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Maria Paula - 105 FMT Insuficiência Cardíaca Classicamente, o desenvolvimento de insuficiência cardíaca é desencadeado por um insulto ao coração - seja de natureza crônica (ex. hipertensão arterial sistêmica) ou aguda (ex. infarto agudo do miocárdio). Uma vez que o dano ao miocárdio está estabelecido - seja estresse parietal exagerado, alteração de pressões de enchimento e/ou perda de músculo cardíaco - uma cascata de eventos será ativada por mecanismos neuro-humorais, com a finalidade de compensar a redução do débito cardíaco, mas evolui com mal adaptação, passando a sobrecarregar o sistema cardiovascular em vários aspectos funcionais. Apesar de as exatas razões pelas quais os pacientes com disfunção do VE permanecem assintomáticos não serem claras, uma explicação em potencial é que inúmeros mecanismos compensatórios mantêm-se ativados no contexto da lesão cardíaca ou de débito cardíaco deprimido e parecem modular a função do VE dentro de uma extensão fisiológica/homeostática, sendo que a capacidade funcional do paciente é preservada ou apenas minimamente reduzida. Contudo, na transição do paciente para IC sintomática, a ativação mantida dos sistemas neuro-hormonais de citocinas leva a uma série de mudanças dentro do miocárdio, denominadas coletivamente de remodelamento do VE. Este, é suficiente para causar a progressão da doença na IC, independentemente do estado neuro-hormonal do paciente. Na insuficiência cardíaca, ocorre a incapacidade do coração de atuar como bomba, seja por déficit na SÍSTOLE (CONTRAÇÃO) ou na DIÁSTOLE (RELAXAMENTO). Causando redução no débito cardíaco, isto, por sua vez, instala mecanismos compensatórios para manter a HOMEOSTASIA. Débito cardíaco = Frequência cardíaca x Volume sistólico; ou seja, é a quantidade de vezes que o coração bate por minuto e expele seu volume sanguíneo resultante da contração ventricular. Esse baixo débito cardíaco, associado então a queda da pressão, faz com que haja a captação dessa queda pelos barorreceptores (sensores de pressão), localizados no ventrículo esquerdo, seio carotídeo e arco aórtico. Maria Paula - 105 FMT Mecanismos Compensatórios neuro-hormonais da queda do DC: 1. Sistema Nervoso Simpático ~ sistema adrenérgico 2. Sistema Renina-angiotensina-aldosterona 3. Moléculas vasodilatadoras compensatórias ( CITOCINAS - ENDOTELINA) 4. Mecanismo Frank-Starling 5. Hipertrofia e remodelamento miocárdico ★ Ativação do Sistema Nervoso Simpático A redução do débito cardíaco na insuficiência cardíaca ativa uma série de adaptações para manter a homeostasia cardiovascular. Sendo uma delas, a ativação do sistema nervoso simpático. Como resultado, há o aumento dos níveis circulantes de norepinefrina (catecolamina) um neurotransmissor adrenérgico. O SNS atua em 3 grandes sistemas: 1. Cardíaco 2. Renal 3. Vascular Além disso, a descarga dos barorreceptores periféricos leva à perda do tônus parassimpático inibitório para o sistema nervoso central (SC), resultando em aumento generalizado no tônus simpático eferente e em liberação não osmótica de arginina-vasopressina (AVP) pela hipófise. A AVP (hormônio antidiurético ADH) é um vasoconstritor potente que aumenta a permeabilidade dos ductos coletores renais, levando à reabsorção de água. ● Cardíaco No coração, o sistema nervoso simpático atua na ativação dos receptores beta adrenérgicos (epinefrina e norepinefrina) que irão aumentar a frequência cardíaca e força miocárdica de contração, aumentando então o débito cardíaco. Além disso, a ativação do sistema nervoso simpático leva a estimulação de receptores alfa-adrenérgicos miocárdicos, que induz um efeito inotrópico positivo (inotropismo = capacidade de contração) e vasoconstrição arterial periférica. Receptores beta-adrenérgicos = + relacionados com a aceleração do ritmo cardíaco e aumento da respiração Maria Paula - 105 FMT Receptores alfa-adrenérgicos = + relacionados ao estreitamentos dos vasos sanguíneos ● Renal Nos rins, o sistema nervoso simpático atua: 1. Causando o estreitamento dos vasos sanguíneos renais, o que reduz o fluxo sanguíneo para esse órgão, causando a hipoperfusão renal. Essa hipoperfusão aumenta a reabsorção de sódio e água, pois o rim identifica que há baixo Na+ e H2O circulante, sendo necessário assim, evitar excreção. 2. Liberação da enzima renina pelo aparelho justaglomerular, a qual desencadeia uma série de reações químicas que resultam, eventualmente, na regulação da pressão arterial e da reabsorção de água nos rins. 3. Redução na filtração glomerular, ou seja, há diminuição de fluido filtrado do sangue para formar a urina, evitando a perda excessiva de água e eletrólitos. 