas. Para a dosagem laboratorial das transaminases no sangue, não é necessário jejum prévio. O paciente não pode ter realizado eletroneuromiografia nos últimos três dias e biópsia muscular ou hepática nos últimos 5 dias. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (coletada em EDTA ou Heparina) livres de hemólise. O método utilizado para a dosagem das transaminases baseia-se na função de cada enzima. A ALT catalisa a transferência do grupamento amina da Alanina para α-Cetoglutarato, formando piruvato e glutamato. O Piruvato, em presença de outra enzima denominada lactato desidrogenase, reage com o NADH, reduzindo o Lactato, e o NADH oxida-se a NAD+. A velocidade de oxidação é proporcional à atividade da ALT na amostra. A enzima AST catalisa a transferência do grupo amina do Aspartato para o α-Cetoglutarato, formando Glutamato e Oxalacetato. O Oxalacetato em presença de outra enzima, denominada malato desidrogenase, reage com o NADH, reduzindo o Malato e o NADH oxida-se a NAD+. A velocidade de oxidação é proporcional à atividade da AST na amostra. A γ-glutamiltransferase (γ-GT), também conhecida como γ-glutamiltranspeptidase, é uma glicoproteína heterodimérica que catalisa a transpeptidação e hidrólise do grupo -glutamil da glutationa e substâncias relacionadas. A γ-GT está presente principalmente nas vias biliares, rins, intestinos, próstata, pâncreas, pulmões, cérebro e coração. Não existe uma nomenclatura técnica para denominar o aumento ou diminuição dos níveis séricos das γ-glutamiltransferase. O aumento dos níveis séricos de γ-GT estão relacionados ao dano hepático ou dos ductos biliares, abuso de álcool e doenças renais crônicas. Para a dosagem laboratorial da γ-GT no sangue, não é necessário jejum prévio. O paciente não deve ingerir álcool por 24 horas antes da prova. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (Heparina ou EDTA). Anticoagulantes contendo Citrato, Fluoreto ou Oxalato inibem a atividade da Gama GT. No método para a dosagem de γ-GT é adicionado γ-Glutamil-3-Carboxi-4-Nitroanilida e Glicilglicina na presença da enzima γ-GT, resultando na formação de γ -Glutamilglicilglicina e 5-Amino-2-Nitrobenzoato. A velocidade de formação da 5-Amino-2-Nitrobenzoato em 405 nm é proporcional à atividade da enzima. As fosfatases alcalinas (FA) são um grupo de isoenzimas que catalisam a hidrólise de ésteres de fosfato orgânicos em pH alcalina, tendo zinco e magnésio como cofatores. Existem diversas isoenzimas expressas na mucosa do intestino delgado, nos canalículos biliares, túbulos renais, baço, osteoblastos, leucócitos e na placenta. Cerca de 80% da enzima no soro é liberada pelo fígado e os ossos. No fígado, as FA estão presentes na membrana dos canalículos dos hepatócitos. Os níveis de FA sérica variam com a idade em indivíduos normais e seus níveis são elevados durante a infância devido ao crescimento ósseo. A concentração de FA com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperfosfatasemia alcalina, e as baixas concentrações são denominadas de hipofosfatemia alcalina. As doenças que geram a hiperfosfatasemia alcalina são mais frequentes nas análises clínicas. A hiperfosfatasemia alcalina pode ser gerada em qualquer tipo de obstrução hepática, podendo permanecer em níveis elevados por até 1 semana. Os níveis séricos de FA também podem estar elevados em doenças ósseas caracterizadas pela hiperatividade osteoblástica. Para a dosagem laboratorial da FA no sangue, não é necessário jejum prévio, evitando alimentos ricos em lipídeos. A amostra utilizada pode ser soro ou plasma (Heparina). As hemácias possuem altas concentrações de FA, portanto a amostra não pode conter hemólise. No método para dosagem de FA é adicionado p-nitrofenilfosfato e AMP na presença da enzima FA, resultando na formação de p-Nitrofenol. A velocidade de liberação do p-Nitrofenol é proporcional à atividade enzimática da Fosfatase Alcalina da amostra. A albumina é uma proteína plasmática produzida pelos hepatócitos, composta por uma cadeia peptídica de 585 aminoácidos (66,5 KDa) com abundância de