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CINESIOLOGIA APLICADA A TERAPIA OCUPACIONAL AULA 8 ABERTURA Olá! A melhora do condicionamento físico está relacionada com o bem-estar do indivíduo. Ela é mais significativa ainda quando se pensa em uma população com certas limitações. O exercício promove inúmeras melhorias que estão relacionadas às adaptações benéficas ao condicionamento físico do praticante com características especiais. Nesta aula, você verá sobre as características específicas das populações especiais, os cuidados, riscos e benefícios da prescrição de exercícios para populações especiais e as práticas de condicionamento físico mais indicadas para cada população especial. Bons estudos. Práticas de condicionamento físico para populações especiais REFERENCIAL TEÓRICO A melhora do condicionamento físico por meio da prática do exercício físico deve ser uma recomendação de extrema necessidade para as populações ditas especiais. No capítulo "Práticas de condicionamento físico para populações especiais", do livro Práticas de condicionamento físico, você irá identificar as características específicas das populações especiais, discutir cuidados, riscos e benefícios da prescrição de exercícios para populações especiais e apontar as práticas de condicionamento físico mais indicadas para cada população especial. Faça sua leitura e, ao final, você terá reunido os seguintes aprendizados: • Identificar as características específicas das populações especiais. • Discutir cuidados, riscos e benefícios da prescrição de exercícios para populações especiais. • Apontar as práticas de condicionamento físico mais indicadas para cada população especial. Boa leitura. Práticas de condicionamento físico para populações especiais Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar as características específicas das populações especiais. Discutir cuidados, riscos e benefícios da prescrição de exercícios para populações especiais. Apontar as práticas de condicionamento físico mais indicadas para cada população especial. Introdução Devido a seus múltiplos benefícios, o exercício como prática para a melhoria do condicionamento físico está em ascensão. Nesse sentido, cada vez menos se observa a prescrição de um único tipo de exercício e cada vez mais uma mescla desses estímulos, visando causar inúmeras alterações positivas junto ao praticante. Podemos projetar essas melhorias tanto para indivíduos saudáveis quanto para sujeitos com determinadas particularidades ou cuidados especiais que, dependendo de suas altera- ções metabólicas, poderão colher os benefícios da prática do exercício de uma maneira mais intensa. Neste capítulo, você conhecerá as características específicas das popu- lações especiais, bem como os benefícios, riscos e cuidados da prescrição de exercícios para populações especiais. Além disso, estudará as práticas de condicionamento físico mais indicadas para cada população especial. 1 Exercício físico e populações especiais O exercício é uma prática extremamente importante para mantermos e me- lhorarmos nossa qualidade de vida. Por meio dele, o corpo de uma maneira geral tende a fi car mais efi ciente e econômico para a realização de diferentes atividades (DOMINSKI et al., 2019). Pensando na prescrição de exercícios para promoção da saúde, o Colégio Americano de Medicina do Esporte reco- menda que sejam realizadas ao menos duas sessões por semana, com duração mínima de 30 minutos em intensidade moderada (AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE, 2017). Naturalmente, essa recomendação de prescrição de exercício é apenas uma premissa básica e, além dela, todos os cuidados referentes a seleção, prescrição, acompanhamento e avaliação do treinamento físico devem ser tomadas, sendo essas recomendações válidas tanto para indivíduos saudáveis quanto para populações especiais, que requerem uma atenção redobrada. Entende-se por populações especiais um grupo de indivíduos com uma condição clínica singular, que pode ser adquirida ou congênita, afetando funções ou estruturas corporais e trazendo algumas dificuldades específicas que podem limitar a atividade e participação em condições de igualdade com as demais pessoas. De acordo com Andrella e Nery (2012), é justamente por esse fator fisiológico que esses indivíduos se distinguem da “população geral”, sendo colocados em um grupo especial, que requer supervisão adicional para que a prescrição do treinamento seja segura e eficiente. Apesar de exigir uma atenção maior do profissional de educação física que acompanha esses grupos em sua rotina de treinamentos, o exercício físico gera inúmeros benefícios para essas populações especiais, dentre os quais podemos destacar a redução de sintomas e a melhoria do componente de aptidão física e condição de saúde (DOMINSKI et al., 2019). Ou seja, o exercício físico pode não curar cada um desses indivíduos, mas certamente trará adaptações significativas para sua saúde e qualidade de vida. Neste capítulo, abordaremos as seguintes populações: idosos, cardio- patas, diabéticos, gestantes e obesos. Ao longo do texto, apresentarmos as principais características de cada um desses grupos especiais, suas principais limitações, pontos que exigem atenção/cuidado adicional do profissional de educação física, os principais efeitos positivos do exercício para cada população e estratégias de treinamento físico que podem ser extremamente eficientes para seus praticantes especiais. Começaremos por uma condição que de certa forma não é nem crônica nem adquirida, mas que, de todo modo, é almejada por todos nós: a chegada à velhice. Práticas de condicionamento físico para populações especiais2 Idosos O envelhecimento é um processo natural, dinâmico e constante, infl uenciado por uma série de fatores biopsicossociais que acarretam mudanças fi siológicas signifi cativas no corpo humano. Segundo Silveira (2017), apesar de ser um processo natural, o envelhecimento não é vivenciado da mesma forma por todas as pessoas, já que o ambiente, o contexto social, o contexto econômico e o contexto familiar infl uenciam nesse processo e são fundamentais para que transcorra bem e com saúde. Considerando o processo de envelhecimento, observamos inúmeras mu- danças fisiológicas no corpo e em seus diversos sistemas, como o nervoso, o muscular, o cardiovascular, o endócrino, o respiratório e o esquelético, bem como na integração entre eles. A maioria dessas mudanças ocasionadas pelo envelhecimento representa processos que reduzem a capacidade funcional do indivíduo idoso, prejudicando, por consequência, sua saúde e qualidade de vida (SILVERTHORN, 2017). O processo de envelhecimento pode começar a se tornar mais visível e perceptível entre os 40–45 e os 60–65 anos de idade, podendo ser precoce ou não dependendo dos hábitos e da qualidade de vida de cada pessoa. Além disso, o processo de envelhecimento pode ser dividido em primário e secundário. O primário é caracterizado pelos processos deletérios fisiológicos naturais do envelhecimento, independentemente da presença de doenças ou de fatores do meio ambiente. Ou seja, são as mudanças pelas quais todas as pessoas irão passar ao longo da vida devido à degeneração celular. O secundário é caracterizado pelo somatório dos processos degenera- tivos com a presença de doenças e fatores ambientais. Esses efeitos deletérios do envelhecimento impõem mudanças significativas, como no sistema neuromuscular, em que são observadas alterações como a sarcopenia, um processo que envolve a perda de massa muscular e que, em associação ao processo de dinapenia (perda de força muscular), impõe aos idosos diversas limitações de movimentação e independência funcional. Ao mesmo tempo, o envelhecimento também altera aspectos neurais, como o processo de desmielinização dos neurônios, que causa uma diminuição na velocidade de condução dos impulsos elétricos pelo sistema nervoso, afetando a percepçãodo idoso, bem como sua velocidade de reação (AAGAARD et al., 2007). 3Práticas de condicionamento físico para populações especiais A sarcopenia refere-se especificamente à perda de massa muscular associada ao envelhecimento. No entanto, esse termo tem sido estendido à perda de força muscular relacionada com o avanço da idade. A prevalência de sarcopenia é de aproximadamente 12% para adultos de 60 a 70 anos de idade, aumentando para 30% por volta dos 80 anos de idade. Na maioria dos estudos, seu desenvolvimento está fortemente asso- ciado a elevada incapacidade, a desordens na marcha e no equilíbrio e a mortalidade (CÂMARA; BASTOS; VOLPE, 2012). Considerando o sistema esquelético, o processo de envelhecimento é marcado por uma ineficiência na remodelação óssea, de forma que as ações osteoclásticas, que induzem uma degradação óssea, ficam mais intensas e frequentes que as ações osteoblásticas, que induzem uma síntese óssea. Dessa forma, o envelhecimento promove um quadro de fragilidade óssea, conhecido como osteoporose, em que há uma grande perda da densidade mineral óssea, tornando os ossos mais frágeis e suscetíveis a fraturas. A osteoporose é uma doença metabólica do tecido ósseo, caracterizada por perda gra- dual da massa óssea, que enfraquece os ossos por deterioração da sua microarquitetura tecidual, tornando-os mais frágeis e suscetíveis a fraturas. A perda da independência funcional, decorrente da incapacidade de deambular, é a principal consequência da fratura de quadril, seja por limitação funcional ou por medo de quedas. A inatividade física leva à piora da osteoporose e aumenta ainda mais os riscos de novas quedas (SANTOS; BORGES, 2010). Observando os fatores recém-citados, identificamos que o idoso é um indivíduo que vivencia diariamente o processo de envelhecimento, que causa uma perda na percepção sensorial e espacial. Dessa forma, desequilíbrios são mais frequentes. Quando ocorrem, devido à redução de força, resistência e potência musculares, costuma haver uma grande dificuldade de retomada do equilíbrio ora perdido, ocasionando uma queda. A queda, por sua vez, induz um trauma físico de grande magnitude sobre os ossos do idoso, que já se encontram fragilizados pela osteoporose e apresentam grande risco de fraturas. Caso Práticas de condicionamento físico para populações especiais4 ocorra uma fratura no idoso, devido à sua fragilidade fisiológica, o processo de cicatrização é mais complexo, demandando um tempo de recuperação muito maior, durante o qual o idoso deverá permanecer imobilizado, reduzindo significativamente seu nível de atividade física. Isso, consequentemente, tornará as perdas funcionais causadas pelo envelhecimento ainda maiores, até o desenvolvimento da síndrome da fragilidade, uma condição patológica com grandes efeitos na saúde e qualidade de vida do idoso, além de uma grande taxa de mortalidade. Felizmente, o exercício físico tem se mostrado uma estratégia eficiente no combate aos problemas causados pelo envelhecimento e para manter a qualidade de vida durante o esse processo. Essa melhora da qualidade de vida — e por consequência do condicionamento físico com o exercício — tende a exercer uma influência favorável sobre a condição funcional do organismo e sobre sua capacidade de desempenho. Segundo Cadore et al. (2014), a prática de exercícios pode acarretar alterações benéficas para retardar os processos deletérios do envelhecimento. Podemos observar, por exemplo, os resultados da prática tanto no tecido ósseo quanto no muscular. Considerando o sistema muscular, o treinamento físico é capaz de promo- ver mudanças significativas nos níveis de força, massa muscular e potência neuromuscular, representando um aumento extremamente importante dessas valências físicas, que repercutem diretamente na independência funcional, bem como na saúde e qualidade