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Organização das Nações Unidas


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DESCRIÇÃO
A origem, as dinâmicas e o funcionamento da Organização das Nações Unidas e seus principais órgãos.
PROPÓSITO
Apresentar a principal organização internacional do mundo, a Organização das Nações Unidas (ONU), de modo a compreender o papel que ela exerce na política global, no desenvolvimento do Direito Internacional e na promoção e proteção dos Direitos Humanos em todo o mundo.
PREPARAÇÃO
Antes de iniciar o conteúdo deste tema, tenha à mão um vade-mécum de Direito Internacional ou, ao menos, a Carta das Nações Unidas para verificar as referências destacadas.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Reconhecer as atribuições e as resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas
MÓDULO 2
Reconhecer os Estados-membros permanentes e as atribuições do Conselho de Segurança das Nações Unidas
MÓDULO 3
Identificar as origens e o funcionamento do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas
INTRODUÇÃO
Neste tema, conheceremos os principais órgãos da Organização das Nações Unidas: a Assembleia Geral, o Conselho de Segurança, o Secretariado e o Conselho de Direitos Humanos.
Também discutiremos a composição, os mandatos e os métodos de funcionamento de cada um desses organismos, com destaque para suas particularidades.
Além disso, a ONU servirá também de exemplo sobre como as organizações internacionais funcionam na prática. Seus processos de tomada de decisão, o caráter das normas que produz e os instrumentos à sua disposição serão contextualizados de acordo com o objetivo consagrado na Carta das Nações Unidas para a ONU: garantir a paz e a segurança internacional.
MÓDULO 1
Reconhecer as atribuições e as resoluções da Assembleia Geral das Nações Unidas
Fonte: EQRoy / Shutterstock
A ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS (AGNU)
A Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) é um dos seis principais órgãos da Organização das Nações Unidas (ONU), juntamente com o Conselho de Segurança, o Secretariado, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela e a Corte Internacional de Justiça.
A AGNU é resultado de um longo processo de evolução na forma de negociação entre os Estados e se inspira nas práticas recorrentes das conferências internacionais do século XIX e na experiência da Liga das Nações.
Com o avanço do multilateralismo – a prática de se discutir e trabalhar um tema simultaneamente entre diversos atores, contraposta ao bilateralismo – ao longo do século XIX, multiplicaram-se as chamadas conferências internacionais. Convocadas em resposta a momentos ou necessidades específicos, essas conferências ofereciam a oportunidade para que diversos Estados (ou outras formas de unidade política, como reinos e cidades-Estados) pudessem discutir problemas e chegar a soluções compartilhadas, aplicáveis a todos. Com frequência, essas conferências resultam em grandes tratados multilaterais que vinculam todos os signatários igualmente. Alguns exemplos são o Congresso de Viena, convocado após a derrota de Napoleão, e a Conferência de Berlim, que discutiu a repartição de territórios coloniais.
A Liga das Nações já incluía, entre seus órgãos principais, uma Assembleia Geral em formato semelhante àquele adotado pela Carta da ONU. Baseava-se em práticas e regras parlamentares e tinha como presunção os princípios básicos de publicidade e diplomacia aberta.
LIGA DAS NAÇÕES
Sociedade das Nações, também conhecida como Liga das Nações, foi uma organização internacional, idealizada em 28 de abril de 1919, em Versalhes, nos subúrbios de Paris, onde as potências vencedoras da Primeira Guerra Mundial se reuniram para negociar um acordo de paz. Sua última reunião ocorreu em abril de 1946.
Fonte: Wikipédia
CONGRESSO DE VIENA
O Congresso de Viena foi uma conferência entre embaixadores das grandes potências europeias que aconteceu na capital austríaca, entre setembro de 1814 e junho de 1815, cuja intenção era a de redesenhar o mapa político do continente europeu após a derrota da França napoleônica na primavera anterior.
Fonte: Wikipédia
Fonte: Furfur / Wikimedia Commons
CONFERÊNCIA DE BERLIM
A Conferência de Berlim, também conhecida como conferência da África Ocidental ou Conferência do Congo, realizou-se em Berlim, de 15 de novembro de 1884 a 26 de fevereiro de 1885, marcando a colaboração europeia na partição e divisão territorial da África.
Fonte: Wikipédia
Fonte: Eric Gaba / Wikimedia Commons
 SAIBA MAIS
A expansão da ONU, ao longo do século XX, representou também a expansão da AGNU, uma vez que todos os Estados-membros estão lá representados. Enquanto, em 1945, apenas 51 países faziam parte da organização (como fundadores) e da AGNU, no início dos anos 2000 esse número já passava de 190 países.
AS ATRIBUIÇÕES DA ASSEMBLEIA GERAL
De acordo com a Carta da ONU, a Assembleia Geral tem as seguintes atribuições:
ART. 11.1
Discutir quaisquer questões ou assuntos que estiverem dentro das finalidades da presente Carta ou que se relacionarem com as atribuições e funções de qualquer dos órgãos nela previstos e fazer recomendações aos Membros das Nações Unidas ou ao Conselho de Segurança.
ART. 11.3
Solicitar a atenção do Conselho de Segurança para situações que possam constituir ameaça à paz e à segurança internacionais.
ART. 13.1
Iniciar estudos e fazer recomendações, destinados a: a) promover a cooperação internacional no terreno político e incentivar o desenvolvimento progressivo do Direito Internacional e a sua codificação; e b) promover a cooperação internacional nos terrenos econômico, social, cultural, educacional e sanitário e favorecer o pleno gozo dos Direitos Humanos e das liberdades fundamentais, por parte de todos os povos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.
ART. 14
Recomendar medidas para a solução pacífica de qualquer situação, qualquer que seja sua origem, que lhe pareça prejudicial ao bem-estar geral ou às relações amistosas entre as nações, inclusive em situações que resultem da violação dos dispositivos da presente Carta que estabelecem os Propósitos e Princípios das Nações Unidas.
ART. 17.1
Considerar e aprovar o orçamento da organização.
(DECRETO 19.841/1945)
Grande parte das votações na AGNU é decidida por maioria simples, exceto um conjunto de atribuições específicas, listado no artigo 18 da Carta, que depende de aprovação de dois terços dos membros. Nessas votações, destacam-se as atribuições de eleger os membros não permanentes do Conselho de Segurança e os membros do Conselho Econômico e Social e, conjuntamente com o Conselho de Segurança, a admissão de novos membros à organização, assim como a suspensão e a expulsão de membros da organização.
A AGNU é responsável também, conjuntamente com o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), pela designação de juízes da Corte Internacional de Justiça (art. 4 do Estatuto da Corte) e pela seleção do secretário-geral da ONU.