4. Menor resposta a fatores natriuréticos, uma vez que estes atuam ajudando a reduzir a retenção de sódio e água nos rins, promovendo a vasodilatação e inibindo sistemas que elevam a pressão arterial. Assim, a hipoperfusão renal, o sódio filtrado reduzido atingindo a mácula densa no túbulo distal e a liberação de renina, levam a ativação do segundo mecanismo neuro-hormonal de regulação compensatória: Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona. ● Vascular No sistema vascular, o sistema nervoso simpático atua na vasoconstrição neurogênica. Uma vez que o SNS libera neurotransmissores, como a noradrenalina, que se ligam aos receptores alfa adrenérgicos nas paredes dos vasos sanguíneos. Isso leva à contração dos músculos lisos nas paredes dos vasos, resultando em vasoconstrição, ou seja, o estreitamento dos vasos sanguíneos. Isso reduz o calibre dos vasos e aumenta a resistência ao fluxo sanguíneo, o que pode elevar a pressão arterial. A ação do SNS atua também atua na hipertrofia vascular, uma vez que a vasoconstrição exerce constante sobre as paredes dos vasos sanguíneos pode levar a uma resposta adaptativa que envolve o aumento da espessura das paredes dos vasos para lidar com a pressão elevada e ocorre também o estímulo ao crescimento celular, visto que a noradrenalina e outros sinais ativados pelo Maria Paula - 105 FMT sistema nervoso simpático podem estimular o crescimento celular nas camadas musculares lisas das paredes dos vasos. Isso pode levar ao aumento da quantidade de células musculares lisas nas paredes, contribuindo para a hipertrofia vascular. ★ Sistema Renina-Angiotensina-Aldosterona A diminuição da pressão arterial (baixa de sódio no túbulo distal identificada pela mácula densa) faz com que a pró-renina seja convertida em renina nas células justaglomerulares. A secreção de renina pelas células justaglomerulares é aumentada pela estimulação dos nervos simpáticos renais. A renina é uma enzima que no plasma catalisa a conversão de angiotensinogênio em angiotensina I. Nos pulmões e rins, a angiotensina I é convertida em angiotensina II, reação catalisada pela enzima conversora de angiotensina (ECA). Maria Paula - 105 FMT A angiotensina II atua sobre as células da zona glomerulosa do córtex supra renal, estimulando a síntese e a secreção de aldosterona. A aldosterona, atua sobre as células principais do túbulo renal distal e ducto coletor aumentando a reabsorção de Na⁺, levando ao aumento do LEC e volume sanguíneo. A angiotensina II atua sobre o hipotálamo, aumentando a sede e a ingestão de água. E estimula a secreção do hormônio antidiurético (vasopressina), que aumenta a reabsorção de água nos ductos coletores. A ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona promove retenção de água e sal e leva à vasoconstrição da vasculatura periférica, hipertrofia dos miócitos, morte celular de miócitos e fibrose miocárdica. Embora os mecanismos neuro-hormonais facilitem a adaptação em curto prazo por meio da manutenção da pressão arterial, esses mesmos mecanismos neuro-hormonais resultam em alterações nos órgãos-alvo, no coração e na circulação, bem como em retenção excessiva de água e sal nos casos avançados de IC. Além disso, a aldosterona possui ação celular, atuando na produção de colágeno mais denso e hipertrofia do coração. IC x Frank Starling Com o aumento da retenção de sódio e água pelos rins, aumenta-se o volumevascular e, com isso, o retorno venoso. Causando assim, aumento da pré-carga, uma vez que há maior distensão do átrio pelo aumento da volemia. De acordo com o mecanismo de Frank Starling, em que quanto mais o miocárdio for distendido durante o enchimento, maior será a força da contração e maior será a quantidade de sangue bombeada para a aorta. Assim, de acordo com o mecanismo de Frank Starling, ocorre a amplificação da tensão da parede ventricular, visto que ocorre maior chegada de volume nas paredes daquela câmara e, consequentemente, aumento do consumo de oxigênio pelo miocárdio. Como o aumento da tensão da parede ventricular intensifica o consumo de O2 pelo miocárdio, isso passa a comprometer o inotropismo, e o mecanismo compensatório para a pré-carga passa a não favorecer o indivíduo em questão. Maria Paula - 105 FMT ★ Moléculas vasodilatadoras compensatórias Ocorre a ativação de uma família de moléculas vasodilatadoras compensatórias, as quais compensam a vasoconstrição vascular excessiva. Prostaglandina E2 (PGE2) e prostaciclina (PGI2) estão elevadas em pacientes com insuficiência cardíaca. PGE2 - atua na vasodilatação