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AULA 2 O TRABALHO AO LONGO DO TEMPO Prof.ª Laira Gonçalves Adversi A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 2 CONVERSA INICIAL O objetivo desta aula é apresentar a forma de organização do trabalho ao longo da história da humanidade, partindo da sociedade primitiva até a contemporaneidade. São apresentadas as essenciais características de cinco tipos de organizações sociais, destacando as principais particularidades relacionadas ao trabalho. O Tema 1 discorre sobre a sociedade primitiva, o Tema 2 descreve o modo de produção asiático, o Tema 3 mostra as características da sociedade escravista, o Tema 4 explica o modo de produção feudal e, por último, o Tema 5 aborda alguns aspectos acerca da organização do trabalho na contemporaneidade a fim de compreender os aspectos relacionados ao trabalho na atualidade. Para compreender as principais nuances que envolvem trabalho na atualidade, toma-se como ponto de partida o modo de produção taylorista, difundido no início do século XX. Posteriormente, apresenta-se o fordismo, em seguida o toyotismo. Por fim, mostram-se as características básicas relacionadas à organização do trabalho na atualidade. TEMA 1 – A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NO SISTEMA PRIMITIVO DE PRODUÇÃO O sistema de produção primitivo constituía as sociedades pré-históricas. Os homens eram nômades, caçavam e pescavam. Não produziam seus próprios alimentos, apenas colhiam os frutos dados pela natureza e dividiam entre suas tribos (Pinsky, 1982). Os homens trabalhavam em conjunto para suprir as necessidades imediatas do grupo, não havendo acumulação dos excedentes. Não havia propriedade privada, pois, a terra pertencia a todos e os frutos do trabalho eram propriedade coletiva. Todos os membros da comunidade tinham condições iguais no uso e nas responsabilidades dos meios de produção. Cada pessoa da comunidade recebia a sua quota de produção conforme suas necessidades (Santos, 2012). Além disso, não havia a existência do Estado. O nomadismo ocorria porque os homens precisavam migrar em busca de novos lugares com mais alimentos, visto que não plantavam, apenas colhiam os alimentos dados pela natureza. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 3 O trabalho representava a luta pela sobrevivência. A necessidade de se alimentar, de se abrigar, de se proteger de outros animais era o fator que determinava a necessidade de trabalhar (Santos, 2012). O sistema primitivo de produção começou a se desestruturar quando os homens começaram a ter noção de território e se tornaram sedentários. Além disso, ocorreu o desenvolvimento da agricultura, a domesticação dos animais, a melhoria da fabricação de instrumentos, ferramentas e das armas de metal (Santos, 2012; Pinsky, 1982). Assim, ocorreu uma revolução no mundo do trabalho e na produção de bens materiais. Surgiu a divisão de trabalho: uns plantavam, outros trabalhavam nos moinhos, e alguns defendiam as terras dos outros, formando os primeiros exércitos (Pinsky, 1988). Nasceu, então, o intercâmbio de produtos derivados do trabalho, primeiro entre as tribos e depois no centro das próprias comunidades. As tribos fragmentaram-se em famílias que se converteram em unidades econômicas separadas. O trabalho comunitário dissolveu-se e desenvolve-se a ideia de propriedade particular (Santos, 2012). Figura 1 – Famílias primitivas Crédito: Ewilding/Shutterstock. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 4 Figura 2 – Nômades Crédito: Olga Kuevda/Shutterstock. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 5 Figura 3 – Humanos das cavernas Crédito: Panda Vector/Shutterstock. TEMA 2 – ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO SISTEMA ASIÁTICO DE PRODUÇÃO A fase histórica posterior à pré-história é a Antiguidade, período em que surgiram as primeiras civilizações. Uma civilização caracteriza-se pela presença de três estruturas: o poder político (Estado), a organização econômica (organização da produção dos meios necessários para subsistência) e a estrutura social (distinção entre diferentes grupos com funções distintas) (Pinsky, 1982). O modo de produção asiático, que teria início em 2500 a.C., na Antiguidade, caracterizou-se pelos primeiros Estados surgidos na Ásia Oriental. Era composto por nove civilizações: Egito, Mesopotâmia (sumérios, acádios, amoritas, assírios e caldeus), Palestina (fenícios e hebreus) e Persa (Irã). São as regiões que atualmente compreendem a China, a Índia e o Egito (Oltramari, 2019; Pinsky, 1982). Essas sociedades eram hidráulicas, ou seja, fixavam-se próximas aos rios, pois necessitavam de recursos hídricos para sobreviver. Caracterizavam-se A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 6 por serem estamentais, pois não havia mobilidade social, ou seja, a aposição social era determinada por hereditariedade (Oltramari, 2019; Pinsky, 1982). A economia, fundada na agricultura, era estatizada, ou seja, o governo controlava as atividades econômicas. O Estado era teocrático, pois a religião fundamentava o poder político (Oltramari, 2019; Pinsky, 1982). O sistema de trabalho pautava-se na servidão coletiva, em que os servos trabalhavam de forma compulsória em prol de obras públicas, pertencentes ao Estado (Oltramari, 2019; Pinsky, 1982). Os trabalhadores, também chamados de servos, camponeses ou aldeãos, pagavam aluguel ao Estado pelo uso das terras e ficavam com uma parte do que produziam, entregando ao Estado a maior parte restante (Pinsky, 1982). Essa forma de organizar a sociedade estava centrada na figura do rei- imperador, que exercia seu poder absoluto por meio da legitimação da graça divina (Santos, 2012). Nesse período, observou-se o surgimento de cadeias hierárquicas, com o aparecimento das classes sociais, a exploração do humano pelo humano e as lutas entre tribos. Figura 4 – Sistema de produção Crédito: Hennadii H/Shutterstock. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 7 TEMA 3 – ORGANIZAÇÃO DO TRABAHO NO SISTEMA ESCRAVISTA DE PRODUÇÃO O modo de produção escravista, que teria início em 3000 a.C., na Antiguidade, surgiu na Mesopotâmia e no Egito. No entanto, foram os gregos e romanos os povos que tiveram no escravismo o principal sistema de trabalho e produção (Santos, 2012). A base das relações de produção nesse regime era a propriedade privada da terra (Santos, 2012). A posse das terras concedia poder aos seus donos. A sociedade nesse modo de produção era censitária, ou seja, a divisão social dava-se por meio da renda, a qual, por sua vez, era representada pela posse de terras. A posse de terras concedia maior poder e, consequentemente, maior participação política às pessoas. Assim, os donos das propriedades privadas compunham a elite da época. Criava-se uma hierarquia de acordo com a renda, ou seja, a posse de terras. Os donos de menores quantidades de terras tinham alguns direitos, porém, com menor participação política. Os direitos políticos ligavam-se diretamente à renda, ou seja, à posse de terras. Quanto mais renda, mais direitos políticos. A classe composta pelos menos afortunados em renda era chamada de classe de “homens livres”. Assim, o grau de nobreza de uma pessoa era determinado pela quantidade de terras que possuía (Pinsky, 1982). Além da elite dos homens livres, existiam os escravos, que não tinham poderes nem direitos. O escravo era propriedade da classe dominante, a elite da sociedade. Não recebiam salário e a ele era concedido um mínimo de alimentos e de roupas.Podia ser vendido e não era considerado gente, mas sim “mercadoria”. Além disso, era exposto a vários castigos (Santos, 2012). Uma característica da sociedade escravista era a mobilidade social (diferente da sociedade estamental do sistema de produção asiático). Um homem livre, por exemplo, podia ser tornar escravo como forma de pagamento de dívidas. O detentor de terra poderia se tornar um homem livre e vir a se tornar um escravo (Pinsky, 1982). O aumento das famílias nobres trazia a necessidade de obtenção de mais terras e mais pessoas para trabalhar em seus cultivos. Por isso, ocorriam as guerras de conquista. Guerreava-se com povos vizinhos e as terras conquistadas A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 8 eram repartidas entre os nobres. O povo derrotado era, então, escravizado, e tornavam-se propriedades do Estado, cedidos aos nobres para o trabalho em suas terras (Pinsky, 1982). As possibilidades de progresso desse sistema ficaram esgotadas e, no final do Império Romano (476 d.C.), o sistema escravista desabou para dar lugar a outro sistema, o feudalismo (Santos, 2012). Figura 5 – Escravidão Crédito: Bilha Golan/Shutterstock. TEMA 4 – ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO NO SISTEMA FEUDAL DE PRODUÇÃO O sistema feudal tem suas origens na decadência