Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
AULA 3 ORGANIZAÇÕES CONVENCIONAIS DE TRABALHO Profª Laira Gonçalves Adversi A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 2 CONVERSA INICIAL Esta aula tem o objetivo de apresentar as principais características das organizações convencionais de trabalho na atualidade. Estas, por sua vez, apresentam um repertório de características, porém, nesta aula explicitaremos apenas algumas que podem ser consideradas principais. As organizações convencionais de trabalho são burocráticas, gerencialistas, orientadas exclusivamente para o crescimento econômico e para o mercado. Além disso, possuem um modo de organizar específico. Sendo assim, esta aula, a fim de discorrer sobre as organizações convencionais de trabalho, organiza-se se dividindo em cinco temas: 1. O modo de estabelecer as organizações convencionais de trabalho; 2. Organizações burocráticas; 3. Organizações gerencialistas; 4. Organizações orientadas exclusivamente para o crescimento econômico; e 5. Organizações orientadas exclusivamente para o mercado. Assim, os termos burocracia, gerencialismo, crescimento econômico e mercado estão relacionados diretamente às organizações convencionais de trabalho. TEMA 1 – O MODO DE ESTABELECER AS ORGANIZAÇÕES CONVENCIONAIS DE TRABALHO As organizações convencionais de trabalho se baseiam em um modelo dominante, considerado o tipo ideal de organização, padrão a ser seguido por representar maior eficiência técnica. Caracterizam-se predominantemente por: hierarquia, delegação e representação, individualismo e elitismo, valores orientados para o mercado, discriminação da diferença, rotina e reprodução nas práxis burocratizadas, gerencialismo (Misoczy; Flores; Böhm, 2008), modelo de empresarização (Vieira; Darbilly; Barros, 2012), acomodação, enclausuramento e competição (Barcellos; Dellangnelo, 2013). As organizações convencionais de trabalho tendem a se estabelecer como “a única forma pela qual o organizar pode ser articulado – tornando invisível, não existente, a multiplicidade de diferentes mundos organizacionais” A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 3 (Misoczy; Flores; Böhm, 2008, p. 182). Podem ser denominadas como organizações burocráticas (Weber, 1982): organizações gerencialistas (Gaulejac, 2007), organizações hegemônicas (Barcellos; Dellagnelo, 2013; Moraes, 2010), organizações capitalistas, isto é, mercadológicas e orientadas para o crescimento econômico (Seifert; Vizeu, 2015), entre outros termos. TEMA 2 – ORGANIZAÇÕES BUROCRÁTICAS A burocracia caracteriza as organizações convencionais de trabalho. Assim, as organizações modernas de trabalho são chamadas de organizações burocráticas. O termo burocracia foi cunhado por Marx Weber para estabelecer um quadro de características comuns que compunham as organizações sociais da modernidade. Por isso, burocracia caracteriza as organizações convencionais de trabalho modernas, tanto públicas quanto privadas. A categoria central da metodologia do estudo de Max Weber é o tipo ideal. Os tipos ideais são conceitos puros que necessariamente representam deformações da realidade. A noção de tipo ideal implica a admissão de que a ciência não é uma cópia da realidade, de que nosso conhecimento da realidade é, portanto, necessariamente limitado e imperfeito. Tipos ideais como feudalismo, capitalismo etc. jamais ocorrem no mundo concreto. São exageros propositados de situações concretas, cuja finalidade é servir para estimar o grau de pureza ou hibridez dos fatos. O tipo ideal é um conceito tecnicamente elaborado. Por isso, não é um achado, nem uma descoberta (Ramos, 2006). Posto isto, ao observar as organizações convencionais de trabalho da modernidade, dificilmente é possível encontrar exatamente todas as características, concomitantemente, mencionadas por Weber. Assim, o tipo ideal de burocracia é usado como um parâmetro de comparação para observar o quanto uma organização se aproxima ou se afasta do modelo descrito pelo autor. Ao elencar as características da burocracia, Weber descreve essa estrutura