Assista ao vídeo para conhecer o resumo sobre o funcionamento da AGNU.
O FUNCIONAMENTO DA AGNU
A agenda temática da AGNU é bastante ampla, segundo a própria designação da Carta da ONU: quaisquer questões ou assuntos que estiverem dentro das finalidades da presente Carta ou que se relacionarem com as atribuições e funções de qualquer dos órgãos nela previstos (art. 10).
Estão excluídas, em tese, apenas as controvérsias ou situações sobre as quais o Conselho de Segurança já estiver atuando (art. 12) e questões relativas à jurisdição doméstica (art. 2.7). Na prática, a AGNU tem aceitado poucas restrições em relação a temas sobre os quais pode atuar.
Justamente por conta dessa amplíssima agenda, a Assembleia Geral é integrada por seis comitês temáticos que lidam mais diretamente com cada tema:
PRIMEIRO COMITÊ
Desarmamento e segurança internacional
SEGUNDO COMITÊ
Economia e finanças
TERCEIRO COMITÊ
Questões sociais, humanitárias e culturais
QUARTO COMITÊ
Política especial e descolonização
QUINTO COMITÊ
Administrativo e orçamentário
SEXTO COMITÊ
Legal (desenvolvimento do Direito Internacional)
Usualmente, a AGNU funciona por meio de sessões regulares, que duram de setembro a dezembro e são iniciadas por uma cerimônia conhecida como a Abertura da AssembleiaGeral, onde os chefes dos Estados-membros e outros líderes da ONU discursam, tratando de fatos relevantes no cenário internacional e perspectivas para a sessão que se inicia. O presidente da República do Brasil (ou seu indicado) costuma ser o primeiro dos líderes a discursar, em função de uma tradição histórica que remonta à fundação da ONU.
A AGNU também pode convocar sessões especiais para discutir temas específicos ou mesmo para finalizar a aprovação de um tratado internacional que tenha sido elaborado pelo sexto comitê ou pela Comissão de Direito Internacional.
EXEMPLO
Por exemplo, a ocorrência de uma sessão especial da Assembleia Geral da ONU sobre corrupção.
AS RESOLUÇÕES DA ASSEMBLEIA GERAL
Quanto às resoluções adotadas pela AGNU, é importante compreender a sua força normativa. Há resoluções que têm caráter obrigatório, como aquelas que definem questões relacionadas ao orçamento ou de administração da Organização das Nações Unidas (art. 17, da Carta da ONU). Em regra, no entanto, as resoluções têm caráter meramente recomendatório, expressando a opinião da maioria dos Estados sobre determinado assunto ou questão.
É isso que consagra o art. 10 da Carta da ONU quando delimita a atribuição da AGNU a realizar recomendações:
ARTIGO 10. A ASSEMBLEIA GERAL PODERÁ DISCUTIR QUAISQUER QUESTÕES OU ASSUNTOS QUE ESTIVEREM DENTRO DAS FINALIDADES DA PRESENTE CARTA OU QUE SE RELACIONAREM COM AS ATRIBUIÇÕES E FUNÇÕES DE QUALQUER DOS ÓRGÃOS NELA PREVISTOS E, COM EXCEÇÃO DO ESTIPULADO NO ARTIGO 12, PODERÁ FAZER RECOMENDAÇÕES AOS MEMBROS DAS NAÇÕES UNIDAS OU AO CONSELHO DE SEGURANÇA OU A ESTE E ÀQUELES, CONJUNTAMENTE, COM REFERÊNCIA A QUALQUER DAQUELAS QUESTÕES OU ASSUNTOS.
(DECRETO 19.841/1945)
Isso não quer dizer, no entanto, que as resoluções da AGNU sejam desprovidas de força normativa. Com o progressivo fortalecimento da AGNU e a expansão da sua agenda, foi aprovada uma série de resoluções com conteúdo inegavelmente importante, como, por exemplo, a Declaração sobre os princípios de Direito Internacional relativo às relações amistosas e à cooperação entre os Estados de acordo com a Carta da ONU e a Declaração sobre a concessão de independência aos países e povos coloniais.
As resoluções da Assembleia Geral passaram a ocupar um papel fundamental na própria comprovação do costume internacional, que é fonte primária do Direito Internacional, tradicionalmente entendido como composto, necessariamente, por dois elementos: (i) a prática reiterada dos Estados, fatos materiais, o comportamento propriamente dito dos Estados; (ii) a crença de que uma atividade estatal é legalmente obrigatória, a opinio juris.
As resoluções da AGNU – fórum universal do qual fazem parte virtualmente todos os Estados – podem exercer um papel duplo na comprovação de costumes internacionais. A maneira como votam e argumentam os Estados constituem provas práticas dos Estados e do seu entendimento do Direito. As resoluções constituem, ainda, prova da existência de uma opinio juris formada ou em formação em relação aos temas dos quais tratam.
OPINIO JURIS
Art. 38. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o Direito Internacional as controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará: b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito.
Fonte: Estatuto da CIJ
A Corte Internacional de Justiça, no caso Legalidade da Ameaça ou do Uso de Armas Nucleares, manifestou-se no sentido de que as resoluções da Assembleia Geral, mesmo que não sejam vinculantes, podem às vezes ter valor normativo. Em certas circunstâncias, podem constituir provas importantes para se identificar a existência de uma norma ou o surgimento de uma opinio juris (CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA, 1996).
Fonte: Ankor Light / Shutterstock
Para além desse papel com relação aos costumes internacionais, as resoluções da AGNU também exercem uma função importante, com frequência, ao oferecerem interpretações (autorizadas, com legitimidade correspondente) da Carta da ONU e dos vários princípios nela constantes.
 SAIBA MAIS
A AGNU desempenha ainda, especialmente, por meio do sexto comitê, um papel importante na codificação do Direito Internacional. A AGNU também criou a Comissão de Direito Internacional, composta por 34 especialistas, dedicada a produzir relatórios, estudos e, principalmente, projetos de tratados internacionais a serem discutidos e, eventualmente, assinados pelos Estados em conferências especificamente dedicadas a esse fim, convocadas pela ONU. Convenções internacionais sobre Direito do Mar, Relações Diplomáticas e Direito dos Tratados, por exemplo, seguiram esse trâmite.
SECRETARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS
O Secretariado Geral da ONU é outro dos seis principais órgãos da organização. Composto por mais de 32 mil funcionários, é a máquina administrativa que realiza e concretiza as atividades da organização e apoia o funcionamento dos demais órgãos.
