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EDUCAÇÃO FÍSICA INCLUSIVA E ESPORTES ADAPTADOS Beatriz Paulo Biedrzycki Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer os elementos fundamentais das modalidades esportivas para pessoas com deficiências intelectuais. � Identificar as diferentes modalidades esportivas adaptadas para pes- soas com deficiências intelectuais. � Analisar a influência das atividades motoras e esportivas na vida de pessoas com deficiências intelectuais. Introdução A deficiência intelectual pode ser entendida como uma incapacidade no funcionamento das habilidades sociais e das funções cognitivas. Essa população, assim como as pessoas com as demais deficiências, pode ser beneficiada pela prática de atividades físicas em diversas áreas — motoras, sociais e mentais. Neste capítulo, você vai identificar as modalidades esportivas que podem ser praticadas por pessoas com deficiência intelectual, reconhe- cendo seus elementos fundamentais e percebendo como elas podem ser adaptadas para essa população. 1 Compreendendo a deficiência intelectual Valle e Connor (2014) nos convidam à reflexão quando apontam que nor- malmente as representações que vemos na mídia de pessoas com deficiência reforçam as conotações negativas associadas às deficiências em geral, prin- cipalmente a intelectual. Ironicamente, ao ter esse modelo difundido, cria-se uma ideia de que essa população é problemática, reforçando seus estereóti- pos, distorcendo a realidade e perpetuando a marginalização da pessoa com deficiência. Inicialmente, é importante compreender o termo deficiência como uma condição resultante de um impedimento, ou seja, como uma limitação em algum nível que compromete determinados desempenhos, sendo uma perda ou uma anormalidade (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 1995; OMS, 1993; SASSAKI, 2005). A deficiência intelectual pode ser entendida como uma incapacidade caracterizada por limitações significativas tanto no funcionamento intelectual como no comportamento e na aquisição de habilidades conceituais, sociais e práticas, manifestando-se ainda na infância (LUCKASSON et al., 2002). Dias e Oliveira (2013) afirmam que, diferente- mente das deficiências físicas, a deficiência intelectual possui uma situação peculiar, devido à dificuldade de percebê-la e à invisibilidade da deficiência, que atribuem, à pessoa com deficiência intelectual, uma cognição infantil, excluindo seus direitos de uma vida adulta, autônoma e cidadã. Assim, é correto afirmar que a característica fundamental da deficiência intelectual é o prejuízo cognitivo, que pode acarretar um funcionamento intelectual (quociente de inteligência [QI]) inferior à média, com limitações significativas das competências práticas, sociais e emocionais. Além disso, há limitações adaptativas em pelo menos duas das seguintes habilidades: comunicação, autocuidado, vida no lar, interação social, saúde e segurança, uso de recursos da comunidade, autodeterminação, funções acadêmicas, lazer e trabalho (AAIDD, 2011). Ademais, de acordo com a Classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde, 10ª revisão (CID-10) (OMS, 1993), a deficiência intelectual corresponde a um desenvolvimento incompleto do funcionamento intelectual, caracterizada, essencialmente, por um comprometimento das capacidades que determinam o nível global de inteligência, ou seja, das funções cognitivas. Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais2 As funções cognitivas englobam diferentes capacidades e habilidades humanas, como a capacidade de aprender e compreender. Essas funções superiores são estabe- lecidas a partir do sistema nervoso central, englobando as capacidades de linguagem, aquisição da informação, percepção, memória, raciocínio e pensamento, e permitindo a realização de tarefas como leitura, escrita, cálculos, sequência de movimentos, etc. (MALLOY-DINIZ et al., 2010). Quando se trata das funções cognitivas, a linguagem merece uma atenção especial. Essa habilidade parece ser uma das mais deficitárias, como prejuízos no entendimento da morfologia das palavras e na construção de frases curtas e