resíduos de lisina, arginina, glutamato e aspartato. Em um humano adulto saudável, a albumina é sintetizada a uma taxa entre 12 e 25 g por dia. Suas principais funções são a geração da pressão coloidosmótica e transporte de bilirrubina, lipídios, hormônios lipossolúveis e fármacos. A concentração de albumina com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperalbuminemia e as baixas concentrações são denominadashipoalbuminemia. O aumento dos níveis séricos de albumina é raro, como nos casos de carcinomatose metastática e desidratação aguda. Já a hipoalbuminemia é encontrada nas doenças crônicas hepáticas, principalmente na cirrose, insuficiência renal aguda, pacientes renais crônicos e em indivíduos com dificuldade na absorção de nutrientes. Para a dosagem laboratorial da albumina no sangue, não é necessário jejum prévio. A coleta deve ser feita preferencialmente pela manhã, devido ao efeito circadiano. Durante a coleta, deve-se evitar a estase prolongada. A amostra utilizada deve ser soro livre de hemólise. EXEMPLIFICANDO A concentração de albumina na urina coletada durante 24 horas é de até 30 mg, no entanto, quando são verificados níveis entre 30 e 299 mg, esse quadro pode ser denominado microalbuminúria. Algumas das situações em que pode ser verificada a microalbuminúria são: diabetes, hipertensão, doenças cardiovasculares, doenças renais e alimentação rica em proteínas. No método de dosagem da albumina é utilizado o reagente Verde Bromocresol. A albumina liga-se ao Verde de Bromocresol formando um complexo corado que exibe um espectro de absorção diferente do corante no seu estado livre, permitindo a dosagem da concentração da albumina. Os analitos utilizados para a avaliação da função hepática são de grande auxílio no diagnóstico de doenças hepáticas, entretanto devem ser utilizados em conjunto e em associação com o grau de evolução da doença (agudo ou crônico). FAÇA A VALER A PENA Questão 1 A concentração de Fosfatase Alcalina com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada hiperfosfatasemia alcalina, e as baixas concentrações são denominadas hipofosfatasemia alcalina. A enzima Fosfatase Alcalina é uma enzima responsável pela hidrólise de ésteres de fosfato orgânicos em pH __________. Essa enzima está presente em inúmeros órgãos, entretanto a concentração da fosfatase alcalina presente no sangue está relacionada aos danos no __________ e nos __________. Assinale a alternativa que preenche corretamente as lacunas. a. alcalino / fígado / ossos. b. ácido / fígado / ossos. c. alcalino / cérebro / ossos. d. ácido / fígado / adipócitos. e. alcalino / cérebro / adipócitos. Questão 2 Os prefixos são morfemas utilizados antes dos radicais com intuito de modificar o sentido, entretanto não produzem mudanças de classe gramatical. Os prefixos hiper e hipo são amplamente utilizados nas análises clínicas com intenção de indicar que a concentração de um analito está aumentada ou diminuída nos líquidos biológicos. Esses prefixos são utilizados em alguns marcadores de avaliação da função hepática. Tomando como referência as informações apresentadas, julgue as afirmativas a seguir em (V) Verdadeiras ou (F) Falsas. ( ) O termo hipoalbuminemia é utilizado quando um paciente apresenta níveis baixos de albumina no sangue. ( ) O termo hiperbilirrubinemia direta é utilizado quando um paciente apresenta níveis elevados de bilirrubina não conjugada no sangue. ( ) O termo hiperbilirrubinemia indireta é utilizado quando um paciente apresenta níveis elevados de bilirrubina indireta no sangue. ( ) O termo hipofosfatasemia alcalina é utilizado quando um paciente apresenta níveis elevados de fosfatase alcalina no sangue. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA. a. V - V - F - F. b. F - F - V - V. c. V - F - V - F. d. V - F - V - V. e. V - V - V - F. Questão 3 Um homem, com idade de 20 anos, chega ao hospital no setor de urgência apresentando febre, fadiga, perda de apetite e dores abdominais. O paciente também relata que sua urina encontra-se escura, suas fezes claras e que compartilha seringas com outros indivíduos no intuito de utilizar drogas ilícitas. Durante a avaliação física, o médico percebe que a mucosa ocular do paciente encontra-se extremamente amarelada. Após avaliação clínica, o médico suspeita de hepatite viral e solicita a dosagem laboratorial de bilirrubina, ALT, AST e albumina. Tomando como base as informações apresentadas na Tabela 1, avalie as informações a seguir. I. O aumento na concentração sérica de bilirrubina direta pode estar relacionado ao dano celular gerado pela lesão das células hepáticas. II. A concentração sérica de alanina aminotransferase e aspartato aminotransferase indicam que a lesão gerada pela hepatite viral é aguda. III. A concentração sérica de albumina encontra-se dentro dos valores de referência, pois seu aumento está relacionado a lesões crônicas hepáticas. IV. A concentração de bilirrubina indireta também deveria estar aumentada, pois em hepatites agudas a lesão do hepatócito libera bilirrubina indireta no sangue. Considerando o contexto apresentado, assinale a alternativa que apresenta as afirmativas corretas. a. I e II, apenas. b. III e IV, apenas. c. I, II e III, apenas. d. I, III e IV, apenas. e. II, III e IV, apenas. REFERÊNCIAS FAN, Y.; JIN, X.; MAN, C.; GONG, D. Association of serum gamma-glutamyltransferase with chronic kidney disease risk: a meta-analysis. Free Radical Research, v. 52, n. 8, p. 819-825, 2018. LOWE, D.; SANVICTORES, T.; JOHN, S. Alkaline Phosphatase. In: StatPearls. StatPearls Publishing Treasure Island. 2020. MARTELII A. Síntese e metabolismo da bilirrubina e fisiopatologia da hiperbilirrubinemia associados à Síndrome de Gilbert: revisão de literatura. Revista Médica de Minas Gerais. v. 22, n. 2, p. 216-220, 2012. MOTTA, V. T. Diabetes e Outras Desordens dos Carboidratos. In: Bioquímica clínica para o laboratório: princípios e interpretações. 5. ed. Porto Alegre: Médica Missau, 2003. cap. 15, p. 227-240. NDREPEPA, G.; COLLERAN, R.; KASTRATI, A. Gamma-glutamyl transferase and the risk of atherosclerosis and coronary heart disease. Clinica Chimica Acta. v. 1, n. 476, p. 130-138, 2018. NÓBREGA, B. P.; LIMA, L. J. L.; FONSECA, D. V.; TENÓRIO, A. P. O.; TENÓRIO, P. P.; LOPES, M. R. A importância da análise sedimentoscópica diante dos achados físico-químicos normais no exame de urina. Revista Brasileira de Análises Clínicas, v. 51, n. 1, p. 58-64, 2020. PALIOGIANNIS, P.; ZINELLU, A. Bilirubin levels in patients with mild and severe Covid-19: A pooled analysis. Liver International, v. 40, n. 7, p. 1787-1788, 2020. PERLMAN, J. M.; VOLPE, J. J. Bilirubin. In: Volpe’s Neurology of the Newborn. 6. ed. Philadelphia: Elsevier. 2018. cap. 26, p. 730–762. ROY-CHOWDHURY, N., WANG, X., & ROY-CHOWDHURY, J. Bile Pigment Metabolism and Its Disorders. In: Emery and Rimoin’s Principles and Practice of Medical Genetics and Genomics. 7. ed. London: Elsevier 2020. cap. 19, p. 507–553. TANG, Z.; CHEN, H.; HE, H.; MA, C. Assays for Alkaline phosphatase activity: progress and prospects. TrAC Trends in Analytical Chemistry. v. 113, n. 1, p. 32-43, 2019. OLIVEIRA, I. M. V.; PAULO, R. H. Y.; FUJIMORI, E. Efeito da restrição energética na atividade hepática da gama-glutamiltranspeptidase e nos níveis de glutationa. Revista de Nutrição. v. 13, n. 1, p. 51-56, 2000. AVALIAÇÃO DA LESÃO E FUNÇÃO HEPÁTICA Caio Cesar Richter Nogueira SEM MEDO DE ERRAR A atividade das transaminases é utilizada como indicadora de danos hepatocelulares e o coeficiente AST:ALT (quociente de Ritis) tem grande valor diagnóstico. Após avaliação das transaminases, os valores das concentrações de Alanina aminotransferase e Aspartato aminotransferase encontrados no sangue de um paciente foram de 69 U/L e 121 U/L, respectivamente. Portanto, para obter o coeficiente de Ritis, basta o biomédico dividir o valor da concentração de Aspartato aminotransferase pela concentração de alanina aminotransferase. Após a divisão dos valores, o biomédico encontrou o valor de 1,75 U/L. Uma vez que o valor encontrado foi maior do que 1, isso pode indicar lesões crônicas, como a cirrose e hepatites