periférica, aumenta a excreção de sódio (redução de volemia) e modula a ação antidiurética da AVP (hormônio antidiurético ADH). Entre os mais importantes sistemas neuro-hormonais contrarregulatórios que se tornam ativados em IC, estão os: 1. Peptídeos natriuréticos atrial (ANP) 2. Peptídeo natriurético tipo cerebral (BNP). Em condições fisiológicas, ANP e BNP funcionam em resposta aos aumentos de estiramento atrial ou miocárdico, frequentemente secundários à excessiva entrada de sódio (alta volemia). Uma vez liberados, estes peptídeos cardíacos agem no rim e na circulação periférica para aliviar o coração, através da excreção aumentada de sódio e de água, enquanto inibem a liberação de renina e aldosterona, com o intuito de redução de volemia. Neste contexto de ativação da SRA, a liberação de ANP e BNP pode servir como um importante mecanismo contrarregulatório que mantém a homeostasia de sódio e de água para não ocorrer uma alta elevação constante da pressão, atuam diminuindo essa PA. * ANP e BNP atuam como marcadores essenciais no diagnóstico de Insuficiência Cardíaca. Além disso, fisiologicamente há ação do óxido nítrico, liberado pelas células endoteliais, que atua na vasodilatação periférica. No entanto, em indivíduos com IC, ele se encontra atenuado. A bradicinina, por sua vez, atua também na vasodilatação, sendo importante na regulação do tônus muscular em indivíduos com IC. ★ Remodelamento do Ventrículo Esquerdo Embora o modelo neuro-hormonal explique muitos aspectos da progressão da doença na insuficiência cardíaca, há uma crescente evidência clínica sugerindo Maria Paula - 105 FMT que nossos atuais modelos neuro-hormonais falham em explicar completamente a evolução do quadro em IC. Ou seja, enquanto os antagonistas neuro-hormonais estabilizam IC e, em alguns casos, revertem certos aspectos do processo da doença, a IC vai progredir na esmagadora maioria dos pacientes, embora a um ritmo mais lento. REMODELAMENTO COMOMECANISMO COMPENSATÓRIO O desenvolvimento de hipertrofia do miocárdio é um dos principais mecanismos pelos quais o coração compensa o aumento da carga. Embora a hipertrofia ventricular melhore o desempenho do trabalho do coração, também é um importante fator de risco para morbidade e mortalidade cardíaca subsequente. A hipertrofia e remodelação inadequadas podem resultar em mudanças na estrutura (i. e., massa muscular, dilatação da câmara) e função (i. e., comprometimento da função sistólica ou diastólica), que muitas vezes levam a maior disfunção no bombeamento e na sobrecarga hemodinâmica. A hipertrofia e a remodelação miocárdicas envolvem uma série de eventos complexos nos níveis molecular e celular. O miocárdio é composto de miócitos, ou células musculares, assim como de não miócitos (macrófagos, fibroblastos, células endoteliais). Os miócitos são as unidades funcionais do músculo cardíaco, o seu crescimento é limitado por um aumento no tamanho das células, em oposição a um aumento no número de células. Quando o estímulo primário para a hipertrofia é a sobrecarga de pressão, o aumento de tensão da parede conduz à replicação em paralelo das miofibrilas, espessamento dos miócitos individualmente e hipertrofia concêntrica. A hipertrofia concêntrica pode preservar a função sistólica por um determinado período de tempo, mas eventualmente o trabalho realizado pelo ventrículo ultrapassa a reserva vascular, predispondo à isquemia. Quando o estímulo primário é a sobrecarga de volume ventricular, o aumento da tensão da parede conduz a replicação em série das miofibrilas, alongamento das células musculares cardíacas e hipertrofia excêntrica. Esta última leva a uma diminuição da espessura da parede ventricular, com aumento do volume diastólico e na tensão da parede. Resumo: Ocorre o aumento e espessamento dos cardiomiócitos já existentes desencadeada por estímulos de pressão elevada, ou seja, para que ocorra a ejeção de sangue (suplantar pós-carga) e há a multiplicação dos miócitos. No Maria Paula - 105 FMT entanto, a demanda sanguínea suplanta a quantidade de vasos sanguíneos, causando isquemia daquele coração e deterioração cardíaca crônica. A insuficiência cardíaca pode ser classificada quanto ao acometimento. No entanto, independente da agressão e local, todas enfrentam os mecanismos compensatórios citados acima. ★ Disfunção sistólica versus disfunção diastólica Maria Paula - 105 FMT A fisiopatologia separa a disfunção sistólica da disfunção diastólica com base na fração de ejeção ventricular (a ejeção do volume diastólico situa-se entre 55 a 70%) Na disfunção ventricular sistólica, a contratilidade miocárdica é prejudicada, levando