simples, gerando uma escassa capacidade de expressão e comunicação, o que diminui o nível de interação social do indivíduo, principalmente pela dificuldade de expressar-se com os demais. Essa dificuldade da construção da linguagem das pessoas com deficiência intelectual faz elas criarem um dialeto muito próprio, o qual não é entendido pela maioria das pessoas. Isso acarreta, muitas vezes, um processo de desistência de aprender a linguagem verbal, o que leva a inúmeros prejuízos, uma vez que a fala aparece como elemento primordial para o desenvolvimento dos demais processos cognitivos (SANTOS, 2012). Uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2013) traçou a prevalência de diferentes manifestações de deficiência, relacionando-a com a faixa etária. Na população brasileira, foi encontrada uma progressão da deficiência intelectual proporcional ao avanço da idade, que acomete ambos os sexos de maneira similar: � 0–14 anos — 0,9%; � 15–64 anos — 1,4%; � Acima dos 65 anos — 2,9%. Dias e Oliveira (2013) aponta para a importância de a deficiência intelectual não ser tratada como uma forma abstrata e descontextualizada das práticas sociais, que também englobam as práticas corporais, uma vez que, ao falar de deficiência intelectual, precisamos falar sobre a maneira como as pessoas se relacionam e o processo de mediação que se estabelece no contexto histórico, social e cultural e na escola, que dá significado a essas diferenças. 3Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais O mesmo autor ainda afirma que, ao inserir a deficiência intelectual na escola, é importante que esta seja compreendida e entendida de maneira global e contextualizada. Assim, deve-se ter cuidado para que ela não caia em uma perspectiva desumanizadora, retirando o que o sujeito possui de mais importante: sua condição humana, que possui facetas sociais e culturais, não havendo limites para essas interações nem para o seu desenvolvimento. A deficiência intelectual aponta para dificuldades importantes na linguagem verbal. Portanto, compreender que a educação física escolar também está pautada na utilização do corpo como forma de expressão da sua identidade e cultura e criar espaços e estratégias para que o aluno se inteire da aula e participe ativamente podem ser ferramentas para melhorar as capacidades de expressão, interferindo diretamente na qualidade de vida. Rodrigues e Lima (2014) apontam que a procura e a inserção dessa popu- lação em atividades esportivas — seja em nível competitivo, recreativo ou de lazer — estão crescendo em todo o mundo e no Brasil. Então, esta pode ser uma ferramenta interessante e importante para construir bases fortes, melhorando os aspectos em que esse estudante possui dificuldade. O evento esportivo conhecido como Olimpíadas Especiais, que atende unicamente pessoas com deficiência intelectual, é pautado no respeito e na inclusão. Hoje, no Brasil, existem 10 modalidades esportivas olímpicas espe- ciais, as quais você conhecerá a seguir. Elementos fundamentais das modalidades esportivas para pessoas com deficiência intelectual Conforme supracitado, o Brasil hoje disponibiliza treinamento para parti- cipação olímpica especial em 10 diferentes modalidades, descritas a seguir. 1. Atletismo — desenvolve-se de maneira igual à modalidade olímpica regular, contando com provas de campo e pista (corridas e saltos). 2. Basquete — segue as regras oficiais da Confederação Brasileira de Basketball (CBB), sem diferenças. 3. Bocha — consistem em rolar uma bola até colocá-la próximo a um alvo. Pode ou não apresentar adaptações e mudanças na regra. Parapessoas que têm exclusivamente deficiência intelectual, não há necessidade de nenhuma alteração; mas, caso haja alguma outra deficiência física associada, serão necessárias adaptações para que seja possível realizar o movimento com a bola, como calhas e prolongadores. Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais4 4. Futebol — é praticado de maneira similar à modalidade das Olímpiadas regulares. 