É importante destacar o mandamento pela independência e autonomia dos funcionários do Secretariado da ONU em relação aos Estados-partes da organização, constante na Carta, no artigo 100:
1. NO DESEMPENHO DE SEUS DEVERES, O SECRETÁRIO-GERAL E O PESSOAL DO SECRETARIADO NÃO SOLICITARÃO NEM RECEBERÃO INSTRUÇÕES DE QUALQUER GOVERNO OU DE QUALQUER AUTORIDADE ESTRANHA À ORGANIZAÇÃO. ABSTER-SE-ÃO DE QUALQUER AÇÃO QUE SEJA INCOMPATÍVEL COM A SUA POSIÇÃO DE FUNCIONÁRIOS INTERNACIONAIS RESPONSÁVEIS SOMENTE PERANTE A ORGANIZAÇÃO.
2. CADA MEMBRO DAS NAÇÕES UNIDAS SE COMPROMETE A RESPEITAR O CARÁTER EXCLUSIVAMENTE INTERNACIONAL DAS ATRIBUIÇÕES DO SECRETÁRIO-GERAL E DO PESSOAL DO SECRETARIADO E NÃO PROCURARÁ EXERCER QUALQUER INFLUÊNCIA SOBRE ELES, NO DESEMPENHO DE SUAS FUNÇÕES.
(DECRETO 19.841/1945)
Consta, assim, que, apesar de nacionais dos diferentes Estados-partes, os funcionários da ONU atuam de maneira independente em relação aos seus interesses, contribuindo, direta e unicamente, para as atividades, os princípios e objetivos da organização.
O secretário-geral desempenha duas funções simultâneas: a chefia administrativa da Organização das Nações Unidas, como um todo, e a liderança do Secretariado, que é um órgão da ONU criado pela Carta, com competências e atribuições específicas (JONAH, 2008). É o principal representante e diplomata da ONU, a voz e a face da organização para o mundo. Frequentemente desempenha bons ofícios e atividades de mediação para contribuir com a identificação de soluções pacíficas de controvérsias e crises entre os Estados-partes. (SHAW, 2010)
O secretário-geral desempenha um conjunto de atividades que lhe podem ser atribuídas pelo Conselho de Segurança, pela Assembleia Geral, pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC) e pelos demais órgãos do Sistema ONU. Pode também levar diretamente uma questão que, na sua percepção, ameace a paz e a segurança internacional para o Conselho de Segurança (art. 99, da Carta da ONU).
Do ponto de vista administrativo, o secretário-geral elabora o orçamento da organização, que é arcado pelos Estados-partes, os quais contribuem com cotas diferentes e proporcionais, fixadas pela AGNU (art. 17, da Carta da ONU). Ele deverá apresentar também um relatório anual à AGNU sobre os trabalhos da organização (art. 98, da Carta da ONU).
A escolha da pessoa que ocupará esse posto é realizada, em tese, pela Assembleia Geral, a partir de uma recomendação do Conselho de Segurança (art. 97, da Carta da ONU). Na prática, são o CSNU e, especialmente, os seus cinco membros permanentes que definem o escolhido. É comum a realização de amplas campanhas pelos pretendentes a esse cargo, que incluem altos funcionários de carreira da ONU, ministros de Relações Exteriores, chefes de Estado e Governo. Essas campanhas podem ser patrocinadas pelos governos que veem na elevação de seu nacional a esse posto uma demonstração de prestígio e influência, ainda que o secretário-geral seja independente de todo e qualquer governo, incluindo aquele de nacionalidade.
O mandato do secretário-geral é de cinco anos, podendo ser renovado apenas uma vez, o que costuma acontecer. AONU já teve nove secretários-gerais, originários de diferentes países e regiões, evidenciando um esforço de se garantir a rotação geográfica na seleção do ocupante desse posto de destaque:
Fonte: Cancillería Argentina / Wikipedia
ANTÓNIO GUTERRES
(Portugal)
2017 (atual)
Fonte: World Economic Forum / Wikipedia
BAN KI-MOON
(Coreia do Sul)
2007 a 2016
Fonte: US Mission in Geneva / Wikipedia
KOFI ANNAN
(Gana)
1997 a 2006
Fonte: Fernando Pereira / Anefo - Wikipedia
BOUTROS BOUTROS-GHALI
(Egito)
1992 a 1996
Fonte: Rob Bogaerts / Anefo - Wikipedia
JAVIER PÈREZ DE CUÈLLAR
(Peru)
1982 a 1991
Fonte: Fritz Basch / Wikipedia
KURT WALDHEIM
(Áustria)
1972 a 1981
Fonte: Jac. de Nijs / Anefo - Wikipedia
U THANT
(Mianmar)
1961 a 1971
Fonte: Domínio público
DAG HAMMARSKJÖLD
(Suécia)
1953 a 1961
Fonte: Atelier Benkow / Wikipedia
TRYGVE LIE
(Noruega)
1946 a 1952
No processo de recrutamento profissional do Secretariado, há um esforço contínuo para se garantir que a representatividade do corpo de funcionários corresponda à diversidade de membros da Organização, como faz referência o art. 101.3 da Carta da ONU. Outros fatores, como a contribuição financeira de cada Estado para a ONU, também impactam o nível desejado/mínimo de nacionais de cada país entre os funcionários permanentes da ONU (JONAH, 2008).
EXEMPLO
O Brasil, por exemplo, é um país sub-representado no corpo de funcionários da ONU, ou seja, há menos brasileiros do que o desejado, considerando a representatividade geográfica do país.
ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA
OS DIREITOS HUMANOS
O Escritório do Alto Comissariado para Direitos Humanos é a principal entidade da ONU sobre os Direitos Humanos. Ele foi criado pela Assembleia Geral em 1993, por meio da Resolução 48/141. A recomendação para que fosse criado o Escritório surgiu na Conferência Internacional de Direitos Humanos, de 1993, que culminou na Declaração de Viena e no Programa de Ação.
O mandato do Escritório do Alto Comissário para Direitos Humanos da ONU inclui diversas atribuições:
ATRIBUIÇÕES
· Promover e proteger os Direitos Humanos para todos;
· Recomendar que todos os organismos do Sistema ONU aprimorem seus esforços de promoção e proteção dos Direitos Humanos;
· Promover e proteger o direito ao desenvolvimento;
· Fornecer assistência técnica aos Estados em atividades relacionadas aos Direitos Humanos;
· Coordenar os programas de educação e informação pública da ONU sobre Direitos Humanos;
· Trabalhar ativamente para remover os obstáculos para a concretização dos Direitos Humanos e prevenir violações a estes direitos;
· Engajar-se em diálogos com governos para garantir o respeito aos Direitos Humanos;
· Aprofundar a cooperação internacional para a promoção e proteção dos Direitos Humanos;
· Coordenar as atividades de promoção e proteção dos Direitos Humanos no Sistema ONU;
· Racionalizar, adaptar, fortalecer os mecanismos de proteção aos Direitos Humanos do Sistema ONU.