a uma diminuição da fração de ejeção e do débito cardíaco. Já a disfunção ventricular diastólica se caracteriza por uma fração de ejeção normal, mas com comprometimento do relaxamento ventricular que, por consequência, reduz o enchimento do ventrículo, provocando diminuição na pré-cara, no volume sistólico e débito cardíaco. Disfunção sistólica É definida principalmente como uma diminuição da contratilidade do miocárdio, caracterizada por uma fração de ejeção inferior a 40%. Um coração normal ejeta aproximadamente 65% do sangue encontrado no ventrículo ao final da diástole. Nos casos de insuficiência cardíaca sistólica, a fração de ejeção declina progressivamente. Com a diminuição da fração de ejeção, consequentemente ocorre aumento do volume diastólico final (pré-carga, visto que permaneceu maior volume residual), da dilatação ventricular, da tensão da parede ventricular e da pressão diastólica final do ventrículo . O aumento do volume, juntamente com o retorno venoso normal, resulta no aumento da pré-carga no ventrículo. Acredita-se que o aumento da pré-carga represente um mecanismo compensatório para ajudar a manter o volume de ejeção por meio do mecanismo de Frank-Starling, apesar da queda na fração de ejeção. (volume residual + aumento de volume para manter ejeção) Embora funcione como um mecanismo de compensação, o aumento da pré-carga pode também conduzir a uma das consequências mais deletérias da disfunção ventricular sistólica: o acúmulo de sangue nos átrios e no sistema venoso (que desemboca no átrio), causando edema pulmonar ou edema periférico. A disfunção sistólica comumente é o resultado de condições que comprometem o desempenho contrátil do coração (p. ex., doença cardíaca isquêmica e no miocardiopatia); produzem sobrecarga de volume (p. ex., insuficiência valvar e anemia); ou geram uma sobrecarga de pressão (p. ex., hipertensão e estenose valvar) no coração. Disfunção diastólica Maria Paula - 105 FMT Embora a insuficiência cardíaca esteja frequentemente associada ao comprometimento da função sistólica deficiente, em aproximadamente 55% dos casos a função sistólica foi preservada e a insuficiência cardíaca se manifesta exclusivamente com base na disfunção diastólica do ventrículo esquerdo.Ainda que um coração nessas condições seja capaz de contrair normalmente, o relaxamento é anormal. O enchimento anormal do ventrículo compromete o débito cardíaco, especialmente durante a prática de exercícios físicos. Para qualquer volume ventricular determinado, as pressões ventriculares se mostram elevadas, conduzindo a sinais de congestão venosa pulmonar e sistêmica, idêntica à que é observada em pessoas com um coração dilatado e problemas de contração do músculo cardíaco. Entre as condições que causam uma disfunção diastólica encontram-se aquelas: 1. Que impedem a expansão do ventrículo (p. ex, derrame pericárdico, pericardite constritiva); 2. Aumentam a espessura da parede e reduzem o tamanho da câmara (p. ex., hipertrofia do miocárdio, miocardiopatia hipertrófica); 3. Retardam o relaxamento diastólico (p. ex., envelhecimento, doença isquêmica do coração). ➔ O processo de envelhecimento muitas vezes é acompanhado por um retardo no relaxamento do coração durante a diástole, de tal maneira que o preenchimento diastólico se inicia enquanto o ventrículo ainda se encontra rígido e resistente ao estiramento para aceitar um aumento de volume. A função diastólica é ainda mais influenciada pela frequência cardíaca, que determina o tempo disponível para o enchimento ventricular. Um aumento na frequência cardíaca encurta o tempo de enchimento diastólico. Assim, a disfunção diastólica pode ser agravada por taquicardia ou arritmia e melhorada por uma redução na frequência cardíaca, que possibilita o enchimento do coração por um período mais longo. Nos casos de disfunção diastólica, o sangue é incapaz de se mover livremente no interior do ventrículo esquerdo, causando aumento da pressão intraventricular em qualquer volume determinado. As pressões elevadas são transferidas do ventrículo esquerdo para o átrio esquerdo e para o sistema venoso pulmonar, causando uma diminuição da complacência pulmonar, o que aumenta o trabalho da respiração e evoca sintomas de dispneia. Maria Paula - 105 FMT O débito cardíaco se apresenta reduzido não por causa de uma redução na fração de ejeção ventricular, como acontece com a disfunção sistólica, mas devido a uma diminuição do volume (pré-carga) disponível para proporcionar um débito cardíaco adequado, pois sua inadequação durante a prática de exercícios pode levar à fadiga das pernas e dos músculos acessórios