5. Natação — são disputadas provas em águas abertas e fechadas. A nata- ção para pessoas com deficiência intelectual possui as diferenças mais significativas, se a comparamos com a modalidade tradicional. Essas alterações foram feitas para atender todas as diferenças, permitindo que todos que se interessem por esportes aquáticos possam participar. As modalidades são: caminhada e flutuação; nado não assistido (em que é necessário percorrer a distância sem nenhum tipo de ajuda); e nado assistido (em que há auxílio para realizar a prova). 6. Ginástica rítmica — é praticada apenas por atletas do sexo feminino, e é menos exigente quanto a peso, altura e flexibilidades ou controle dos aparelhos (corda, bola, arco, massa e corda). No entanto, mantém sua característica fundamental de realizar os movimentos de acordo com a música, de maneira individual ou em grupo. 7. Tênis — é praticado de maneira similar ao praticado nas Olímpiadas regulares. Apareceu, pela primeira vez, nas Olimpíadas especiais de 1998. 8. Tênis de mesa — é composto por uma mesa, a qual é dividida por uma rede. Cada jogador possui uma raquete e deve passar a bola para o campo adversário. São provas oficiais: simples, de duplas, duplas mistas, unificadas duplas, habilidades individuais e cadeirantes. 9. Vôlei de praia — segue as normas e regras do esporte, sem adapta- ções. Em alguns casos e graus de comprometimento, é necessário um olhar diferenciado quanto à qualidade técnica do atleta, adaptando movimentações. 10. Judô — os atletas são divididos quanto a seu nível de habilidade, seu peso e seu sexo, tornando a disputa mais igualitária. O início da disputa pode acontecer em pé ou de joelhos no solo, sendo realizadas as técnicas de go-kyo e imobilizações. As técnicas de sacrifício, estrangulamento e chave de braço não são permitidas. Também existem outras altera- ções, como posicionamento verbal do árbitro e adaptações no tempo do combate. 5Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais 2 Diferentes modalidades esportivas adaptadas para pessoas com deficiência intelectual Muitas são as possibilidades de modalidades esportivas e de lazer que podem ser realizadas por pessoas com deficiência. Independentemente da modalidade, algumas adaptações serão necessárias, conforme as necessidades individuais apresentadas por cada sujeito. Assim, criam-se estratégias para que ele possa desfrutar plenamente da atividade, propiciando o pleno desenvolvimento de suas habilidades e capacidades. Dessa forma, surge a necessidade de pensar em atividade física adaptada, que é um campo do conhecimento que, com a educação física adaptada e o esporte adaptado, direciona seus estudos para a educação, o bem-estar e a prática esportiva e de lazer dos indivíduos com deficiência (SEABRA JUNIOR, 2008). Apesar de serem conceitos extremamente similares, a atividade física adaptada difere do esporte adaptado e da educação física adaptada. � Atividade física adaptada — esse conceito foi pensado pela necessidade de compreender as diferentes atividades de lazer realizadas fora do contexto escolar do esporte, sendo algo mais abrangente, permitindo, assim, ser entendida como uma ferramenta inclusiva. � Esporte adaptado — refere-se unicamente a alto rendimento, competições esportivas e paralimpíadas, ou seja, aos esportes em geral que não são praticados por todas as pessoas com deficiência. � Educação física adaptada — refere-se ao componente curricular, englobando unicamente as atividades realizadas dentro da escola, durante a idade escolar do sujeito, estando subordinada às matrizes curriculares nacionais. Nascimento et al. (2019) apontam para a versatilidade dos esportes aquáti- cos, como natação, hidroginástica, exercícios na água e/ ou sessões recreativas, que, quanto à intensidade, possuem uma característica leva a moderada. São considerados apropriados para pessoas com deficiência, principalmente por possuir uma característica sensorial importante e única, podendo ser adaptados para atender as mais diferentes necessidades que um sujeito pode apresentar. Além disso, a flutuabilidade pode ser entendida como uma característica Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais6 extremamente positiva, permitindo uma maior interação com o professor, estreitando os laços e a