em seu tipo ideal. Posto isto, de acordo com o Weber (1982), as características da burocracia são: regência de áreas de jurisdição fixas e oficiais, leis e normas administrativas, relações de autoridade, normas relativas aos meios de coerção e consenso, relação hierárquica, sistema de mando e subordinação, gerência das atividades, tarefas delegadas por autoridade, A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 4 administração formalizada por meio de documentos que regulam a conduta e as atividades das pessoas, treinamento e especializações das atividades, generalização do cargo para transformá-lo em profissão e suas atividades poderem ser aprendidas por qualquer outro trabalhador, impessoalidade, transitoriedade, salários recebidos por funcionários em troca de certa segurança social, carreira, entre outros. A burocracia baseia-se na ação racional orientada para fins. Ela desconsidera os valores pessoais e grupais, a afetividade, os hábitos e costumes da tradição. A burocracia, portanto, “tem um caráter ‘racional’: regras, meios, fins e objetivos dominam sua posição” (Weber, 1982, p. 282). Assim, as organizações burocráticas materializam o tipo ideal de organização orientado para o alcance da máxima eficiência e produtividade. Ademais, em aspectos técnicos, apresenta-se como forma vantajosa e superior de organização (Faria; Meneghetti, 2011). Em uma sociedade de produção industrial, este tipo de organização apresenta as características essenciais necessárias, tendo em vista, garantir a maior quantidade de fabricação de produtos e serviços, assim como maior possibilidade de consumo (Advsersi, 2018). Por exemplo, quando uma pessoa é contratada para trabalhar em uma organização, seja pública ou privada, ela irá preencher com um cargo que existe há bastante tempo. Esse indivíduo irá exercer as atividades de trabalho que estão descritas para esse cargo. Assim, ele insere-se em uma máquina já em funcionamento para cumprir a função específica, como uma engrenagem que vai contribuir para o funcionamento geral da máquina organizacional. Os regulamentos e as normas direcionam e moldam os comportamentos das pessoas. Ou seja, todas as pessoas da organização devem agir de acordo com as regras, que, a princípio, estão formalizadas e escritas. A autoridade é delimitada pelas normas, assim como a forma de exercer essa autoridade, pois a pessoa que exerce a autoridade aplica as sanções e punições de modo coercitivo, conforme instruções normativas. As contratações de funcionários são realizadas conforme as qualificações exigidas, previstas por um regulamento geral. A hierarquia caracteriza fortemente a burocracia. Existem as pessoas que mandam e as que executam conforme o que lhes é mandado. Ou seja, caracteriza-se pelo mando e subordinação. Assim, há a supervisão dos postos inferiores pelos superiores. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 5 Em geral, a forma de agir e de se comportar das pessoas é orientada por normas escritas, porém, há casos que os documentos escritos não são mais necessários, pois ocorre o que Weber chama de Introjeção das normas sociais. Ou seja, os indivíduos, devido à reprodução dos modos sociais habituais, repetem ações de forma automática sem necessitar de regras escritas. Estes reproduzem por força do hábito sem ao menos refletir sobre suas ações. Os cargos são criados de forma que qualquer pessoa possa ocupá-los, pois as suas atribuições estão descritas formalmente.Assim, qualquer pessoa que realizar treinamento para um cargo específico poderá assumir a posição do cargo. Nas organizações burocráticas, há a separação entre os bens públicos e os bens privados, assim como também há a separação entre o local de trabalho e a residência do funcionário. Segrega também as atividades oficiais de trabalho das atividades de esfera da vida privada. Nessas organizações, o empresário comportar-se como o “primeiro funcionário” de sua empresa, da mesma forma pela qual um governante de um Estado burocrático, considera-se como o “primeiro servidor” do Estado (Weber, 1982). TEMA 3 – ORGANIZAÇÕES