da respiração. Na disfunção diastólica, a capacidade de relaxamento do músculo cardíaco, principalmente o ventrículo esquerdo, está comprometida. Isso pode levar a uma redução no volume de enchimento ventricular durante a diástole, pois o músculo rígido não consegue relaxar completamente para permitir o enchimento adequado. ★ Disfunção ventricular direita versus esquerda A IC pode também ser classificada quanto ao lado do coração afetado majoritariamente. No entanto, os casos de insuficiência cardíaca geralmente envolvem os dois lados. Disfunção ventricular direita A insuficiência cardíaca do lado direito compromete a capacidade de mover o sangue desoxigenado da circulação sistêmica para a circulação pulmonar. Consequentemente, quando o ventrículo direito falha, há redução do volume de sangue movido para a circulação pulmonar, em seguida, para o lado esquerdo do coração, provocando, em última análise, uma diminuição do débito cardíaco do ventrículo esquerdo. Além disso, se o ventrículo direito não mover o sangue para frente, ocorre acúmulo ou congestão no sistema venoso sistêmico, provocando elevação das pressões diastólica final do ventrículo direito, do átrio direito e venosa sistêmica. Um efeito importante da insuficiência cardíaca direita é o desenvolvimento de edema periférico. Devido aos efeitos da força da gravidade, o edema é mais pronunciado em áreas do corpo mais baixas. Quando a pessoa se encontra de pé, o edema é observado nos membros inferiores; quando a pessoa está deitada, o edema é visto na área sobre o sacro. A acumulação de líquido de edema pode ser evidenciada por um aumento de peso. A insuficiência cardíaca do lado direito também produz congestão das vísceras, pois à medida que a distensão venosa progride, o sangue retorna para as veias hepáticas, que drenam na veia cava inferior e o fígado fica túrgido, podendo causar dor no quadrante superior direito e hepatomegalia. Maria Paula - 105 FMT Nos casos de insuficiência do lado direito grave e prolongada, ocorre comprometimento da função hepática e células hepáticas morrem. A congestão da circulação porta também pode conduzir a edema do baço e desenvolvimento de ascite. A congestão do sistema digestório pode interferir na digestão e na absorção de nutrientes, causando anorexia e desconforto abdominal. As veias jugulares, localizadas acima do nível do coração, normalmente não são visíveis quando a pessoa está de pé ou quando sentada com a cabeça elevada em um ângulo maior que 30°. Nos casos graves de insuficiência do lado direito, as veias jugulares externas ficam distendidas e podem ser visualizadas quando a pessoa está sentada ou em pé. As causas da disfunção ventricular direita incluem as condições que impedem o fluxo de sangue para os pulmões ou que comprometem a eficácia de bombeamento do ventrículo direito. Insuficiência ventricular esquerda é a causa mais comum de insuficiência ventricular direita, também causada por hipertensão pulmonar sustentada. Desenvolve-se hipertensão pulmonar em pessoas com doença pulmonar crônica, pneumonia grave, embolia pulmonar, ou estenose mitral ou aórtica. Quando a insuficiência cardíaca direita ocorre em resposta à doença pulmonar crônica, é denominada cor pulmonale. Outras causas comuns incluem estenose ou regurgitação das valvas tricúspide ou pulmonar, infarto do ventrículo direito e miocardiopatia. Em resumo: Condições que impeçam o fluxo sanguíneo para os pulmões ou que comprometam a ejeção do sangue com baixa de O2, causam disfunção ventricular. Como o sangue não é ejetado corretamente, ocorre uma estagnação daquele sangue para trás, causando congestão de tecidos periféricos, visto que ocorre aumento da pressão venosa, gerando saída de líquido para o interstício. Com isso, ocorre edema e ascite posturais e, devido à ação da gravidade, vê-se o edema mais localizado na região abdominal. Além disso, toda a drenagem venosa passa pelo fígado pois, nele, desemboca na veia cava inferior. Assim, uma congestão desse sangue que não ascende para o coração e fica congestionado na cava, gera um edema no fígado, causando dor e hepatomegalia. Além disso, a função hepática comprometida pode levar à redução da síntese de proteínas, incluindo as proteínas envolvidas na regulação do apetite. Maria Paula - 105 FMT Em decorrência dessa congestão, ocorre o aumento da pressão no trato gastrointestinal, visto que o edema fica pressionando as paredes destes órgãos, gerando uma sensação de plenitude, desconforto abdominal e falta de apetite (sente-se cheio). Não obstante, a diminuição do fluxo sanguíneo nos pulmões devido à disfunção ventricular