relação social. Castro et al. (2013) propõem sugestões de atividades que podem ser realiza- das por diferentes sujeitos com as mais variadas deficiências. Essas atividades, descritas a seguir, podem ser benéficas para a melhora da coordenação motora, do equilíbrio e do esquema corporal, além de trazer benefícios quanto aos marcadores de saúde, à linguagem e à socialização. São elas: Esportes e jogos adaptados — propiciam o desenvolvimento de diversas habilidades específicas dos esportes, além de habilidades motoras fundamen- tais e outras funções adaptativas ligadas ao controle postural, à mobilidade e ao manejo de materiais de diferentes pesos e tamanhos. As adaptações podem acontecer quanto ao formato da quadra (que pode ser diminuída ou ampliada), quanto às regras (para deixar o esporte mais fácil de ser praticado) e até mesmo quanto aos equipamentos (pode-se utilizar uma bola maior ou com som, pensando em tornar o momento do esporte coletivo algo divertido e permitindo que todos consigam fazer as atividades propostas). Os autores ainda afirmam que é importante estar atento quanto à formação dos times, buscando deixá-los equilibrados e mesclando os quadros mais severos com os mais leves, bem como os tipos de deficiência e o nível de habilidade. Atividades aquáticas — buscam desenvolver as habilidades equilíbrio, mo- bilidade, orientação no meio, controle de materiais e objetos e orientação espacial. Além disso, são fortalecidas as habilidades das atividades típicas da natação, como flutuação, propulsão, submersão, controle e coordenação respiratória, coordenação de braços e pernas na propulsão dentro de um estilo de natação. Para muitos, as atividades aquáticas são uma oportunidade de relaxamento, diversão, trocas entre os pares, apoio e segurança, entre outros aspectos de interação social. Sempre devem ser desenvolvidas de uma forma lúdica, com cuidado para que os alunos não fiquem sozinhos dentro da piscina, isolando-se do grupo. Atividades para melhora do condicionamento físico — devem ter como objetivo o desenvolvimento de habilidades motoras fundamentais, com inten- sidade elevada, buscando melhora do tônus muscular e do condicionamento aeróbio. Para isso, podem ser realizadas atividades em diferentes superfícies de apoio — com instabilidade e inclinações diferentes — ou, ainda, materiais de diferentes pesos e tamanhos, realizando atividades de mudanças de direção, em grupos e individuais. 7Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais Atividades de ritmo e dança — podem ser realizadas atividades coreográficas, dramatizações e formas de expressão corporal, criando novas ferramentas, além da fala, para expressar-se, proporcionando diferentes possibilidades para serem executadas com o corpo. Além disso, essas atividades estimulam a memória e a percepção auditiva ou temporal, destacando, nas estruturas rítmicas, propriedades de contrastes, ordem e sucessão. Atividades de dança resgatam o controle da respiração e permitem expressão e alegria, podendo ser adaptadas para todas as realidades. Alguns alunos podem apresentar hipersensibilidade ao barulho— nesses casos, é interessante utilizar um volume reduzido e músicas mais calmas. Atividades alternativas — podem ser enquadradas as atividades na natureza e as atividades com animais, trazendo a dificuldade e a novidade. A natureza é um local pouco explorado, instável e mutável, que coloca os alunos em um risco — ainda que baixo, calculado e esperado —, e é capaz de produzir expe- riências inéditas, coragem, respeito aos elementos de risco, senso de aventura e diversão. O contato com animais também parece ser benéfico para pessoas com deficiência — podem ser animais domésticos e de fazenda, como cachor- ros, gatos e cavalos —, trazendo calma e interação entre o animal e o sujeito. Assim, podemos perceber que as possibilidades de atividades físicas, esportivas e de lazer para pessoas com deficiência são múltiplas; não existem contraindicações, mas sim cuidados e adaptações importantes para cada uma das deficiências. Para sujeitos surdos, por exemplo, é imperativo o uso da Língua Brasileiras de Sinais, demonstrações