de vida. Para o tecido ósseo, o impacto proveniente da prática da atividade física causa uma maior sobrecarga óssea, expondo o osso a episódios de estresse e remodelamento e reduzindo o processo de oste- oporose. Alguns estudos científicos indicam que há um efeito reverso, em que o treinamento promove ganho de massa óssea; no entanto, isso não é consenso na literatura. Seja como for, pelo mero fato de evitar um processo prejudicial que é causado pelo envelhecimento, pode-se considerar que intervenções via exercício são eficientes para o sistema ósseo (CHANDLER; BROWN, 2009). Pensando na prescrição de exercícios para idosos, alguns estudos sugerem que o treinamento concorrente é uma estratégia de treinamento físico mais eficiente (CADORE; IZQUIERDO, 2003). O treinamento concorrente é um método de treinamento físico que associa em uma mesma sessão o treinamento de força, seja na forma de musculação ou de treinamento funcional, com o treinamento aeróbico, realizado em esteira ou bicicleta ergométrica (cicloer- gômetro). Esse método têm se mostrado eficiente, pois associa as adaptações decorrentes do treinamento de força — como ganhos de massa muscular, de força muscular, de potência muscular, de densidade mineral óssea, entre outros — com os benefícios do treinamento aeróbico — como redução da 5Práticas de condicionamento físico para populações especiais pressão arterial, redução de massa adiposa, aumento da capacidade aeróbica, incrementos na resistência cardiorrespiratória, controle glicêmico, entre outros (CADORE et al., 2010). A prescrição do treinamento concorrente para idosos deve seguir uma série de cuidados, desde a anamnese, que busca conhecer informações rele- vantes do aluno, até o exame de doenças pré-existentes que possam afetar a prescrição do exercício, como hipertensão arterial ou diabetes. Além disso, é preciso identificar a experiência prévia do aluno com programas de exercício físico. O planejamento deve envolver sessões de familiarização, cujo objetivo é apresentar exercícios, movimentos e cuidados que o aluno deve ter com os equipamentos. A prescrição de exercícios deve levar em consideração as características, potencialidades e dificuldades de cada aluno, e sempre que algum exercício causar algum desconforto específico, deve ser substituído por outro exercício que trabalhe o mesmo grupo muscular. Em um estudo recente, pesquisadores avaliaram o efeito benéfico potencial da prescri- ção de treinamento de força com repetições máximas (SILVEIRA, 2017). Os pesquisadores dividiram a amostra em três grupos diferentes e avaliaram os efeitos do treinamento de força, dentro do treinamento concorrente, após 12 semanas. Os resultados desse estudo demonstraram que grupos que obedeceram a regime de repetições até a falha não obtiveram maiores incrementos de força ou massa muscular quando comparados a grupos que realizaram o treinamento de força com um número reduzido de repetições. Assim, conclui-se que não há necessidade de prescrever exercícios com repetições máximas, já que essa condição, além de não trazer maiores incrementos, causa um desconforto maior para os alunos, coloca-os em um risco mais elevado de lesão e induz uma maior dor muscular tardia. 2 Condições crônicas Cardiopatas Cardiopatas são todos aqueles indivíduos que possuem alguma alteração pato- lógica ou doença, seja crônica ou adquirida, que afeta o sistema cardiovascular, atuando em especial no coração ou nos vasos sanguíneos. Como exemplos de cardiopatias, podemos citar a doença cardíaca coronária, uma enfermidade que afeta os vasos sanguíneos que levam o sangue para o miocárdio; a ar- Práticas de condicionamento físico para populações especiais6 teriosclerose, uma condição em que há um acúmulo de gordura nas paredes dos vasos sanguíneos, diminuindo o fl uxo de sangue; e, sem dúvida, a mais frequente dentre as cardiopatias, que é a hipertensão arterial, uma condição em que o sangue que circula pelos vasos sanguíneos exerce uma força (pressão) muito grande contra as paredes dos vasos arteriais (SILVERTHORN, 2017). As cardiopatiasmerecem uma atenção especial, pois são os principais fato- res de risco para o surgimento de eventos que levam ao óbito, tanto no Brasil quanto no mundo, pois, quando se observa as causas de mortalidade, nota-se que as principais são eventos cardiovasculares, como cardiopatias isquêmicas e o acidente vascular cerebral (AVC). Tais eventos cardiovasculares que levam a óbito são influenciados diretamente por cardiopatias, como as citadas. De acordo com Monteiro e Sobral (2004), essa forte relação entre cardiopatias e eventos cardiovasculares que levam a óbito se dá principalmente porque essas cardiopatias causam um constante e progressivo desgaste e sobrecarga das estruturas cardiovasculares. Analisemos o caso da hipertensão arterial, a cardiopatia de maior inci- dência na população, para observar como isso ocorre. O primeiro aspecto a ser entendido é que o aumento da pressão causada pelo sangue contra as paredes dos vasos sanguíneos gera um estresse mecânico nos vasos, graças à força de cisalhamento que o fluído exerce contra o tubo pelo qual passa. Esse estresse mecânico contínuo, ocorrendo cronicamente, induz a um des- gaste das paredes dos vasos sanguíneos, que acabam mais suscetíveis ao aparecimento de pequenas lesões, que comprometem a circulação sanguínea ideal. Além disso, esse contínuo cisalhamento que ocorre contra as paredes dos vasos pode causar sua ruptura, levando a uma hemorragia interna que, como geralmente ocorre em vasos sanguíneos de pequeno porte, não causará uma perda de sangue significativa; no entanto, prejudicará o fluxo sanguíneo para determinadas células e tecidos, causando uma hipóxia nesses locais, que ficam sem suprimento de sangue e oxigênio, causando assim uma condição conhecida como isquemia ou derrame. Um segundo aspecto importante é o seguinte: para que o sangue seja ejetado do coração, é necessário que a sístole ventricular pressione o sangue existente no ventrículo até que a pressão intraventricular seja maior que a pressão arterial da aorta. Em condições normais, quando a pressão intraventricular passa de 80 mmHg, o sangue começa a ser ejetado do ventrículo para o interior da artéria aorta. No entanto, em uma condição de hipertensão, há necessidade do ventrículo contrair-se com mais força até gerar uma pressão que seja maior que a pressão da artéria aorta, na ordem de 120 mmHg. Ou seja, acaba havendo uma maior sobrecarga do miocárdio, que precisará constantemente se contrair 7Práticas de condicionamento físico para populações especiais com mais força para manter o ciclo cardíaco acontecendo. Em condições de hipertensão crônica, portanto, o miocárdio sempre precisará de um trabalho mais intenso e desgastante, até o ponto em que esse trabalho intenso fica tão desgastante que induz a uma condição chamada de insuficiência cardíaca, um quadro caracterizado por um coração ineficiente em bombear o sangue para todo o corpo, o que representa uma importante causa de óbito (SILVER- THORN, 2017). A hipertensão é uma enfermidade ainda mais perigosa por seu caráter de doença silenciosa, isto é, que não apresenta grandes sintomas ao indivíduo. Os principais sintomas percebidos ocorrem em casos de crises hipertensivas, quando pode-se observar uma forte dor de cabeça, tonturas, visão turva e dores no peito. Dessa forma, com exceção de casos de crises hipertensivas, a hipertensão arterial costuma ser uma doença assintomática e, por isso, pode levar anos (e até décadas) para ser diagnosticada. Porém, enquanto isso todos os desgastes causados pela hipertensão arterial continuam ocorrendo de forma progressiva, sem que a pessoa sequer tenha conhecimento. Felizmente, o treinamento físico também é uma estratégia bastante eficiente para prevenir, combater e controlar as cardiopatias, reduzindo significativa- mente suas magnitudes e efeitos prejudiciais ao organismo. Eis algumas das principais adaptações causadas pelo exercício: Redução da frequência cardíaca de repouso — a redução da frequência cardíaca de repouso é uma manifestação que indica uma maior eficiência do sistema cardiovascular. Ou seja, o sistema cardiovascular consegue suprir todas as necessidades do organismo com um número menor de ciclos cardíacos, reduzindo o trabalho do miocárdio e preservando-o de desgastes que podem induzir a uma insuficiência cardíaca. Redução da pressão arterial — o treinamento físico induz a uma redução da pressão arterial de origem multifatorial, como pela redução no débito cardíaco; por alterações humorais, como a produção de substâncias vasoativas, como o peptídeo atrial natriurético; pela liberação de subs- tâncias vasodilatadoras, como óxido nítrico; e pela retirada simpática, que induz a diminuição da secreção de adrenalina e noradrenalina, substâncias com grande potencial vasoconstritor. Práticas de condicionamento físico para populações especiais8 Melhora do perfil lipídico — o exercício promove um aumento nas concentrações de lipoproteína de alta densidade (HDL) e uma redução nos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL) e colesterol total. Essa mudança diminui significativamente o risco de surgimento de problemas arteriais, como a aterosclerose, que é a deposição de gorduras nas paredes dos vasos arteriais, causando uma redução significativa do fluxo sanguíneo. Dentro do campo do exercício físico, inúmeras estratégias de treinamento podem ser prescritas para cardiopatas, desde que inúmeros aspectos sejam observados e cuidados pelo profissional de educação física. No entanto, uma prática extremamente eficiente para cardiopatas é o treinamento aeróbico, que pode ser realizado em ambiente aberto, como em pista de atletismo e praças, ou em ambiente fechado, como em academia, em esteira ou em bicicleta ergométrica (cicloergômetro) (SILVA, 2019). Destacamos o treinamento aeróbico porque, além das adaptações cardiovas- culares citadas anteriormente, ele causa um aumento da capacidade cardiorres- piratória, demonstrada principalmente por uma elevação do consumo máximo de oxigênio e uma redução na massa adiposa, sendo uma efetiva estratégia de emagrecimento. Além disso, o treinamento aeróbico é uma intervenção em que o controle e a manipulação das suas variáveis é extremamente fácil, ou seja, o profissional de educação física pode acompanhar em tempo real a frequência cardíaca do aluno utilizando um simples frequencímetro (equipamento de baixo custo e altamente eficiente, extremamente recomendado para profissionais de educação física que atuam com a prescrição de exercícios). Como consequência, consegue-se efetuar ajustes para aumentar ou diminuir a intensidade do exercício, mantendo-o eficiente e seguro (MONTEIRO; SOBRAL FILHO, 2004). Considerando a prescrição de exercício físico para cardiopatas, a Asso- ciação Americana do Coração recomenda a prática semanal de pelo menos 75 minutos de atividade intensa ou 150 minutos de atividade moderada, que podem ser divididos em 3 dias por semana (SMITH JR. et al., 2006). Além disso, alguns cuidados precisam ser tomados, como o constante controle das variáveis cardiovasculares antes, durante e após a sessão de treinamento. Por isso, antes de iniciar a sessão de treinamento é extremamente importante que seja mensurada a pressão arterial e a frequência cardíaca do aluno, pois caso apresente valores elevados, deve-se aguardar em repouso para avaliar novamente e, caso a pressão arterial continue elevada, deve-se suspender a sessão de treinamento e recomendar que o aluno busque algum serviço de saúde especializado. 