crônicas. AVANÇANDO NA PRÁTICA CUIDADO COM A LUZ A bilirrubina é uma substância de coloração amarelada produzida pelas hemácias e pelo fígado. O exame de bilirrubina pode auxiliarno diagnóstico de doenças hepáticas, vias biliares ou alterações hematológicas (anemia hemolítica). Fábio é um biomédico responsável pelo setor de coleta de um hospital de emergência. Durante a rotina de coleta, Fábio foi chamado para um procedimento no Centro de Terapia Intensiva (CTI) e precisou deixar sua funcionária mais nova no setor de coleta. Após uma hora no CTI, Fábio volta para o setor de coleta e repara que sua funcionária havia coletado uma amostra para dosagem de bilirrubina em um tubo sem proteção da luz. Quais procedimentos você tomaria com a amostra coletada? A fase pré-analítica dos laboratórios de análises clínicas é de extrema importância para a qualidade da amostra que será analisada. Alguns fatores, como temperatura de armazenamento, manuseio e fotossensibilidade da amostra podem influenciar em um diagnóstico correto. A exposição à luz pode alterar as características de alguns analitos, acelerando sua degradação e influenciando a análise. Portanto, é recomendado preservar ao abrigo da luz em tubo âmbar as alíquotas para dosagem de bilirrubina, betacaroteno, vitamina A, vitamina B6 e porfirinas. Com a exposição da amostra à luz, sabe-se que a concentração de bilirrubina no soro está diminuída devido à oxidação da amostra, portanto solicita-se uma nova coleta e se descarta a amostra anterior. AVALIAÇÃO DAS DISLIPIDEMIAS Caio Cesar Richter Nogueira PRATICAR PARA APRENDER Os principais tipos de lipídeos presentes nos alimentos são os triglicerídeos, os fosfolipídeos e o colesterol. Esses lipídios são utilizados principalmente para a formação de energia através da beta-oxidação e na formação de hormônios esteroidais. Esses lipídios e os seus transportadores podem ser utilizados para avaliação do metabolismo e das doenças. Portanto, nesta seção você vai aprender os tipos de lipídeos; métodos utilizados para a dosagem desses analitos no sangue do paciente e orientações para a coleta da amostra. Uma criança (3 anos) é atendida em um hospital de emergência, sendo filho único de pais consanguíneos, sem antecedentes de doenças na família. Os pais encaminharam a criança para o hospital devido ao choro prolongado e à dilatação abdominal. Após avaliação de exames de imagem, o raio-X de abdômen mostrou aumento do fígado e a ultrassonografia de abdome revelou hepatomegalia. Na investigação laboratorial, foi solicitada a dosagem de AST, ALT, bilirrubinas e perfil lipídico. Uma biomédica recebe a amostra da criança no laboratório de análises clínicas do hospital. Ao observar o soro do paciente, ela percebe que a amostra apresenta lipemia acentuada. Pensando nos exames solicitados, quais análises você realizaria e qual o procedimento prévio deve ser realizado com a amostra? CONCEITO-CHAVE Os lipídios são um conjunto de macromoléculas, cuja característica química em comum é ser insolúvel em água (hidrofóbico). Eles são fundamentais para a produção de energia, constituição da membrana plasmática e precursores de hormônios e sais biliares. Dentre os lipídeos de importância nas análises clínicas, encontram-se as moléculas de triacilglicerol, o colesterol e os transportadores de lipídeos, como as lipoproteínas. O lipidograma é um exame laboratorial solicitado pelo médico com o objetivo de verificar o perfil lipídico do paciente, sendo ele composto pela dosagem do colesterol total (CT), lipoproteína de alta densidade (HDL), lipoproteína de baixa densidade (LDL) e triglicerídeos, podendo esse perfil lipídico ser estendido para a inclusão das análises da lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL) e colesterol não HDL. As moléculas de triacilglicerol, também denominadas de triglicerídeos (TG) ou gorduras neutras, são formadas a partir da reação de esterificação entre três moléculas de ácido graxos e uma molécula de glicerol. Nessa reação ocorre a interação entre o grupo ácido carboxílico do ácido graxo e a hidroxila