e sinais visuais. Para pessoas com deficiência intelectual, são importantes materiais adaptados, como bola com guizos e marcações em relevos, estímulos sonoros e ordens claras faladas. Quando se trata de pessoas com deficiência intelectual, é essencial compreender suas dificuldades e ter paciência e calma para explicar as atividades, respei- tando o tempo do sujeito para cada atividade. Para pessoas com deficiência motora, as atividades podem ser realizadas com os participantes sentados no chão ou utilizando cadeiras de rodas, buscando sempre ferramentas para que todos realizem a mesma atividade e respeitando suas diferenças. Assim, cada um pode solucionar o problema de uma maneira diferente, chegando ao mesmo resultado. Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais8 11 Benefícios da prática de atividades físicas por pessoas com deficiência intelectual Pessoas com deficiência têm sido vistas, historicamente, como incapazes de levar uma vida independente. Essa visão equivocada, além de acentuar a exclusão social, inibe o surgimento e o incentivo da prática de atividades físicas por parte dessa população. Ainda que isso esteja garantido em lei, essa prática, seja com objetivo educacional, competitivo ou de lazer, encontra diversas barreiras para sua democratização, desde questões ambientais até fatores ligados aos aspectos pessoais e sociais. Enfatiza-se, aqui, a necessidade de formação profissional especializada nessa área (GREGUOL, 2017). Instrumentos como a Constituição Brasileira de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o Estatuto da Pessoa com Deficiência e o Plano Nacional de Inclusão da Pessoa com Deficiência buscam zelar pelo encorajamento às atividades esportivas como forma de lazer, reabilitação e inserção social, atentando para a necessidade da criação de programas específicos para essa população, bem como a importância da capacitação profissional para atendê-la (GREGUOL, 2017). Ao falar sobre o ensino das práticas corporais para os alunos com deficiência intelectual e afins, não é raro o questionamento sobre o modo de trabalhar com esses alunos. Na escola, temos como amparo o fundamento de que esse local deve atender a todos, independentemente das necessidades adaptativas, prevendo a singularidade de cada sujeito e garantindo a possibilidade de desenvolver sua capacidade cognitiva, motora e social (SANTOS, 2014). Para tanto, é importante que o professor compreenda que, por vezes, será necessário utilizar metodologias diferenciadas, uma vez que as tradicionais podem não atender essa população. O professor deve buscar opções que se adaptem ao aluno, auxiliando para que ele tenha a compreensão do que será feito e garantindo sua efetiva participação na aula (SANTOS, 2014). O estudo de Holbrook, Kang e Morgan (2013) mostrou que a predisposição ao desenvolvimento de doenças hipocinéticas — cardiopatias, hipertensão, diabetes, obesidade e doenças osteoarticulares crônicas — da população com algum tipo de deficiência está fortemente relacionada com a falta de oportuni- dade de praticar uma atividade física e não necessariamente com a deficiência. Aqui, há dois pontos importantes: 1) os benefícios que a atividade física pode proporcionar nessa população e 2) a falta de preparo dos profissionais para atender essa população, o que não permite que as pessoas com deficiência participem ativamente e com constância de algum programa esportivo ou de lazer. 9Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais Essa dificuldade de engajamento nas atividades físicas encontra força quando analisamos dados apresentados por Greguol (2017), que apontam que essa população possui mais dificuldade de se envolver de maneira autônoma em um lazer ativo. Assim, pessoas com deficiência têm maior tendência a atividades sedentárias, assim como a sobrepeso. As barreiras que impedem que as pessoas com deficiência estejam engajadas em atividades físicas podem ser divididas em fatores pessoais, ambientais e sociais (Quadro 1) (RIMMER, MARQUES, 2012), mostrando a necessidade de frequentarem locais onde haja apresentação e oferta de espaços e atividades físicas. Fonte: Adaptado de Greguol (2017) e Rimmer e Marques (2012). Fatores pessoais Fatores ambientais Fatores sociais Dor, fadiga, percepção de que a atividade é difícil, falta de conhecimento sobre as atividades, vergonha e limitações impostas pela própria deficiência Falta de transporte adaptado, falta de equipamentos adequados, falta de profissionais capacitados, falta de acessibilidade arquitetônica e falta de recursos financeiros Crença dos familiares, dos amigos e do círculo social de que o sujeito com deficiência não possui capacidades necessárias para ingressar em uma prática esportiva, falta de programas disponíveis Quadro 1. Fatores que impedem a prática de atividades físicas por pessoas com deficiên- cia Assim, ao analisar o quadro, percebemos que profissionais devidamente capacitados, com conhecimento e formação para atender a população com deficiência intelectual, podem suprir os fatores ambientais e os fatores sociais, auxiliando para uma modificação, inclusive dos fatores pessoais, o que poderá gerar um maior engajamento na prática de atividades físicas. Rodrigues e Lima (2014) realizaram uma pesquisa cujo objetivo era identi- ficar os efeitos do treinamento de um programa de atividades aquáticas voltado para sujeitos com deficiência intelectual. Como resultados dessa pesquisa, Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais10 percebeu-se que os participantes obtiveram ganhos quanto aos marcadores de coordenação motora, mostrando uma relação positiva entre ela e as atividades no meio aquático. Os autores ainda apontam que, apesar dos ganhos, quando comparados com sujeitos sem deficiência que realizaram o mesmo treinamento no mesmo período, os ganhos apresentados foram inferiores, mostrando uma maior dificuldade de adaptabilidade dos sujeitos com deficiência intelectual também em aspectos motores, não apenas nas funções sociais e/ou cognitivas. Joaquim e Dantas (2016) perceberam, em seus estudos, que existe uma relação proporcional entre a frequência nas atividades físicas e uma melhora das habilidades desenvolvidas na atividade-fim — no caso, o ensino do futsal. Nos sujeitos que obtiveram uma frequência maior que 85%, foram encontrados resultados visivelmente maiores do que naqueles com uma frequência menor. Os mesmos autores ainda sugerem que o engajamento da população com deficiência em esporte de invasão pode ser um fator importante, uma vez que ele possui uma característica de tomada de decisões constantes, pautadas nos movimentos de outras pessoas, o que é bastante imprevisível. Além disso, o estudo apontou que a motivação fez umagrande diferença na progressão dos sujeitos estudados, uma vez que aqueles que apresentaram menos níveis de motivação obtiveram também uma progressão inferior. Após todos esses dados apresentados, é inegável que a prática de atividades físicas por parte da população com deficiência, além de ser um direito garantido em lei, também parece ser um fator importante para a melhora de diversos marcadores motores e de saúde, além de criar um momento de socialização dessa população, que costuma ser bastante reduzido. Muitos são os benefícios encontrados na atividade física para as pessoas com deficiência intelectual, bem como para os sujeitos que possuem outras deficiências, melhorando não apenas os marcadores de saúde, mas também a coordenação motora, a percepção do espaço, o esquema corporal, a autoestima, o bem-estar e as funções sociais, criando possibilidades de relações sociais com um objetivo em comum. Além disso, parece ser de extrema importância a possibilidade de explorar diferentes maneiras de movimentar o corpo e usá-lo como forma de expressão e de socialização. No entanto, para que possamos chegar a todos esses benefícios, é importante que os professores estejam capacitados, reconhecendo as dificuldades de cada sujeito e encontrando maneiras para contorná-las e permitir que todos, sem exceção, participem de atividades físicas ao longo de toda a vida. 11Atividades motoras e esportivas voltadas para pessoas com deficiências intelectuais AAIDD. Definition of intellectual disability. 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