GERENCIALISTAS O gerencialismo é uma característica das organizações convencionais de trabalho. Assim, as organizações modernas de trabalho são chamadas de organizações gerencialistas. O termo gerencialismo relaciona-se à redução de custos, à produtividade e ao aumento da eficiência na busca de objetivos organizacionais e sociais com ênfase na flexibilidade da gestão, adoção de programas de qualidade total, satisfação dos consumidores (Abrucio, 1997), empreendedorismo e dinamismo. Este se refere à aplicação de teorias, conceitos, técnicas e ferramentas administrativas e gerenciais aos diversos setores da vida em sociedade. No gerencialismo, há a celebração mais dinâmica do gestor-como-herói, como líder e formatador da cultura corporativa, inspirando a infinita busca de qualidade e excelência (Clarke; Newman, 1993). Nessa perspectiva, uma organização bem gerenciada é sinônima de organização bem-sucedida. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 6 O gerencialismo é uma estrutura calculista que organiza o conhecimento sobre as metas organizacionais e os meios para alcançá-las. Usualmente, está estruturado em torno de um cálculo interno de eficiência (entradas-saídas) e um cálculo externo de posicionamento competitivo em um campo de relações de mercado. Contudo, o gerencialismo também é uma série de discursos superpostos que articulam proposições diferentes – até mesmo conflitantes – a respeito de como gerir e do que deve ser gerido. Assim, diferentes formas de gerencialismo enfocam liderança, estratégia, qualidade e assim por diante para produzirem um campo complexo e mutante de conhecimento gerencial (Clarke; Newman, 1993). A ciência gerencial que se institui como área de conhecimento após a década de 1960 – trabalha com um ideal de indivíduo que se comporta racionalmente e que é capaz de alcançar sempre mais. Convida-se o indivíduo ao autoaperfeiçoamento incessante e ao gerenciamento racional de si mesmo como se ele próprio fosse uma empresa privada (Gaulejac, 2007; Moraes, 2012). Predomina o culto da excelência, no qual se incita não apenas a fazer melhor, mas a ser “o” melhor em comparação com outros e consigo mesmo em fases anteriores. A exigência de excelência – que jamais pode ser satisfeita, pois sempre é possível melhorar – esconde-se sob o conceito de qualidade. A qualidade, enfim, aparece sempre como melhoria, como progresso e não como pressão. Assim, supõe-se que a experiência humana possa ser traduzida em cálculo. Os índices e os indicadores meritocráticos converteram o ser humano em fator econômico equivalente à matéria-prima e às ferramentas de produção. A objetividade numérica travestida de neutralidade (Gaulejac, 2007; Moraes, 2012). O avanço das tecnologias informáticas e de telecomunicações instituiu uma “ditadura do tempo real”, em que o lucro deve ser imediato e os prazos são cada vez mais curtos. A economia já não está a serviço do desenvolvimento da sociedade, torna-se um fim em si, para o qual toda a sociedade deve se direcionar. O ritmo da vida individual, social e institucional passa a ser determinado pelo ritmo das corporações (Gaulejac, 2007; Moraes, 2012). O gerencialismo é, de acordo com Gaulejac (2007), uma tecnologia de poder. Nessa perspectiva, “a gestão é um conjunto de técnicas e saberes práticos, propagados pelas grandes empresas, visando a orientar condutas e a estabelecer uma cultura corporativa” (Gaulejac, 2007, p. 20). Refere-se a uma A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 7 ideologia que legitima a mercantilização do ser humano, transformando-o em “capital que convém tornar produtivo” (Gaulejac, 2007, p. 28). Para o autor, o gerencialismo atua na mobilização das subjetividades para a realização de um ideal de indivíduo adequado às exigências da nova ordem econômica, ou seja: autônomo, polivalente, criativo, que assume responsabilidades e arque com riscos, que seja flexível o suficiente para contornar a instabilidade atual do sistema econômico, ou seja, um super-humano, que faça sempre melhor e mais rápido. A gestão é um sistema de interpretação