do Império Romano. Predominou na Europa durante a Idade Média, entre os séculos V e XV. As invasões dos povos bárbaros às cidades enfraqueceram o comércio e levaram ao êxodo urbano, ou seja, à migração para o campo (Faber, 2011; Pinsky, 1982). O sistema feudal de produção baseou-se na servidão. Os senhores feudais eram os possuidores dos meios de produção e o principal deles, na época, era a terra (Faber, 2011; Pinsky, 1982). Era composto basicamente por três classes: o senhor feudal, que recebia a posse das terras do rei e tornava-se seu servo; os servos, que trabalhavam para os senhores feudais em troca de moradia, proteção e alimentação; e o clero, responsável pela vida religiosa do feudo (Faber, 2011; Pinsky, 1982). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 9 Os servos pagavam alguns tributos quitados com trabalho ou produtos. Entre os tributos, estão a corveia, trabalho gratuito nas terras senhoriais em alguns dias da semana; a talha, entrega de 50% da produção das terras servis ao proprietário do feudo; a banalidade, tributo cobrado pela utilização das instalações do feudo (moinhos, celeiros, fornos etc.), entre outros tributos (Faber, 2011; Pinsky, 1982). O termo feudalismo relaciona-se a feudo, que era uma grande área de terra constituída por grandes instalações, castelo, moinho, forno, igreja e vila servil (Faber, 2011). Na sociedade feudal, a economia era agrícola de subsistência, ou seja, voltada para o consumo próprio. Era uma sociedade estamental, ou seja, não havia mobilidade social, visto que a posição social era definida pela origem de nascimento, pois acreditava-se que as funções sociais eram estabelecidas pela vontade divina (Faber, 2011; Pinsky, 1982). A posse de terra era o principal símbolo de poder e autoridade no sistema feudal. O poder político, embora formalmente fosse constituído pela figura do rei, na prática era descentralizado, pois o poder era exercido pelos proprietários de terras que prestavam serviços militares ao rei (Faber, 2011; Pinsky, 1982). Entre os senhores feudais, havia uma subdivisão de classe em que os suseranos constituíam a classe doadora de terras e os vassalos compunham a classe receptora de terras que se comprometia a prestar serviços militares para os suseranos (Faber, 2011). Com o passar dos séculos, os camponeses foram lutando contra a opressão feudal para obter o direito de dispor livremente do produto de seu trabalho (Santos, 2012). Até que, ao final da Idade Média, o comércio e as cidades foram ressurgindo e minando esse sistema de produção. Surgiram pequenas unidades artesanais, apareceram grandes empresas empregando trabalhadores não submetidos à servidão e o comércio cresceu além dos mares com descobertas de novas rotas comerciais e com a colonização da América (Santos, 2012). Além disso, nos séculos XVI e XVII, realizaram-se grandes descobrimentos científicos e técnicos e, aos poucos, foi se desenvolvendo no seio da sociedade feudal um novo sistema, o sistema capitalista de produção. (Santos, 2012). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 10 Figura 6 – Feudo Crédito: Annanenasheva/Shutterstock. Figura 7 – Feudalismo Crédito: Macrovector/Shutterstock. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 11 TEMA 5 – ORGANIZACÃO DO TRABALHO NA CONTEMPORANEIDADE Para compreender os aspectos relacionados ao trabalho na atualidade, o Tema 5 toma como fatores de análise a organização do trabalho em três modos de organização da produção capitalista da contemporaneidade: taylorismo, fordismo e o toyotismo. A organização do trabalho nesses modos de produção, de certa forma, influencia a forma como o trabalho é concebido na atualidade. 5.1 Organização do trabalho no modelo taylorista de produção A organização do trabalho no modelo taylorista de produção é representada pela divisão do trabalho e tarefas especializadas e repetitivas, com maior controle sobre o tempo gasto (com cronômetro) a fim de reduzir os movimentos desnecessários. O trabalho é fragmentado para atingir modos mais rápidos e eficientes de executá-lo, garantindo o aumento da produtividade (Cattani, 2002). Assim, cada trabalhador exerce uma atividade específica no sistema industrial. Há uma “única maneira correta de se executar uma tarefa” e o estabelecimento de quotas de produção (Paula, 2002). A divisão do trabalho dá-se entre os trabalhadores especialistas que se encontravam na direção (engenheiros, cronometristas e contramestres) e os trabalhadores do chão da fábrica que executam as tarefas. Assim, marca-se a diferenciação entre trabalho intelectual ou de planejamento (gerente) e manual ou de execução (operários) representada pela hierarquização (Cattani, 2002). O trabalho baseia-se em controle e disciplina dos trabalhadores para acabar com qualquer desperdício de tempo e aumentar a produtividade. As atividades de trabalho são rotinizadas, monótonas, extenuantes e sem sentido para quem realiza (Ferreira, 2012). A autonomia dos trabalhadores de chão de fábrica representa um obstáculo para a organização. Assim, busca-se diminuir o domínio operário sobre a produção (Cattani, 2002) Para garantir o controle sobre a produção, a remuneração dos trabalhadores é proporcional à quantidade de trabalho realizada e há premiação por produtividade (Santos, 2012). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 12 5.2 Organização do trabalho no modelo fordista de produção O modelo fordista de produção apresenta semelhanças com o taylorismo, como a separação entre o planejamento e execução, bem como a fragmentação e simplificação do trabalho, que exige pouca capacitação por parte dos trabalhadores executores (Ferreira, 2012). Uma característica do fordismo é linha de montagem. Uma esteira rolante conduz o produto e cada funcionário executa uma pequena etapa da atividade de trabalho. Os funcionários não precisam sair do seu local de trabalho e o resultado é uma maior velocidade de produção (Santos, 2012). Cada trabalhador executa apenas uma pequena tarefa dentro de sua etapa de produção. No fordismo, o ritmo do trabalho é determinado pela velocidade da esteira, enquanto que, no taylorismo, o ritmo dos trabalhadores é controlado pelos cronômetros e pela eliminação dos movimentos desnecessários à produção (Laranjeira, 2002). Outra característicado fordismo é a fabricação em massa para o consumo em massa. O objetivo é reduzir ao máximo os custos de produção e baratear o produto, podendo vender para o maior número possível de consumidores a fim de obter maiores lucros (Santos 2012; Ferreira, 2012). Por um lado, o sistema se baseia no pagamento de baixos salários como forma de reduzir custos de produção. Por outro, possui uma abrangência que ultrapassa os limites fabris, incorporando estratégias de negociação com sindicatos para aumentar a renda da população e tornar os trabalhadores clientes das indústrias (Ferreira, 2012). Os problemas do fordismo para os trabalhadores dão-se devido ao trabalho repetitivo e desgastante, a falta de visão geral sobre todas as etapas de produção e a baixa qualificação profissional (Bitencourt; Bezerra, 2011). Além disso, utiliza- se de métodos rígidos e mecanismos punitivos para manter a disciplina e obter a obediência dos funcionários, sufocando conflitos e resistências por meio de sanções e ameaças (Paula, 2002). O modelo fordista apresenta sinais de crise ainda nos anos 1970. Em resposta à crise estrutural do capital, inicia-se um processo de reestruturação produtiva, tendo como objetivo a recuperação do ciclo reprodutivo do sistema capitalista. A reestruturação reflete em mudanças relacionadas ao desenvolvimento tecnológico e à introdução da gestão flexível, tendo como A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 13 referência o toyotismo. Assim, ocorrem as mudanças no modo como os trabalhadores realizam seus trabalhos. 5.3 Organização do trabalho no modelo toyotista de produção Em um ambiente de crise do capitalismo e reestruturação produtiva, surge o toyotismo. O novo modelo de organização surge nas fábricas de automóveis da Toyota, no Japão dos anos 1970. É um modelo de produção industrial que visa ao princípio da acumulação flexível, evitando principalmente os desperdícios ao longo do processo. Seus métodos possibilitam uma produção vinculada à demanda, individualizada, variada e heterogênea, em outras palavras, suficientemente flexível para atender às novas necessidades produtivas, tecnológicas e mercadológicas. Surgem os programas de qualidade total e de melhoria contínua, além das ferramentas kaizen e kanban (Ferreira, 2012; Santos, 2012). Quanto às relações de trabalho, o toyotismo é marcado pela horizontalidade, trabalho em equipe, multifuncionalidade dos trabalhadores e autocontrole. Há a valorização da cooperação, do consenso, da participação, flexibilização, qualificação do trabalhador, além