(ONU, 2020)
A liderança do Escritório, ou seja, o Alto Comissário para Direitos Humanos, é selecionada pelo secretário-geral da ONU, cuja escolha deve ser ratificada pela Assembleia Geral. Desde 2018, Michelle Bachelet, ex-presidente do Chile, é a Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
Parte superior do formulário
1. QUAL DAS ATRIBUIÇÕES ABAIXO A CARTA DA ONU NÃO CONCEDE À ASSEMBLEIA GERAL?
Considerar e aprovar o orçamento da organização.
Recomendar medidas para a solução pacífica de qualquer situação.
Autorizar a aplicação de uma sanção a um Estado que cometeu ato de agressão contra outro.
Solicitar a atenção do Conselho de Segurança para situações que possam constituir ameaça à paz e à segurança internacionais.
Discutir temas considerados relevantes para o desenvolvimento internacional.
Parte inferior do formulário
Parte superior do formulário
2. SINALIZE A OPÇÃO QUE NÃO CORRESPONDE A UMA FUNÇÃO DAS RESOLUÇÕES DA ASSEMBLEIA GERAL DA ONU:
Demonstram a opinião da comunidade internacional sobre dado tema.
Decidem questões internas, como o orçamento da organização.
Servem de prova da existência de uma opinio juris.
Vinculam os Estados, impondo sanções no caso do seu descumprimento.
São provas das práticas dos Estados para fins da demonstração da existência de um costume internacional.
Parte inferior do formulário
GABARITO
1. Qual das atribuições abaixo a Carta da ONU não concede à Assembleia Geral?
A alternativa "C " está correta.
Autorizar a aplicação de sanções é uma atribuição privativa do Conselho de Segurança. Assim sendo, está correta a letra C.
2. Sinalize a opção que não corresponde a uma função das resoluções da Assembleia Geral da ONU:
A alternativa "D " está correta.
A letra D está correta, pois as resoluções da AGNU não têm caráter obrigatório, mas sim de recomendação.
MÓDULO 2
Reconhecer os Estados-membros permanentes e as atribuições do Conselho de Segurança das Nações Unidas
Fonte: Andrea Izzotti / Shutterstock
O CONSELHO DE SEGURANÇA DA ORGANIZAÇÃO
DAS NAÇÕES UNIDAS
NOÇÕES GERAIS
O Conselho de Segurança das Nações Unidas guarda a responsabilidade primária pela manutenção da paz e da segurança internacional, conforme explicita o art. 24 da Carta da ONU:
A FIM DE ASSEGURAR PRONTA E EFICAZ AÇÃO POR PARTE DAS NAÇÕES UNIDAS, SEUS MEMBROS CONFEREM AO CONSELHO DE SEGURANÇA A PRINCIPAL RESPONSABILIDADE NA MANUTENÇÃO DA PAZ E DA SEGURANÇA INTERNACIONAIS E CONCORDAM EM QUE NO CUMPRIMENTO DOS DEVERES IMPOSTOS POR ESSA RESPONSABILIDADE O CONSELHO DE SEGURANÇA AJA EM NOME DELES.
(DECRETO 19.841/1945)
O CSNU tem atribuições mais específicas também, dentro do Sistema ONU. É responsável por recomendar o nome do secretário-geral da ONU para escolha da Assembleia Geral (art. 97 da Carta da ONU) e por selecionar, também em conjunto com a AGNU, os juízes da Corte Internacional de Justiça (art. 4, Estatuto da CIJ).
A admissão de novos membros à ONU depende também de recomendação por parte do CSNU (art. 4.2 da Carta da ONU). Atualmente, o reconhecimento de novos Estados tem passado, na prática, por sua admissão à ONU. Representa a consumação do amplo reconhecimento da comunidade internacional em relação àquele novo ente político, e a aprovação do Conselho de Segurança é passo-chave para esse reconhecimento.
EXEMPLO
A título de exemplo, vale mencionar o esforço da Palestina para ser admitida à ONU. Esse esforço tem sido frustrado, apesar de um reconhecimento amplo do seu status entre a maioria dos países, pela oposição dos Estados Unidos, membro permanente do CSNU. Atualmente, a Palestina tem status de Estado não membro observador na ONU.
A agenda do CSNU tem se expandido de maneira progressiva, especialmente a partir do final da Guerra Fria. Do ponto de vista temático, as restrições à sua atuação dependem da interpretação conferida aos conceitos de paz e segurança internacional. Nota-se, especialmente, desde a década de 1990, uma disposição em se interpretar esses conceitos de forma cada vez mais extensa.
Como resultado, atualmente, o Conselho de Segurança identifica como ameaças à paz e à segurança internacional uma série de fenômenos e situações bastante diversas daquelas relacionadas estritamente a agressões militares e conflitos armados que inspiraram a sua constituição.
VOCÊ SABIA
Questões como violações a Direitos Humanos, o crime organizado e o tráfico de drogas, o terrorismo e a pirataria, as mudanças climáticas e a corrupção têm sido consideradas, em níveis variados, ameaças à segurança internacional que justificam a atuação do Conselho de Segurança.
COMPOSIÇÃO E TOMADA DE DECISÃO DO CSNU
O CSNU é composto por 15 membros, dos quais cinco (Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido) são membros permanentes. Os demais 10 membros são temporários, exercendo mandatos de dois anos. Esses 10 membros são escolhidos por meio de eleição da Assembleia Geral, de acordo com um critério que garante diversidade geográfica. Considera-se que 5 membros devem se originar na Ásia e na África, 1 na Europa Oriental, 2 na América Latina e 2 na Europa Ocidental. A depender da questãodiscutida, outros países poderão ser convidados para participar das reuniões, sem poder de voto. O secretário-geral da ONU também costuma participar das reuniões.
O Conselho de Segurança tem um presidente que é o representante de um dos Estados-membros, mas esse posto rotaciona mensalmente, seguindo a ordem alfabética. Trata-se de uma posição mais procedimental, considerando que o presidente é responsável por guiar as reuniões (LUCK, 2006).
MEMBROS PERMANENTES
Inicialmente, o Conselho contava com apenas seis membros não permanentes e um total de 11 membros. A expansão do número de Estados-partes da ONU, no entanto, com a onda de descolonização afro-asiática, gerou uma pressão para aumentar o número de representantes no CSNU. Em 1963, a Assembleia Geral aprovou uma emenda à Carta da ONU acrescentando mais 4 membros não permanentes ao Conselho (LUCK, 2006).