do mundo social que comporta uma visão de mundo e um sistema de crenças que oferecem uma ilusão de onipotência e de poder. Assim, o sucesso do modelo gerencialista deve-se à confusão entre o desejo de reconhecimento e uma fantasia narcísica de onipotência que é projetada nas empresas e reiterada pelo discurso de que o crescimento pessoal do indivíduo corresponde ao crescimento da corporação (Gaulejac, 2007; Moraes, 2012). TEMA 4 – ORGANIZAÇÕES ORIENTADAS EXCLUSIVAMENTE PARA O CRESCIMENTO ECONÔMICO Antes de explanar sobre as organizações orientadas exclusivamente para o crescimento econômico, faz-se necessário diferenciar o crescimento econômico do desenvolvimento econômico. O crescimento econômico é mensurado pelo Produto Interno Bruto – PIB. Está associado a fatores quantitativos. Este refere-se à produção de bens e serviços. Assim, quanto maior a produção de uma determinada região, mais elevado será o seu crescimento. Então, o PIB é calculado por meio da soma de todos os produtos e serviços finais de uma região para um determinado período (UNDP, 2019). Quando o PIB cresce, significa que há um maior nível de produção. Assim, as empresas contratam mais funcionários, mais pessoas passam a receber salários, e isso permite que as famílias passem a consumir mais bens e serviços. Consequentemente, esse fluxo continua gerando uma cadeia de mais produção e mais crescimento econômico (UNDP, 2019). O desenvolvimento econômico está relacionado à melhoria do bem- estar da população. Mede-se por meio Índice de Desenvolvimento Humano – IDH. Esse fator é medido por indicadores de educação, saúde, renda, pobreza, A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 8 entre outros. Está diretamente ligado a aspectos e fatores qualitativos. Envolve a melhoria no padrão de vida da população, a melhoria da qualidade de vida das pessoas e, também, mudanças de cunho estrutural da economia de um país (UNDP, 2019). Posto isto, verifica-se que o crescimento econômico não garante o desenvolvimento, pois a riqueza gerada pelo crescimento econômico pode não ser distribuída de forma equitativa, não resultando, assim, em melhoria no padrão de vida da população. Assim, a má distribuição da riqueza gera as desigualdades sociais, impedindo o desenvolvimento do país (UNDP, 2019). O crescimento econômico é um dos princípios orientadores das organizações capitalistas (Seifert; Vizeu; Hocayen-da-Silva, 2015) ou seja, das organizações convencionais de trabalho. Seifert e Vizeu (2015) apresentam o crescimento como uma ideologia, pois a orientação para o crescimento econômico é aceita como característica universal da condição humana moderna, partindo de desejos e ambições ilimitadas. Essa visão baseia-se nas teorias de Adam Smith (2003), que defende que a natureza humana é essencialmente econômica e o progresso e as riquezas das nações dependem fundamentalmente de pessoas motivadas a satisfazer suas necessidades pessoais, estas ilimitadas (Seifert;Vizeu, 2015). A lógica crescimento econômico é ideologia do desenvolvimento ilimitado (Illich, 1976), causa prejuízo social, a destruição de espaços conviviais e redução da diversidade, pois as pequenas organizações produtoras, que muitas vezes têm papel primordial em comunidades locais, acabam sendo abolidas pelo processo de crescimento de grandes corporações (Seifert; Vizeu, 2015). A orientação para o crescimento econômico baseia-se na acumulação ilimitada de capital, ou seja, a acumulação de riqueza e geração de lucro (Latouche, 2009). Por isso, verifica-se que a sociedade sofre de uma quase universal idolatria do gigantismo, em que se busca o crescimento econômico a qualquer custo. Neste contexto, aponta-se necessário reconhecer as virtudes da pequenez (Schumacher, 1977). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 9 TEMA 5 – ORGANIZAÇÕES ORIENTADAS EXCLUSIVAMENTE PARA O MERCADO As organizações convencionais são caracterizadas pela orientação para o mercado, que se emaranha à lógica da criação artificial de necessidades, ao consumismo, à propaganda e à obsolescência programada. “O mercado tende a transformar-se numa categoria de abrangência total, quanto à ordenação da vida individual e social” (Ramos, 1989, p.148). Assim, as organizações convencionais de trabalho centradas no mercado moldam as formas de ser, agir, sentir e pensar (Ramos, 1989). Se baseiam em “construções modernas como o individualismo, o mito da escassez, a privatização do mundo, a racionalização, e a ideologia do progresso” (Barcelos; Dellagnello, 2013, p. 4). O que faz sentido para os mercados faz com que o trabalho humano perca suas significações primeiras (Gaulejac, 2007). A orientação para o mercado pode se expressar por meio da criação de necessidades. Sendo assim, ocorre o que Illich (1976) chama de industrialização da carência. Para o autor, a necessidade pessoal se transforma em carência mensurável, pois acredita-se que não se pode viver sem o que a instituição produz e, quanto menos se pode usufruir o que se obteve, mais se sente a necessidade de quantificá-lo. “A industrialização das necessidades reduz qualquer satisfação a um ato de verificação operacional, substituindo a alegria de viver pelo prazer de aplicar uma medida” (Illich, 1976, p. 36). A orientação para o mercado relaciona-se ao consumismo. A sociedade de consumo depende da não satisfação dos consumidores e isso é vital para a capacitação e autorreprodução do sistema capitalista, uma educação e doutrinação ideológica que favorece o efêmero e a instantaneidade, em que a individualidade é privilegiada em detrimento do bem e do interesse da coletividade, enfraquecendo condições de resistência, organização e luta social (Baumam, 2008). O alto padrão de consumo torna-se sinal de sucesso, mesmo que se pague o preço de ter que trabalhar mais e estar fora de casa levando o contato entre amigos e familiares ao comprometimento (Baumam, 2008). “Tornar-se consumidor exige um nível que dificilmente deixa tempo para as atividades que tornar-se cidadão demanda” (Baumam, 2008, p. 188). O consumismo e o vício em trabalho alimentam o consumo de antidepressivos, ou seja, a indústria dos bens de consolação (Latouche, 2009). O consumismo A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 10 desenfreado é uma forma de preencher o vazio causado por um modo de vida dirigido pelas premissas das organizações convencionais, pois o prazer momentâneo propõe-se a aliviar as tensões resultantes desse modo de vida. A luta por posições na hierarquia social desgasta o homem, e mesmo quando obtém ascensão, o vazio continua sem ser preenchido (Adversi, 2018). A teoria econômica moderna, baseada fundamentalmente em Adam Smith, consiste na análise da produção, distribuição, consumo de bens e serviços e uso de recursos escassos. Além disso, os indivíduos são autointeressados e motivados por incentivos externos, assim, o “livre mercado” apresenta-se como solução para que haja o bem-estar para maioria de pessoas, por meio da competição. Isso se dá, pois, os agentes econômicos, motivados apenas por seus próprios interesses, por meio da competição, contribuem para o consumo e expansão do mercado e assim promovem o bem-estar da sociedade (Adversi, 2018). A mercantilização se baseia no princípio da escassez, levando à acumulação e à competição por recursos. “Como bem mostraram Ivan Ullich e Jean-Pierre Dupuy, a economia transforma a abundância natural em escassez pela criação artificial da falta e da necessidade diante da apropriação da natureza e sua mercantilização” (Latouche, 2009, p.46). Para exemplificar, Haddad (2018) afirma que a introdução da ideia de que os recursos são escassos faz com que haja competição, pois, não há recursos disponíveis para todos, então as pessoas acumulam recursos e tiram de circulação, assim, os preços aumentam e menos pessoas podem ter acesso aos bens devido à barreira de preço criada. Outrossim, as pessoas e os agentes econômicos tornam-se introdutores de escassez artificial (Adversi, 2018). Verifica-se que o mercado exclui uns e outros, etiqueta a gratuidade, impõem-lhe logotipos, marcas, pedágios e depois a revende. Essa escassez postulada pelos economistas se torna uma profecia que se autorrealiza (Latouche, 2009). O princípio da escassez permeia todos os segmentos da sociedade. Na educação, por exemplo, as vagas em escolas e universidades podem ser escassas, porém, a circulação de conhecimento e aprendizados por meio de relacionamentos não é escassa. Quanto ao trabalho, pode haver escassez de postos de emprego ao considerar-se que a forma como trabalho é concebido na atualidade é ideologizada, porém, as atividades de trabalho não são escassas se outras perspectivas forem exploradas (Haddad, 2018). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 11 REFERÊNCIAS ABRUCIO. L. F. O impacto do modelo gerencial na administração pública. Cadernos ENAP, 1997. ADVERSI, L. G. Organizações não convencionais: um estudo comparativo de casos. 2018. 173 f. Dissertação (mestrado em administração). Universidade Tecnológica Federal do Paraná, 2018. BARCELLOS, R. M. R.; DELLAGNELO, E. H. L. Novas formas organizacionais: do dominante às ausências. RPCA. Rio de Janeiro, v. 7 n. 1, p. 1-16. jan./mar., 2013. BAUMAM, Z. Vida para o consumo. A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 2008. FARIA, J. H.; MENEGHETTI, F. K. Burocracia como organização, poder e controle. Rev. adm. empres. [online], vol. 51, n. 5, 2011. GAULEJAC, V. Gestão como doença social: Ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. Tradução: Ivo Storniolo. São Paulo: Ideias & Letras, 2007. HADDAD, C. J. Collaborative consumption as a new economic model and the challenge of building trust between strangers. 2011. 60 f. Dissertação (mestrado em meio ambiente e desenvolvimento sustentável). University College, London, UK, 2011. _____. Curso de economia colaborativa. Descola, S.d. Disponível em: <https://descola.org/curso/economia-colaborativa>. Acesso em: 5 ago. 2019. ILLICH, I. A Convivencialidade. Ed. 4116/2148. Lisboa: Sociedade Industrial Gráfica Telles da Silva, 1976. LATOUCH, S. Pequeno tratado do decrescimento sereno. 1. ed. São Paulo: Ed. Martins Fontes. 2009. MISOCZKY, M. C.; FLORES, R. K.; BÖHM, S. A práxis da resistência e a hegemonia da organização. O&S, v.15, n. 45 – Abr. /Jun., 2008. MORAES, J. Self-management as a tool to organize counter-hegemony. O&S, Salvador, v.17, n. 55, p. 585-604, Out./Dez., 2010. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 12 MORAES, M. R. C. Gestão como doença social: ideologia,poder gerencialista e fragmentação social. Rev. bras. Saúde ocup., São Paulo, v. 37, n. 126, p. 287- 289, 2012. NEWMAN, J.; CLARKE, J. Gerencialismo. Revista Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 37, n. 2, p. 353-381, maio/ago. 2012. Disponível em: <http://www.ufrgs.br/edu_realidade>. Acesso em: 5 ago. 2019. RAMOS, A. G. A sociologia de Max Weber. Sua importância para a teoria e a prática da Administração. Revista do Serviço Público Brasília, v. 57, n. 2, p. 267-282, Abr./Jun., 2006. RAMOS, A. G. A nova ciência das organizações. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1989. SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno. Um Estudo de Economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Ed. Zahar,1973. SEIFERT, R. E.; VIZEU, F. Crescimento Organizacional: Uma Ideologia Gerencial? RAC, Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, pp. 127-141, Jan./ Fev., 2015. UNDP. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. UNDP, S.d. Disponível em: <http://www.br.undp.org>. Acesso em: 5 ago. 2019. VIEIRA, M. M. F.; DARBILLY, L. V. C.; BARROS, D. F. O fenômeno da empresarização e a busca por alternativas na produção, comercialização e distribuição da música no Brasil como formas de resistência. O&S, v. 19, n. 61, p. 333-355 – Abr./ Jun., 2012. VIZEU, F.; SEIFERT, R. E.; HOCAYEN-DA-SILVA, A. J. Non-capitalist organizations in Latin America: lessons from the Brazilian Faxinal grassroot community. Cad. EBAPE.BR, v. 13, n. 2, Paper 8, Apr. /Jun. 2015. WEBER, M. Ensaios de sociologia. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC Editora, 1982. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com
Compartilhar