de perspectivas de mobilidade social vertical e horizontal na organização. O controle que, antes, no taylorismo- fordismo, era externo, realizado pela chefia, é substituído pelo autocontrole dos trabalhadores a fim de diminuir os custos; assim, os próprios trabalhadores responsabilizam-se pelo processo produtivo. Além disso, há o aumento do uso de tecnologia e a redução do número de trabalhadores (Sennet, 1999). Embora se caracterize por maior flexibilização e participação, as relações de trabalho distanciam-se de uma real democratização, pois contribuem para a intensificação e a precarização do trabalho. Além disso, as estratégias participativas possibilitam que as organizações se apropriem dos conhecimentos dos trabalhadores (Paula, 2002; Antunes, 2009). Surgem os programas de qualidade total expressos por certificados de qualidade ISO. Por um lado, os profissionais a serem contratados devem ser altamente qualificados, por outro, cria-se uma indústria do “certificado”, obrigando o trabalhador a fazer constantes cursos de qualificação que, muitas vezes, não o qualificam (Santos, 2012). As práticas toyotistas encontram-se fortemente presentes nas organizações na atualidade. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 14 5.5 Trabalho na atualidade A reestruturação produtiva em escala global, resultante da crise de 1970, ocasionou mudanças no mundo do trabalho. A crise nos modelos taylorista e fordismo de produção desencadearam a difusão de novos modelos produtivos de trabalho flexível do toyotismo. A influência da configuração toyotista de produção, juntamente com o desenvolvimento das tecnologias, resultaram na nova morfologia do trabalho da atualidade, em que se predomina a precarização das relações de emprego (Antunes, 2009). A nova morfologia do trabalho configura-se, dentre outras, das seguintes tendências: formas mais desreguladas de ocupação (terceirizados, subcontratados, temporários, part-time); aumento dos trabalhos informais; aumento do trabalho feminino com remuneração inferior à média masculina; absorção dos desempregados do setor industrial pelo setor de serviços, resultando em expansão dos assalariados médios nesse setor; exclusão de jovens que atingiram a idade de ingresso no mercado, ou seja, jovens em idade pós-escolar; exclusão dos trabalhadores idosos com idade próxima de 40 anos e inclusão precoce de crianças no mercado nas mais diversas atividades produtivas; redução do trabalho chamado de improdutivo, relacionado às atividades de gerência e supervisão; e redução dos tempos improdutivos no processo de trabalho (Antunes, 2009). Além das tendências supramencionadas que configuram as formas de trabalho da atualidade, uma ampla gama de trabalhadores floresce nas últimas três décadas por meio do aumento do uso da tecnologia da informação, da globalização e da degradação das condições de trabalho: os profissionais da tecnologia de informação, denominado por Antunes (2009) de infoproletariado. Alguns dos profissionais que fazem amplo uso das tecnologias de informação praticam o trabalho a distância, o trabalho em casa (home office), em que o público e o privado se entrelaçam e a jornada de trabalho em geral se expande, pois, o trabalhador fica sempre disponível e pode ser solicitado a qualquer hora por conta do trabalho, e o trabalhador concorda com o próprio controle do tempo de trabalho. Além disso, essa modalidade pode levar ao isolamento, à individualização, ao fim do trabalho coletivo e à quebra dos vínculos sociais (Antunes, 2009; Rêses, 2019). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 15 Até mesmo os trabalhadores considerados de ponta, modernos, que usam ou desenvolvem tecnologias avançadas, estão imersos em condições de trabalho precárias como as que reinavam no final do século XIX e início do século XX. A tecnologia não amenizou a degeneração do trabalho, apenas a transformou (Antunes, 2009). Outra expressão de tipo de trabalhador envolvido pela tecnologia da informação é o operador de telemarketing. Ele é submetido a um rígido controle do processo de trabalho, não pode conversar com o colega do lado, tem tempo limitado para ir ao banheiro, é punido se não cumpre as metas e faz um trabalho repetitivo e prescrito ao limite (Antunes, 2009; Rêses, 2019). Além dos tipos de trabalho supracitados, vem ocorrendo na atualidade a expansão de ofícios no terceiro setor, assumindo uma forma