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Intoxicações exógenas na pediatria Intoxicação é a manifestação, através de sinais e sintomas, dos efeitos nocivos produzidos em um organismo vivo como resultado da sua interação com alguma substância química (exógena) que necessitam de atendimento de urgência e/ou emergência devido ao risco à saúde. Crianças menores de cinco anos de idade formam um grupo particularmente vulnerável às intoxicações acidentais, principalmente devido à curiosidade inerente à idade, elas exploram o ambiente de forma íntima com todos os sentidos, o que favorece o contato e a ingestão de agentes tóxicos. Epidemiologia Em 2002, segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde, cerca de 350 mil mortes devido às intoxicações ocorreram no mundo, sendo pelo menos 10% em menores de 15 anos de idade. As causas externas, entre as quais se incluem os acidentes, homicídios, suicídios e outras violências, muitas delas causadas por intoxicações agudas exógenas, constituem a primeira causa de morte a partir dos dois anos de idade. Dentre os 13 agentes tóxicos considerados pelo SINITOX (Sistema Nacional de Informações Tóxico- Farmacológicas), os medicamentos ocupam a primeira posição nas intoxicações em crianças e adolescentes. Os principais agentes tóxicos mais letais foram: medicamentos, agrotóxicos de uso agrícola, domissánitarios, produtos químicos e animais peçonhentos. As intoxicações devem ser sempre investigadas devido aos casos de subnotificação, principalmente, em crianças por serem um grupo de risco que apresentam alterações de nível de consciência, convulsões, comprometimento hemodinâmico ou respiratório ou distúrbios metabólicos sem causa claramente definida. As principais causas para o contato de crianças e adolescentes com produtos considerados tóxicos são o armazenamento incorreto e a supervisão inadequada. Diagnóstico O diagnóstico é baseado na história clínica, no exame físico e nos exames laboratoriais. No exame físico encontram-se manifestações sugestivas para o diagnóstico etiológico da intoxicação. Deve se procurar alterações de pele em relação à temperatura, cor, odor, estado de hidratação, presença de lesões, principalmente vasculares como púrpuras. Na boca avalia-se hálito, salivação e lesões na mucosa. Nos olhos deve se verificar as conjuntivas, pupilas, movimentos oculares externos e lacrimejamento. No sistema nervoso, avalia - se o nível de consciência através da escala de coma de Glasgow, tônus musculares, presença de convulsões, presença de movimentos involuntários e estado mental (psicose, orientação, delírio). Em relação ao sistema cardiocirculatório verifica-se a frequência cardíaca, ritmo cardíaco, perfusão capilar periférica e pressão arterial. No sistema respiratório examina-se a frequência respiratória, padrão respiratório e ausculta. Na avaliação gastrintestinal verifica-se a presença de vômitos, dor abdominal, constipação e diarreia. Para facilitar o diagnóstico de um paciente pediátrico ou adulto inconsciente intoxicado são necessárias informações adquiridas pelos acompanhantes ou responsáveis como: acessibilidade de substâncias tóxicas no domicílio, onde o indivíduo esteve nas horas precedentes, antecedentes patológicos e antecedentes de uso de medicamentos pelo paciente e pelos familiares. Quando há o conhecimento da substância tóxica ingerida é fundamental o levantamento de informações relativas à quantidade ingerida, o tempo decorrido da exposição se foi acidental ou intencional e se pode haver outra substância envolvida. Atendimento O atendimento do paciente intoxicado segue uma série de etapas, geralmente, mas não necessariamente, sequenciais. Esquematicamente são as seguintes: avaliação clínica inicial; estabilização; reconhecimento da toxíndrome e identificação do agente causal; descontaminação; administração de antídotos; aumento da eliminação do tóxico absorvido; tratamento sintomático. Intoxicação por medicamentos na pediatria Paracetamol O paracetamol é o analgésico e antipirético mais amplamente usado em pediatria, em diferentes apresentações e, por isso, muito comumente disponível nas residências, onde acontecem a maioria dos acidentes por ingestão de doses inapropriadas. • Dose tóxica Crianças: 150-200mg/kg (crianças menores de 10-12 anos parecem menos suscetíveis à hepatotoxicidade, devido à menor contribuição do citocromo P-450 para o metabolismo do paracetamol). Quadro clínico Dividido em horas após a ingesta: - 30 minutos a 24 horas: anorexia, vômitos, mal- estar. Em casos raros, a superdosagem poderá causar alteração do estado de consciência e acidose metabólica, piorando expressivamente o prognóstico. - 24 a 48 horas: dor abdominal no quadrante superior direito, elevação das transaminases (AST>ALT) e redução do tempo de protrombina (TP). - 3 a 5 dias: pico das transaminases, desenvolvimento da falência hepática e de demais sistemas, morte ou início da recuperação. - 4 dias a 2 semanas: resolução da função hepática (melhora clínica precede à melhora histológica). Tratamento Vômito espontâneo: deverá ser tratado com ondansetrona, a fim de não retardar a terapêutica com o antídoto oral ou carvão ativado. Transplante hepático: poderá ser de emergência em casos de insuficiência hepática fulminante (encefalopatia, acidose metabólica, hipoglicemia ou aumento progressivo no tempo de protrombina são indícios de lesão hepática grave). Antídoto N-acetilcisteína (NAC): -- Dosagem oral inicial: 140mg/kg – Dose de manutenção: 70mg/kg a cada 4 horas. – Dose endovenosa: inicial de 150mg/kg (40- 60min); primeira dose de manutenção de 50mg/kg (em 4 horas); segunda dose de manutenção 100mg/kg (em 16 horas). Descontaminação: administrar carvão ativado via oral se o risco de intoxicação justifica o risco da administração do carvão. Pode ser administrado em um período de 60 a 120 minutos após a ingestão. A lavagem gástrica não é necessária após ingestões pequenas a moderadas caso o carvão ativado seja administrado prontamente. Eliminação aumentada: a hemodiálise é eficiente, mas raramente necessária pois a terapia com NAC é bastante satisfatória. Ibuprofeno Agente anti-inflamatório não-esteroidal, popularmente usado como analgésico e antipirético. • Dose tóxica: A ingestão aguda de dose inferior a 200mg/ kg raramente causa toxicidade, mas a ingestão superior a 400mg/kg pode produzir efeitos sérios como alteração de sensório e acidose metabólica. Quadro clínico Os sintomas, em geral, aparecem 4 a 6 horas após a ingestão e desaparecem em 24 horas. Manifestações como náuseas, vômitos e dor abdominal são comuns. Sangramentos gastrintestinais e úlceras são descritos com o uso crônico. Após ingestão massiva (acima de 400mg/kg), os pacientes podem apresentar alteração de sensório, acidose metabólica, insuficiência renal e, mais raramente, depressão respiratória. Diagnóstico Avaliação da função renal, gasometria, hemograma com plaquetas, provas de coagulação. Tratamento Suporte de acordo com a evolução. Descontaminação com carvão ativado no máximo em 2 horas após a ingestão. Não há antídoto específico. Pacientes assintomáticos após 4 a 6 horas da ingestão podem ser considerados livres do medicamento.
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