direita pode levar à hipoxemia (baixos níveis de oxigênio no sangue), o que por sua vez pode afetar o metabolismo e a função do sistema nervoso central, incluindo os centros reguladores do apetite no cérebro, podendo causar uma posterior anorexia/perda de peso. ★ Disfunção Ventricular Esquerda A insuficiência cardíaca do lado esquerdo compromete o movimento de sangue da circulação pulmonar de baixa pressão para o lado arterial de alta pressão da circulação sistêmica. Com o comprometimento da função cardíaca esquerda, há a diminuição do débito cardíaco para a circulação sistêmica. O sangue se acumula no ventrículo esquerdo, átrio esquerdo e circulação pulmonar, o que provoca uma elevação da pressão venosa pulmonar. Quando a pressão dos capilares pulmonares (normalmente de aproximadamente 10 mmlig) excede a pressão osmótica capilar (normalmente de aproximadamente 25 mmHg), ocorre um deslocamento do líquido intravascular para o interstício pulmonar e o desenvolvimento de edema pulmonar. Frequentemente, ocorre um episódiode edema pulmonar durante a noite, após um período em que a pessoa tenha sido mantida em posição reclinada e as forças gravitacionais tenham sido removidas do sistema circulatório. É nesse momento que o líquido de edema que tinha sido sequestrado nas extremidades inferiores durante o dia é devolvido ao compartimento vascular e redistribuído para a circulação pulmonar. As causas mais comuns de disfunção ventricular esquerda são hipertensão arterial e infarto agudo do miocárdio. Pessoas com este último podem desenvolver muito rapidamente insuficiência cardíaca ventricular esquerda e congestão pulmonar. Mesmo quando a área de infarto é pequena, pode existir uma região circundante de tecido isquêmico, o que pode resultar em grandes áreas de hipocinesia ou acinesia da parede ventricular e rápido desenvolvimento de congestão pulmonar e edema. Estenose ou regurgitação da valva mitral ou aórtica também cria o nível de retorno do lado esquerdo que resulta em congestão pulmonar. À medida que a pressão pulmonar aumenta como resultado da congestão, pode evoluir para produzir insuficiência cardíaca do lado direito. Maria Paula - 105 FMT Em resumo: Uma disfunção ventricular causa uma disfunção na ejeção do sangue, assim, há redução do débito cardíaco, de maneira a gerar assim, menor perfusão tecidual dos tecidos e congestão pulmonar, visto que o sangue não consegue circular para frente devido a incapacidade de uma ejeção ventricular eficaz. Maria Paula - 105 FMT Assim, ocorre comprometimento das trocas gasosas, visto que não há circulação sanguínea para troca de O2 no sangue, causando cianose e hipóxia. E, também, ortopneia, visto que ocorre uma transudação de líquido para o interstício do pulmão, causando o edema pulmonar e redução de área para expansão do pulmão. ★ Insuficiência de alto débito versus de baixo débito A insuficiência de alto débito ou de baixo débito cardíaco é descrita em termos de volume cardíaco. Insuficiência de alto débito: tipo raro de insuficiência cardíaca causada por uma excessiva carga de volume cardíaco. Nesses casos, a função do coração pode Maria Paula - 105 FMT estar acima do normal, porém é inadequada devido a necessidades metabólicas aumentadas. As causas para essa anomalia incluem anemia grave, tireotoxicose, condições que causam desvio arteriovenoso e a doença de Paget. Insuficiência de baixo débito: Causada por distúrbios que prejudicam a capacidade de bombeamento do coração, como acontece com a doença cardíaca isquêmica e miocardiopatia. É caracterizada pela manifestação clínica de vasoconstrição sistêmica com extremidades frias, pálidas e, às vezes, cianóticas. Nas formas avançadas de insuficiência de baixo débito, as reduções acentuadas no volume sistólico são comprovadas por um estreitamento da pressão diferencial. Em contraste, nos casos de insuficiência de alto débito, as extremidades geralmente se apresentam quentes e com rubor e a pressão diferencial é ampliada ou, no mínimo, mantida no normal. ★Manifestações clínicas Dependem da extensão e do tipo de disfunção cardíaca e da rapidez que ela se desenvolve. As manifestações de insuficiência cardíaca refletem os efeitos fisiológicos do comprometimento da capacidade de bombeamento do coração, da diminuição do fluxo sanguíneo renal e da ativação de mecanismos simpáticos compensatórios. Sinais e sintomas: 1. Falta de ar e outras manifestações respiratórias 2. Fadiga e tolerância limitada ao exercício 3. Retenção de líquidos e edema 4. Caquexia 5. Desnutrição 6. Cianose ● Manifestações respiratórias Uma das principais manifestações de insuficiência