A determinação dos membros permanentes foi realizada durante as negociações sobre a Carta da ONU em São Francisco (EUA), reservando-se espaço de destaque justamente aos países que haviam vencido a Segunda Guerra Mundial. Além de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança, esses cinco países possuem também aquilo que ficou conhecido como poder de veto. Formalmente, a Carta da ONU prevê que qualquer resolução, para ser aprovada, precisa receber o voto favorável de nove membros do Conselho, incluindo os cinco membros permanentes.
Fonte: Andrii Yalanskyi / Shutterstock
Duas ressalvas precisam ser feitas. Quanto às resoluções ditas processuais, não haveria poder de veto, de modo que a oposição de um membro permanente não seria suficiente para impedir a sua aprovação (Art. 27.2 da Carta da ONU). A experiência prática mostra, contudo, que a distinção entre resoluções processuais e materiais é frágil e a própria definição do que seria ou não uma resolução processual estaria sujeita à votação do Conselho, onde o veto poderia ser exercido. Em segundo lugar, passou-se a reconhecer a possibilidade de que os membros permanentes se abstivessem de votações sem que isso implicasse na derrota das resoluções em questão.
Assim, uma resolução será aprovada caso alcance os nove votos necessários, mesmo que não conte com o apoio dos cinco membros permanentes – desde que nenhum deles vote contrariamente.
 SAIBA MAIS
O chamado poder de veto foi exercido com frequência variável nos últimos anos, com um pico ao longo das décadas de 1980 e 1990 (LUCK, 2006). A quantidade numérica de vezes em que um membro permanente exerceu essa faculdade não representa efetivamente seu impacto sobre as deliberações. Isso porque, na maioria das vezes, a própria ameaça de um voto contrário é suficiente para evitar que a resolução seja colocada em discussão e votação.
OS INSTRUMENTOS DE FUNCIONAMENTO DO CSNU
De maneira geral, o Conselho de Segurança atua por meio de resoluções, que podem ter naturezas distintas, a depender da base jurídica que as fundamente.
No caso das resoluções adotadas sob a égide do Capítulo VI da Carta da ONU (Solução Pacífica de Controvérsias), diz-se que a resolução tem caráter recomendatório. São os casos em que, confrontado com uma ameaça à paz e à segurança internacional, o Conselho busca resolvê-la por meios pacíficos, convidando as partes envolvidas a se engajar em esforços de negociação, inquérito, mediação, conciliação, arbitragem, solução judicial, recurso a entidades ou acordos regionais, ou a qualquer outro meio pacífico à sua escolha (art. 33 da Carta da ONU). O caráter recomendatório é explicitado nos artigos 36.3 e 38.
O objetivo desse item é explicitar a função do Conselho de Segurança, em situações de ameaça à paz e à segurança internacional, de buscar mais informações e investigá-las para, em seguida, apresentar recomendações no sentido de resolvê-las de modo pacífico (LUCK, 2006).
Por outro lado, as resoluções adotadas sob a égide do Capítulo VII da Carta da ONU (Ação relativa a ameaças à paz, ruptura da paz e atos de agressão) têm caráter obrigatório. Objetivando endereçar uma ameaça à paz e à segurança internacional, o CSNU poderá tomar dois tipos de medidas cujo cumprimento é compulsório a todos os Estados:
MEDIDA 1
MEDIDA 2
MEDIDA 1
Medidas que não envolvem o uso da força, como, por exemplo, a interrupção completa ou parcial das relações econômicas, dos meios de comunicação, ferroviários, marítimos, aéreos, postais, telegráficos, radiofônicos, ou de outra espécie e o rompimento de relações diplomáticas (art. 41, da Carta da ONU).
MEDIDA 2
Medidas que envolvem o uso da força, como demonstrações, bloqueios e outras operações por parte das forças aéreas, navais ou terrestres dos Membros das Nações Unidas (art. 42, da Carta da ONU).
Essas medidas não só têm caráter obrigatório, como são também executáveis. Isso porque a própria Carta da ONU (artigo 43 e seguintes) explicita os meios que devem ser colocados à disposição do Conselho, incluindo as Forças Armadas dos Estados, e detalha o estabelecimento de uma Comissão do Estado Maior para planejar e executar operações que envolvam o uso da força militar.
O uso da força é uma medida extrema que será autorizada apenas em casos excepcionais. A solução pacífica de controvérsias é princípio basilar do Sistema ONU, conforme preveem diversos dos seus dispositivos, inclusive o art. 2.3 da Carta da ONU. Deve ser, portanto, a primeira opção, como previsto no Capítulo VI, antes de o Conselho se voltar para as alternativas oferecidas pelo Capítulo VII.
O caráter obrigatório das decisões tomadas pelo Conselho de Segurança é excepcional no sentido de que, no Direito Internacional, o consentimento é essencial para vincular um Estado a uma regra. O princípio basilar do Direito Internacional, o pacta sunt servanda, prevê que aquilo que foi pactuado deve ser cumprido, baseando-se, portanto, no consentimento (REZEK, 2010).
No caso das resoluções do CSNU, elas obrigam e vinculam mesmo os Estados que não votaram a seu favor e aqueles que sequer participaram do processo de deliberação sobre o seu conteúdo – hipótese mais comum, visto que apenas os 15 Estados-parte têm direito a voto nas deliberações do CSNU. Houve, na realidade, uma manifestação de consentimento prévia e genérica em relação a todas as decisões do CSNU quando os Estados ratificaram a Carta da ONU, a qual explicita, em seu artigo 25, que os Membros das Nações Unidas concordam em aceitar e executar as decisões do Conselho de Segurança, de acordo com a presente Carta.
O nível de obrigatoriedade e vinculação dessas decisões é notável, ainda, no sentido de que mesmo o princípio da não intervenção nos assuntos domésticos não é passível de ser alegado em relação às decisões tomadas pelo Conselho sob égide do Capítulo VII. Ou seja, não pode um Estado justificar o descumprimento de uma dessas decisões sob o argumento de que é ilegítima a interferência da ONU em suas questões internas, por exemplo. Prevê o art. 2 da Carta da ONU:
PACTA SUNT SERVANDA
O pacta sunt servanda (do latim: os pactos devem ser observados) é uma expressão latina elaborada na forma gerundiva, reconhecida como um brocardo jurídico. Tem origem no Direito Canônico medieval do séc. XIII a XVI, com posterior evolução no Direito Natural do séc. XVII. É um princípio-base do Direito Civil e do Direito Internacional.
NENHUM DISPOSITIVO DA PRESENTE CARTA AUTORIZARÁ AS NAÇÕES UNIDAS A INTERVIREM EM ASSUNTOS QUE DEPENDAM ESSENCIALMENTE DA JURISDIÇÃO DE QUALQUER ESTADO OU OBRIGARÁ OS MEMBROS A SUBMETEREM TAIS ASSUNTOS A UMA SOLUÇÃO, NOS TERMOS DA PRESENTE CARTA; ESTE PRINCÍPIO, PORÉM, NÃO PREJUDICARÁ A APLICAÇÃO DAS MEDIDAS COERCITIVAS CONSTANTES DO CAPÍTULO VII.