alternativa de ocupação, por meio de empresas de perfil mais comunitário, abarcando um amplo leque de atividades nas quais predominam aquelas de caráter assistencial, sem fins lucrativos e que se desenvolvem relativamente à margem do mercado. Essa forma de atividade social, movida predominantemente por valores não mercantis – por exemplo, os trabalhos realizados nas ONGs e outras associações similares – tratam-se de alternativas limitadas para compensar o desemprego estrutural, não se constituindo em alternativa efetiva e duradoura ao mercado de trabalho capitalista. Além disso, frequentemente mascaram formas precarizadas de trabalho (Antunes, 2009). Assim, como a crise de 1970 direcionou para a reestruturaçãoprodutiva do sistema capitalista, resultando no modo de produção toyotismo, tem-se, com a crise de 2008, um direcionamento para uma nova reestruturação produtiva chamada de Indústria 4.0. Refere-se ao movimento que nasce na Alemanha em 2011, pensado pelos países capitalistas avançados. O conceito básico dela é o robô, a robótica, e a inteligência artificial que resulta em grande reestruturação no mercado de trabalho (Antunes, 2018b). A Indústria 4.0 também é identificada como a quarta revolução industrial. Realizando um apanhado histórico, a Primeira Revolução Industrial ocorreu no século XVIII, com a máquina a vapor. A Segunda, da metade do século XIX até o início do século XX, foi marcada pela descoberta e pelo aproveitamento de novas fontes de energia – como o petróleo para o motor a combustão, a água nas usinas hidrelétricas, o urânio para a energia nuclear – que revolucionaram ainda mais a produção industrial. A Terceira teve como propulsor a microeletrônica, a partir da A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 16 Segunda Guerra Mundial. Estar-se-ia, na atualidade, vivendo a Quarta Revolução Industrial com a indústria 4.0 (Evangelista, 2018). Um relatório apresentado durante a última edição do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, de nome “Futuro do trabalho: emprego, competências e estratégia da força de trabalho para a Quarta Revolução Industrial”, enunciou que postos de trabalho serão substituído por tecnologia inteligente e muitos profissionais poderão perder seus empregos. Além disso, já existem funções que, independentemente da tecnologia, estão sendo reunidas e absorvidas por um único trabalhador, como é o caso do motorista de ônibus que, além de dirigir o veículo, ainda precisa cobrar a passagem. Em contrapartida, ainda segundo o texto, haverá um ganho total de empregos nas áreas novas originadas devido à introdução tecnologias que substituem o trabalho humano (Evangelista, 2018). Outro estudo apresentado em 2017 pela consultoria estadunidense McKinsey & Company converge com o relatório apresentado no fórum mundial e acrescenta que, em países do capitalismo central, como Estados Unidos e Alemanha, entre 23% e 24% dos empregos atuais sofrerão diretamente com a automação, segundo esse levantamento. Países periféricos, que têm menos dinheiro para investir em automação e robótica, não seriam tão afetados até 2030. No Brasil, esse percentual pode chegar a 15% (Evangelista, 2018). Houve, nos anos 1970 e 1980, a tese de que o trabalho estaria acabando, que a classe trabalhadora ia desaparecer, a tese do fim da centralidade do trabalho. Para eles, a técnica e a ciência tornar-se-iam a principal força produtiva, substituindo a teoria do valor trabalho. Na realidade, há uma mutação profunda no mundo do trabalho (Antunes, 2006). Além disso, a fragmentação da classe trabalhadora e o desemprego estrutural têm servido de argumentos para a negação das possibilidades de emancipação humana pelo trabalho e para as proposições que fazem apologia à sociedade do tempo livre e do ócio criativo (Ferreira, 2012). Um desafio maior da humanidade é dar sentido ao trabalho humano tornando nossa vida também dotada de sentido, ou seja, instituir uma nova sociedade dotada de sentido humano e social dentro e fora do trabalho (Antunes, 2009). A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 17 Figura 8 – Trabalho atualmente Crédito: Elnur/Shutterstock. A luno: A N G É LIC A C A P R ILE S S A N T O S E m ail: a.capriles@ hotm ail.com 18 REFERÊNCIAS ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2000. _____. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 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