9Práticas de condicionamento físico para populações especiais Considerando ainda a prescrição, deve-se optar por exercícios de intensidade moderada, entre 60% e 80% da frequência cardíaca máxima, com duração de até 50 minutos. Nesse quesito, é importante destacar que a sobrecarga cardiovascular é influenciada mais pelo tempo em exercício do que pela intensidade. Dessa forma, em indivíduos que já contam com um maior nívelde treinamento, é mais adequado promover incrementos na intensidade do exercício do que no tempo de exercício, prescrevendo aeróbicos intensos, mas de curta duração, como nas modalidades de treino intervalado de alta intensidade (HIIT) (GÓES, 2017). Por fim, é importante destacar que outras estratégias de treinamento também podem ser utilizadas para o treinamento de cardiopatas, mas requerem também cuidados especiais. De acordo com Mello (2019), o treinamento de força, por exemplo, é uma estratégia bem interessante; porém, sua prescrição precisa ser completamente adaptada, evitando principalmente sessões com grande número de repetições e repetições máximas, já que nessas condições ocorre maior sobrecarga cardiovascular, o que pode colocar em risco a segurança do praticante. Além dos cardiopatas, outro grupo das populações especiais são os diabé- ticos, indivíduos que apresentam uma série de características que devem ser levadas em conta na hora de prescrição de exercício físico. Diabéticos O diabetes mellitus é uma doença metabólica que causa uma condição de hiperglicemia, isto é, grande quantidade de açúcar (glicose) no sangue. O diabetes pode ser classifi cado em duas variações/tipos: Diabetes tipo 1 — nessa condição, o sistema imunológico ataca as células do pâncreas responsáveis pela produção e secreção da insulina, reduzindo significativamente a capacidade fisiológica de produção e secreção desse hormônio, que, ausente, induz a um aumento na gli- cemia. Esse tipo de diabetes é muito menos frequente e geralmente é diagnosticado ainda na infância, sendo necessária a aplicação exógena de insulina. Diabetes tipo 2 — nessa condição, a insulina é produzida e secretada normalmente pelo pâncreas; no entanto, existe uma grande resistência à insulina, isto é, algum tipo de alteração fisiológica faz com que a insulina seja produzida e secretada, mas havendo dificuldade em desenvolver sua atuação, ocasionando o acúmulo de glicose na cor- Práticas de condicionamento físico para populações especiais10 rente sanguínea. Essa é a forma mais comum de diabetes, sendo sua incidência maior a partir dos 30 anos de idade e estando diretamente relacionada a hábitos inadequados de saúde, como sedentarismo e obesidade. O diabetes é uma condição bastante frequente na população. Estima-se que mais de 400 milhões de pessoas no mundo e 14,3 milhões de pessoas no Brasil sejam diabéticas, o que representa uma parcela substancial da população. Desse total, estima-se que entre 7 e 12% dos casos sejam de diabetes tipo 1, enquanto a maior parte, aproximadamente 90% dos casos, seja de diabetes tipo 2 (SILVERTHORN, 2017). O diabetes é prejudicial à saúde, sendo responsável por neuropatias que podem causar fraqueza e perda de sensibilidade. Além disso, sua gravidade é aumentada principalmente por ser um fator de risco para comorbidades, em especial as doenças cardiovasculares. Nesse caso, é possível classifi- car as complicações causadas pela diabetes em micro e macrovasculares (LEITE, 2018). Considerando as complicações microvasculares, isto é, as lesões causadas em pequenos vasos sanguíneos, podemos destacar a retinopatia, principal causa de perda da capacidade visual e até mesmo cegueira causada pelo diabetes, além da nefropatia, que pode inclusive induzir a uma insuficiência renal que pode ser fatal. Já entre as complicações macrovasculares, ou seja, aquelas que afetam os grandes vasos sanguíneos, podemos destacar situações como a aterosclerose, já que a hiperglicemia é um dos principais responsáveis pela formação de placas de ateroma, que podem bloquear parcial ou totalmente o fluxo sanguíneo, podendo ser causadoras de infartos. É interessante observar, no entanto, que o treinamento físico é uma es- tratégia efetiva também no combate e prevenção ao diabetes, tanto do tipo 1 quanto principalmente do tipo 2. Entre os principais benefícios causados pelo treinamento físico, destaca-se a sua eficiência no controle glicêmico, causada principalmente por uma adaptação das células musculares, o que as torna mais eficientes na capacidade de captação e utilização de glicose por vias independentes de insulina, contribuindo significativamente para redução da glicemia e dos níveis de hemoglobina glicosilada. Além disso, o exercício físico contribui significativamente para diversos fatores de risco que estão associados ao diabetes, em especial o diabetes tipo 2, como adequação do perfil lipídico, aumento no nível de atividade física, aumento de massa muscular, redução da massa adiposa, etc. 11Práticas de condicionamento físico para populações especiais Dentre as inúmeras possibilidades de intervenção física, destaca-se o treinamento de força como uma estratégia bastante efetiva para o trata- mento de pessoas diabéticas. Essa escolha é pensada a partir de inúmeros estudos que comprovam sua eficiência, promovendo ganhos de força, massa muscular, capacidade funcional, além de aspectos metabólicos ligados ao metabolismo da glicose, como aumento da sensibilidade à insulina e da captação de glicose. Considerando a prescrição do treinamento de força para indivíduos diabé- ticos, recomenda-se a utilização de exercícios multiarticulares, que mobilizam grandes massas corporais. Umpierre et al. (2011) afirmam que a intensidade pode ser de moderada a intensa e grandes volumes de treinamento podem ser recomendados, já que o tempo de atividade física é um fator que está relacionado à eficácia do treinamento físico no controle do diabetes O cuidado com a prescrição de exercícios para diabéticos deve levar em consideração também o ambiente externo à academia, sempre consultando qual foi o horário