(DECRETO 19.841/1945)
O Conselho de Segurança também poderá receber reclamações por parte de Estados que considerem que obrigações oriundas de uma decisão da Corte Internacional de Justiça não foram cumpridas. Nesse caso, poderá tomar qualquer das medidas previstas nos capítulos VI e VII da Carta da ONU com objetivo de garantir o cumprimento daquela decisão (art. 94.2, da Carta da ONU).
Assista ao vídeo para conhecer a composição e as propostasde reforma do Conselho.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
Parte superior do formulário
1. QUAL DESTES ESTADOS NÃO É MEMBRO PERMANENTE DO CONSELHO DE SEGURANÇA?
França
Alemanha
Reino Unido
Estados Unidos
Rússia
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2. NÃO ESTÁ ENTRE AS ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO DE SEGURANÇA:
Recomendar o nome do secretário-geral da ONU para escolha da Assembleia Geral.
Recomendar a adesão de novos membros à ONU.
Aprovar o orçamento da ONU.
Recomendar o nome de juízes para a Corte Internacional de Justiça.
Autorizar o uso da força em uma situação que constitua ameaça à paz internacional.
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GABARITO
1. Qual destes Estados não é membro permanente do Conselho de Segurança?
A alternativa "B " está correta.
A China é o quinto membro permanente do CSNU, não integrando o CSNU a Alemanha. Assim, a letra B é a afirmativa correta.
2. Não está entre as atribuições do Conselho de Segurança:
A alternativa "C " está correta.
Aprovar o orçamento da ONU é atribuição da Assembleia Geral, não do Conselho de Segurança. Assim, a letra C é a correta.
MÓDULO 3
Identificar as origens e o funcionamento do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas
Fonte: Peter Stein / Shutterstock
O CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS DA ORGANIZAÇÃO
DAS NAÇÕES UNIDAS
AS ORIGENS E O FUNCIONAMENTO DO CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
Antes de apresentar o Conselho de Direitos Humanos, é importante discutir seu antecessor, a Comissão de Direitos Humanos. A Comissão foi um organismo subsidiário criado pelo Conselho Econômico e Social (ECOSOC), em 1946, com objetivo de constituir o principal órgão legislativo, no Sistema ONU, dedicado a promover e proteger os Direitos Humanos. O resultado da sua primeira sessão de reuniões, em 1947, foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada como resolução da Assembleia Geral.
Durante os primeiros 20 anos de funcionamento, a Comissão se dedicou à definição e elaboração de normas internacionais de Direitos Humanos, utilizando, em larga medida, a Declaração Universal como fundamento. Como resultado desse esforço, foram elaborados e adotados o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS COUNCIL, 2020b).
A partir de 1967, a Comissão recebeu o mandato oficial para lidar com violações de Direitos Humanos nos Estados. Para realizar esse mandato, foi estabelecida uma sistemática envolvendo grupos de trabalho e relatores especiais (RE), com enfoques temáticos ou responsabilidade para acompanhar a situação de países específicos.
No entanto, havia grande disputa entre os blocos capitalista e socialista que se manifestava no trabalho e nas votações da Comissão. Além de uma preferência daquele por questões relacionadas a direitos políticos e civis e deste pelos direitos econômicos e sociais – criando uma falsa dicotomia –, era frequente a participação de Estados com graves históricos de violação na Comissão. Buscavam, assim, blindarem-se de críticas e condenações em relação a questões que consideravam internas. Essas disfunções não se encerraram com o fim da Guerra Fria (SHORT, 2008).
Ao longo da década de 1990 e início dos anos 2000, esse cenário se agravou.
A COMISSÃO COMEÇOU A RUIR PROGRESSIVAMENTE, DEIXANDO DE CUMPRIR SEU PAPEL E AINDA SERVINDO DE APOIO AOS RESPONSÁVEIS POR ABUSOS DE DIREITOS HUMANOS, INDIRETAMENTE GARANTINDO QUE ELES RECEBESSEM IMUNIDADE DO ESCRUTÍNIO INTERNACIONAL PELOS PRÓPRIOS MECANISMOS DA COMISSÃO.
(SHORT, 2008)
Enquanto líderes autoritários, como os do Sudão e da Líbia, utilizavam o princípio da soberania como justificativa para evitar uma interferência da Comissão nos seus assuntos domésticos e conquistavam assentos para garantir direito de voz e voto em suas deliberações, aumentava o clamor internacional para que a Comissão ampliasse seu mandato, realizando monitoramento da implementação de normas de Direitos Humanos e, eventualmente, criticasse publicamente aqueles que estivessem em desacordo com elas.
Entre os sucessos da Comissão, merecem destaque o trabalho intenso de produção normativa, que gerou alguns dos principais tratados internacionais sobre Direitos Humanos, assim como o esforço inicial de desenvolver mecanismos de monitoramento de graves violações em todo mundo. Em determinado momento, havia mais de 40 relatores especiais investigando e chamando atenção do mundo para temas, países e regiões críticos para o regime internacional de Direitos Humanos (SHORT, 2008).
Às questões mencionadas se somava uma crítica reiterada sobre a seletividade das críticas públicas realizadas pela Comissão, assim como a aparente contradição de ter países com histórico de graves violações aos Direitos Humanos decidindo sobre os rumos de seu trabalho, gerando uma grande perda de credibilidade.
Conforme avançaram propostas sobre a reforma da Comissão, chegou-se à conclusão de que era necessário um respaldo institucional maior para o trabalho de promoção e proteção aos Direitos Humanos. Assim, foi aprovada uma resolução da Assembleia Geral (Resolução 60/251) que criava o Conselho de Direitos Humanos (UNHRC, na sigla em inglês) como órgão subsidiário da própria Assembleia, e não mais do ECOSOC.
Criado em 2006, o Conselho de Direitos Humanos conta com 47 Estados-membros, contra os 53 membros da Comissão. Apesar de uma mudança relativamente pequena nessa composição, que se tornou também mais representativa de países em desenvolvimento, foram introduzidos critérios mais rígidos para a adesão ao Conselho. Objetivava-se, assim, evitar a participação de Estados com graves problemas nessa esfera. A Resolução 60/251 determinava que deveria ser levada em consideração, na eleição dos membros do CDH, (i) a contribuição dos candidatos à promoção e proteção dos Direitos Humanos e (ii) as promessas e os compromissos voluntários que tenham feito. Impunham-se, ainda, exigências aos membros, como se submeter ao mecanismo universal de exame periódico durante o seu mandato.