cardíaca do lado esquerdo é a falta de ar devido à congestão da circulação pulmonar. A percepção de falta de ar (dificuldade respiratória) é chamada de dispneia, e, quando está relacionada com aumento na atividade física, é chamada dispneia aos esforços. Ortopneia: é a dificuldade respiratória que se manifesta quando uma pessoa está em decúbito dorsal. As forças gravitacionais causam o sequestro do líquido nas Maria Paula - 105 FMT pernas e pés quando a pessoa está de pé ou sentada. Quando a pessoa assume a posição de decúbito, o líquido das pernas e de partes pendentes do corpo é mobilizado e redistribuído para uma circulação pulmonar já distendida. Dispneia paroxística noturna: crise súbita de dispneia que ocorre durante o sono. Ela perturba o sono, e a pessoa acorda com uma sensação de estar sendo sufocada que desaparece quando se senta. Inicialmente, a experiência pode ser interpretada como o despertar de um sonho ruim. Um sintoma sutil e que muitas vezes passa despercebido em casos de insuficiência cardíaca é uma tosse crônica seca não produtiva que se agrava quando a pessoa está deitada. O broncoespasmo devido à congestão da mucosa brônquica pode causar chiado e dificuldade em respirar. Esta condição muitas vezes é chamada de asma cardíaca. Respiração de Cheyne-Stokes Cheyne-Stokes é um padrão de respiração periódica caracterizado por um aumento gradual na profundidade (e algumas vezes na frequência) respiratória até um ponto máximo, seguido de uma redução que resulta em apneia. Embora não seja mais associado unicamente com casos de insuficiência cardíaca, este padrão respiratório é reconhecido como um fator de risco independente para o agravamento da insuficiência cardíaca. Tem sido sugerido que a respiração de Cheyne-Stokes pode não ser apenas um marcador para o agravamento da insuficiência cardíaca, mas pode também representar um agravante. Durante o sono, esse padrão respiratório causa despertar recorrente, reduzindo os períodos de sono de onda lenta e de movimento rápido dos olhos (REM). O ciclo recorrente de hipoventilação/apneia e hiperventilação pode também aumentar a atividade simpática e predispor ao desenvolvimento de arritmias. Tem sido observado que a administração noturna de oxigênio melhora o sono, a tolerância ao exercício e a função cognitiva. Edema pulmonar agudo Sintoma mais significativo da SICA, é uma condição potencialmente fatal na qual os líquidos nos capilares se deslocam para os alvéolos. O líquido acumulado nos alvéolos e vias respiratórias provoca rigidez do pulmão, dificulta a expansão pulmonar e prejudica a função de troca gasosa do pulmão. Maria Paula - 105 FMT Com a diminuição da capacidade dos pulmões para oxigenar o sangue, a hemoglobina deixa a circulação pulmonar sem que esteja completamente oxigenada, o que resulta em dificuldade respiratória e cianose. A pessoa com edema pulmonar grave geralmente pode ser vista sentada com falta de ar. O pulso é rápido, a pele fica úmida e fria e os lábios e as unhas se apresentam cianóticos. À medida que o edema pulmonar se agrava e ocorre uma queda no suprimento de oxigênio para o encéfalo, surgem confusão mental e torpor. A dispneia e a dificuldade respiratória são acompanhadas por uma tosse produtiva com catarro espumoso (que se assemelha à clara de ovo), muitas vezes tingido de sangue - que representa o efeito da mistura de ar com a albumina sérica e hemácias que se deslocaram para os alvéolos. O movimento do ar através do líquido alveolar produz sons crepitantes finos chamados crepitações, que podem ser ouvidos com ausculta pulmonar. À medida que o líquido se move para vias respiratórias maiores, as crepitações se tornam mais fortes e mais grossas. ● Fadiga, fraqueza e confusão mental Fadiga e fraqueza frequentemente acompanham a redução do débito do ventrículo esquerdo. A fadiga cardíaca é diferente da fadiga geral, na medida em que normalmente não se manifesta na parte da manhã, mas aparece e progride à medida que aumenta a atividade durante o dia. Na insuficiência esquerda aguda ou grave, o débito cardíaco pode cair para níveis que são insuficientes para suprir o encéfalo com a quantidade adequada de oxigênio, acarretando indícios de confusão mental e perturbações no comportamento. Confusão mental, transtornos de memória, ansiedade, agitação e insônia são sintomas comuns em idosos com insuficiência cardíaca avançada, particularmente naqueles com aterosclerose cerebral.Estes sintomas podem confundir o diagnóstico de insuficiência cardíaca em idosos por causa da miríade de outras causas associadas ao envelhecimento. ● Retenção de líquido e edema Muitas