da última refeição. Nesse sentido, o controle da glicemia deve ser feito ao menos antes e depois do exercício. Além disso, apesar do treinamento de força envolver basicamente ações relacionadas ao sistema ATP–CP, o profissional de educação física deve estar atento aos sinais de hipoglicemia, que podem ser causados pelo exercício, como tonturas, palpita- ções ou formigamento ao redor da boca. Nesses casos, o profissional deve ter consigo sempre algum alimento com elevado índice glicêmico, como balas, bebidas adocicadas ou chocolates, que causarão um aumento temporário da glicemia sanguínea, normalizando-a. Os sinais de hipoglicemia e hiperglicemia são os seguintes. Hiperglicemia: corresponde a uma alta taxa de glicose no sangue. Como sintomas, observamos inquietação, nervosismo, sede, cãibras, visão turva, náuseas, dor ab- dominal e aumento da diurese. Hipoglicemia: corresponde a uma baixa taxa de glicose no sangue. Como sintomas, observamos suor excessivo, palpitações, tremores, confusão, sonolência, falta de coordenação, náuseas e dor de cabeça. Práticas de condicionamento físico para populações especiais12 Até o momento, observamos os cuidados necessários para a prescrição de exercícios para populações especiais que possuem alguma condição crônica. No entanto, dentre as populações especiais estão também indivíduos com condições adquiridas e/ou temporárias, como é o caso das gestantes. 3 Condições adquiridas Gestantes A gestação é um momento ímpar na vida de uma mulher. Ao longo de 40 semanas, essa mulher passará por inúmeras alterações fi siológicas e biome- cânicas em seu corpo, causando, entre outras coisas, mudanças posturais e do centro de gravidade, que tende a se deslocar para frente, podendo provocar forte dor lombar, a ponto de causar o afastamento de inúmeras atividades que a mulher desenvolvia até então. De uma maneira geral, durante a gravidez podemos observar um aumento do volume sanguíneo, o que acarreta um aumento na frequência cardíaca em cerca de 10 a 15 batimentos por minuto. Isso causa uma sobrecarga do músculo cardíaco para bombear o sangue de maneira eficiente para a mãe e para o feto. Paralelamente, com o transcorrer das semanas gestacionais, observamos uma maior dificuldade para a mãe realizar os movimentosventilatórios, o que tende a aumentar a dificuldade na transferência dos gases entre a atmosfera e suas células. Outra região que sofre é o sistema musculoesquelético. A postura tende a impor maior sobrecarga às articulações. Sabe-se que a gestante sofre um aumento de peso (líquido, bebê e tecido adiposo), o que pode variar de 11 a 30 kg, causando maior desconforto e dificuldade para as atividades básicas. Os músculos abdominais, dorsais e do assoalho pélvico acabam sendo os principais prejudicados pela fraqueza muscular. A gestante tende a encontrar uma posição que proporcione maior conforto, deixando de lado o correto alinhamento postural, o que aumenta as lombalgias e acentua a cifose torácica. Outros fatores significativos durante o período gestacional são o aumento da flexibilidade pela elevação hormonal — a fim de aumentar a amplitude articular da pelve no momento do parto — e também a alteração do centro de gravidade. 13Práticas de condicionamento físico para populações especiais O exercício físico gera muitos benefícios para a gestante, como aumento de força muscular, menor ganho de gordura corporal e peso, melhor adaptação do organismo materno às modificações da postura pela evolução gestacional, prevenção de traumas, melhora do humor e da imagem corporal, redução da depressão e ansiedade e diminuição de quedas e de desconfortos musculo- esqueléticos (MCDONALD et al., 2016). O exercício pode amenizar alguns ajustes que costumam causar desconfortos nesse momento. Acima de tudo, o exercício na gestação é recomendado na total ausência de qualquer anor- malidade e mediante avaliação médica especializada. Ademais, o exercício durante o período gestacional deve ter apenas o objetivo de manutenção da aptidão física e principalmente ser apenas visado para a saúde e não para um treinamento em busca de rendimento, pois isso poderia trazer riscos à gestante e ao feto. O exercício físico para gestantes deve ser planejado conforme o período da gestação. Para cada fase, são observadas algumas alterações importantes. Podemos dividir de uma maneira mais simplista o período gestacional em três partes. 1. Nas 12 primeiras semanas deve haver um cuidado redobrado, devido ao risco de aborto por má implementação da placenta no útero. Dessa forma, tanto a intensidade quanto o volume de treino devem ser ame- nizados nesse período. 2. Entre a 12ª e a 28ª semana, a grávida está no melhor período para a realização de treinamento. Com o maior aporte hormonal proveniente da gestação, ela encontra-se apta a realizar todas as atividades, bastando ter cuidado com aumentos de temperatura, humidade e sobrecargas. 3. Da 28ª semana em diante, são observadas grandes limitações pelo aumento da barriga, menor capacidade de manter o equilíbrio, maior sobrecarga cardíaca, entre outras. É nesse período que a grávida observa as maiores limitações. A prática de atividades na gestação é importante e recomendada, já que traz inúmeros benefícios, podendo inclusive auxiliar no momento do parto. No entanto, é importante destacar que não é recomendado que uma mulher sedentária comece uma atividade de alta intensidade durante a gestação. Sendo assim, é recomendado a continuidade de atividades para mulheres que já praticavam a atividade antes do início da gestação. Em caso de início das atividades, deve-se optar por atividades de intensidade leve a moderada e, nesse caso, o Pilates é uma modalidade que se destaca, trazendo inúmeros benefícios Práticas de condicionamento físico para populações especiais14 para gestantes em todas as etapas da gestação, como o desenvolvimento de força da