Ainda que subjetivos, os critérios sinalizavam uma preocupação e criavam um possível constrangimento para Estados que desejassem integrar o Conselho: submeter-se ao Mecanismo Universal de Revisão Periódica.
O Mecanismo Universal de Revisão Periódica (UPR, na sigla em inglês) foi criado com o objetivo de analisar como países vinham implementando as normas internacionais de Direitos Humanos. O UPR avalia o cumprimento dos Estados em relação à Carta da ONU, à Declaração Universal de Direitos Humanos, aos tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo país, aos compromissos voluntários assumidos e ao Direito Humanitário Internacional.
O UPR tem como objetivo avaliar periodicamente todos os 193 Estados-partes da ONU. Em uma primeira rodada, que durou entre 2007 e 2012, todos os Estados foram avaliados e, a partir de 2012, uma nova rodada se iniciou. A revisão de cada Estado é conduzida por grupos de 3 Estados, com base em informações oferecidas pelo próprio Estado sob avaliação, em informações de relatórios independentes dos relatores especiais, dos comitês criados pelos tratados internacionais e de outros órgãos da ONU e em informações coletadas por instituições não governamentais locais (UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS COUNCIL, 2020a).
Essa revisão tem um caráter dialógico, envolvendo trocas e discussões com o Estado avaliado. O relatório final, contendo as conclusões, recomendações e questões, assim como as respostas apresentadas pelo próprio Estado em avaliação, é considerado pelo Grupo de Trabalho UPR, composto dos 47 membros do CDH e, eventualmente, adotado em reunião plenária do próprio CDH. A adoção e implementação de recomendações eventualmente apresentadas são monitoradas pelo CDH periodicamente (UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS COUNCIL, 2020a).
Assista ao vídeo para conhecer o Mecanismo de Revisão Periódica Universal e sua avaliação periódica do Brasil.
O MODELO DE TRABALHO DO CDH
Para além dessas inovações, vale mencionar algumas outras modificaçõesno modelo de trabalho do CDH, em relação à Comissão, sua antecessora:
MODIFICAÇÃO 1
MODIFICAÇÃO 2
MODIFICAÇÃO 1
O CDH se reúne com mais frequência do que a Comissão, dando vazão à grande demanda que se criou. Além das reuniões anuais, o CDH pode se reunir em sessões especiais, a pedido de um membro, com apoio de um terço dos seus integrantes, para lidar com questões específicas e crises (SHORT, 2008);
MODIFICAÇÃO 2
Foi estabelecido também um mecanismo para o recebimento de denúncias de graves violações a Direitos Humanos e liberdades fundamentais, realizadas por indivíduos, grupos ou ONGs, vítimas dessas violações ou com informações confiáveis e concretas sobre elas. Caso essas denúncias sejam admitidas, o que ocorrerá na hipótese do atendimento a requisitos básicos, seus fatos poderão ser levados à atenção do Conselho que decidirá as medidas cabíveis.
Facilitou-se a participação de organizações da sociedade civil doméstica e internacional nas discussões do CDH e foi expandido ainda o rol de outros procedimentos e órgãos que compõem e contribuem para o funcionamento do CDH e para a realização do seu mandato de proteção e promoção dos Direitos Humanos.
Os Procedimentos Especiais do CDH consistem na designação de especialistas para avaliar e monitorar uma temática ou um país sob a perspectiva de Direitos Humanos. Os Relatores Especiais (ou Special Rapporteurs) realizam visitas, atuam em casos individuais, emitem comunicados, conduzem pesquisas, reúnem especialistas, contribuem para o desenvolvimento de padrões de Direitos Humanos e se engajam em atividades de conscientização e advocacy, além de apresentar relatórios anuais ao CDH ou à Assembleia Geral. Em 2020, havia 44 mandatos temáticos e 11 mandatos específicos para determinados países.
Há, ainda, a possibilidade de que sejam constituídas Comissões Internacionais de Inquérito e missões de investigação para averiguar situações especialmente complexas e apresentar recomendações sobre possíveis condutas a serem adotadas pelo CDH e pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos.
ADVOCACY
Advocacy é uma prática política levada a cabo por indivíduo, organização ou grupo de pressão, no interior das instituições do sistema político, com a finalidade de influenciar a formulação de políticas e a alocação de recursos públicos.
Fonte: Wikipédia
OUTROS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS
NO SISTEMA ONU
Além do Conselho de Direitos Humanos e do Alto Comissariado de Direitos Humanos, existem diversos outros órgãos internacionais de proteção aos Direitos Humanos no Sistema ONU.
Merecem destaque o Alto Comissariado para Refugiados, a ONU Mulheres, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
Outros órgãos, ainda que não considerados subsidiários da ONU, são denominados adstritos aos tratados da ONU. Trata-se de órgãos colegiados (comitês) criados por tratados internacionais específicos com objetivo de monitorar e promover a implementação de suas normas. Têm uma relação próxima com a ONU, repassando informação por meio do Centro de Direitos Humanos (SHAW, 2010)
Entre eles, destacam-se:
1
Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, criado pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965;
2
Comitê de Direitos Humanos, criado pelo Pacto de Direitos Civil e Políticos, de 1966;
3
Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, criado pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979;
4
Comitê contra a Tortura, criado pela Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984;
5
Comitê para os Direitos das Crianças, criado pela Convenção sobre os Direitos da Criança, de 1989;
6
Comitê sobre os Direitos de Pessoas com Deficiência, criado pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, de 2007.
Esses comitês têm competências e atribuições específicas previstas nos tratados que os constituem. De modo geral, são grupos de especialistas ou peritos independentes, eleitos entre os Estados-partes do respectivo tratado. Eles são responsáveis por avaliar os relatórios periódicos preparados pelos próprios Estados sobre os esforços de implementação da convenção, com possibilidade de apresentarem recomendações. O foco desse processo é o desenvolvimento de um diálogo produtivo e construtivo, mas, eventualmente, podem ser publicadas considerações críticas sobre a situação em um Estado, como parte de uma estratégia de naming and shaming(Nomear e envergonhar, constranger.). Os comitês também podem ser responsáveis por dirimir eventuais controvérsias entres os Estados-partes.
Os comitês são, em alguns casos, empoderados para receber reclamações e petições individuais ou coletivas sobre violações aos direitos previstos nos tratados correspondentes. Essa competência para recebimento e processamento de denúncias tem natureza mais sensível. Às vezes ela depende de um reconhecimento explícito por parte do Estado (art. 21, Convenção contra Tortura, por exemplo). Em outros, depende da ratificação de protocolo adicional (Pacto de Direitos Civis e Políticos, por exemplo).