manifestações de insuficiência cardíaca resultam do aumento da pressão capilar (aumento da pressão hidrostática) que se desenvolve na circulação periférica em pessoas com insuficiência cardíaca direita e na circulação pulmonar em pessoas com insuficiência cardíaca do lado esquerdo. O aumento da pressão capilar reflete o enchimento excessivo do sistema vascular devido ao aumento da retenção de sódio e água e à congestão venosa, Maria Paula - 105 FMT anteriormente denominada insuficiência retrógrada, resultante do comprometimento do débito cardíaco. Nictúria é o aumento noturno no débito urinário que ocorre relativamente no início do curso da insuficiência cardíaca. Ocorre devido ao aumento do débito cardíaco, do fluxo sanguíneo renal e da taxa de filtração glomerular que acompanham o aumento do retorno de sangue ao coração quando a pessoa está posicionado em decúbito dorsal. Oligúria, que é a diminuição do débito urinário, é um sinal tardio relacionado com uma forte redução no débito cardíaco e com insuficiência renal resultante. Pode ocorrer transudação de líquido na cavidade pleural (hidrotórax) ou na cavidade peritoneal (ascite) nos estágios avançados da insuficiência cardíaca. Como as veias da pleura drenam tanto em leitos venosos sistêmicos quanto pulmonares, o hidrotórax é observado mais comumente em indivíduos com hipertensão, envolvendo os dois sistemas venosos.? O derrame pleural se desenvolve à medida que o excesso de líquido nos espaços intersticiais do pulmão atravessa a pleura visceral, que, por sua vez, sobrecarrega a capacidade do sistema linfático pulmonar. A ascite se desenvolve em pessoas com aumento da pressão nas veias hepáticas e nas veias que drenam no peritônio. Isso geralmente reflete insuficiência ventricular direita e elevação da pressão venosa sistêmica na insuficiência cardíaca crônica que já acontece há muito tempo. ● Caquexia e desnutrição Caquexia cardíaca é uma condição resultante de desnutrição e da perda de tecido que ocorre em pessoas com insuficiência cardíaca em fase terminal. Diversos fatores provavelmente contribuem para o seu desenvolvimento, incluindo fadiga e depressão, que interferem na ingestão de alimentos; congestão das estruturas hepáticas e gastrointestinais, que prejudica a digestão e a absorção, enquanto produz sensação de saciedade; e circulação de toxinas e mediadores liberados de tecidos com perfusão prejudicada, que comprometem o apetite e contribuem para a perda de tecido. Há vasoconstrição pois não é órgão nobre, reduzindo a absorção de nutrientes e menor esvaziamento (menor peristaltismo). Cria edema da parede intestinal que reduz a absorção. ● Cianose É a coloração azulada que surge na pele e nas mucosas causada pelo excesso de hemoglobina dessaturada no sangue; muitas vezes é um sinal tardio de Maria Paula - 105 FMT insuficiência cardíaca. A cianose pode ser central, causada por dessaturação arterial resultante de comprometimento das trocas gasosas pelos pulmões, ou periférica, causada por dessaturação venosa resultante de extensa extração de oxigênio no nível dos capilares. A cianose central é causada por condições que prejudicam a oxigenação do sangue arterial, como edema pulmonar, insuficiência cardíaca esquerda ou desvio cardíaco da direita para a esquerda. A cianose periférica é causada por condições como insuficiência de baixo débito que resulta na entrega deficiente de sangue oxigenado aos tecidos periféricos, ou por condições como vasoconstrição periférica, que causa remoção excessiva de oxigênio do sangue. A cianose central pode ser mais bem acompanhada pela coloração dos lábios e mucosas, porque essas áreas não estão sujeitas a outras condições, como um ambiente frio, que provoca cianose periférica. Pessoas com insuficiência cardíaca direita ou esquerda podem desenvolver cianose, especialmente ao redor dos lábios e nas áreas periféricas dos membros. ● Arritmias e morte súbita cardíaca Tanto arritmias atriais quanto ventriculares podem ocorrer em pessoas com insuficiência cardíaca. A fibrilação atrial é o tipo mais comum de arritmia. As manifestações clínicas estão relacionadas com perda da contração atrial, taquicardia, frequência cardíaca irregular e sintomas associados a uma queda de pressão arterial. Também existem fortes indícios de que pessoas com insuficiência cardíaca apresentam risco maior de parada cardíaca súbita; Isto é, morte não testemunhada e morte que ocorre no intervalo de uma hora após o aparecimento dos sintomas. Em pessoas com disfunção ventricular, a morte súbita é causada mais frequentemente por taquicardia ventricular ou fibrilação ventricular.