do glicerol. A concentração de triacilglicerol com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada de hipertrigliceridemia pura e quando em conjunto com altas concentrações de colesterol é denominada de hiperlipidemia conjugada. As baixas concentrações de triacilglicerol são denominadas de hipotrigliceridemia. As doenças que geram a hipertrigliceridemia são mais frequentes nas análises clínicas e estão correlacionadas às dietas ricas em carboidratos, hipotireoidismo, síndromes genéticas (hiperlipidemia familial) e ao uso de fármacos. Para a dosagem laboratorial de triglicerídeos no sangue, é necessário jejum prévio de 12 a 14 horas, sendo possível a dosagem sem jejum caso solicitação médica. O laboratório deve informar no laudo os dois valores de referência (sem jejum e jejum de 12 horas), de acordo com o critério do médico solicitante. O paciente deve manter a dieta habitual nos cinco dias que antecedem a realização do exame, mas sem ingerir bebidas alcoólicas nas últimas 72 horas. Além disso, o paciente deve evitar a prática de exercício físico vigoroso nas 24 horas que antecedem a coleta da amostra. A amostra utilizada pode ser o soro ou plasma (coletada em EDTA ou heparina) livres de hemólise, pois pode interferir no resultado do exame (hemoglobina acima de 200 mg/dL). As amostras lipêmicas devem ser previamente diluídas com cloreto de sódio a 0,85%, na proporção 1:2. REFLITA A lipemia é o aspecto turvo do plasma, devido à presença de lipoproteínas. As altas concentrações de lipídios no sangue podem alterar a dosagem de alguns analitos. Você sabe como os lipídeos podem interferir nos métodos laboratoriais? Os métodos químicos utilizados para a dosagem de triglicerídeos no sangue do paciente estão sendo abandonados devido à necessidade de remover previamente interferentes, como os fosfolipídeos e a glicose. No método enzimático é utilizada uma lipase para quebrar a molécula de triglicerídeo em glicerol e ácidos graxos livres. A enzima glicerol quinase utiliza o glicerol formado na reação anterior e adiciona um grupo fosfato do ATP para formar glicerol-3-fosfato (G-3F). O G-3F na presença do oxigênio molecular sofre ação da enzima glicerol fosfato liberando peróxido de hidrogênio (H2O2). O H2O2, 4-aminoantipirina e p-clorofenol, na presença da enzima peroxidase, origina um cromógeno de cor cereja, cuja intensidade de cor é proporcional à concentração de triglicérides na amostra do paciente. Os esteróis são lipídios estruturais presentes nas membranas da maioria das células eucarióticas. Sua estrutura é caracterizada por um núcleo esteroidal, que consiste em quatro anéis, três com seis carbonos e um com cinco. O principal esterol nos tecidos animais é o colesterol. Essa molécula é formada por 27 carbonos, cujo carbono 3 apresenta uma hidroxila e uma dupla ligação entre os carbonos 5 e 6. Segundo recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), a ingestão diária da substância deve ser inferior a 300 mg para a população em geral, e menor que 200 mg para pessoas com histórico de doenças cardiovasculares. A concentração de colesterol total com valores superiores à taxa normal no sangue é chamada de hipercolesterolemia, e as baixas concentrações de colesterol são denominadas de hipocolesterolemia. O aumento dos níveis séricos de colesterol está correlacionado com a hipercolesterolemia poligênica. Essa doença ocorre devido a uma complexa interação entre múltiplos fatores genéticos e ambientais e é caracterizada por níveis séricos entre 240 e 350 mg/dL de colesterol e teores normais de triglicerídeos. A hipercolesterolemia familiar também pode acontecer. Essa doença se caracteriza por uma desordem autossômica que produz elevações do colesterol total e da lipoproteína de baixa densidade. A diminuição dos níveis séricos de colesterol está correlacionada principalmente com a má absorção de lipídeos, hipertireoidismo e uso de medicamentos. Para a dosagem laboratorial de colesterol total no sangue, não é necessário jejum prévio, sendo possível a dosagem com jejum máximo de
Compartilhar