musculatura lombar, que causará uma minimização das dores na região, além de uma melhora da postura corporal, mesmo com a mudança do centro de gravidade. Como se não bastasse, há o aumento na força da parede abdominal e assoalho pélvico, facilitando o trabalho de parto, bem como melhora na circulação sanguínea, na qualidade do sono, na concentração e na respiração. Já no pós-parto, a prática do Pilates acelera a recuperação, reduzindo a incontinência urinária e constipação, além de melhorar o sistema circulatório (JUSTINO; PEREIRA, 2016). A prescrição deve ser individualizada e adaptada, considerando as etapas gestacionais e evitando atividades complexas. Assim, é preciso que o profis- sional de educação física esteja sempre avaliando as variáveis fisiológicas da aluna, como frequência cardíaca, glicemia e pressão arterial. Um ponto importante é compreender as etapas da gestação e adaptar a rotina de atividades frente a essas demandas (MACEDO et al., 2018): O primeiro trimestre gestacional é a fase mais crítica da gestação, quando devem ser tomados os maiores cuidados, já que ainda não há formação ou fixação completa da placenta na parede do útero, não protegendo totalmente o bebê. Nessa fase, exercícios que envolvam a torção de tronco e exercícios mais dinâmicos com grande exigência de força abdominal devem ser evitados. No segundo semestre, a placenta já está bem fixada e o bebê, bem protegido. Portanto, há a possibilidade de incluir exercícios que exijam maior trabalho da musculatura abdominal e do assoalho pélvico, que inclusive, contribuirão para o trabalho de parto. Já movimentos comple- xos e com risco de queda devem ser evitados nesse período. É preciso estabelecer contato constante com o médico da gestante, já que pode haver algumas restrições na intensidade ou faixa de frequência cardíaca. No terceiro semestre, a gestação já está no estágio avançado, com grande proeminência abdominal e sobrecarga pelo peso do bebê, exigindo bastante da coluna lombar e dificultando a mobilidade da gestante Assim, é necessário recomendar movimentos mais simples, que evitem a compressão e que não causem desconfortos para a gestante. Dessa forma, pudemos observar as principais alterações fisiológicas vi- venciadas durante o processo gestacional e como os exercícios podem ser benéficos nessa condição. No próximo tópico, observaremos as características da obesidade e como o treinamento físico pode ser eficaz no seu tratamento. 15Práticas de condicionamento físico para populações especiais Obesos A obesidade é uma condição defi nida pelo acúmulo excessivo de gordura, armazenada nos depósitos de tecido adiposo, tanto superfi ciais — na forma de gordura subcutânea, presente imediatamente abaixo da pele nas regiões abdominais, glúteas e femorais — quanto em depósitos de gordura profundos, na forma de gordura visceral, localizada na cavidade abdominal junto aos órgãos vitais. Esse acúmulo excessivo de gordura, em especial de gordura visceral, traz inúmeros prejuízos para a saúde do indivíduo. Dados epidemio- lógicos indicam que no mundo já existem mais de 500 milhões de pessoas obesas. Segundo Rech (2014), no Brasil, essa condição tem demonstrado um crescimento considerável, assim como nos países desenvolvidos. O diagnóstico da obesidade é feito pelo índice de massa corporal (IMC), que é encontrado a partir de um cálculo simples, em que a massa corporal (em kg) é dividida pelo quadrado da estatura. Caso o resultado dessa equação esteja acima de 30 kg/m2, o indivíduo é considerado obeso. Apesar de simples, a avaliação do IMC tem sido utilizada em muitos estudos clínicos e epidemiológicos e possui grande eficácia populacional. No entanto, algumas ressalvas devem ser feitas, já que para indivíduos que apresentam uma massa muscular muito desenvolvida, como no caso de fisiculturistas, o resultado tende a ser impreciso, porque não distingue massa magra de massa adiposa. Contudo, essa condição se aplica a um número muito baixo de pessoas e, portanto, o IMC segue sendo uma avaliação bastante eficaz (CAPRA, 2016). O Quadro 1 apresenta os critérios de classificação de peso a partir do cálculo do IMC. Fonte: Adaptado de Capra et al. (2016). IMC (kg/m2) Classificação Grau de obesidade Risco de comorbidade Abaixo de 18,5 Peso baixo 0 Baixo 18,5–24,9Peso normal 0 Médio 25,0–29,9 Sobrepeso I Aumentado 30,0–39,9 Obeso II Moderado/alto Acima de 40 Obeso grave III Altíssimo Quadro 1. Valores referente ao IMC, sua classificação, grau de obesidade e risco de co- morbidade Práticas de condicionamento físico para populações especiais16 Os problemas advindos da obesidade ocorrem porque o tecido adiposo pode ser considerado, além de uma reserva de energia, um órgão endócrino, capaz de interagir com os demais sistemas fisiológicos, causando na maioria das vezes prejuízos que afetam o funcionamento correto desses sistemas, como uma espécie de processo inflamatório. A obesidade afeta os mais diversos sistemas. No cardiovascular, por exem- plo, o acúmulo de gorduras pode contribuir para a formação de uma placa aterogênica, induzindo hipertensão e outras doenças cardiovasculares. Já no sistema endócrino, a obesidade afeta a sensibilidade à insulina, tornando os indivíduos mais resistentes ao hormônio pancreático e induzindo um processo diabetogênico. No sistema muscular, pode-se observar um processo de infil- tração de tecido adiposo no músculo esquelético, o que, embora não cause uma atrofia, reduz a qualidade muscular pela diminuição de tecido contrátil intramuscular e, consequentemente, causando prejuízos na capacidade de contração e produção de força (RECH, 2014). Para que ocorra redução nos acúmulos de gordura e, consequentemente, o emagrecimento, o principal fator a ser observado é o déficit energético. Sempre que o consumo calórico for maior que o gasto calórico, haverá um estímulo para aumento do tecido adiposo. Já