É este também o caso da Convenção sobre os Direitos de Pessoas com Deficiências: a competência do Comitê para receber e apreciar denúncias e reclamações está prevista e detalhada em seu Protocolo Facultativo. Tanto a Convenção quanto o Protocolo Facultativo foram ratificados pelo Brasil (Decreto 6.949/2009) de acordo com o rito de tramitação previsto no art. 5, §3º da Constituição Federal, de modo que têm status constitucional.
A apresentação de petição individual perante esses comitês temáticos de Direitos Humanos é um direito individual perante o Direito Internacional. O recebimento dessas petições pode estar, contudo, sujeito a condições específicas, como o esgotamento das instâncias internas (art. 2, Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos de Pessoas com Deficiência). Recebida a denúncia, o comitê poderá apresentá-la ao Estado denunciado e pedir maiores informações sobre o caso. Cabe, ainda, a realização de outras diligências independentes para investigar as denúncias. O comitê apresentará suas recomendações, em caráter cautelar ou definitivo, para que o Estado enderece a denúncia apresentada, e acompanhará a implementação dessas recomendações. Em geral, esses procedimentos correm em sigilo.
Por fim, os comitês são também considerados intérpretes legítimos dos próprios tratados, publicando, com frequência, comentários e notas interpretativas sobre os dispositivos dos tratados, conferindo maior especificidade e detalhamento a direitos e obrigações previstos. Esse trabalho, em específico, será realizado em consonância e alinhamento com as Conferências anuais dos Estados-partes a fim de discutir a implementação do tratado.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
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1. QUANDO O CONSELHO DE DIREITOS HUMANOS FOI CRIADO?
1945
1991
2001
2006
2012
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2. NÃO É ORGANISMO DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS PERTENCENTE AO SISTEMA ONU:
Conselho de Direitos Humanos.
Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Alto Comissariado para Direitos Humanos.
Alto Comissariado para Refugiados.
Organização Internacional do Trabalho.
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GABARITO
1. Quando o Conselho de Direitos Humanos foi criado?
A alternativa "D " está correta.
A letra D é a correta, porque 2006 foi o ano de criação do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
2. Não é organismo de proteção aos Direitos Humanos pertencente ao Sistema ONU:
A alternativa "B " está correta.
A Comissão Interamericana é parte do sistema interamericano de Direitos Humanos, daí porque a letra B é a correta.
CONCLUSÃO
Fonte: Osugi / Shutterstock
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Organização das Nações Unidas é um dos mais ousados experimentos da sociedade internacional em sua história. Criar uma organizaçãoverdadeiramente global com a responsabilidade de manter a paz e a segurança internacional foi uma resposta a duas grandes guerras que haviam matado milhões e transformado o mundo. Representava a esperança de que uma guerra mundial não voltasse a acontecer e, nisso, foi bem-sucedida.
Certamente, a ONU é passível de críticas, algumas das quais foram mencionadas neste tema. O ritmo de reformas é considerado, com frequência, mais lento do que desejam os reformistas. Diversos assuntos urgentes demoraram a entrar na agenda da ONU e, mesmo atualmente, a resposta da organização não está à altura dos desafios e dos impactos que trazem a mudança climática, as violações de Direitos Humanos, a criminalidade organizada e tantos outros problemas.
Algumas instituições e práticas, como o poder de veto no Conselho de Segurança, soam anacrônicas no século XXI. Outras, como o Conselho de Direitos Humanos, foram capazes de se reinventar, mas ainda estão em processo de aprendizado e adaptação. Apesar de independente, a ONU ainda é um reflexo dos seus membros e depende deles para o seu impulso. Aproximar essa organização global dos cidadãos de cada um dos seus Estados-membros talvez seja o desafio do século XIX, necessário para adequá-la às suas expectativas e necessidades.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
BRASIL. Casa Civil. Decreto n. 19.841, de 22 de outubro de 1945. Promulga a Carta das Nações Unidas, da qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de Justiça, assinada em São Francisco, a 26 de junho de 1945, por ocasião da Conferência de Organização Internacional das Nações Unidas. Rio de Janeiro, 1945.
CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Legalidade da Ameaça ou do Uso de Armas Nucleares. Haia, 1996.
HERZ, M.; HOFFMANN, A. R. Organizações Internacionais: história e práticas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.
JONAH, J. O. C. Secretariat: independence and reform. In: WEISS, T. G.; DAWS, S. The Oxford Handbook on the United Nations. Oxford: Oxford University Press, 2008.
LUCK, E. C. UN Security Council: practice and promise. Oxford: Routledge, 2006.
MALONE, D. M. Security Council. In: WEISS, T. G.; DAWS, S. The Oxford Handbook on the United Nations. Oxford: Oxford University Press, 2008.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. ONU. Mandate of the UN Human Rights. Consultado em meio eletrônico em: 22 out. 2020.
PETERSON, M. J. General Assembly. In: WEISS, T. G.; DAWS, S. The Oxford Handbook on the United Nations. Oxford: Oxford University Press, 2008.
REZEK, F. Direito Internacional: curso elementar. Rio de Janeiro: Saraiva, 2010.
SHAW, M. N. Direito Internacional. São Paulo: Martins Fontes, 2010.
SHORT, K. Da Comissão ao Conselho: a Organização das Nações Unidas conseguiu criar um organismo de Direitos Humanos confiável. In: Sur Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 5, n. 9, São Paulo, 2008.
UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS COUNCIL. Basic facts about the UPR. Consultado em meio eletrônico em: 28 out. 2020a.
UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS COUNCIL. Brief historic overview of the Commission on Human Rights. Consultado em meio eletrônico em: 28 out. 2020b.
EXPLORE+
· Busque mais informações sobre a Organização das Nações Unidas e outros órgãos, como a Corte Internacional de Justiça, no site oficial da ONU.
· Assista ao filme Sérgio, que conta a história do diplomata brasileiro Sérgio Vieira de Mello, que atuou por décadas em posições de destaque na Organização das Nações Unidas.
· Acesse o site do Centro Conjunto de Operações de Paz do Brasil para saber mais sobre a participação do Brasil em operações de paz.
· Acesse a Declaração de Viena e o Plano de Ação definido na Conferência Internacional de Direitos Humanos, de 1993, no site United Nations Humans Right (em inglês).
· Para mais informações sobre o procedimento de apresentação de denúncias ao Conselho de Direitos Humanos, acesse a seção Complaint procedure, do site United Nations Humans Right (em inglês).
· Os Procedimentos Especiais do CDH podem ser acessados através do site United Nations Humans Right (em inglês), na seção Human Rights Bodies.
· Para uma lista completa dos Fundos, Programas e Agências Especializadas da ONU, acesse a seção ABOUT THE UN, no site da ONU.
CONTEUDISTA
Guilherme de Jesus France
CURRÍCULO LATTES

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