quando houver um consumo calórico inferior ao gasto calórico, haverá um estímulo que promove a redução na quantidade de tecido adiposo. Nesse aspecto, o treinamento físico surge como uma estratégia impor- tante, já que é capaz de promover o aumento no gasto calórico tanto de forma aguda — seja durante a própria sessão de treinamento ou após o exercício — quanto de forma crônica, já que a longo prazo o treinamento físico promove um aumento da taxa metabólica basal, isto é, a quantidade de calorias gastas diariamente pelo corpo. Além disso, o exercício estimula o aumento da massa magra e o aumento da mobilização de gorduras como fonte de energia. Podemos destacar tam- bém a maior resistência para suportar uma sessão de treinamento, aumento da oxidação de gorduras, elevação do consumo de energia pós-exercício, intensificação do consumo de oxigênio e aumento no gasto calórico diário. Como exemplo de recomendações, um programa de treinamento pode gerar déficit de 500 a 1000 kcal para gerar perdas de peso entre 0,45 e 0,90 kg por semana, e perda de peso de 10% em seis meses (FLECK; KRAEMER, 2017; HAFF; BOMPA, 2012; ARRUDA, et al., 2010). No entanto, diversos cuidados devem ser levados em consideração na hora de selecionar qual o tipo de atividade física será realizada, tendo em vista que o sobrepeso corporal traz um aumento na carga suportada pelo corpo e pelas 17Práticas de condicionamento físico para populações especiais articulações corporais. Essa sobrecarga fica ainda maior quando são realizados exercícios de alto impacto, como saltos, corridas, etc., que podem impor danos significativos ao sistema articular do aluno e prejudicar sua continuidade no programa de treinamento físico. Pensando nisso, as atividades no meio aquático, em especial a natação ou a hidroginástica, são estratégias eficientes, já que pro- movem inúmeros benefícios além do gasto calórico, sem que haja uma sobrecarga articular por atividades de alto impacto (CAPRA, 2016). É importante destacar que essas atividades em meio aquático podem ser aplicadas como estratégia de treinamento para indivíduos obesos, já que nelas é possível modificar diversos parâmetros de treinamento, como intensidade e volume, sem que haja aumento na sobrecarga articular (PINHO et al., 2017; FERREIRA JUNIOR et al., 2019). Na natação, por exemplo, a intensidade pode ser modulada pela velocidade do nado (mensurada pelo tempo para se completar cada volta na piscina) ou pelo uso de implementos que aumentem a força de arrasto, como palmares. Já o volume do treinamento pode ser modulado pelo controle do número de voltas realizadas, enquanto a densidade do treino é modulada pelo tempo de intervalo entre cada volta ou entre cada ciclo de voltas. Já na hidroginás- tica, a intensidade pode ser modulada pela velocidade de execução de cada movimento, ou ainda pela utilização de implementos que aumentem a força de arrasto, como palmares. Já o volume pode ser modulado pelo número de repetições, séries ou exercícios para cada grupo muscular. Em ambos casos, o treinamento promoverá diversas adaptações cardiome- tabólicas que estão relacionadas à obesidade, como diminuição na quantidade de tecido adiposo, maior eficácia no controle glicêmico e controle da pressão arterial. Também pode promover adaptações em variáveis que não estão diretamente relacionadas à obesidade, mas que contribuem para maior saúde e qualidade de vida, como aumento da capacidade aeróbica, aumento da força e resistência musculares, além de melhor coordenação motora. Dessa forma, ao longo deste capítulo pudemos observar as caraterísticas de cada um dos principais grupos considerados populações especiais. Além disso, compreendemos como o treinamento físico pode ser uma estratégia eficiente para o controle e prevenção dessas condições crônicas ou temporárias, além de identi- ficarmos as intervenções mais adequadas para cada um dos grupos especiais. O domínio desses conteúdos é importante para o profissional de educação física, já que o exercício físico é utilizado como tratamento para todos esses indivíduos. Assim, um profissional que compreenda as características, limitações e potencialidades de cada um de seus alunos, poderá avaliar, planejar e prescrever um treinamento físico de forma eficaz e segura, garantindo-lhes mais saúde e qualidade de vida. Práticas de condicionamento físico para populações especiais18 AAGAARD, P. et al. Mechanical muscle function, morphology and fiber type in lifelong trained elderly. Medicine & Science in Sports & Exercise, v. 39, nº. 11, p. 1989–1996, 2007. AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE. ACSM’s guidelines for exercise testing and prescription. 10. ed. Philadelphia: Wolters Kluwer, 2017. ANDRELLA, J. L.; NERY, S. de S. Populações especiais: conceitos na área das ciências da saúde e do esporte. EFDeportes.com, ano 17, nº. 167, abr. 2012. Disponível em: https:// www.efdeportes.com/efd167/populacoes-especiais-na-area-das-ciencias-da-saude. htm. Acesso em: 29 jun. 2020. ARRUDA, D. P. de et al. Relação entre treinamento de força e redução do peso corporal. 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Caso ele permaneça sedentário ao longo da vida, o processo degenerativo ocorrerá em velocidade mais acentuada. No entanto, com a prática do exercício, essa velocidade é reduzida e a pessoa pode aproveitar por mais tempo a manutenção do condicionamento físico. Faça uma reflexão sobre como o exercício pode afetar o ser humano ao longo da vida. PESQUISA Exercícios para crianças https://www.youtube.com/watch?v=anSUPS3j5wI O Serviço de Condicionamento Físico propõe, neste material, atividades simples, que você pode fazer com alguns utensílios da sua casa, para entreter as crianças de 2 a 5 anos e se exercitar com elas. As atividades devem sempre ser supervisionadas por um adulto. N
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